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MEDIAÇÃO EDUCATIVA EM ESPAÇOS NÃO FORMAIS 3 EDUCAÇÃO ESTÉTICA COMO POSSIBILIDADE MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS Este estudo tem como tema a educação estética que é entendida como a possibilidade de o homem refinar seus sentidos para um olhar que possibilita provocar experiências, reflexões, fruições sensíveis e saberes que constituem a humanização. A educação compreende a humanização do sujeito numa busca por constituir um ser consciente, com saberes que são provocados por experiências diárias, a fim de consolidar sua visão de mundo, com conhecimentos que consideram aspectos objetivos e subjetivos. Estes aspectos possibilitam sensibilizar o sujeito, e por meio das experiências existentes, pode promover a aprendizagem estética na sua vida. APRESENTAÇÃO Organização Vania Konell Reitor da UNIASSELVI Prof. Hermínio Kloch Pró-Reitora do EAD Prof.ª Francieli Stano Torres Edição Gráfica e Revisão UNIASSELVI Autora Vania Konell CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS EDUCAÇÃO ESTÉTICA COMO POSSIBILIDADE MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS .03 TÓPICO 1 A EDUCAÇÃO ESTÉTICA COMO POSSIBILIDADE DE EXPERIÊNCIA SENSÍVEL 1 INTRODUÇÃO Este estudo tem como tema a educação estética que é entendida como a possibilidade de o homem refinar seus sentidos para um olhar que possibilita provocar experiências, reflexões, fruições sensíveis e saberes que constituem a humanização. A educação compreende a humanização do sujeito numa busca por constituir um ser consciente, com saberes que são provocados por experiências diárias, a fim de consolidar sua visão de mundo, com conhecimentos que consideram aspectos objetivos e subjetivos. Estes aspectos possibilitam sensibilizar o sujeito, e por meio das experiências existentes, pode promover a aprendizagem estética na sua vida. As experiências levam o sujeito à formação estética, a constituir novos olhares sobre o mundo que o rodeia, mas estas experiências em que se pretende alcançar são aquelas que promovem sensibilização, afetamento. Para discutir o tema experiência sensível será contemplado o teórico Jorge Larrosa (2016), que considera como um acontecimento que promove paixão, reflexão e transformação. Este tema, experiência sensível, com a educação estética, serão estudados e analisados neste momento como aportes teóricos que consideram aspectos objetivos e subjetivos para transformar a educação numa possibilidade de humanização. CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS A educação estética apresenta-se como uma das possibilidades de constituir estes novos olhares correspondendo à imperiosa necessidade de acompanhar as mudanças que assistimos e provocamos. Estética porque mobiliza criação. Estética porque pode sensibilizar apropriações da realidade polifacetada, interpretando-a em suas diferentes formas de apresentação sígnica. Estética porque supera o estésico, alcançando pensares e fazeres a patamares onde se bricolam inovações (ZANELLA et al., 2007, p. 13). A educação estética compartilha a criação e a sensibilização, e a partir desse compartilhar desenvolve saberes, promove apreciações sensíveis que buscam o bem-estar do sujeito quando interfere no público, tornando-se um elemento que permite experiências, trocas e encontros. Neste sentido, é importante questionar sobre como os sujeitos educam-se esteticamente. Tem como objetivo compreender o conceito de educação estética e sua relação com o sujeito nas diferentes experiências sensíveis vividas no cotidiano. Convidamos você a explorar um pouco mais este campo do conhecimento, que envolve saberes filosóficos e as linguagens. A experiência sensível permite um olhar além daquilo que vemos a tal modo que o sujeito possa se extasiar com suas ações para uma formação humanizadora. 