Baixe o app para aproveitar ainda mais
Esta é uma pré-visualização de arquivo. Entre para ver o arquivo original
Alice Bastos Infecção puerperal Introdução A infecção puerperal também é denominada febre puerperal; É um termo genérico que representa qualquer infecção bacteriana do trato genital feminino no pós-parto recente; Ainda é responsável por considerável número de mortes maternas; Todos os estados febris puerperais são agrupados sob a denominação de morbidade febril puerperal; É a ocorrência de temperatura de pelo menos 38 °C, excluídas as primeiras 24 horas de puerpério, por 2 dias quaisquer, durante os 10 dias iniciais do pós-parto, devendo a temperatura ser determinada por via oral, pelo menos quatro vezes ao dia, segundo técnica padrão; A incidência é maior após operação cesariana (quando comparada com a incidência após parto vaginal); O uso de antibiótico profilático em cesárea, eletiva ou de urgência, diminui de forma importante a ocorrência de infecção puerperal. Endometrite Fatores de risco Rotura prematura de membranas ovulares (RPMO), anemia, fórcipe médio, lacerações do canal de parto, trabalho de parto prolongado e infecção vaginal são fatores predisponentes para a ocorrência de endometrite pós-parto; Mulheres com baixo nível socioeconômico apresentam maior risco de desenvolver infecção. Microbiologia É polimicrobiana e, na maioria das vezes, as bactérias envolvidas são aquelas que habitam o intestino e colonizam o períneo, a vagina e o colo uterino; Geralmente as bactérias são pouco agressivas, mas podem se tornar virulentas na presença de hematomas e tecido cirúrgico desvitalizado; As bactérias mais frequentes são: Streptococcus agalactiae, Enterococcus spp., Escherichia coli, Bacteroides bivius e Bacteroides disiens. Patogenia A cavidade uterina no pós-parto, em especial a área da ferida placentária, constitui região com grande potencial para desenvolvimento de infecção; A endometrite origina-se a partir da ascensão, através do colo uterino, de bactérias que se encontram no trato genital inferior; Após a colonização do trato genital inferior do útero, essas bactérias ascendem ao segmento inferior do útero e alcançam a área da ferida placentária; A existência de decídua necrótica e sangue na cavidade uterina são importantes meios de cultura para o crescimento bacteriano, especialmente para bactérias anaeróbias; A simples presença ou replicação de bactérias na decídua necrótica parece não ser suficiente para ocasionar endometrite pós-parto, sendo necessária a penetração bacteriana na camada basal residual da decídua. Diagnóstico Diagnóstico clínico Baseia-se principalmente na presença de febre, uma vez excluída com rapidez outras causas; 10 a 20% das pacientes têm sinais de bacteriemia: febre, tremores, calafrio, taquipneia e taquicardia; A presença de dor abdominal pode auxiliar nos casos de endometrite posterior a parto vaginal; Esse parâmetro não deve ser utilizado em casos de mulheres submetidas a cesárea, pois é normal a maioria relatar dor abdominal moderada após a cirurgia; Alice Bastos Tríade de Bumm (tríade clássica da endometrite pós- parto): útero lenhos, pastoso e hipoinvoluído; A loquição pode se tornar fétida e com aspecto purulento. Exames subsidiários Hemograma: a leucocitose em casos de endometrite varia de 15.000 a 30.000 células/mm³; Deve-se atentar ao fato de que o aumento do número de leucócitos é um processo fisiológico do pós-parto e isoladamente não é indicativo de infecção; Hemocultura: sua realização é tema controverso; Preconiza-se a realização nos casos que não respondem ao tratamento inicial feito de forma empírica, nas pacientes imunodeprimidas e nos casos de sepse; Exames de imagem: a ultrassonografia auxilia no diagnóstico de retenção dos produtos da concepção, abscessoes, hematomas intracavitários e da parede abdominal; A utilização de tomografia computadorizada ou ressonância nuclear magnética fica reservada àquelas pacientes que não respondem de forma adequada ao tratamento antimicrobiano. Tratamento Clínico Baseia-se na prescrição de antibióticos de largo espectro, uma vez que a infecção é polimicrobiana, com bactérias aeróbias e anaeróbias provenientes da flora intestinal e genital; Em virtude do potencial de complicação, dá-se preferência a instituir o tratamento com a paciente internada; Em casos de endometrite não complicada, a antibioticoterapia parenteral deve ser administrada até a paciente tornar-se afebril por 24 a 48 horas; Após esse período, não há necessidade de manutenção de antibióticos e a paciente pode ser liberada para controle ambulatorial; As