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Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges 7. Agentes Públicos Introdução Em decorrência do mau estigma que, infelizmente (e injustamente na maioria dos casos) envolve os servidores públicos, esse é um dos temas do Direito Administrativo que mais tem sofrido alterações substanciais nos últimos anos, especialmente a partir da chamada “Reforma Administrativa” (iniciada com a Emenda Constitucional nº 19/98) que culminou por criar uma nova categoria de agente público: o empregado público, conforme veremos neste capítulo. 7.1 Conceito Agentes Públicos são todas as pessoas físicas que prestam serviços à Administração Pública Direta e Indireta. 7.2 Categorias Excluindo-se os militares, de acordo a doutrina majoritária, os agentes públicos são subdivididos em três categorias, a saber: agentes políticos, agentes em colaboração e servidores públicos. •••• Agentes políticos: são os titulares dos cargos estruturais à organização política do País, isto é, são os ocupantes dos cargos que compõem o arcabouço constitucional do Estado e, portanto, o esquema fundamental do poder. Sua função é a de formadores da vontade superior do Estado, exercendo atividades típicas de Estado, por meio de mandato, via eleição, ou como auxiliares imediatos daqueles. Ex.: Presidente da República, Governadores, Prefeitos, Ministros, Secretários, Senadores, Deputados e Vereadores. •••• Agentes em colaboração: são aqueles que, ainda que sem remuneração, prestam serviços sem vínculo empregatício, de maneira voluntária ou via requisição. Como exemplo, temos os que atuam em momentos de emergência (enchente, incêndio), bem como os jurados e os mesários das eleições, além dos empregados de empresas concessionárias e permissionárias, leiloeiros, intérpretes etc. •••• Servidores públicos: em sentido amplo, são todos os que prestam serviços ao Estado, incluindo a Administração Pública Indireta, e têm vínculo empregatício pagos pelos cofres públicos. Podem também ser chamados de agentes administrativos. Incluem-se nesta última classificação tanto os servidores públicos em sentido restrito (também denominados estatutários, sujeitos ao regime legal), quanto os empregados públicos (do regime contratual), e os temporários, nos termos do art. 37, IX, da CF/88. Isso porque, nesse ponto, a CF/88 se refere aos Servidores Públicos como sendo todos aqueles que prestam serviços à Administração Pública Direta, autárquica e fundacional, com vínculo empregatício. Porém a doutrina é quase unânime em apontar falta de rigor terminológico, pois em outras oportunidades a própria CF/88 fala de servidores referindo-se também à Administração Indireta. Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges Saiba disto! Todos os agentes citados acima, inclusive os que trabalham em concessionárias e permissionárias, são considerados servidores públicos para efeitos penais, conforme dispõe o art. 327 do Código Penal. Além disso, o servidor que cometer alguma infração pode ser responsabilizado nas três esferas (administrativa, civil e penal), e a absolvição criminal só repercute na esfera administrativa nos casos de negativa da existência do fato ou sua autoria, conforme art. 126 da Lei nº 8.112/90. São espécies de servidores públicos (em sentido amplo) os servidores estatutários, empregados públicos e temporários. • Servidores estatutários (servidores em sentido estrito): titulares de cargos públicos e sujeitos ao regime estatutário, também chamado legal, pois é a lei (Estatuto do Servidor Público) de cada ente (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios) que estabelece as regras de inter-relação dos servidores com a Administração Pública. Essas regras podem ser alteradas unilateralmente, respeitando-se os direitos adquiridos. Tal regime é destinado, preferencialmente, às funções públicas que exigem do agente poderes próprios de Estado (art. 247, CF/88), conferindo-lhe prerrogativas especiais, como a estabilidade. Ademais, a própria CF/88, indiretamente, exige o regime estatutário para algumas carreiras, como da magistratura, do ministério público, tribunais de contas, polícia, defensoria e advocacia públicas. No plano federal, o estatuto dos Servidores Civis da União, Autarquias e Fundações Públicas é a Lei nº 8.112/1990 (com alterações posteriores pela Lei nº 9.527/97). Já no plano estadual, é a Lei nº 1.818/2007 que institui o Estatuto dos Servidores Públicos Civis do Estado do Tocantins. • Empregados públicos: são aqueles contratados, seguindo o regime trabalhista. Assim devem seguir a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), bem como as regras impostas pela CF/88, como acesso mediante concurso público (art. 37, II, CF/88), limitações de remuneração (art. 37, XI, CF/88) e acumulação remunerada de cargos e empregos públicos (art. 37, XVI e XVII, CF/88). Em relação à Administração Pública Direta, autarquias e fundações, na esfera federal, é a Lei nº 9.962/2000 que disciplina os empregos públicos e, de maneira subsidiária, pela CLT. Estados e Municípios devem seguir a CLT, com regras estabelecidas na CF/88, pois a competência para legislar sobre direito do trabalho é privativa da União (art. 22, I, CF/88). Como dito acima, atualmente podem ser encontrados na Administração Pública servidores e empregados, sendo que, na prática, a grande diferença entre eles está na possibilidade de aquisição de estabilidade por aqueles, seguindo as regras do art. 41, da CF/88. A Lei nº 9.962/2000 também conferiu certa estabilidade aos empregados, porém não como a que tem direito o funcionário. • Temporários: esses são contratados para atividades temporárias, submetidos a um regime jurídico especial, como, na esfera federal, é disciplinado pela Lei nº 8.745/93 (com alterações posteriores, em especial pela Lei nº 10.667/2003). Essa Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges classe de agentes públicos (temporários) está prevista no art. 37, IX, da CF/88. Já no plano estadual, a contratação temporária (sempre por tempo determinado) é regida pela Lei nº 1.978/2008. Saiba Disto! Servidores públicos (em sentido estrito): são os submetidos ao regime legal, estatutário, titulares de cargos públicos, com maior gama de benefícios e garantias. Empregados públicos: regime contratual, CLT, titulares de empregos públicos. Temporários: submetidos a um regime jurídico especial, contratados por prazo certo, prorrogável, por exclusiva necessidade temporária de excepcional interesse público. 7.3. Cargos, Empregos e Funções A Constituição Federal distribui competências administrativas entre as pessoas jurídicas (União, Estados-membros, Distrito Federal e Municípios); órgãos e agentes públicos. Estes, por sua vez, podem ocupar cargos, empregos ou exercem funções. Observe. • Cargo: segundo o art. 3º da Lei nº 8.112/90 (Estatuto do Servidor Público Federal), cargo é o conjunto de atribuições e responsabilidades previstas na estrutura organizacional que devem ser cometidas a um servidor público. Então cargo é a menor divisão de competência funcional atribuída a um servidor. Deve ser criado por lei, com denominação própria e vencimento pago pelos cofres públicos, para provimento em caráter efetivo ou em comissão (art. 3º, § único, Lei nº 8.112/90). O cargo público pode ser de provimento efetivo ou em comissão, e essa característica quanto à possibilidade de permanência no cargo deve ser prevista na lei que o cria. Assim, se o preenchimento pressupõe continuidade e permanência no cargo, será este efetivo; de outro modo, temporário é o provimento do cargo em comissão (também chamado de cargo de confiança), que não comporta maiores direitos ao seu titular momentâneo, e não gera direito à estabilidade no cargo, tampouco à aposentadoria pelo regime de previdência próprio dos servidores públicos (art. 37, II, V e art. 40, § 13, CF/88). • Emprego: também é um conjuntode atribuições e responsabilidades definido por lei, mas que se diferencia exclusivamente pelo vínculo que une seus titulares ao Estado (vínculo celetista - CLT). Provimento por concurso, mas sem direito à estabilidade. • Função: refere-se a uma atribuição específica dada pelo Poder Público a um agente. Ou seja, é o acréscimo de algumas atribuições àquelas já destinadas ao agente, em especial no que concerne à chefia, direção ou assessoramento. Assim exige-se que, para exercê-la, já seja concursado. O agente tem suas atividades normais dentro do cargo que ocupa e adquire mais algumas, como, por exemplo, para ser chefe de uma seção. Em contrapartida, há acréscimo na remuneração (art. 61, I, Lei nº 8.112/90). Essa possibilidade está prevista no art. 37, V, da CF/88. Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges Saiba disto! Cargo: conjunto de atribuições, criado por lei, destinado a servidores públicos. Provimento por concurso e confere direito à estabilidade após o estágio probatório. Emprego: conjunto de atribuições, criado por lei, destinado a empregados públicos. Provimento por concurso, mas não dá direito à estabilidade. Função: conjunto de atribuições acrescidas às atribuições habituais dos servidores e empregados que desempenham, cumulativamente com seu cargo/emprego, o papel de chefia, direção ou assessoramento. Conforme o art. 37, II da CF/88, os cargos, empregos e funções públicas são acessíveis aos brasileiros que preencham os requisitos legais, assim como aos estrangeiros, “na