Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ Centro de Filosofia e Ciências Humanas – CFCH Instituto de História – IH O INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS SOCIAIS (IPES) E A DITADURA EMPRESARIAL-MILITAR: OS CASOS DAS EMPRESAS ESTATAIS FEDERAIS E DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA (1964-1967) Elaine de Almeida Bortone 2018 O INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS SOCIAIS (IPES) E A DITADURA EMPRESARIAL-MILITAR: O CASO DAS EMPRESAS ESTATAIS FEDERAIS E DA INDÚSTRIA FARMACÊUTICA (1964-1967) Elaine de Almeida Bortone Tese de doutoramento apresentada ao Curso de Doutorado do Programa de Pós-Graduação em História Social do Instituto de História da Universidade Federal do Rio de Janeiro como parte dos requisitos necessários à obtenção do título de doutor em História Social. Linha de pesquisa: Sociedade e Política Orientador: Prof. Dr. Renato Luis do Couto Neto e Lemos RIO DE JANEIRO 2018 i "Sem sombra de dúvida, a vontade do capitalista consiste em encher os bolsos o mais que possa. E o que temos a fazer não é divagar acerca da sua vontade, mas investigar o seu poder, os limites desse poder e o caráter desses limites." Karl Marx “O que foi feito é preciso conhecer para melhor prosseguir” Milton Nascimento e Fernando Brant ii Agradecimentos Ao Renato Luís do Couto Neto e Lemos pela parceria e sólida orientação, pela leitura atenta e cuidadosa, e pelos debates com recomendações e sugestões consistentes que contribuíram para enriquecer a forma e o conteúdo da pesquisa. Às professoras que compuseram a banca de qualificação: Sonia Regina de Mendonça e Virgínia Fontes, cujas críticas e sugestões foram fundamentais para a versão final da tese. Aos colegas do Coletivo Mais Verdade, que contribuíram com seus comentários e críticas sobre os resultados parciais apresentados, sobretudo Demian Bezerra de Melo, Luis Mário Behnken, Martina Spohr Gonçalves e Rejane Carolina Hoeveler. Aos colegas do Grupo de Trabalho de Orientação (GTO), que trouxeram subsídios teóricos fundamentais, e do Grupo de Trabalho Empresários e Ditadura, que teceram discussões importantes na apresentação parcial da pesquisa, especialmente Pedro Henrique Pedreira Campos. Um agradecimento muito especial aos meus amigos do doutorado. Ana Carolina Reginatto, pelos adoráveis estudos e debates, e Vicente Gil da Silva e sua companheira Laura Maria Loss Schwarz, pelas intermináveis conversas sobre nossas pesquisas, trocas de ideias e pelos documentos que carinhosamente me cederam dos arquivos em que pesquisaram nos Estados Unidos, os quais enriqueceram a minha tese. Nossas parcerias contribuíram para não me sentir mais sozinha do que o pesquisar impõe. Ao Felipe Pereira Loureiro, pelos documentos gentilmente cedidos do National Archives and Records Administration (NARA). À Larissa Ribeiro Raymundo, pelo trabalho caprichoso na organização da base do banco de dados. Ao Guilherme Girardi Calderazzo, pela revisão cuidadosa dos originais. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior (CAPES), pela bolsa de Doutorado regular. Aos professores, funcionários e coordenadores do PPGHIS. A todos os funcionários das inúmeras bibliotecas e acervos que passei pelas disposições, ajudas e orientações. Às minhas amigas Adriana Cesário de Faria Alvim, Alba Sales, Azilde Andreotti, Cristina Alvim Castello Branco, Helena Alvim Castello Branco, Isabela Cesário de Faria Alvim, Márcia Rachid, Maria Teresa Lima e Sonia Soares Ferreira, que sempre carinhosas compartilharam minhas angústias e me apoiaram para que este resultado fosse alcançado. Agradeço a toda minha família que não só entendeu minhas ausências frequentes, como me amparou nesta caminhada. Às minhas sobrinhas Talita de Almeida Bezerra Souza, iii que cuidou da minha mãe todas as vezes que precisei viajar para pesquisar e participar de congressos, e Karolina de Almeida Bezerra, que me ajudou em buscas no Diário Oficial. Ao meu primo Alexandre Alves de Mello, que me acolheu de forma supercarinhosa, em Brasília, sempre que precisei estar na cidade para pesquisar. Ao Marcio Almeida Campos, primo querido, que me fez dar boas gargalhadas com sua irreverência nos momentos mais tensos. Nenhuma palavra pode expressar a gratidão pelo enorme amor incondicional e o incentivo que recebi da minha mãe, Terezinha de Almeida Bezerra. No auge dos seus 81 anos, precisando de mim para suas demandas naturais da idade, me deu enorme suporte para que esta etapa da minha vida fosse a mais tranquila possível. iv RESUMO O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e a ditadura empresarial-militar: os casos das empresas estatais federais e da indústria farmacêutica (1964-1967) Elaine de Almeida Bortone Orientador: Prof. Dr. Renato Luis do Couto Neto e Lemos Resumo da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em História, Instituto de História, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos à obtenção do título de Doutor em História Social. Este trabalho apresenta uma pesquisa sobre o Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES). Entidade fundada, em 1961, por empresários nacionais e internacionais, tecnocratas de alto escalão e por militares da alta patente, em especial oficiais da Escola Superior de Guerra (ESG), com o apoio financeiro das empresas associadas e do governo norte-americano, para integrar os diversos grupos civis e militares em uma oposição que pudesse deter o governo de João Belchior Marques Goulart (1961-1964) e as forças sociais que o apoiavam. Após o golpe de 1964, ipesianos ocuparam os cargos mais importantes no Estado. A pesquisa analisa a presença política de associados e parceiros do IPES e sua área de influência em instâncias importantes do Estado brasileiro após o golpe. Trata-se das empresas estatais federais existentes no primeiro governo ditatorial, as quais tinham ipesianos nas suas direções determinando o rumo das empresas dentro dos interesses de sua classe. Entre as empresas associadas, se encontravam indústrias farmacêuticas, nacionais e estrangeiras, e empresários do setor que financiaram e se articularam no instituto. Na ditadura, mais precisamente no governo de Humberto de Alencar Castello Branco (1964-1967), eles trabalharam e exerceram pressão na formulação de políticas públicas para salvaguardarem seus interesses econômicos e políticos. O recorte temporal compreende o período entre 1961 e 1967 e justifica-se por ter sido uma época marcada pela fundação do IPES e o término do governo Castello Branco. Desta forma, este estudo se propõe a compreender as articulações da classe empresarial no início dos anos 1960 e o seu projeto econômico e político que deram origem à ditadura empresarial-militar. Palavras-chave: Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais; IPES; Ditadura empresarial-militar; Empresas estatais federais; Indústria Farmacêutica. v ABSTRACT O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e a ditadura empresarial-militar: os casos das empresas estatais federais e da indústria farmacêutica (1964-1967) Elaine de Almeida Bortone Orientador: Prof. Dr. Renato Luis do Couto Neto e Lemos Abstract da Tese de Doutorado submetida ao Programa de Pós-Graduação em História, Instituto de História, da Universidade Federal do Rio de Janeiro – UFRJ, como parte dos requisitos à obtenção do título de Doutor em História Social. This work presents a research on the Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES). Founded in 1961 by national and international businessmen, high-ranking technocrats andhigh-ranking military personnel, especially Escola Superior de Guerra (ESG)’s officers, with the financial support of associated companies and the US government, to integrate the various civilian and military groups in an opposition that could stop the government of João Belchior Marques Goulart (1961-1964) and the social forces that supported it. After the coup of 1964, ipesianos occupied the most important positions in the State. The research analyzes the political presence of members and partners of IPES and its area of influence in important instances of the Brazilian State after the coup. These are the federal state enterprises that existed in the first dictatorial government, which had ipesianos in their directions determining the direction of the companies within the interests of their class. Among the associated companies, were pharmaceutical industries, national and international, and entrepreneurs of the sector that financed and were articulated in the institute. During the dictatorship, more precisely in the government of Humberto de Alencar Castello Branco (1964-1967), they worked and exerted pressure in the formulation of public policies to safeguard their economic and political interests. The time cut comprises the period between 1961 and 1967 and is justified because it was a time marked by the foundation of the IPES and the end of the Castello Branco government. In this way, this study intends to understand the articulations of the business class in the early 1960’s, its economic and political project that gave rise to business-military dictatorship. Key-words: Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais; IPES; Business-military dictatorship; Federal state-owned companies; Pharmaceutical industry. vi Lista de quadros Quadro 1 – Membros da AMCHAM e suas ligações com outras entidades (1964) 50 Quadro 2 – Valores enviados aos estados pelo IBAB 55 Quadro 3 – Evolução do salário real (1958-1969) 