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Psicologia clínica e sua identidade Fundamentos da Psicologia Clínica Prof.: Bruno Carrasco Introdução No artigo 'A Psicologia Clínica - Procura de uma Identidade', da psicóloga clínica Sandra Brito, ela destaca de forma crítica e reflexiva as especificidades do exercício da psicologia clínica, nas suas vertentes de diagnóstico e acompanhamento, definindo o objeto, os objetivos, métodos e instrumentos específicos. Faz ainda uma revisão histórica da evolução deste ramo de saber, delimitando as fronteiras com as ciências que lhe são próximas. Segundo a autora, a psicologia clínica começou a se afirmar como alternativa ao modelo médico, propondo-se procurar a explicação dos comportamentos visíveis numa condição psíquica invisível e com uma interioridade metafórica. Psicologia Clínica Revendo a história da psicologia clínica encontramos uma ambiguidade de sua delimitação. O termo 'clínica' está associado ao de 'doença', porém pode ser transposto a uma nova forma de abordagem dos fenômenos, bastante afastada da patologia, do sofrimento ou do conflito. A psicologia clínica corresponde num conjunto de teorias e métodos, e a uma atividade prática. Tem como objetivo o estudo, a avaliação, o diagnóstico, a ajuda e o tratamento do sofrimento psíquico, seja quais forem suas causas. Sua prática consiste na observação singular e concreta do individual, com o intuito do conhecimento individual, centrado no caso psicológico singular. Papel da Psicologia Clínica O termo "clínico" usado na expressão 'Psicologia Clínica' define uma sensibilidade particular a dois níveis da elaboração científica: ● Ao nível do objeto: a psicologia clínica interessa-se pelo sujeito enquanto tal, fazendo uma investigação sistemática e mais completa possível dos casos individuais. ● Ao nível da metodologia: trata-se de um processo de recolha de dados, tomando sempre em consideração o contexto individual. Do ponto de vista teórico, a prática clínica é feita a partir das teorias, que servem para articular e ordenar aquilo que é percebido. A observação clínica é constituída tanto de uma leitura como também de uma compreensão do sujeito individual. "A identidade de um Psicólogo Clínico define-se pelo domínio de teorias, técnicas e métodos compatíveis entre si, cujo objetivo é tentar atingir a 'verdade' psicológica do sujeito observado para se poder, direta ou indiretamente, iniciar um processo de intervenção." (Marques, em 'Do desejo de saber ao saber do desejo', 1994) Trabalho do Psicólogo Clínico Para se compreender o trabalho do Psicólogo Clínico, é preciso explicitar o que caracteriza ser o "psicológico". Para esta compreensão, é preciso que se tenha um sólido e claro quadro de referência teórico, que confira sentido ao que observamos, bem como ao conjunto de estratégias claramente definidas, que permitam alcançar ao entendimento sobre o que se pretende. A psicologia clínica é uma psicologia individual que se refere a todo o ciclo da vida, onde o psicólogo clínico deve cumprir essencialmente três funções: diagnosticar, avaliar e tratar situações de sofrimento psicológico, em diferentes níveis e qualidades. Há muitas vertentes em Psicologia Clínica, e cada uma possui uma concepção de ser humano, de tratamento e melhoria. Psicanálise A psicanálise surgiu para prestar serviço à psicologia em dois planos, o de um embasamento teórico e de um exemplo de prática. Por conta disso, a psicologia propagou a psicanálise como a forma mais comum de psicoterapia, apesar de haverem tantos outros. Por elaborar uma teoria explicativa das perturbações mentais e uma teoria geral do funcionamento do psiquismo, a psicanálise se caracteriza, ao mesmo tempo, um método terapêutico e uma doutrina, tendo se constituído como uma grande fonte de inspiração para a psicologia clínica. De modo que a psicologia clínica tem tido algumas dificuldades para constituir seus próprios conhecimentos, pois