2 EXPERIÊNCIA SENSÍVEL PARA UMA EDUCAÇÃO TRANSFORMADORA A educação estética é estudada por diferentes áreas, pois está associada à linguagem não verbal, à subjetividade e à criação. Compreendendo estes aspectos é possível perceber que a educação estética tem uma proximidade maior com as linguagens artísticas, propiciando uma educação voltada para o desenvolvimento das percepções sensíveis e culturais do indivíduo. A educação estética tem a possibilidade de refinar seus sentidos para um olhar que possibilita provocar experiências que consideram reflexões, fruições sensíveis e saberes que constituem a humanização. Estas experiências devem ser significativas para o sujeito, a fim de torná-las um meio de transformação pessoal. As experiências provocadas na prática pedagógica, segundo Larrosa (2016), também devem ser consideradas por tratarem-se de uma possibilidade de educação, não como uma realidade, uma coisa, um fato, pois não é fácil de definir nem de identificar, não pode ser objetivada, não pode ser produzida, mas é algo que acontece e que nos faz pensar, nos faz sofrer, nos faz felicitar, ou ainda, é algo que luta pela expressão. Neste sentido, a educação tem o compromisso de buscar experiências que promovem a abertura para o desconhecido com o intuito de promover a aprendizagem que consideram aspectos relevantes para a vida do ser humano. CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS Para este mesmo autor, a experiência tem a capacidade de formação ou de transformação. Segundo Larrosa (2016, p. 25-26), “é experiência aquilo que “nos passa”, ou que nos toca, ou que nos acontece, e ao nos passar nos forma e nos transforma. Somente o sujeito da experiência está, portanto, aberto a sua própria transformação”. Isso significa que o sujeito tem a liberdade de escolher se quer ou não experienciar algo que provoque mudanças, que provoque transformar-se. Para Larrosa (2016, p. 7): Educamos para transformar o que sabemos, não para transmitir o já sabido. Se alguma coisa nos anima a educar é a possibilidade de que esse ato de educação, essa experiência em gestos, nos permita libertarmos de certas verdades, de modo a deixarmos de ser o que somos para ser outra coisa para além do que vimos sendo. A experiência é uma possibilidade de pensar sobre, não para julgar ou somente para criar opiniões, mas para relacionar aspectos de diferentes naturezas, como emoções, sensações, vivências e sentimentos. Neste percurso, percebe-se que a educação e as linguagens, como a arte, estão interligadas, uma vez que categoriza o começo, a liberdade, a emancipação, o acontecimento, a diferença, a alteridade, a catástrofe, que para Larrosa (2016) consiste em não saber, não poder e não querer. Para ele: É verdade que pensar a educação a partir da experiência a converte em algo mais parecido com uma arte do que com uma técnica ou uma prática. E é verdade que, a partir daí, a partir da experiência, tanto a educação como as artes podem compartilhar algumas categorias comuns (LARROSA, 2016, p. 12). A educação e as artes necessitam de um olhar sensibilizador, de um olhar compreensível, de uma proposta que valoriza a subjetividade de cada ação, de cada sujeito. A proposta de Larrosa (2016) indaga a possibilidade de pensar a educação a partir do par “experiência-sentido”. Isto significa que o sujeito precisa permitir-se sensibilizar para conseguir experienciar algo. Caso o indivíduo não esteja aberto, ou ainda, não esteja livre para a experiência sensível, ela consequentemente não acontecerá e não terá o resultado sensibilizador que Larrosa propõe para transformar a sua vida, mas caso o sujeito se permita sensibilizar, é possível humanizar-se. Neste sentido, a educação estética se volta à experiência sensível como proposta de reflexão, de encontros e desencontroscom as emoções, com os sentimentos, com as percepções e com as compreensões de cada indivíduo. A estesia, na qual é alcançada com as mais profundas sensações da apreciação, não pode ser confundida com uma experiência sem sentido, como apenas uma ação realizada, como algo que não toque o sujeito, mas como uma experiência que é entendida como paixão. Larrosa (2016) denomina a lógica da paixão como uma reflexão do sujeito sobre si mesmo enquanto sujeito passional. CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS Assim, a experiência está além daquilo que o sujeito executa ou produz. Ela é aquilo que “nos acontece” e não somente o que acontece. Isso significa que, para alcançar o saber da experiência, é necessária a mediação entre conhecimento e a vida humana. Outro aspecto relevante a ser destacado, que Larrosa (2016) aborda, é que para se chegar ao saber da experiência, deve-se levar em conta de que tudo é particular, subjetivo, relativo, contingente e pessoal, ou seja, cada sujeito vai estabelecer uma relação diferente com a experiência vivida e, consequentemente, a transformação também será distinta de um indivíduo para outro. É neste caminho que percorre a identidade do sujeito, sua condição de ser único, da vida singular. Portanto, a transformação do sujeito está associada à relação entre o conhecimento e a vida humana, àquilo que é permitido que “nos toque” de maneira sensível, provocando todas as emoções e sentimentos possíveis. CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS TÓPICO 2 EDUCAÇÃO ESTÉTICA COMO PROPOSTA DE HUMANIZAÇÃO DO SUJEITO 1 INTRODUÇÃO A educação estética tem seu conceito fundamentado nos estudos do filósofo alemão Friedrich Schiller, que trata este tema numa perspectiva de plenitude da vida humana desde 1760. A partir dos estudos de Schiller, vários autores brasileiros buscaram confrontar e concretizar seu aporte teórico para a atualidade, destacando-se Verástegui (2006), Moreira (2007) e Lenzi (2012). Este olhar para o momento atual é imprescindível, porque a sociedade contemporânea necessita de uma nova perspectiva de ver as coisas, pois as informações são constantes e o sujeito precisa capturar tudo que está a sua volta e determinar o máximo possível de signos e seu significado num curto espaço de tempo. Tal possibilidade de educação vem ao encontro da realidade do sujeito, quando acredita estar em um mundo que explora a criatividade e a sensibilidade para compreender uma sociedade que se consolida na busca pela formação plena. Isto é possível porque os sujeitos educam-se esteticamente quando são provocados por experiências sensíveis que permitem reflexões, fruições e saberes que constituem a sua humanização. Convidamos você a entender um pouco mais sobre educação estética e como ela pode contribuir para a formação do sujeito. 2 MÚLTIPLOS SABERES SOBRE EDUCAÇÃO ESTÉTICA A educação estética foi um tema muito estudado pelo alemão Friedrich Schiller, que escreve uma série de cartas entre 1791 e 1793, que culminou no livro “Educação Estética do Homem”, apoiando-se em referenciais que propõem uma via para a libertação do homem voltada para uma reunificação entre corpo e mente. Schiller busca a totalidade do homem e reconhece sua natureza dúbia: a racionalidade e a subjetividade (MOREIRA, 2007). A partir do pesquisador conhecido como Schiller e demais referenciais que tratam sobre a educação estética, busca-se conceituar este tema para convergir com aspectos relacionados à humanização do sujeito. A educação estética volta-se à cultura, à criação e à sensibilização. Para Schiller (2002, p. 51) “a formação da sensibilidade é, portanto, a necessidade mais premente da época, não apenas porque ela vem a ser um meio de tornar CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS o conhecimento melhorado eficaz para a vida, mas também porque desperta para a própria melhora do conhecimento”. Lenzi (2012) ressalta que para Schiller o ser humano se liberta pelo estado estético, em virtude da determinação interior que está implícita nesse estado e ele se eleva pelo estado moral. O ser humano não pode elevar-se moralmente, sem antes passar pelo estado estético. Assim, a cultura estética de Schiller tem sua relevância também na esfera da educação, para que antes promova a libertação, permitindo o desenvolvimento moral e ético do ser humano. Os escritos teóricos de Schiller consideram a educação estética do ser humano como verdadeira felicidade, alicerçada pela ética, refletindo a preocupação de um filósofo consciente de sua inserção num contexto civilizatório que valorizava a utilidade como o