120 Quadro 4 – Expurgos na burocracia civil (1964-1967) 146 Quadro 5 – Posição social das ocupações civis 148 Quadro 6 - Tipos de punições com base nos Atos Institucionais 148 Quadro 7 – Relação dos ministérios e ministros no período 1964-1967 149 Quadro 8 – Empresas estatais federais do setor financeiro e seus gestores ipesianos (1964-1967) 157 Quadro 9 – Membros do CMN com ligações com sistema financeiro 163 Quadro 10 – Desembolso efetuado pelo Sistema BNDE no setor siderúrgico – em R$ milhões 179 Quadro 11 – Empresas estatais federais do setor siderúrgico e seus gestores ipesianos (1964-1967) 181 Quadro 12 – Empresas estatais federais do setor elétrico e seus gestores ipesianos (1964-1967) 190 Quadro 13 – Empresas estatais federais do setor da mineração e seus gestores ipesianos (1964-1967) 198 Quadro 14 – Empresas estatais federais do setor petrolífero e seus gestores ipesianos (1964-1967) 203 Quadro 15 – Empresas estatais federais do setor de tecnologia e seus gestores ipesinaos (1964-1967) 208 Quadro 16 – Empresas estatais federais do setor telecomunicações e seus gestores ipesianos (1964-1967) 213 Quadro 17 – Empresas estatais federais do setor de transporte e seus gestores ipesianos (1964-1967) 217 Quadro 18 – Empresas estatais federais do setor infraestrutura e seus gestores ipesianos (1964-1967) 225 Quadro 19 – Empresas estatais federais do setor agricultura e seus gestores ipesinaos (1964-1967) 238 Quadro 20 – Empresas estatais federais do setor administrativo e seus gestores ipesianos (1964-1967) 249 Quadro 21 – Empresas estatais federais do setor educação e seus gestores ipesianos (1964-1967) 262 Quadro 22 – Empresas estatais federais do setor social/saúde e seus gestores ipesianos (1964-1967) 273 Quadro 23 – Empresas estatais federais do setor turismo e seus gestores ipesianos (1964-1967) 280 Quadro 24 – Ipesianos na elaboração da reforma administrativa (1963) 282 Quadro 25 - Capital estrangeiro aplicado no Brasil (1960) 305 Quadro 26 – Setores que receberam o capital norte-americano (1960) 305 Quadro 27 – Setores que mais receberam investimentos estrangeiros no Brasil (1960/1961) 306 Quadro 28 – Participação das indústrias nacionais e estrangeiras em diferentes setores (1960) 311 Quadro 29 – Número de laboratórios nacionais entre as vinte maiores empresas no mercado (1957-1962) 307 Quadro 30 – Capitais estrangeiros investidos no Brasil (1963) 308 Quadro 31 - Resumo das empresas estrangeiras que entraram no Brasil (1919-1973) 310 Quadro 32 – Alguns laboratórios nacionais vendidos a grupos estrangeiros (1936-1983) 316 vii Quadro 33 - Empresas dominantes no mercado brasileiro (1976) 319 Quadro 34 – Membros da Comissão Parlamentar de Inquérito (1961) 325 Quadro 35 – Participação do capital estrangeiro em indústrias brasileiras (1960-1961) 328 Quadro 36 - Sindicatos e Associações farmacêuticas criadas no Brasil (1932-1967) 349 Quadro 37 – Diretoria da ABIF (1964-1965) 361 Quadro 38 – Diretoria da ABIF (1965-1966) 363 Quadro 39 – Diretoria da ABIF (1966-1967) 363 Quadro 40 - Diretoria da SINDUSFARMA (1964-1966) 365 Quadro 41 – Diretoria do SINFAR (1964-1966) 368 Quadro 42 – Diretoria do SINFAR (1966-1968) 369 Quadro 43 – Diretoria do SINQFAR (1966-1968) 372 Quadro 44 – Diretoria da ABIQUIM (1964-1967) 376 Quadro 45 – Indústrias farmacêuticas que financiaram o IPES 380 Quadro 46 - Diretoria da Hoechst do Brasil Química Farmacêutica (1964-1967) 383 Quadro 47 – Diretoria da Merck (1964-1965) 392 Quadro 48 – Diretoria da Merck Sharp & Dohme- MSD (1964) 392 Quadro 49 – Diretoria da Química Farmacêutica Mauricio Villela (1964) 394 Quadro 50 – Diretoria da Pravaz-Recordati Laboratórios (1962-1967) 395 Quadro 51 – Diretoria do Laboratório Farmacêutico Internacional (1963-1964) 396 Quadro 52 – Diretoria da Indústrias Farmacêuticas Fontoura-Wyeth (1964-1966) 397 Quadro 53 – Diretoria da Laborterápica-Bristol (1964-1967) 399 Quadro 54 - Empresários do setor farmacêutico no IPES 410 Quadro 55 – Empresas e associações onde Paul N. Albright trabalhou 415 Quadro 56 – Empresas e associações onde Paulo Ayres Filho trabalhou 416 Quadro 57 – Atuação profissional de Paulo Ayres Filho 420 Quadro 58 - Empresa e associações onde Fernando Edward Lee trabalhou 423 Quadro 59 - Empresas e associações onde Jayme Torres trabalhou 425 Quadro 60 – Empresas onde Amilar Campos Filho trabalhou 427 Quadro 61 - Empresas e associações onde Mauricio Libânio Villela trabalhou 428 Quadro 62 – Empresas e associações onde José Scheinkmann trabalhou 429 Quadro 63 - Empresas e associações onde Zulfo de Freitas Mallmann trabalhou 431 Quadro 64 - Empresas e associação onde Hélio José Pires de Oliveira Dias trabalhou 433 Quadro 65 - Empresas e associação onde Domingos Pires de Oliveira Dias trabalhou 435 Quadro 66 - Empresas e associações onde Humberto Monteiro da Cunha trabalhou 438 Quadro 67 – Legislações que regulamentaram o capital estrangeiro no Brasil (1946-1964) 446 Quadro 68 – Comparações entre a Lei nº 4.131 e o Projeto de Lei nº 4.677 448 Quadro 69 – Observações apontadas por Paulo Ayres Filho para o governo 527 viii Lista de figuras Figura 1 – Cartaz da UNE 78 Figura 2 – Crescimento da indústria farmacêutica 291 ix Lista de siglas ABDIB Associação Brasileira para o Desenvolvimento da Indústria Básica ABF Associação Brasileira de Farmacêuticos ABIF Associação Brasileira de Indústria Farmacêutica ABIFARMAAssociação Brasileira da Indústria Farmacêutica ABIQUIM Associação Brasileira da Indústria Química ABRAFARM Academia Brasileira de Farmácia Militar ACB Ação Comunitária do Brasil ACBC Associação de Cultura Brasileira Convivio ACM Associação Cristã de Moços ACMRJ Associação Comercial do Rio de Janeiro ACMSP Associação Comercial de São Paulo ADCE Associação dos Dirigentes Cristãos de Empresas ADEP Ação Democrática Popular ADESG Associação dos Diplomados pela Escola Superior de Guerra ADF Associação Democrática Feminina ADIPES Associação dos Diplomados do IPES ADP Ação Democrática Parlamentar AERP Assessoria Especial de Relações Públicas AGEF Rede Federal de Armazéns Gerais Ferroviário AGO Assembleia Geral Ordinária AI Ato Institucional AID Agency for International Development AIDS Acquired Immunodeficiency Syndrome AIFLD Institute for Free Labor Development ALALC Associação Latino-americana de Livre Comércio ALANAC Associação dos Laboratórios Farmacêuticos Nacionais ALEF Aliança Eleitoral pela Família AM Amazônia AMCHAM American Chamber of Commerce for Brazil AMFORP American & Foreign Power Company AN Agência Nacional ANBID Associação Nacional dos Bancos de Investimentos ANF Academia Nacional de Farmácia ANIFAR Associação Nacional da Indústria Farmacêutica ANPES Associação Nacional de Programação Econômica e Social ANPES Associação Nacional de Programação Econômica e Social ANVISA Agência Nacional de Vigilância Sanitária APEC Análise e Perspectiva Econômica ARENA Aliança Renovadora Nacional ASESTRA Assessoria Especial de Estudos de Reforma Administrativa AUI Associação Universitária Interamericana AVB Ação dos Vigilantes do Brasil BA Bahia BANERJ Banco do Estado do Rio de Janeiro BASA Banco da Amazônia x BB Banco do Brasil BCA Banco de Crédito da Amazônia BCB Banco Central do Brasil BENITA Beneficiamento de Itabirito BIRD Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento BNB Banco do Nordeste do Brasil BNCC Banco Nacional de Crédito Cooperativo BNDE Banco Nacional de Desenvolvimento BNH Banco Nacional de Habitação BPR Bloco Parlamentar Revolucionário CAB Curso de Atualidades Brasileiras CACEX Carteira de Comércio Exterior CACO Centro Acadêmico Cândido de Oliveira CADE Conselho Administrativo de Defesa Econômica CAEEB Companhia Auxiliar de Empresas Elétricas Brasileiras CAMDE Campanha da Mulher pela Democracia CAPES Campanha de Aperfeiçoamento de Pessoal Especializado de Nível Superior CAS Corpo de Assistentes Sociais CBEE Companhia Brasileira Energia Elétrica CBP Consórcio Brasileiro de Produtividade CBR Confederação Brasileira Rural CCBFL Companhia Central Brasileira de Força Elétrica CCC Centro de Comando Anticomunista CCN Companhia Comércio e Navegação CCPIC Comissão Consultiva da Política Industrial e Comercial CD Comitê Diretor CD Conselho de Desenvolvimento CDFR Liga de Mulheres Democráticas CDI Comissão de Desenvolvimento Industrial CE Comitê Executivo CED Committee for Economic Development CEEB Companhia de Energia Elétrica da Bahia CEERG Companhia Energia Elétrica Rio Grandense CEF Caixa Econômica Federal CEFERJ Caixa Econômica do Estado do Rio de Janeiro CEFET Centro Federal de Educação Tecnológica CESIM Carteira de Exportação e Importação CESITA Companhia Aços Especiais Itabira CF Conselho Fiscal CFC Confederação das Famílias Cristãs CFEA Conselho Federal de Engenharia e Arquitetura CFF Conselho Federal de Farmácia CFLMG Companhia Força e Luz Minas Gerais CFLN Companhia de Força e Luz Nordeste CFLP Companhia de Força e Luz do Paraná CFP Comissão de Financiamento da Produção CGT Comando Geral dos Trabalhadores CHESF Companhia Hidrelétrica do São Francisco CHEVAP Companhia Hidrelétrica do Vale do Paraíba CIA Central Intelligence Agency xi CIB Centro Industrial do Brasil CIBRAZEM Companhia Brasileira de Armazenagem CIEE Centro de Integração Empresa-Escola CIERJ Centro de Indústrias do Estado do Rio de Janeiro CIESP Centro das Indústrias do Estado de São Paulo CICYP Consejo Interamenricano de Comércio y Producción CLA Council for Latin American CLACE Centro Latino-Americano de Coordenação Estudantil CLT Consolidação das Leis do Trabalho CMBEU