combinações mais comumente utilizadas são: Clindamicina em associação com gentamicina; Ampicilina ou penicilina associada a aminoglicosídeo (gentamicina ou amicacina) e metronidazol (esquema tríplice). Cirúrgico O tratamento cirúrgico da infecção puerperal está indicado nas seguintes situações: Curetagem de restos placentários; Debridamento de material necrótico; Drenagem de abscessos; Histerectomia: indicada nas formas disseminadas, localizadas ou propagadas, refratárias ao tratamento clínico. Profilaxia A administração profilática de antimicrobianos reduz a incidência de morbidade febril puerperal; Administração cerca de 30 a 60 minutos antes do início da cirurgia; O emprego de antibiótico profilático reduz a incidência de endometrite em cerca de 70%; Utilização de dose única de ampicilina ou de cefalosporina de primeira geração. Parametrite É a infecção do tecido conjuntivo fibroareolar, parametrial, decorrente, na maioria das vezes, de lacerações no colo e na vagina, em que o germe se propaga pela via linfática; O local de eleição é o tecido parametrial laterocervical (unilateral em 70% dos casos), podendo haver, todavia, invasão anterior (paracistite) ou posterior (pararretite), além da incursão ao ligamento largo; Temperatura elevada que persiste por mais de 10 dias sugere parametrite; Ela aumenta gradativamente e em pouco tempo atinge 39 a 39,5°C, com remissões matutinas; O toque vaginal desperta dor intensa, revelando endurecimento dos paramétrios; Se não for tratado em tempo, o processo evolve para a supuração e a flutuação, Alice Bastos transformando-se em abscesso do paramétrio ou do ligamento largo; O prognóstico normalmente é favorável. Tratamento O tratamento baseia-se no emprego de antibióticos e anti-inflamatórios; Quando há formação de abscessos, deve-se drenar pela via vaginal ou pela abdominal (fleimão do ligamento largo), com mobilização da mecha no 2° ou no 3° dia, e somente retirada completamente quando terminada a exsudação. Anexite (salpingite e ovarite) As anexites são representadas pela infecção e inflamação das tubas uterinas e dos ovários; As salpingites são mais frequentes e surgem após abortamentos infectados e partos vaginais prolongados; Fase aguda (endossalpingite): as tubas uterinas inicialmente se apresentam endurecidas, tumefeitas, com precoce acolamento das fímbrias e obliteração tubária, daí a retenção da exsudação purulenta que forma o piossalpinge; A salpingite pode evoluir para absorção do material com recuperação parcial do órgão, comumente deixando a sequela de obstrução tubária, ou evoluir para a forma subaguda, em que o processo se organiza, formando o tumor inflamatório anexial; Pode prosseguir para cronicidade, podendo deixar com sequela o hidrossalpinge; Pode prosperar, de maneira aguda, como nas formas sépticas, atingindo a serosa peritoneal (peritonite); A infecção pode alcançar os ovários, desencadeando a ovarite; Clinicamente, inicia-se com dor abdominal aguda, predominando nas fossas ilíacas, febre alta (39 a 39,5°C) e discreta defesa abdominal; Toque genital revela grande sensibilidade de anexos; Tratamento É feito por antibióticos; Em raros casos, por motivo de ruptura de piossalpinge, há necessidade de realizar a salpingectomia. Peritonite Clinicamente, surgem dor intensa e defesa muscular no baixo ventre, febre alta (40°C), perturbação funcional dos intestinos, com retenção de gases e fezes, pulso de 140 e sinal de Blumberg positivo; O toque desperta intensa dor no fundo de saco vaginal posterior; Quando há coleção purulenta, nota-se abaulamento; A peritonite generalizada intercorre quando o microrganismo é muito virulento, como no caso de estreptococo beta-hemolítico. Tromboflebite pélvica puerperal É uma enfermidade rara; Não se sabe ao certo se primeiro há formação do trombo e este se infecta, ou se a infecção pélvica puerperal favorece a formação de trombos, ou, ainda, se os dois fenômenos ocorrem simultaneamente; A patogênese da tromboflebite pélvica pode ser explica por estase venosa ou baixo fluxo sanguíneo, alteração da coagulação (hipercoagulabilidade) e lesão da camada íntima dos vasos; Com a queda de fluxo sanguíneo no pós-parto, pode haver estase venosa e até fluxo retrógrado em consequência da incompetência valvular, o que propicia a ocorrência de trombose; A gestação e o puerpério são situações de hipercoagulabilidade em decorrência do aumento dos fatores de coagulação (I, II, VII, IX e X) e também da adesividade plaquetária; A lesão da camada íntima das veias pode ser provocada por infecção ou trauma; Essa lesão ocorre secundariamente à endometrite