grande ídolo do seu tempo. Para Schiller (2002), é pela beleza que se chega à liberdade e as belas artes constituem um agente emancipador, na medida em que se elevem da carência e recebam suas diretrizes, não pela precária materialidade, mas pelas necessidades do espírito. Esta abordagem valoriza as linguagens artísticas como uma possibilidade de experienciar a educação estética por meio do belo, do sublime. Isto não significa que se deve considerar somente o que nos agrada, mas também aquilo que nos incomoda, ou seja, que nos faz refletir sobre. É importante perceber que a educação estética também é movida pela particularidade, ou seja, é necessário que se faça a reflexão e a análise a partir do material, da técnica, bem como do contexto histórico, social e cultural do que está sendo observado. Outro aspecto em que Schiller considera como pertinente para o desenvolvimento da educação estética está ligado à cultura. Para ele, a cultura “é aquilo que deve conduzir a natureza humana à plenitude de seu desenvolvimento, à conjunção de suas forças sensíveis e racionais, enfim, à única de dignidade moral e felicidade” (2002, p. 19). Esta plenitude entre razão e emoção, entre subjetividade e racionalidade, deve-se ao fato de que a humanização decorre desses dois fenômenos. A educação estética permeia pelo conhecimento de como algo é feito, como é produzido, considerando os materiais e as técnicas, mas também é importante considerar em que momento histórico foi feito, sob quais condições, quais as percepções sensíveis daquele sujeito no momento da produção. Verástegui (2006) considera que para Schiller a experiência estética faz confluir emoção e razão, reações culturalmente ricas, que agrupam os instrumentos dos quais nos servimos para aprender o mundo que nos rodeia. Os dois princípios opostos que se equilibram na experiência estética são, de um lado, a forma que expressa o sentimento, o subjetivo, e se manifesta de maneira espontânea e, de outro, a matéria que representa o racional, o CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS objetivo, as regras, a técnica. “No caso do homem espiritual, a beleza da experiência estética o afasta da forma e o aproxima da matéria para equilibrá- lo” (SCHILLER, 1993, p. 69). “Schiller também propôs uma educação movida pela graça e dignidade, visando ações humanas belas. A educação estética cria as condições para o desenvolvimento de um senso crítico que permite desvelar os graus de liberdade dos fenômenos” (LENZI, 2012, p. 41). O belo numa perspectiva estética não se limita a conceitos de beleza, mas para a ideia de reflexão sensível, do que agrada ou desagrada, do que é bom e do que é ruim. Neste sentido, é necessário saber identificar os graus de beleza dos objetos ou fenômenos, na medida em que se apresentam e não os confundir com a verdadeira aparência estética da “enganosa cosmética que encobre a verdade e que tem a pretensão de substituir a realidade” (SCHILLER, 1994, p. 96). A educação estética,quando associada ao domínio da racionalidade e emoção contempla a formação integral e consequentemente consiste na transformação. O equilíbrio desses dois fatores compreende a humanização do sujeito. CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS TÓPICO 3 EDUCAÇÃO ESTÉTICA E AS LINGUAGENS ARTÍSTICAS 1 INTRODUÇÃO O conhecimento das linguagens artísticas pode influenciar na formação estésica do ser humano à medida em que esse processo está pautado nos diferentes olhares, onde o objeto artístico atua como propositor de sentimento, de mediação entre o conhecimento e o sensível. Para Meira (2003 apud SOARES, 2017, p. 162): As obras de arte, os artistas contemporâneos, os agenciamentos estéticos formam um campo de estudos e um referencial de sensibilidade ético- estético que se propõem a configurar uma forma de experiências múltiplas, podendo ser diagramadas por uma educação do olhar compatível com um saber pensar por imagens. A arte é uma área de conhecimento que convida o espectador a participar, a interagir, a fazer parte dela por meio da sua apreciação, da sua