Comissão Mista Brasil-Estados Unidos CMN Conselho Monetário Nacional CNBB Conferência Nacional dos Bispos do Brasil CNE Conselho Nacional de Economia CNEN Comissão Nacional de Energia Nuclear CNG Conselho Nacional de Geografia CNI Confederação Nacional das Indústrias CNP Conselho Nacional do Petróleo CNPq Conselho Nacional de Desenvolvimento Científico e Tecnológico CNT Conselho Nacional de Transportes CNV Comissão Nacional da Verdade CO Conselho Orientador COBAL Companhia Brasileira de Armazenagem COFAP Comissão Federal de Abastecimento e Preços COMBRATUR Comissão Brasileira de Turismo COMESTRA Comissão Especial de Estudos da Reforma Administrativa COMIND Banco Comércio e Indústria de São Paulo CONCLAP Conselho das Classes Produtoras CONEP Comissão Nacional de Estímulo à Estabilização de Preços CONFE Conselho Federal de Estatística CONSIDER Conselho Consultivo da Indústria Siderúrgica CONSPLAN Conselho Consultivo do Planejamento CONSULTEC Sociedade Civil de Planejamento e Consultas Técnicas CONTEL Conselho Nacional de Telecomunicações COS Centro de Orientação Social COSIPA Companhia Siderúrgica Paulista CPDOC Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil CPEF Companhia Paulista de Estrada de Ferro CPFL Companhia Paulista de Força e Luz CPI Comissão Parlamentar de Inquérito CREA Conselho Regional de Engenharia e Arquitetura CREAI Carteira de Crédito Agrícola e Industrial CRF Conselho Regional de Farmácia CRF Cruzada do Rosário em Família CSAB Curso Superior de Atualidades Brasileiras CSN Conselho de Segurança Nacional CTB Companhia Telefônica Brasileira CURSEF Curso Superior de Estudos Financeiros CVRD Companhia Vale do Rio Doce DASP Departamento Administrativo do Serviço Público DCT Departamento de Correios e Telégrafos xii DNAE Departamento Nacional de Produção Mineral DNEF Departamento Nacional de Estradas de Ferro DNER Departamento Nacional de Estradas e Rodagem DNOS Departamento Nacional de Obras de Saneamento DNPS Departamento Nacional de Previdência Social DNPVN Departamento Nacional de Portos e Vias Navegáveis DNSPC Departamento Nacional de Seguros Privados de Capitalização DOI-CODI Destacamento de Operações de Informação do Centro de Operações de Defesa Interna DOPS Departamento de Ordem Política e Social DOU Diário Oficial da União DOSP Diário Oficial de São Paulo ECEME Escola de Comando e Estado Maior do Exército ELETROBRÁS Centrais Elétricas Brasileiras ELETRONORTE Centrais Elétricas do Norte do Brasil ELETROSUL Centrais Elétricas do Sul do Brasil EMBRATEL Empresa Brasileira de Telecomunicações EMC Educação Moral e Cívica EME Estado Maior do Exército EPEA Escritório de Pesquisa Econômica Aplicada ESG Escola Superior de Guerra ETPAR Escritório Técnico Paulo de Assis Ribeiro EUA Estados Unidos da América FAC Frente Anticomunista Cristã FACUR Fraterna Amizade Cristã Urbana e Rural FAS Fundo de Ação Social FDA Food and Drug Administration FEBRAFARMA Federação Brasileira da Indústria Farmacêutica FEE Foundation for Economic Education FGTS Fundo de Garantia por Tempo de Serviço FGV Fundação Getúlio Vargas FIEGA Federação das Indústrias do Estado da Guanabara FIEPE Federação do Estado de Pernambuco FIERJ Federação das Indústrias do estado do Rio de Janeiro FIESP Federação das Indústrias do Estado de São Paulo FIFARMA Federación Latino-amreicana de la Indústria Farmacéutica FINAME Fundo de Financiamento pra Aquisição de Máquinas e EquipamentosIndustriais FINEP Financiadora de Estudos e Projetos FIPEME Programa de Financiamento à Pequena e Média Empresa FIRJ Federação das Indústrias do Rio de Janeiro FIRJAN Federação das Indústrias do Estado do Rio de Janeiro FJD Frente de Juventude Democrática FMP Frente de Mobilização Popular FNM Fábrica Nacional de Motores FNQ Fundação Nacional da Qualidade FPN Frente Parlamentar Nacionalista FUNABEM Fundação Nacional do Bem-Estar ao Menor FUNAR Fundo Agro-Industrial de Reconver FUNDACENTRO Fundação Jorge Duprat Figueiredo de Segurança e Medicina do Trabalho xiii FUNDEPRO Fundo de Desenvolvimento da Produtividade FUNTEC Fundo Tecnológico GAP Grupo de Ação Patriótica GAP Grupo de Assessoria Parlamentar GB Guanabara GD Grupo de Doutrina GE Grupo de Estudo GEA Grupo de Estudo e Ação GED Grupo de Estudo e Doutrina GEIFAR Grupo Executivo da Indústria Químico-Farmacêutica GEIPOT Grupo de Estudos para a Integração da Política de Transportes GEIQUIM Grupo Executivo da Indústria Química GI Grupo de Integração GLC Grupo de Levantamento de Conjuntura GLPs Good Laboratory Practices GO Goiás GOP Grupo de Opinião Pública GPE Grupo de Publicações/Editorial GRET Grupo de Trabalho sobre o Estatuto da Terra GT Grupo de Trabalho HIV Human Immunodeficiency Virus IAA Instituto do Açúcar e do Álcool IADESIL Instituto Americano para o Desenvolvimento do Sindicalismo Livre IAPs Institutos de Aposentadoria e Pensões IBAD Instituto Brasileiro de Ação Democrática IBC Instituto Brasileiro do Café IBRA Instituto Brasileiro de Reforma Agrária ICM Imposto sobre Circulação de Mercadoria ICT Instituto Cultural do Trabalho IDORT Instituto de Organização Racional do Trabalho IEA Instituto de Energia Atômica IED Instituto de Educação Democrática IFS Instituto de Formação Social IHGB Instituto Histórico Geográfico Brasileiro INDA Instituto Nacional de Desenvolvimento Agrário INPM Instituto Nacional de Pesos e Medidas INPS Instituto Nacional de Previdência Social INT Instituto Nacional de Tecnologia INTERFARMA Associação da Indústria Farmacêutica de Pesquisa IOC Instituto Oswaldo Cruz IPES Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais IPHAN Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional IPI Imposto sobre Produtos Industrializados IPM Inquérito Policial Militar IRD Information Research Department ITT International Telephone & Telegraph IUL Instituto Universitário do Livro JK Juscelino Kubitschek LAFI Laboratório Farmacêutico Internacional LBA Legião Brasileira de Assistência xiv LBAC Legião Brasileira Anti-Comunista LIDER Liga Democrática Radical LIMDE Liga de Mulheres Democráticas LLOYDBRÁS Companhia de Navegação Lloyd Brasileiro LPB Laboratório Paulista de Biologia MA Maranhão MAC Movimento Antidemocrático MAF Movimento Familiar Cristão MDB Movimento Democrático Brasileiro MDM Mobilização Democrática Mineira MED Movimento Estudantil Democrático MG Minas Gerais MSD Movimento Sindical Democrático MTR Movimento Trabalhista Renovador MUD Movimento Universitário de Desfavelamento MUDES Movimento Universitário de Desenvolvimento Econômico e Social NCNC National Captive Nations Committee NOVACAP Companhia Urbanizadora da Nova Capital do Brasil OAB Ordem dos Advogados do Brasil OBAN Operação Bandeirantes OEA Organização dos Estados Americanos OSPB Organização Social e Política Brasileira PAEG Programa de Ação Econômica do Governo PB Paraíba PCB Partido Comunista do Brasil PDC Partido Democrático Cristão PE Pernambuco PETROBRÁS Petróleo Brasileiro PL Partido Libertador PL Projeto de Lei PMDB Partido do Movimento Democrático Brasileiro PP Partido Progressista PR Paraná PRN Partido da Reconstrução Nacional PSD Partido Social Democrático PTB Partido Trabalhista Brasileiro PTN Partido Trabalhista Nacional PUC Pontifícia Universidade Católica RAM Reamarmento Moral REDETRAL Resistência Democrática dos Trabalhadores Livre RFFSA Rede Ferroviária Federal RJ Rio de Janeiro RN Rio Grande do Norte RS Rio Grande do Sul SAJE Sociedade de Auxílio à Juventude Estudantil SANBRA Sociedade Algodoeira do Nordeste Brasileiro SC Santa Catarina SERFHAU Serviço Federal de Habitação e Urbanização SERPRO Serviço Federal de Processamentos de Dados SFH Sistema Financeiro de Habitação xv SINDIFAR Sindicato da Indústria de Produtos Farmacêuticos do Estado do Rio Grande do Sul SINDURFARQ Sindicato das Indústrias de Produtos Farmacêuticos e Químicos para Fins Industriais no Estado de Minas Gerais SINDUSFARMA Sindicato das Indústrias de Produtos Farmacêuticos no Estado de São Paulo SINFACOPE Sindicato das Indústrias de Produtos Farmacêuticos, Medicamentos, Cosméticos, Perfumarias e Artigos de Toucador do Estado de Pernambuco SINFAR Sindicato das Indústrias de Produtos Farmacêuticos do Estado do Rio de Janeiro SINQFAR Sindicato das Indústrias Químicas e Farmacêuticas do Estado do Paraná SNA Sociedade Nacional de Agricultura SNFMF Serviço Nacional de Fiscalização de Medicina e Farmácia SNI Serviço Nacional de Informação SP São Paulo SPVEA Superintendência do Plano de Valorização Econômica da Amazônia SRB Sociedade Rural Brasileira SUDAM Superintendência da Amazônia SUDENE Superintendência do Desenvolvimento do Nordeste SUDEPE Superintendência do Desenvolvimento da Pesca SUFRAMA Superintendência da Zona Franca de Manaus SUMOC Superintendência da Moeda e do Crédito SUNAB Superintendência Nacional de Abastecimento SUPRA Superintendência de Política Agrária TERMOCHAR Termoelétrica de Charqueadas UCF União Cívica Feminina UDN União Democrática Nacional UEB União de Empresas Brasileiras UFBA Universidade Federal da Bahia UFF Universidade Federal Fluminense UFRJ Universidade Federal do Rio de Janeiro UNE União Nacional dos Estudantes USAID United States Agency for International Development USIBA Usina Siderúrgica da Bahia USIMINAS Usinas Siderúrgicas de Minas Gerais VRDN Vale do Rio Doce Navegações xvi Sumário Introdução 1 Objetivo geral 3 Objetivos específicos 4 Estrutura da tese 8 Metodologia 9 Capítulo 1 - O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e o governo Castello Branco (1964-1967) 13 1.1. Estrutura organizacional 23 1.2. Recursos