tem aplicado seus procedimentos com base nos conceitos e princípios de outra disciplina, no caso a psicanálise. “O essencial do meu trabalho faz-se com pessoas que me procuram em função da dor dos seus desencontros interiores e, comigo, tentam encontrar-se perante a dor da consciência de si próprios.” (Eduardo Sá, em 'Aspectos psicológicos da dor', 1995, comentando sobre o exercício da Psicologia Clínica) Trabalho clínico Com o trabalho clínico, pretende-se promover as capacidades do sujeito, tendo em vista a sua posterior aplicação às dificuldades do dia a dia, de modo a que o sujeito possa funcionar na sociedade de uma forma mais segura e estável. O campo da Psicoterapia é imenso, agrupando métodos variados, que repousam sobre pressupostos muito diferentes, cujo intuito é o desenvolvimento cuidadoso da relação terapêutica, de modo a alcançar a resolução dos conflitos. O termo "psicoterapia" reúne o conjunto dos métodos sustentados por uma teoria e uma validação dos resultados, permitindo que, através de meios psicológicos, o sujeito possa modificar alguns de seus comportamentos e pensamentos de forma benéfica para si. Papel do psicólogo O processo clínico encoraja o sujeito a resolver seus conflitos, buscando promover o equilíbrio psico-afetivo e diminuição dos sintomas aparentes, ajudando este a se desenvolver enquanto indivíduo. Segundo Aguirrre et. al., em ‘A formação da atitude clínica no estagiário em Psicologia’, 2000, o principal instrumento de trabalho de um psicólogo clínico é a sua pessoa. E, para que possa exercer a empatia diante do cliente, é preciso que se fortaleça em alguns aspectos: o conhecimento teórico, a própria psicoterapia, a prática clínica supervisionada e a atualização teórica por meio de formações e grupos de estudo. “Os conhecimentos teóricos só podem ser internalizados e processados numa psicoterapia pessoal que torne possível o conhecimento do mundo interno e a utilização de recursos pessoais na investigação e compreensão dos processos psíquicos. A supervisão, por sua vez, procura facilitar a integração destes dois aspectos na prática clínica.” (Aguirre et al., em 'A formação da atitude clínica no estagiário de Psicologia, 2000) Psicologia e abordagens A Psicologia clínica, nascida da prática com doentes em sofrimento, se recusou a extrema objetivação induzida pelo método científico e técnico, tentando produzir conhecimentos que respeitam simultaneamente a singularidade dos sujeitos e o rigor científico. Existem diversas abordagens sobre o funcionamento do ser humano, seu desenvolvimento, seus modos de ser e se relacionar. Grande parte das abordagens na psicologia podem ser definidas em três tendências, as Comportamentais, as Psicanalíticas e as Humanistas-Existenciais. Comportamentais As Comportamentais são as teorias mais científicas na psicologia, tratam de fatos objetivos e comportamentos observáveis, trabalhando com a fisiologia, a neurologia e os sistemas de crenças. Compreendem o ser humano enquanto sua natureza biológica e entende seus comportamentos como naturais somados aos reflexos condicionados por conta do meio. Na linha Comportamental, podemos destacar as abordagens Comportamental (ou Behaviorista), Terapia Cognitivo Comportamental e Terapia Analítico Comportamental. Seus teóricos mais conhecidos são John B. Watson (1878-1958), B. F. Skinner (1904-1990) e Aaron Beck (1921-). Psicanálise A Psicanálise é uma abordagem que entende que nem todas as doenças mentais ou sofrimentos emocionais possuem uma causa orgânica. Para a Psicanálise, existem elementos inconscientes que afetam nossa vida, nossos desejos e traumas emocionais. O inconsciente é analisado por meio da fala e da associação livre dos pensamentos pelo psicanalista. Sigmund Freud (1856-1939) foi quem criou a Psicanálise e estabeleceu suas principais bases, inclusive a estrutura da psique. Depois dele, outros autores desenvolveram novas abordagens tendo como