contemplação. Quando nos deparamos com obras de arte, seja em galerias, seja em museus ou mesmo nas ruas, é importante que estejamos abertos a desenvolver nosso olhar sensível, ou seja, que possamos ver, conhecer e compreender tudo que nos rodeia. Convidamos você a apreciar este campo do conhecimento que envolve as linguagens artísticas, compreendendo a percepção sensível para propor uma experiência que o leve a perceber todos os detalhes, as nuances de objetos observados, seja em sua casa, sua comunidade ou em todos os espaços em que você for contemplar algo. 2 APRECIAÇÃO ARTÍSTICA Schil ler (1993, p. 65) ressalta que a estética pode restabelecer a humanidade íntegra, conduzindo o indivíduo ao equilíbrio por meio da beleza: “O belo resulta da união recíproca de dois impulsos opostos e da união de dois princípios opostos; logo, o ideal superior do belo terá de ser buscado na união e no equilíbrio, o mais perfeito possível da realidade e da forma”. Na arte, por exemplo, o artista se expressa por meio desses dois impulsos que expressam a mensagem da obra de arte criada, ou seja, vai utilizar diferentes materiais, como pincéis, telas, papéis, tintas etc., que são considerados a realidade, bem como vai representar sua arte por meio da CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS expressão de sentimentos e emoções que propõem a forma. Vejamos um exemplo de arte latino-americana que contempla este equilíbrio do artista Tomás Sánchez (1948), obra: Ao sul do calvário, 1994. FONTE: Stephen (2011, p. 510) FIGURA 1 - ACRÍLICO SOBRE TELA. 91,5 cm X 122 cm A obra de arte acima trata de uma pintura feita pelo artista hiper-realista cubano Tomás Sánchez, nascido em 1948. Essa obra revela a degradação que o consumismo material causa às sociedades contemporâneas. Essa obra retrata detalhes de objetos cotidianos que a sociedade humana rejeita, abandona ou joga no lixo, mesmo que ainda tenham alguma utilidade (STEPHEN, 2011). Você sabe o que significa hiper-realismo? Hiper-realismo é um gênero da pintura que busca a reprodução fiel da realidade, como se fosse uma fotografia. Tomás Sánchez, por muito tempo cr iou pinturas de paisagens naturalísticas, porém a partir de 1980 buscou retratar em suas obras reflexões sobre o tema lixo. Nessas pinturas ele também aborda o ethos espiritual, como é possível perceber no fragmento da pintura exposta a seguir: CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS FIGURA 2 - FRAGMENTO DA PINTURA: CRUCIFIXOS FONTE: Stephen (2011, p. 510) À medida que o lixo se mistura ao fundo, o horizonte é pontuado por uma série de estruturas semelhantes a cruzes, sendo que três destas estruturas em destaque lembram as cruzes da crucificação de Cristo. Essa referência religiosa em meio ao lixo evoca a ideia de redenção junto ao desperdício. Esta obra mostra a intenção do artista, que é um aspecto imprescindível para compreender a estética de uma imagem, de um objeto, de uma performance, de uma apresentação teatral etc. Para Verástegui (2006, p. 115): A obra de arte real consegue um equilíbrio particular a partir de um movimento, do esforço do artista para comunicar (a forma) a partir dos meios técnicos da arte (a matéria). Cada artista procura seu equilíbrio como uma experiência pessoal, isto enriquece o conceito de arte. A realidade nos permite ver que para perceber a beleza temos que ter em conta a época, o artista, a técnica, seu entorno, e saber que cada obra de arte é experiência única. A experiência artística é única e criativa porque cada artista tem suas próprias condições materiais e sua própria mensagem. Ao contemplar uma obra de arte, seja em uma galeria, seja em uma apresentação de rua, dentro de um museu ou em outro local, é possível realizar a apreciação estética e, com isso, permitir-se conhecer e sensibilizar-se. A educação estética será possível se houver o equilíbrio entre razão e emoção, entre a realidade e a forma. Vamos conhecer mais uma obra de arte que possibilita exemplificar ainda mais a educação estética, da artista: Frida Kahlo (1907-1954). FIGURA 3 - AUTORRETRATO COM