financeiros 36 1.3. Mobilização da sociedade 59 1.4. Campanha ideológica 90 1.5. Os anteprojetos de reformas de base do IPES 101 1.6. O IPES pós-1964 103 1.7. Encerramento das atividades do IPES 112 1.8. O governo de Humberto de Alencar Castello Branco (1964-1967) 117 Capítulo 2 - O Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) no Estado restrito (1964- 1967) 126 2.1. Abordagem Histórica - 1930-1967 128 2.2. Os ipesianos na direção das empresas estatais federais (1964-1967) 145 2.3. A reforma administrativa 281 Capítulo 3 – A indústria farmacêutica em perspectiva histórica e suas formas organizativas 291 3.1. Contexto histórico 295 3.2. Evolução da indústria farmacêutica no Brasil (1860-1967) 300 3.3. Desnacionalização 311 3.4. Farsas, fraudes e crimes da indústria farmacêutica 319 3.5. Aspectos organizacionais das indústrias farmacêuticas 332 3.6. Formas organizativas do Estado e da clase empresarial do setor farmacêutico 339 3.6.1. Organização do empresariado 342 xvii 3.6.1.1. Os aparelhos privados de hegemonia: as associações, federações e sindicatos particulares 345 Captítulo 4 – As articulações do setor farmacêuticono Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) e no Estado (1964-1967) 379 4.1. Indústrias farmacêuticas que financiaram o IPES 380 4.1.1. Históricos das empresas 381 4.1.2. As contribuições financeiras 400 4.1.3. O conluio das indústrias farmacêuticas com a repressão 403 4.2. Empresários e executivos do setor farmacêutico com ligações no IPES 410 4.2.1. Histórico dos empresários 412 4.3. As políticas públicas para o setor farmacêutico 443 4.4. Governo Castello Branco (1964-1967) 466 Capítulo 5 – frações da burguesia contra o governo Castello Branco (1964-1967) 489 5.1. As ambiguidades e tensões com relação às políticas públicas 496 5.2. Ipesianos paulistas e Paulo Ayres Filho contra atacam o governo 521 Conclusão 532 Referências 537 Anexos 564 xviii 1 INTRODUÇÃO Esta tese é resultado de uma reflexão em torno do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), a partir de 2011, quando iniciei o mestrado no Programa de Pós-Graduação em Administração na Universidade Federal Fluminense (PPGAd/UFF). Conforme já apontara Dreifuss1, após o golpe de Estado de 1964, e iniciado o novo governo, sob a presidência de Humberto de Alencar Castello Branco (1964-1967), associados e parceiros do IPES, que haviam contribuído para os trabalhos do Instituto no sentido de depor o presidente João Goulart (1961-1964), foram os responsáveis pela elaboração da Reforma Administrativa, que se deu por meio do Decreto-Lei nº 200 de 1967. Constatei que os preceitos básicos desse decreto coadunavam com os do anteprojeto de Reforma Administrativa criado pelo IPES, no período de 1961 a 1964, o que confirmou a hipótese de que empresários e burocratas ligados ao Instituto estavam no controle do Estado, criando políticas públicas e reformas. O que sugere uma linha de continuidade na relação empresários pré-golpe com o desdobramento da estrutura administrativa do Estado pós-1964. A pesquisa deu origem a minha dissertação intitulada A participação do Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES) na construção da Reforma Administrativa da ditadura civil-militar (1964-1967). Com a documentação que levantei do IPES, as leituras que fiz durante e posteriormente ao mestrado e a participação, entre 2013 e 2017, no grupo de pesquisa Coletivo Mais Verdade2, onde era discutida a relação de poder da classe empresarial no Estado, verifiquei que existem várias questões sobre a importância política do IPES no período que antecedeu ao golpe e no primeiro governo ditatorial, que precisam ser analisadas e aprofundadas. A obra do cientista político uruguaio René Armand Dreifuss, 1964 A conquista do Estado – Ação política, poder e golpe de classe, foi determinante nas minhas reflexões. Dreifuss desenvolveu uma pesquisa inédita sobre o IPES. Investigou as articulações do empresariado com os militares no IPES, um laboratório de ideias que organizava os interesses sociopolíticos do capital multinacional e associado, em torno do golpe que iria derrubar o governo de João Goulart, em 1964. Da mesma forma, indagou sobre as conexões do IPES 1 DREIFUSS, René. 1964 A conquista do Estado. Ação política, poder e golpe de classe. Petrópolis (RJ): Vozes, 2006, p. 447. 2 O Coletivo Mais Verdade, criado em meados de 2013, no Rio de Janeiro, é integrado por uma equipe de pesquisadores de diversas áreas (História, Economia, Ciência Política, Jornalismo, entre outras). O objetivo do grupo é pesquisar as relações entre os grandes grupos econômicos e a ditadura militar que se instalou no Brasil em 1964, e que conformaram grandes impérios que se prolongam até o presente. 2 com associações empresarias na formulação de estratégias para a promoção de seus interesses de classe, sobretudo com o Instituto Brasileiro de Ação Democrática (IBAD) e no essencial todas essas instituições alinhadas nos mesmos objetivos. No seu levantamento, a partir dos documentos oficiais do IPES, Dreifuss identificou as empresas nacionais e internacionais que financiaram o instituto, bem como os empresários, tecnoempresários e diretores de empresas públicas e privadas que trabalharam e se articularam em uma conspiração no IPES. Após 1964, com a conquista do Estado, o autor evidenciou que os ipesianos ocuparam os setores-chave da administração pública, dos ministérios e das empresas públicas, onde asseguraram o rumo do Estado brasileiro servindo aos interesses gerais dos industriais e banqueiros multinacionais e associados. Em razão da abrangência da sua pesquisa, Dreifuss deixou diversas lacunas para futuras pesquisas, que não foram indagadas de forma profunda, até porque seus objetivos imediatos eram identificar as forças sociais que emergiram na sociedade brasileira com o processo de internacionalização, em sua etapa moderna, e acompanhar sua intervenção no Estado e na sociedade brasileira. Diante disto, alguns fatos levantados por Dreifuss indicam a necessidade de se investigar sobre questões que ele não se deteve em profundidade. Desta forma, decidi dar continuidade ao estudo sobre o IPES no doutorado em dois aspectos: 1) a predominância de ipesianos nas empresas estatais federais, após o golpe de 1964, com a “conquista” do Estado, mais precisamente no governo de Castello Branco (1964-1967); 2) a presença financeira das indústrias farmacêuticas no IPES, a participação dos empresários do setor nas articulações e ações políticas no instituto e as políticas públicas do primeiro governo ditatorial que beneficiaram o referido setor, uma vez que foi um dos setores econômicos que mais cresceram no Brasil. Após a pesquisa de Dreifuss, o IPES tem sido investigado por pesquisadores de diferentes áreas, tais como História, Ciência Política, Comunicação, Economia, Administração, Relações Internacionais, etc., que indagam acerca do golpe de 1964, mas não averiguaram os temas por mim escolhidos. Em relação ao primeiro, não encontrei estudos que mostrem e/ou discutam a grande presença de ipesianos nesses aparelhos do Estado, salvo uma referência ou outra. No que diz respeito ao segundo tema, os trabalhos encontrados, embora tenham contribuído com aspectos importantes sobre as indústrias farmacêuticas, discorrem apenas sobre o mercado farmacêutico, patentes, competições, inovações, medicamentos, etc. Não as analisam como um grupo econômico que teve relação direta com o golpe de 1964 e com a ditadura por meio do IPES. 3 A tese, portanto, está divida em duas partes. A primeira analisa caminhos que os ipesianos tomaram após o golpe. Consiste em aprofundar a identificação da presença política de associados e parceiros do IPES e sua área de influência em instâncias importantes do Estado brasileiro após o golpe de 1964. Trata-se das empresas estatais federais, existentes no período de 1964-1967, as quais tinham ipesianos ocupando os cargos de presidente, vice- presidente, diretor e conselheiro. Da mesma forma, analisar algumas características e variáveis das suas ações políticas, destinadas a produzir mudanças para garantir os seus interesses particulares. A segunda parte incide em pesquisar as indústrias farmacêuticas, um dos setores privados mais globalizado em atividade no Brasil, com grande importância na economia capitalista, e, por isto, exerce forte pressão política, econômica e social no Estado. Esta parte está dividida em dois capítulos. O primeiro analisa o desenvolvimento das indústrias farmacêuticas no mundo e no Brasil e, além disso, sistematiza o conhecimento sobre as entidades de classe do setor no sentido de averiguar suas atividades políticas para defender os interesses das suas associadas. O segundo capítulo levanta e examina as indústrias farmacêuticas, nacionais e internacionais, e os empresáriosdo setor que financiaram e participaram da conspiração no IPES. Investiga, ainda, as políticas públicas do governo Castello Branco que beneficiaram o setor, bem como os ipesianos envolvidos nas suas formulações. Para finalizar, o último capítulo analisa as disputas das frações de classe durante o governo Castello Branco, que priorizou o capital externo. Como se mobilizaram em apoio ao golpe, os ipesianos, sobretudo os não associados ao capital estrangeiro, se sentiram traídos, afinal foi um governo que eles respaldaram e ajudaram a criar, e que passou a ameaçar a sorte de sua classe. Objetivo geral Contribuir para compreender como as classes economicamente dominantes se organizou e desenvolveu estratégias e ações políticas, face à resistência de forças sociais e políticas adversas, para assegurarem a consecução dos seus objetivos: a conquista e direção do Estado. Dentre elas, empresários do setor farmacêutico, que financiaram e conspiraram no IPES para a instauração da ditadura empresarial-militar. Da mesma forma, perceber a extensão e as formas assumidas de ipesianos em instâncias estatais brasileiras durante o primeiro governo do regime ditatorial pós-64. 