forma da lei”. Tal norma não é autoaplicável, dependendo de lei regulamentadora (ainda não editada) que estabeleça condições para acesso do estrangeiro. Às universidades é facultado admitir professores, técnicos e cientistas estrangeiros (art. 207, §1 da CF/88). De acordo com o art. 12, §3° da CF/88, são cargos privativos de brasileiro nato: • Presidente e Vice-Presidente da República • Presidente da Câmara dos Deputados • Presidente do Senado Federal • Ministro do Supremo Tribunal Federal • Carreira Diplomática • Oficial das Forças Armadas • Ministro de Estado da Defesa 7.4 Vencimento / Remuneração / Subsídio Via de regra, não se presta serviço à Administração Pública de forma gratuita e/ou voluntária (exceção feita no caso dos agentes em colaboração ou honoríficos). Assim, como contraprestação pelos serviços realizados, há a retribuição pecuniária ao servidor. A CF/888 trata de vencimento, remuneração e subsídio. Todavia, como a distinção entre os dois primeiros não ficou clara no texto constitucional (merecendo críticas da doutrina), coube à legislação infraconstitucional a individualização de cada uma dessas expressões. Assim o Estatuto dos Servidores Públicos Federais (Lei nº 8.112/90, com redação dada pela Lei nº 9.527/97), em seus artigos 40 e 41, nos fornece boas definições a respeito: Art. 40. VENCIMENTO é a retribuição pecuniária pelo exercício de cargo público, com valor fixado em lei. Art. 41. REMUNERAÇÃO é o vencimento do cargo efetivo, acrescido das vantagens pecuniárias permanentes estabelecidas em lei. O artigo 49 da mesma lei enumera as vantagens que compõem a remuneração, explicitadas pelos artigos 51 e 61: Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges Art. 49. Além do vencimento, poderão ser pagas ao servidor as seguintes vantagens: I - indenizações; II - gratificações; III - adicionais. Art. 51. Constituem indenizações ao servidor: I - ajuda de custo; II - diárias; III - transporte. Art. 61. Além do vencimento e das vantagens previstas nesta Lei, serão deferidos aos servidores as seguintes retribuições, gratificações e adicionais: I - retribuição pelo exercício de função de direção, chefia e assessoramento; II - gratificação natalina; III - (Inciso Revogado pela Medida Provisória nº 2.225-45, de 4.9.2001) IV - adicional pelo exercício de atividades insalubres, perigosas ou penosas; V - adicional pela prestação de serviço extraordinário; VI - adicional noturno; VII - adicional de férias; VIII - outros, relativos ao local ou à natureza do trabalho. Já no que diz respeito ao subsídio, note que essa forma de retribuição foi acrescida à CF/88 via Emenda Constitucional nº 19/98, pois o texto original da CF/88 não o previa. Assim, com a redação dada pela EC nº 19/98, essa modalidade de remuneração passou a ser conferida a certos cargos, fixada em parcela única, e é vedado o acréscimo de qualquer gratificação, adicional, abono, prêmio, verba de representação ou outra espécie remuneratória. A ênfase que o constituinte derivado deu ao se referir à parcela única deixa clara sua intenção de proibir a fixação de parte variável, como era no regime constitucional passado. Hoje a CF/88 prevê um extenso rol de cargos sujeitos a subsídio, conforme dispõem os artigos 27 §2º; 28, §2º; 29, V e VI; 39, §4º; 48, XV; 49, VII e VIII; 73, §3º; 96, II, b; 128, § 5º, I, c; 135; 144, § 9º. Além disso, todos os servidores públicos organizados em carreira poderão receber por meio de subsídio (art. 39, § 8º da CF/88). Desse modo, atualmente, tem-se boa parte daqueles que prestam serviços à Administração Pública remunerados por subsídio, que substitui os vocábulos remuneração ou vencimentos, porém designando, de maneira equivalente, a contraprestação pelos serviços prestados. Por fim, está garantida a revisão geral anual e na mesma data para todos, sem distinção de índices, não alcançando, no entanto, as empresas públicas, sociedades de economia mista e fundações públicas. A regra anterior, antes da EC nº 19/88, já previa a revisão geral, mas não fazia menção à periodicidade. Assim, a partir dessa emenda, ganhou-se o direito, reconhecido pelo STF, às revisões anuais. A regulamentação desse dispositivo veio somente em dezembro 2001, por meio da Lei nº 10.331. Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges 7.5 A questão da acumulação Acumulação é o exercício concomitante de mais de um cargo público remunerado, prática essa que, em regra, é vedada constitucionalmente (art. 37, XVI da CF/88). Ressalte-se que tal vedação alcança não só a Administração Pública Direta, mas também autarquias, fundações, empresas públicas e sociedades de economia mista. Além disso, com a edição da Emenda Constitucional nº 19/98, a referida vedação foi ampliada para alcançar também as subsidiárias e as sociedades controladas direta ou indiretamente pelo poder público (art. 37, XVII). Assim, sempre que o poder público tiver participação acionária, diretamente ou por meio da Administração Indireta, haverá a referida vedação quanto à acumulação de cargos. Porém há exceções à regra, todas elas também previstas constitucionalmente de forma taxativa. Assim, se não houver previsão expressa na CF excepcionando a acumulação de certos cargos, serão eles inacumuláveis. Cabe destacar que o rol de exceções não pode ser ampliado pelas Constituições Estaduais e/ou leis, pois tal rol é modificável apenas mediante emenda constitucional. Assim vamos às exceções encontradas de forma esparsa no texto constitucional: • dois cargos de professor (art. 37, XVI, “a”); • um cargo de professor com outro técnico ou científico (art. 37, XVI, “b”); • dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas (art. 37, XVI, “c”); • um de magistrado com função de magistério, seja em instituição pública ou privada (art. 95, § único, I); • um de membro do Ministério Público com outra função pública de magistério (art. 128, § 5º, II, “d”); • um de Ministro do TCU com outra função de magistério (art. 73, § 3º); • um de Vereador com qualquer outro cargo, emprego ou função (art. 38, III) - em não havendo compatibilidade de horários, poderá o vereador optar por sua remuneração. Saiba disto! A redação original da alínea “c” do inciso XVI do art. 37 daCF/88 estabelecia possibilidade de acumulação apenas no caso de médicos, disposição que foi alterada pela EC nº 34/2001, que ampliou a antiga previsão, tratando agora de “profissionais de saúde, com profissões regulamentadas” (ex.: enfermeiro, farmacêutico, fisioterapeuta etc.). Cabe registrar também as possibilidades excepcionais de acumulação na aposentadoria, previstas no art. 37, §10, acrescentado pela EC nº 20/98, que veio a pacificar o entendimento sobre o tema, já previsto no art. 118, § 3º da Lei nº 8.112/90, alterado pela Lei nº 9.527/97, in verbis: “Considera-se acumulação proibida a percepção de vencimento de cargo ou emprego público efetivo com proventos da inatividade, salvo quando os cargos de que decorram essas remunerações forem acumuláveis na atividade.” Dessa forma, podem ser acumulados os proventos de aposentadoria dos civis (art. 40) e militares (artigos 42 e 142), com a remuneração nas seguintes hipóteses: Direito Administrativo - Prof. Evandro Borges • cargos acumuláveis na ativa • cargos eletivos • cargos em comissão, declarados em lei de livre exoneração É possível acumular mais de uma aposentadoria, desde que, na ativa, a acumulação seja possível (art. 40, § 6º). Também é possível que o aposentado pelo regime público volte à ativa, qualquer que seja o cargo pretendido. Ocorre que, se houver previsão de acumulação, receberá tanto sua remuneração quanto seus proventos; porém, em não havendo tal permissivo, terá de dispensar o recebimento dos proventos, ficando apenas com a remuneração, em face na impossibilidade de acumulação. Aos militares é proibida a acumulação (art. 142, § 3º, II e III). Saiba disto! Sobre o Regime Jurídico Único (RJU): A Emenda Constitucional nº 19/98, ao dar nova redação ao art. 39 da CF/88, acabou com o Regime Jurídico Único. Entretanto, no ano de 2007, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) Ao retomar o julgamento da Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 2135, resolveu, por maioria, conceder liminar para suspender a vigência do artigo 39, caput, da Constituição Federal, em sua redação dada pela Emenda Constitucional (EC) 19/98. Com a decisão, volta a vigorar a redação original do artigo, o que, na prática, implica na volta da exigência do Regime Jurídico Único. Conclusão Independentemente das discussões de cunho ideológico que envolvem a questão dos servidores públicos, é certo que sem contar com agentes devidamente selecionados, capacitados, valorizados e amparados por certas garantias funcionais, o Poder Público não conseguirá prestar bons serviços à população, de forma que, muito antes de se constituir em “privilégios”, os direitos, vantagens e prerrogativas conferidos legalmente ao servidor público (dentre os quais a estabilidade) devem ser vistos, na verdade, como garantias necessárias à prestação de serviços públicos eficientes. Dica de Leitura MAFRA, Francisco de Salles Almeida. O Servidor Público e a Reforma Administrativa. São Paulo: Forense, 2008. Referências DI PIETRO, Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. GASPARINI. Diogenes. Direito Administrativo. 10ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005.
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