e em consequência das extensas conexões existentes entre as veias ovarianas e os plexos venosos uterino e vaginal; Admite-se ainda que durante o parto vaginal ou na cesárea ocorra lesão venosa intimal, variando em extensão e grau de comprometimento; Alice Bastos Desse modo, o parto, em especial partos traumáticos ou cirúrgicos, pode ser desencadeante de lesão intimal e, consequentemente, da formação de trombo; Diagnóstico O diagnóstico é difícil; Com exceção da tromboflebite da veia ovariana, em que se pode palpar uma massa dolorosa que se estende até a margem lateral do músculo reto do abdome, o exame físico é pouco elucidativo; Geralmente a paciente se encontra em bom estado, porém apresenta febre persistente, que pode atingir até 40°C, acompanhada de calafrios, a despeito do tratamento antibiótico adequado; Os métodos de imagem (tomografia computadorizada e a ressonância nuclear magnética) auxiliam no diagnóstico. Tratamento Baseia-se no uso de antibióticos de largo espectro e heparinização plena, sendo o tempo de tratamento variável; Os esquemas de antibioticoterapia utilizados são os mesmos empregados nos casos de endometrite. Choque septicêmico O principal responsável é a E. coli; O prognóstico é grave, embora em pacientes obstétricas a mortalidade seja mais baixa; O choque é precedido por sintomas como: calafrios, elevação da temperatura a 40°C, taquicardia (120 a 140 bpm) e mau estado geral; Também pode aparecer sudorese, sede, obnubilação mental e hipotensão; A hipertermia torna-se contínua, com poucas oscilações, o que a diferencia dos processos supurativos localizados; O útero pode não estar doloroso nem aumentado de volume e o corrimento loquial, ausente ou discreto; Na infecção por Clostridium perfringens surgem gangrena gasosa (evidenciada pela crepitação e nas radiografias), hemólise intravascular com hemoglobinemia (soro e urina castanho-escuros), icterícia (hiperbilirrubinemia), coagulação intravascular disseminada e insuficiência renal aguda. Infecção da parede abdominal Após a operação cesariana, essa infecção é uma das principais complicações do período puerperal; Os fatores predisponentes são: tempo prolongado de internação, obesidade, diabetes mellitus, imunossupressão, tempo cirúrgico prolongado, desnutrição, má técnica cirúrgica e infecções em outros sítios; Os agentes microbianos mais prevalentes são: Staphylococcus epidermidis, Staphylococcus aureus e a Escherichia coli; Em geral, a infecção da ferida cirúrgica manifesta-se em torno do quinto ao sétimo dias de pós-operatório; Se há envolvimento do estreptococo beta- hemolítico do grupo A, os sinais denunciadores de infecção podem aparecer precocemente, já dentro de 48 a 72 horas após a cirurgia; O início do processo é precedido de dor no local da incisão; Nas formas leves: edema, eritema, hipertermia local e ausência de manifestações sistêmicas; Nas formas mais graves: febre, calafrio e queda do estado geral; Na presença de celulite, ocorre acometimento difuso e extenso do tecido celular subcutâneo; A forma purulenta exsudativa é a mais típica e, geralmente, acompanhada de hiperemia e febre; A forma mais grave de infecção da ferida cirúrgica é a fasciite necrosante no entanto, é uma forma rara de infecção; Se caracteriza por acometimento difuso do tecido celular subcutâneo e da fáscia muscular associado a crepitação e extensas áreas de necrose tecidual; O tratamento depende da forma clínica da infecção da ferida operatória pós-cesárea. Alice Bastos Infecção de episiotomia É uma complicação infrequente; A gravidade da infecção guarda relação direta com a profundidade da lesão; Na maioria das vezes, a infecção acomete de forma superficial a episiotomia, com presença de dor no local, edema e hiperemia; Nos quadros mais extensos que apresentam formação de abscesso, também é possível notar endurecimento no local acometido, drenagem de material purulento e manifestações sistêmicas. Tratamento O tratamento consiste na combinação de antibioticoterapia e debridamento da área afetada; Nos casos em que não há manifestação sistêmica e abscesso, prescreve-se antibiótico por via oral: amoxicilina, 500 mg, associada a clavulanato de potássio, 250 mg, a cada 8 horas, ou clindamicina, 300 mg a cada 6 horas; Na presença de manifestação sistêmica, acompanhada ou não de abscesso: administra- se, por via intravenosa, clindamicina (600 mg, a cada 6 horas) associada a gentamicina (3,5 a 5 mg/kg, a cada 24 horas; A abordagem cirúrgica consiste na exploração da lesão, retirada dos fios de sutura, debridamento extenso do tecido necrótico e hemostasia.
Compartilhar