4 Objetivos específicos 1- Aprofundar o conhecimento sobre o IPES com documentos inéditos encontrados do IPES-SP, com a finalidade de melhor compreender as conexões entre os empresários e o Estado, antes e depois do golpe; 2- Identificar e analisar as empresas estatais federais e os empresários ipesianos que passaram pelos cargos de direção, com a finalidade de compreender a hegemonia de uma fração de classe no Estado, bem como as suas políticas para beneficiar o setor; 3- Analisar as indústrias farmacêuticas e os empresários do setor que participaram do IPES com o objetivo de inferir sobre suas conexões empresariais, militares e políticas entre a derrubada de João Goulart e o governo Castello Branco; 4- Identificar e analisar as formas de organização da burguesia empresarial do setor farmacêutico junto à sociedade civil e à sociedade política para analisar a sua pressão no sentido de beneficiar o setor; 5- Analisar as divergências e insatisfações de empresários ipesianos com o governo Castello Branco. Para atender aos objetivos da pesquisa, o estudo segue o roteiro teórico-metodológico sugerido pelo marxista italiano Antonio Gramsci sobre Estado ampliado, por conter na sua elaboração as transformações sofridas pelo Estado capitalista, a dominação política de classe, a representação de interesses, as políticas estatais, as relações entre classe dominante, os aparelhos privados de hegemonia, ideologia, além de conceitos que explicam as correlações de força no Brasil no início dos anos 1960, discutidas ao longo de toda a tese. Estudando as mudanças no capitalismo no século XIX, Gramsci analisa o Estado, as modalidades de dominação e as relações de força sobre as quais se erguem as frações de classe. A partir destas questões, o marxista sardo delineia o conceito de Estado entendido de forma mais ampla, que é formado pela sociedade política e sociedade civil, as quais estão em permanente inter-relação. A sociedade política é formada pelas instituições específicas do Estado, ou seja, os aparelhos e agências governamentais incumbidos da administração e da organização dos grupos em confronto, tal como do exercício da coerção sobre o que não consentem. A sociedade civil é a base organizativa das vontades da vida social e expressa contradições e ajustes entre frações da classe dominante, é a arena da luta de classes e da afirmação de 5 projetos em disputas.3 Nela se encontram os aparelhos privados de hegemonia, que gozam de relativa autonomia legal e base material própria, onde se organizam as vontades coletivas dos grupos dominantes ou dos dominados que disputam para conquistar ou conservar hegemonia, atingindo a organização do poder do Estado, isto é, a sociedade política. Segundo Pronko e Fontes: Organizações nas quais se elaboram e moldam as vontades e com base nas quais as formas de dominação se difundem, generalizando modalidades de convencimento adequadas ao grupo ou fração dominante – convencimento que passa a ser, a partir de então, tarefa permanente e fundamental da burguesia para fortalecer a sua capacidade de organizar o consentimento dos dominados, interiorizando as relações e práticas sociais vigentes como necessárias e legítimas.4 Para organizar as vontades e a ação coletiva dos aparelhos, Gramsci aponta a figura do intelectual orgânico que, nas suas palavras, “são ‘prepostos’ do grupo dominante para o exercício das funções subalternas da hegemonia social e do governo político”5. Portanto, têm a capacidade de serem os organizadores de seus interesses e da sociedade. Deste modo, o desenvolvimento de uma classe ou fração depende da capacidade dos aparelhos de gerarem seus intelectuais aptos a lhes conferirem homogeneidade, e, principalmente, a organização da sociedade em geral, o que “configuraria, de modo efetivo, a plena hegemonia da fração de classe específica por eles representada”6. A hegemonia é a visão de mundo, pautada por valores e crenças de um determinado grupo que se impõe sobre os demais grupos da sociedade. A conquista da hegemonia pelos aparelhos privados da sociedade civil é feita pela combinação da força e do consenso “que se equilibram de modo variado, sem que a força suplante em muito o consenso”7. O consenso, acrescenta Gramsci, é obtido também por meio da ação do próprio Estado restrito (sociedade política), que promove e difunde o projeto da fração de classe hegemônica. Portanto, explica Fontes por intermédio do conceito de hegemonia, Gramsci procurou analisar o processo de organização do consentimento, que remete ao trabalho de produção e difusão das concepções de mundo, da consciência social, de 3 MENDONÇA, Sonia Regina. O Estado Ampliado como Ferramenta Metodológica. Marx e o Marxismo v.2, n.2, jan/jul 2014. 4 PRONKO, Marcela e FONTES, Virgínia. Hegemonia. In: CALDART, Roseli Salete et al (org.). Dicionário da Educação no Campo. Fundação Oswaldo Cruz. Rio de Janeiro: Expressão Popular, 2012, p. 392. 5 GRAMSCI, Antonio. Cadernos do Cárcere. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 2000, v. 3, pp.20-21. 6 MENDONÇA, Sonia Regina. op. cit. p. 35. 7 GRAMSCI, Antonio. op. cit. p. 95. 6 formas de ser adequadas aos interesses do capital (hegemonia) ou, ao contrário, capazes de opor-se resolutamente a este (contra-hegemonia)8. Porém, os processos não são unívocos. O Estado constitui também o terreno do conflito de classe, que é, ao mesmo tempo, instrumento de uma classe e também lugar de luta hegemônica e processo de unificação das classes dirigentes9. Para discutir o Estado capitalista, do século XX, é usado o arcabouço teórico do grego Nicos Poulantzas. Poulantzas na sua obra O Estado, o poder, o socialismo, ao analisar a situação política na Europa e o fenômeno do estatismo autoritário, faz uma discussão em torno do Estado, do poder e das classes sociais. Para sair do círculo de estudos acerca do domínio político, que diz que o Estado se reduziria à dominação política no sentido em que cada classe dominante produziria seu próprio Estado, à sua medida, à sua conveniência e manipulá-lo à sua vontade, portanto, todo Estado não passaria de uma ditadura de classe, Poulantzas discute o alcance da utilização de classe do Estado. O Estado apresenta uma ossatura material própria que não pode de maneira alguma ser reduzida à simples dominação política. O aparelho de Estado, essa coisa de especial e por consequência temível, não se esgota no poder do Estado. Mas a dominação política está ela própria inscrita na materialidade institucional do Estado. Se o Estado não é integralmente produzido pelas classes dominantes, não o é também por elas monopolizado.Nem todas as ações do Estado se reduzem à dominação política, mas nem por isso são constitutivamente menos marcadas.10 Poulantzas rejeita, assim, o Estado como uma entidade de direito exclusivo de uma única classe, e passa a evidenciar as contradições que perpassam as relações de força. O Estado capitalista, explica o autor, é expresso pelas dimensões política e econômica nas relações que esse Estado estabelece com as estruturas das relações de produção e com as lutas de classe. É, portanto, uma condensação material de relações de forças entre classes e frações de classe, em que não há somente a presença, em seus aparelhos, das classes dominantes, mas também das classes dominadas. Não é homogêneo nem impermeável às contradições, mas imbuído de fissuras e permeado pelas contradições e lutas sociais. Com relação à dominação política e as lutas políticas na ossatura institucional do Estado, arcabouço que interessa na discussão da tese, o Estado capitalista constitui a burguesia como classe politicamente dominante. Ele representa a ou as classes dominantes, 8 FONTES, Virginia. Reflexões im-pertinentes. História e capitalismo contemporâneo. Rio de Janeiro: Bom Texto, 2005. 9 LIGUORI, Guido; VOZA, Pasquale (Org.). Dicionário gramsciano. Tradução de Ana Maria Chiarini et al. São Paulo: Boitempo, 2017. 10 POULANTZAS, Nicos. O Estado, o poder, o socialismo. Rio de Janeiro: Graal, 1985, p. 17. 