embasamento os princípios da Psicanálise. Carl G. Jung (1875-1961)criou a Psicologia Analítica, Jacques Lacan (1901-1981), Donald Winnicott (1896-1971) e Melanie Klein (1882-1960) desenvolveram suas abordagens com base na psicanálise. Humanistas e Existenciais A terceira tendência refere-se as abordagens Humanistas, Existenciais e Fenomenológicas, que entendem o ser humano não como um mero reprodutor de comportamentos condicionados, nem como resultado de impulsos inconscientes. De um modo geral, utilizam teorias mais filosóficas que médicas, compreendendo o indivíduo como um ser ativo no mundo, que faz suas escolhas na relação que estabelece consigo mesmo e com os outros. Algumas das abordagens mais conhecidas que utilizam o embasamento humanista e existencial são a Gestalt-Terapia de Fritz Perls (1893-1970), a Abordagem Centrada na Pessoa de Carl Rogers (1902-1987), a Análise Existencial de Martin Heidegger (1889-1976) e Jean-Paul Sartre (1905-1980), a Psicoterapia Existencial de Ludwig Binswanger (1881-1966), entre outras. DIFERENÇAS ENTRE ABORDAGENS NA 𝚿 COMPORTAMENTAIS (Cognitiva, Comportamental) PSICANALÍTICAS (Freud, Jung, Lacan, Klein) EXISTENCIAIS-HUMANISTAS (Existencial, Gestalt-Terapia, ACP) FOCO Comportamentos e crenças Inconsciente e traumas Existência e sentimentos BUSCA Ajustar comportamentos Captar significados ocultos Compreender a singularidade ORIENTAÇÃO Objetiva e observável Associação livre de ideias Subjetiva e experiencial PROCEDIMENTO Adaptação e correção Escuta e interpretação Diálogo e autopercepção OBJETIVO DA TERAPIA Modificar comportamentos, crenças e pensamentos Entender o inconsciente e lidar com traumas antigos Compreender os afetos e ampliar possibilidades de ser BASES FILOSÓFICAS Positivismo e Pragmatismo Metafísica e Estruturalismo Fenomenológica e Existencial TERMOS E CONCEITOS Ajuste, crenças, transtornos, pensamentos, reforço Id, ego, superego, traumas, desejos, recalque, projeção Liberdade, escolhas, angústia, conflitos, sentido da vida SER HUMANO (Concepção de) Condicionado, orientado por crenças sobre si e o mundo Age por pulsões, desejos inconscientes e defesas Livre para fazer escolhas e responsável por suas escolhas SAÚDE EMOCIONAL (Concepção de) Promover comportamentos e crenças “saudáveis” Elaborar os conteúdos e conflitos inconscientes Perceber seus sentimentos e fazer escolhas autônomas Por Bruno Carrasco www.brunopsiexistencial.tk Outras abordagens Além das abordagens citadas, existem outras, como a Terapia Vivencial, a Somaterapia, o Psicodrama, a Terapia Sistêmica, a Esquizoanálise. Enfim, são muitos os caminhos na compreensão do ser humano em seu modo de ser mais íntimo, de sentir, sofrer e encarar a vida, tornando a psicologia uma área muito ampla que envolve diversos caminhos e distintos saberes. Referências Bibliográficas BRITO, Sandra. A Psicologia Clínica - Procura de uma Identidade. Revista do Serviço de Psiquiatria do Hospital Fernando Fonseca, 2008. Pgs 63-68. Disponível em: https://repositorio.hff.min-saude.pt/bitstream/10400.10/64/1/Brito.pdf. Acesso em: maio de 2019. Referências Bibliográficas POMPÉIA, João Augusto. Uma caracterização da psicoterapia. Associação Brasileira de Daseinsanalyse n.9, (dez.2000), p.19-30. POMPÉIA, João Augusto. Desfecho - Encerramento de um processo. Palestra proferida na Faculdade de Psicologia da Universidade Católica de Santos, 1990. Editado por Maria de Jesus Tatit Sapienza, a partir da gravação original. Por: Bruno Carrasco Professor de filosofia e psicologia, graduado em psicologia, licenciado em filosofia e em pedagogia, pós-graduado em ensino de filosofia e em psicologia existencial humanista e fenomenológica, pós-graduando em aconselhamento filosófico. www.brunodevir.blogspot.com www.instagram.com/brunodevir www.fb.com/brunodevir http://www.brunodevir.blogspot.com http://www.instagram.com/brunodevir http://www.fb.com/brunodevir
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