7 sob a hegemonia de uma de suas frações, o capital monopolista, e organiza o interesse político do bloco no poder, fenômeno particular das formações capitalistas, que indica a unidade contraditória das classes ou frações de classe politicamente dominantes. Portanto, constitui a unidade política das classes dominantes, à medida que detém uma autonomia relativa em relação a tal ou qual fração, a fim de assegurar a organização do interesse geral da burguesia.11 Autonomia relativa do Estado, conforme Poulantzas, engendrada da relação entre o econômico e o político, possibilita sua mobilidade em torno de interesses divergentes e contraditórios de classe, resultante do jogo de contradições. Segundo Poulantzas, a unidade-centralização do Estado, em favor do capital monopolista, se estabelece por um complexo processo: A classe ou fração hegemônica não instaura apenas como aparelho dominante aquele que já tenha cristalizado por excelência seus interesses, mas também todo aparelho dominante de Estado tende a longo prazo a ser a sede privilegiada dos interesses da fração hegemônica e a encarar as modificações da hegemonia. Essa unidade se estabelece por toda uma cadeia de subordinação de determinados aparelhos a outros, e pela dominação de um aparelho ou setor do Estado, o que cristaliza por excelência os interesses da fração hegemônica sobre outros setores ou aparelhos, centros de resistência de outras frações do bloco no poder. Esse processo pode tomar assim a forma de toda uma série de subdeterminações e de dissimulações de alguns aparelhos em outros deslocamentos das funções e esferas de competência entre aparelhos e decalagens constantes entre poder real e poder formal; a forma de uma efetiva rede transestatal que sobrepuja e provoca curto-circuito em todos os níveis, os diversos aparelhos do Estado, rede que cristaliza por excelência, e por sua natureza, os interesses monopolistas; enfim pela subversão da organização hierárquica tradicional da administração do Estado, a dos circuitos de formação e de funcionamento de corpos-destacamentos especiais de altos funcionários de Estado, dotados de um alto grau de mobilidade não apenas interestatal mais igualmente entre o Estado e os negócios monopolistas e que, sempre pela estratégia de importantes transformações institucionais, são encarregados de colocar em ação a política e em favor do capital monopolista.12 Uma das procupações nesse trabalho foi identificar aparelhos do Estado, as empresas estatais federais, que foram a sede dos interesses da fração hegemônica. Bem como a expressiva quantidade de civis e militares, que passou pela órbita do IPES e ocupou importantes e determinantes cargos nas estatais. Detentores de mobilidade entre o Estado e os negócios monopolistas, a presença desta fração das classes sociais nos aparelhos estatais explica as políticas e diretrizes implantadas. Dados tais contornos, a tese apresenta ainda reflexões sobre o capitalismo, intensificado no Brasil, no início do século XX, com a crescente industrialização, que foi 11 POULANTZAS, Nicos. op. cit. pp. 145-151. 12 Idem, p. 158. 8 responsável por mudanças estruturais no Estado, criando condições para a expansão do modo capitalista de produção. Para tal, para atender a essa reflexão, é indispensável analisar o crescimento das funções do Estado, no caso as empresas estatais federais; a nova burocracia; as novas correlações de força, pois o desenvolvimento do capitalismo é um problema que diz respeito à oposição entre classes sociais que emergem; e identificar os interesses sociais, as alianças políticas e as relações de poder desencadeadas com a industrialização que se converteram em base do Estado. No tocante à propriedade do capital, indagar o papel assumido pelas empresas de capital estrangeiro e pelas empresas estatais na constituição do capitalismo. Estrutura da tese A tese está dividida em cinco capítulos, que podem ser lidos de maneira independente, embora o seu sentido seja mais apreendido com a leitura do capítulo 1 no qual avança os estudos sobre o IPES, sua formação, seus objetivos e ações na direção de organizar o empresariado e segmentos da sociedade para desestabilizar e depor o presidente João Goulart. O capítulo 2 apresenta os levantamentos das empresas estatais federais e seus respectivos presidentes, vice-presidentes, diretores e conselheiros que passaram pela órbita do IPES. O capítulo 3 analisa a indústria farmacêutica, seu crescimento no mundo e no Brasil, que está diretamente relacionado com o processo de entrada e expansão das indústrias farmacêuticas estrangeiras atreladas às desnacionalizações. Para entender esse processo, o capítulo investiga ainda as formas organizativas da classe empresarial do setor. O capítulo 4 analisa a participação das indústrias farmacêuticas e dos empresários do setor no IPES, seja com financiamentos, seja na organização de estratégias e ações para depor Goulart. Por fim, no capítulo 5 são analisadas as disputas internas de frações da classe dominante no governo Castello Branco, que não foi discutido por Dreifuss, embora tenha pontuado que o Estado se tornou uma arena onde frações divergentes das classes dominantes, excluídas do bloco governante, ajustavam suas próprias divergências13. Frações da classe empresarial sentiram-se traídas, afinal foi um governo que eles respaldaram e ajudaram a formar. 13 DREIFUSS, René Armand. 1964: a conquista do Estado. op. cit. p. 514. 9 Metodologia Na primeira parte da pesquisa, a meta inicial era levantar apenas as empresas estatais federais dos setores mais dinâmicos da economia, e que têm coerência com o ideário do IPES. Mas durante as buscas, encontrei empresas de segmentos menos ativos que têm ipesianos nas suas administrações, o que mostra uma dinamização ainda maior dos sócios e parceiros do instituto no Estado e sugere que, no período de 1964-1967, o Estado representou os interesses políticos da burguesia sob a hegemonia de uma de suas frações, o capital multinacional e associado. É importante registrar as dificuldades encontradas para fazer o levantamento das empresas existentes, bem como dos seus respectivos gestores durante o período pesquisado. Com relação às empresas estatais federais, não existe literatura ou órgão oficial que tenha a relaçãocompleta. Só a partir de 1981 que a Secretaria de Controle de Empresas Estatais (SEST)14 começou sistematizar e disponibilizar publicações sobre o conjunto dos organismos estatais. Da mesma forma, foi extremamente difícil obter os nomes dos presidentes, vice- presidentes, diretores e conselheiros das empresas levantadas. Algumas empresas foram desativadas e os seus acervos se evaporaram, outras foram privatizadas e, como já esperado, não atenderam às minhas solicitações. Às estatais federais ainda existentes, recorri à Lei de Acesso à Informação15. Algumas forneceram dados completos, outras incompletos, diversas não possuíam as informações e um caso específico que tem que ser mencionado é o da Petrobrás, que se mostrou muito resistente para disponibilizar as informações, mas, depois de muita insistência e argumentação, cedeu. Diante dessa situação, para compor os quadros das empresas estatais e seus administradores, busquei elementos no Arquivo Nacional (RJ e DF), na Biblioteca Nacional, nas bibliotecas da Eletrobrás e do Instituto Aço Brasil, nos ministérios, no Diário Oficial da União, nos livros, nos jornais da época e na Internet, onde nem sempre encontrei informações completas. Portanto, a falta de dados do período não me permitiu construir uma amostra maior, mas, ainda assim, me proporcionou uma percepção extremamente útil de como o processo de decisão nas empresas estatais estavam nas mãos dos ipesianos, proporcionando 14 Criada por meio do Decreto nº 84.128, de 29 de outubro de 1979, como órgão central do Subsistema de controle de recursos e dispêndios de empresas estatais, no âmbito do Sistema de Planejamento Federal. 15A Lei nº 12.527, sancionada pela Presidência da República em 18 de novembro de 2011, regulamentou o direito constitucional de acesso dos cidadãos às informações públicas, e seus dispositivos são aplicáveis aos três Poderes da União, Estados, Distrito Federal e Municípios. Disponível em <http://www.acessoainformacao.gov.br/sistema/site/acesso_info.html> Acessado em: 27.01.2016. http://www.acessoainformacao.gov.br/sistema/site/acesso_info.html 10 uma cooperação entre representantes do capital internacional, do capital nacional e os altos escalões do aparato estatal na construção da economia brasileira. Com os nomes das empresas levantados, os organizei em quatorze setores para melhor análise: financeiro, siderúrgico, elétrico, mineração, petrolífero, tecnologia, telecomunicações, transporte, infraestrutura, agricultura, administração, educação/cultura, social/saúde e turismo. Para cada setor, construí quadros detalhados com os nomes das empresas estatais, o tipo de empresa (empresa pública, autarquia, economia mista, fundação), os ministérios aos quais estavam vinculadas e seus ministros, e os nomes dos presidentes, vice-presidentes, diretores e conselheiros ipesianos com as datas de suas atuações nas empresas. É importante esclarecer que o nome e o tipo de empresa e o ministério vinculado dizem respeito ao período pesquisado. Em outro momento, as empresas podem ter outra nomenclatura, estarem enquadradas em outro tipo ou estarem vinculadas a outros ministérios. Devido às dificuldades de encontrar datas precisas e os desencontros de informações de atuação dos dirigentes, decidi por apresentar apenas as informações conseguidas, às vezes apenas a data de início na função. Há casos de dirigentes que já vinham atuando nas estatais e uma pequena minoria se manteve nas empresas no fim do governo Castello Branco. A pesquisa não tem como finalidade analisar em profundidade os setores dentro da economia brasileira, já fartamente estudados por outros pesquisadores. As decisões dependem de quem as toma, portanto, para compreender o processo de decisão nas empresas é necessário falar dos homens que as dirigiram. Desta forma, um dos objetivos do capítulo é investigar e analisar os ipesianos que estavam na condução das empresas estatais, onde tomavam e executavam decisões sobre os rumos das empresas, com objetivo de verificar: 1) suas atuações junto e no IPES e em outros aparelhos privados de hegemonia; 2) as suas atuações, conexões e relações nos setores público e privado; 3) as suas participações em entidades de classes; e 4) as suas contribuições na construção de políticas públicas. Para compor os perfis e as trajetórias dos ipesianos, busquei informações nos depoimentos de ipesianos no acervo de história oral do CPDOC/FGV, em livros biográficos, no Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro do CPDOC, jornais de época e Internet. Com a finalidade de certificar se os dirigentes eram ipesianos, recorri aos documentos do IPES e à obra de René Dreifuss, que catalogou os associados, parceiros e apoiadores do instituto. Os documentos do IPES utilizados estão custodiados no Arquivo Nacional do Rio de Janeiro, no fundo correspondente e no Centro de Pesquisa e Documentação de História Contemporânea do Brasil da Fundação Getúlio Vargas (CPDOC/FGV), no acervo de Paulo Ayres Filho. 11 Na segunda parte, que diz respeito às indústrias farmacêuticas, dissertei, a partir de vasta bibliografia dedicada ao tema, sobre o crescimento do setor no mundo e no Brasil; a organização interna das empresas; e a desnacionalização. Ainda rastreei e analisei a organização dos empresários, existentes no momento histórico pesquisado, em torno das entidades de classe com vistas a perceber suas demandas e/ou pressões setoriais, lutas internas, entre entidades e no Estado, para efetivamente defenderem seus interesses e seus projetos. Após o levantamento das entidades de classe do setor, fiz contato com as que ainda estão em atividade para obter dados sobre as histórias de suas formações, atuações, dirigentes, vozes discordantes, etc., já que as informações em suas páginas oficiais na Internet não dão conta do debate que se desenvolveu no seu interior. Elas dizem respeito apenas às organizações e atividades atuais. Mas não obtive o retorno desejado, a maioria ignorou minhas solicitações por e-mail ou por telefone. O presidente da Academia Nacional de Farmácia, Lauro D. Moretto, por exemplo, respondeu meu e-mail e me encaminhou para Serafim Branco e Dan Gedankien, os quais nunca me replicaram, mesmo com minha insistência. Diante da falta de comunicação, fui diretamente a algumas entidades, mas da mesma forma não obtive dados e informações, pois os profissionais que me receberam alegaram que não possuíam acervos. Consegui entrevistar um diretor do Sindicato das Indústrias Farmacêuticas do Rio de Janeiro (SINFAR), Onésimo Azara Pereira, que não só se esquivou com as minhas indagações, como me deu respostas evasivas. Quando o perguntei sobre a entidade de classe, a Associação Brasileira da Indústria Farmacêutica (ABIF), afirmou que nada sabia, mas depois eu li, em um jornal de época, que foi seu diretor. Apenas o Sindicato de Pernambuco me passou algumas informações a respeito da sua formação. Neste contexto de dificuldades de obter elementos para fazer comparações e confrontos, já que o setor privado se fecha tanto pessoalmente como nas suas redes virtuais públicas, busquei subsídios nos jornais de época, Internet, Diário Oficial da União, jornais voltados para a comunidade farmacêutica, A Gazeta da Pharmácia, e alguns poucos números da revista da ABIF, custodiadas na Biblioteca Nacional. Ainda assim não encontrei informações satisfatórias de algumas empresas e entidades. No segundo capítulo da segunda parte da tese são apresentadas as indústrias farmacêuticas e os empresários do setor que passaram pela órbita do IPES, bem como as políticas públicas do governo Castello Branco que atenderam e beneficiaram o setor. O levantamento das empresas e dos empresários foi feito a partir dos documentos do IPES e da 12 obra de Dreifuss. A legislação do setor foi garimpada em algumas bibliografiase nos sites oficiais da Câmara dos Deputados e do Senado Federal. Com as informações levantadas, elaborei quadros detalhados das indústrias farmacêuticas e dos empresários do setor que financiaram e atuaram no IPES. No que diz respeito às indústrias, apontei o capital de origem, com a finalidade de acentuar a presença do capital estrangeiro no país, além de fazer um breve histórico da sua fundação, entrada no Brasil, e de seus dirigentes, com objetivo de encontrar os responsáveis pelos seus vínculos com o instituto. Com relação aos empresários, arrolei os laboratórios em que atuavam e os seus cargos nas empresas, e fiz uma análise dos seus perfis com a finalidade de apontar suas atuações no IPES, no Estado, nas entidades, e nos setores privados e públicos. Para obter as informações, busquei dados nas revistas dos laboratórios, em jornais de época, acervo da Casa de Oswaldo Cruz/FIOCRUZ, Internet, jornais específicos do setor farmacêutico, no Diário Oficial da União e livros biográficos. No último capítulo da tese, que se refere às disputas de frações de classe no governo Castello Branco, sobretudo do setor farmacêutico, as informações foram levantadas nos documentos do IPES-SP e do IPES-GB, jornais de época e algumas pesquisas acadêmicas. Posto isto, é de fundamental importância esclarecer ainda que ipesianos são compreendidos aqui não só os militares, empresários e tecnoempresários que fizeram parte da estrutura formal do IPES. Mas também os convidados que participaram de diversas atividades organizadas pelo instituto, orientaram na elaboração de estratégias para desestabilizar o governo Goulart e trabalharam nos projetos de governo que vieram a ser implementados após o golpe, bem como os membros de associações privadas que atuaram em parceria com o IPES na conspiração. Embora não fizessem parte da estrutura organizacional do IPES, os convidados e os membros das associações defendiam, da mesma forma, os interesses do bloco multinacional e associado e atuaram conjuntamente, em que o IPES era o organizador das ações. 13 CAPÍTULO 1 – O INSTITUTO DE PESQUISAS E ESTUDOS SOCIAIS (IPES) E O GOVERNO CASTELLO BRANCO (1964-1967) O capítulo tem por finalidade analisar o IPES. O contexto político que deu origem ao seu surgimento, objetivos, formação e ações e estratégias desenvolvidas junto à sociedade civil e ao Estado. Bem como o primeiro governo ditatorial, de Castello Branco, de forma a compreender o papel da entidade nas transformações econômicas, políticas e sociais posteriores ao golpe. O IPES foi uma entidade formada por empresários nacionais e internacionais, tecnoempresários e militares de alta patente, em especial vinculados à Escola Superior de Guerra (ESG). Com o apoio financeiro do governo norte-americano e de seus associados, buscou integrar diversos grupos, civis e militares, e organizar uma coesão interna da fração mais internacionalizada do empresariado no Brasil em uma oposição que pudesse deter o governo de João Goulart e as forças sociais que o apoiavam, para obter o controle da sociedade e assegurar a “conquista”16 do Estado. O IPES surgiu dois meses após a posse de João Goulart, em um contexto de crise econômica e política no Brasil. Goulart assumiu a Presidência da República em setembro de 1961, sob o regime parlamentarista. Uma solução conciliatória, diante da possibilidade de um golpe militar, com respaldo de setores civis conservadores para impedir sua ascensão ao poder e para reduzir sua capacidade de decisão, embora, conforme pesquisa do Instituto Brasileiro de Opinião Pública e Estatística (IBOPE), 81% da população da Guanabara manifestava opinião favorável à sua posse17. Em janeiro de 1963, após um plebiscito, foi restabelecido o regime presidencialista18. O empresariado tinha fortes restrições a Goulart, visto que quando estava à frente do Ministério do Trabalho, no segundo governo de Getúlio Vargas (1951-1954), defendeu publicamente o aumento de 100% para os trabalhadores que recebiam salário mínimo19. O governo Goulart objetivava o desenvolvimento do capitalismo nacional, procurava proteger e incentivar os segmentos nacionais, acentuar as relações de interdependência e 16 Expressão cunhada por Dreifuss para explicar como tecnoempresários e empresários do IPES asseguraram poder econômico e administrativo, por meio de seus cargos públicos, transformando o aparelho do Estado brasileiro em parte integrante dos interesses monopolistas que controlavam a economia. 17 Revista O Cruzeiro – extra, de 16.09.61. 18 Para saber mais sobre o plebiscito ver MELO, Demian Bezerra de. O plebiscito de 1963: inflexão de forças na crise orgânica dos anos sessenta. Dissertação (Mestrado em História), Universidade Federal Fluminense, 2009. 19 STARLING, Heloisa Maria Murgel. Os senhores das gerais. Os novos inconfidentes e o golpe de 1964. Petrópolis (RJ): Vozes, 1986, p. 42. 14 complementaridade da economia brasileira com a internacional. Foi marcado por uma intensa crise econômico-financeira, com inflação altíssima; crises político-institucionais; ampla mobilização e participação popular e de trabalhadores no processo político brasileiro, que deixavam de ser classes subalternas, e passaram a participar do debate em torno das “reformas de base” e a reivindicar ajustes salariais; fortalecimento do movimento de trabalhadores do campo; etc. Para combater a inflação e retomar o crescimento do país, o Executivo lançou o Plano Trienal de Desenvolvimento Econômico-Social, proposto para o período de 1962-1965, elaborado pelos ministros Celso Furtado (do Planejamento) e San Tiago Dantas (da Fazenda). Mas o Plano fracassou, e nem a aceleração do crescimento nem a desaceleração da inflação ocorreram, resultado da convergência de condições políticas e econômicas internas e externas. Segundo Ianni, o plano foi esvaziado porque propunha uma racionalidade possível que transcendia o entendimento das facções dominantes da burguesia. Os primeiros efeitos da política deflacionária provocaram reações nas diversas classes sociais, sobretudo as que viam uma relação positiva entre inflação e expansão dos negócios, além de ter posto em evidência que as forças políticas interessadas nas modificações em curso no setor industrial não aceitavam qualquer solução modificadora do modo capitalista de produção. Os grupos dominantes, conforme explica o autor, “temeram que fugissem das suas mãos os comandos do processo econômico, que o predomínio do capital e do mercado estivesse em risco”20. O governo intensificou seu trabalho no sentido de implantar as reformas de base (agrária, bancária, fiscal, eleitoral, universitária, etc.), que tinham como finalidades o desenvolvimento necessário ao capitalismo industrial brasileiro; atenuar as tensões sociais; aumentar a produção de alimentos, de matérias-primas para a indústria; e criar no campo um mercado para os bens manufaturados. A reforma agrária causou um embate na sociedade civil. Foi combatida no Congresso por políticos que representavam os interesses dos grandes proprietários rurais e por setores da Igreja Católica. Setores populares, em torno da Frente de Mobilização Popular (FMP)21, por meio de comícios e passeatas, passaram a exigir a reforma. 20 IANNI, Octávio. Estado e capitalismo. São Paulo: Editora Brasiliense, 1988, pp. 20-21. 21 Movimento nacionalista surgido, em 1962, com o objetivo de pressionar em favor da implementação das chamadas reformas de base (agrária, urbana, tributária, bancária e constitucional). Liderada pelo governador do Rio Grande do Sul Leonel Brizola, congregou representantes de organizações como o Comando Geral dos Trabalhadores (CGT), o Pacto de Unidade e Ação (PUA), a União Nacional dos Estudantes (UNE) e a União Brasileira dos EstudantesSecundários (UBES), além de elementos da Frente Parlamentar Nacionalista (FPN) e de entidades camponesas e femininas como a Frente Nacionalista Feminina. Não tendo chegado na prática a se constituir completamente como organização com atuação própria e definida, foi fechada após o movimento político-militar de 31 de março de 1964 (LAMARÃO, Sérgio. Frente de Mobilização Popular (FMP). In: 15 Em contrapartida, os setores conservadores, ai incluído o IPES, passaram a denunciar a “subversão”, a “comunização do país” e acusar o governo de promover a “desordem e a agitação popular”. Goulart ainda tomou outras medidas que incomodavam e desafiavam o empresariado: a nacionalização das concessionárias de serviços públicos (eletricidade, telefone), monopolizados pelos grupos estrangeiros Brazilian Traction-Light & Power, American & Foreign Power, International Telephone & Telegraph (ITT), moinhos, frigoríficos e indústrias farmacêuticas; o monopólio das exportações de café pelo Instituto Brasileiro do Café (IBC); e ampliação do controle absoluto da importação de petróleo, outorgado à Petrobras, que, até então, era efetuada pelas refinarias particulares, que “comprometidas com os trustes pagavam por um tipo de óleo mais caro, quando na verdade recebiam outro mais barato, transferindo fraudulentamente recursos do país para o estrangeiro, por meio do sobrefaturamento”22. Sob intensas críticas de setores da burguesia nacional associada ao capital multinacional e dos credores estrangeiros, Goulart regulamentou a Lei de Remessa de Lucros, Lei nº 4.131, de 3 de setembro de 1962, que diz respeito a “Disciplina a aplicação do capital estrangeiro e as remessas de valores para o exterior e dá outras providências”.23 Dentre várias medidas, a lei limitou o envio anual, a título de lucro, das empresas estrangeiras para o exterior. Só poderia ser enviado no máximo 10% do capital trazido para o Brasil como investimento. Em meio a essa movimentação interna, no campo internacional, o novo ministro das Relações Exteriores, Francisco Clementino San Tiago Dantas (1961-1962), efetivou o restabelecimento das relações diplomáticas com a União Soviética, rompidas em 1947, e repeliu as investidas dos Estados Unidos para que o Brasil aprovasse sanções contra Cuba, o “calcanhar de Aquiles” do governo norte-americano. A Revolução Cubana (1959) representava, aos olhos da América Latina, a possibilidade de transformação, o que ameaçava os planos dos “ianques” no sentido de conquistar toda a América, em meio à Guerra Fria. Na Conferência de Punta del Este, realizada no Uruguai, entre 22 e 31 de janeiro de 1962, a delegação norte-americana chantageou e insinuou que o resultado poderia prejudicar a aprovação das verbas da Aliança para o Progresso, discutida à frente neste capítulo. Na ABREU, Alzira Alves de et al (coords.). Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro – Pós-1930. Rio de Janeiro: CPDOC, 2010). 22 BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. Presença dos Estados Unidos no Brasil. Rio de Janeiro: Civilização Brasileira, 1973, pp. 465-466. 23 BRASIL. Lei nº 4.131, de 3 de dezembro de 1962. Disponível em <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4131.htm>. Acessado em 05.06.16. http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L4131.htm 16 ocasião, expulsaram Cuba da Organização dos Estados Americanos (OEA) por quatorze votos a favor, e o Brasil se absteve24. A burguesia brasileira, deslocada de seu lugar central, não era mais a única detentora de um poder de classe dominante, perdeu a exclusividade, via alterada “suas relações com o Estado nacional-populista, como forma de fazer avançar seus interesses de classe” 25, e estava sobressaltada com a mobilização política das classes populares. Conforme ata do IPES, o “perigo do Brasil não é o comunismo, no momento, mas o movimento popular de subversão da ordem que será dirigido e encampado pelos extremistas”26. Empresas norte-americanas também passaram a pressionar o seu governo contra Goulart de forma individual. Em 1962, a mineradora Hanna Mining Company, presidida pelo brasilianista John Foster Duller Jr., solicitou ao governo Kennedy para não dar nenhuma assistência financeira ao Brasil até que Goulart resolvesse o caso do cancelamento de suas concessões no quadrilátero ferrífero de Minas Gerais. A Radio Corporation of America (RCA), do setor de telecomunicações, através de seu executivo John Richard, e presidente da American Chamber of Commerce for Brazil (AMCHAM), discutida à frente, sugeriu que os Estados Unidos provocassem um colapso econômico no Brasil com o corte de toda ajuda ao governo Goulart. A agência de créditos oficial do governo federal estadunidense Export- Import Bank of the United States, representada por seu presidente, William H. Drapper, sugeriu a Dean Rusk, Secretário de Estado dos Estados Unidos, 1961 a 1969, que o seu país adotasse a linha dura, recusando qualquer ajuda ao balanço de pagamento do Brasil, até que Goulart aplicasse um plano de estabilização monetária satisfatório para o FMI ou caísse com a crise de suas contas externas.27 Além das ações do governo norte-americano, a Aliança para o Progresso é um exemplo da movimentação de intelectuais orgânicos norte-americanos, pautada pelos interesses da empresa privada. O lançamento da Aliança para o Progresso, no ano de 1961, vem coroar a mudança de posicionamento dos Estados Unidos frente à América Latina no processo posterior a Segunda Grande Guerra, principalmente após a Revolução Cubana de 1959. 24 KRAMER Paulo. Conferência de Punta Del Este. In: ABREU, Alzira Alves de et al (coords.) Dicionário Histórico-Biográfico Brasileiro – Pós-1930. Rio de Janeiro: CPDOC, 2010. 25 STARLING, Heloisa Maria Murgel. op. cit. p. 43. 26 Ata do IPES CD e CE de 27.11.61, p. 3. Acervo Instituto de Pesquisas e Estudos Sociais (IPES), Arquivo Nacional. 27 BANDEIRA, Luiz Alberto Moniz. O golpe militar de 64 como fenômeno de política internacional. In: TOLEDO, Caio Navarro (org). 1964 Visões críticas do golpe. Democracia e reformas no populismo. Campinas (SP): Editora da Unicamp, 2001, pp. 92-93. 17 O governo norte-americano estava disposto a fornecer “assistência econômica a longo prazo” aos países do hemisfério que se comprometessem a promover uma “revolução”, que consistia no fomento ao desenvolvimento econômico e “reformas sociais de caráter vital”, por meio de planejamento e com respeito à democracia.28 Definiu a política externa norte- americana para a América Latina a fim de desenvolver um esforço cooperativo que acelere o desenvolvimento econômico e social dos países latino-americanos, mas conforme aponta Gonçalves, “Aliança pode ser entendida como um esforço do governo Kennedy na entrada de capital de seu país nos principais países do continente”, uma aliança, portanto, para fortalecer o domínio norte-americano nos países latinos. 29 Por fim, a burguesia nacional, a multinacional-associada e as frações de classes sociais surgidas com a expansão industrial e financeira no governo Juscelino Kubitschek (1956- 1961), que sentiam ameaçados os seus interesses empresariais, se organizaram contra Goulart no sentido de esvaziá-lo e depô-lo. Portanto, o golpe de Estado de 1964 se deu devido “às restrições da aliança que estava no poder e ao deslocamento que, nessa aliança, algumas sofrem em detrimento de outras”30. Dentro desse quadro, formou-se uma nova aliança, uma força política para quebrar as alianças de classes, subverter a ordem populista, e constituir em centro estratégico de ação política, o IPES, com vista à ocupação do Estado para, assim, efetivar seu projeto de reordenação capitalista. E que, posteriormente, seria o responsável pela opção política
Compartilhar