COLAR DE ESPINHOS E BEIJA- FLOR, 1940 FONTE: Stephen (2011, p. 442) CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS A obra de arte acima trata de uma pintura feita pela artista mexicana Frida Kahlo (1907-1954). Suas pinturas são carregadas de simbolismo, pois representava em suas obras a sua vida, que por muitos momentos foi algo de difícil retratação, pois sua realidade foi dolorosa, devido a um acidente que sofreu e aos relacionamentos amorosos. Muitos críticos de arte classificaram as obras de Frida Kahlo como surrealistas, porém ela sempre negou ser uma artista surrealista, pois segundo ela, a sua retratação representa a realidade pessoal e não seus sonhos. Colocada no centro da tela, como nos ícones religiosos, o rosto é o ponto focal da pintura. O olhar inabalável de Frida sugere tanto seu sofrimento quanto sua resiliência. Ela usa um penteado tradicional mexicano, revelando o forte senso de identidade com o país e o orgulho de sua origem mestiça. FIGURA 4 - FRAGMENTO DA PINTURA: IDENTIDADE FONTE: Stephen (2011, p. 443) As cores excessivamente vivas e as texturas exageradas das fo lhas carnudas re f le tem o interesse de Frida pela arte nativa mexicana e a folha amarela lembra um halo. As libélulas e as borboletas ao redor de sua cabeça são símbolos cristãos da ressurreição, representando esperança e renascimento. FIGURA 5 - FRAGMENTO DA PINTURA: COR E NATUREZA FONTE: Stephen (2011, p. 443) Um gato preto aparece sobre o ombro esquerdo de Frida. Tradicionalmente um presságio de má sorte, o gato observa, com ar ameaçador, o beija-flor abaixo da garganta da artista, como se esperasse para atacá-lo. Frida amava os animais e cuidou de vários, principalmente após se dar conta de que jamais poderia ter filhos. FIGURA 6 - FRAGMENTO DA PINTURA: GATO PRETO FONTE: Stephen (2011, p. 443) CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS O colar de espinhos de Frida revela suas ra ízes e seu pat r io t i smo. Há um be i ja- f lo r pendurado no centro do colar e essa ave é um símbolo mexicano de sorte e amor – mas o dela está morto. Os espinhos que se enfiam em seu pescoço arrancam gotas de sangue, lembrando de Cristo e também se referindo à dor da própria artista. FIGURA 7 - FRAGMENTO DA PINTURA: COLAR FONTE: Stephen (2011, p. 443) Os macacos são símbolos dodiabo e da luxúria, mas, para Frida, seu macaco de estimação simboliza o amor que ela não recebia de seu marido Rivera, tanto no período logo após o divórcio quanto durante o casamento. Com sua natureza jocosa, o macaco também apresenta o filho que ela não pôde ter em razão de suas condições de saúde. FIGURA 7 - FRAGMENTO DA PINTURA: COLAR FONTE: Stephen (2011, p. 443) Ao analisar uma obra de arte, é imprescindível estudar todos os detalhes da obra, bem como entender a trajetória de vida do artista. Estes são aspectos importantes para o processo de educação estética. A arte é um caso privilegiado de razão e sensibilidade, tanto para o artista que cria obras concretas e singulares quanto para o apreciador que se entrega a elas para encontrar-lhes o sentido. O verdadeiro artista utiliza razão e intuição na expressão da sua arte. Ele vê, ou ouve, o que está por trás da aparência exterior do mundo, para um artista um bloco de mármore deixa de ser uma pedra para ser um meio físico de expressar seus sentimentos. O artista atribui significados ao mundo por meio da sua obra. O espectador lê esses significados nela depositados, capta essa mensagem de razão e espiritualidade (VERÁSTEGUI, 2006, p. 118). Em todas as linguagens artísticas, artes visuais, dança, artes cênicas e na música, o conhecimento estético está extremamente presente. O espectador precisa estar atento aos detalhes, precisa buscar a compreensão da obra para poder se estesiar. “Educar esteticamente consiste em ensinar o homem a olhar, escutar, movimentar-se, agir e experimentar, o que não ocorre de forma natural e espontânea” (NEITZEL et al., 2012, p.47). CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS Primeiro Estágio: Accountive (descritivo, narrativo) Encontram-se neste estágio os sujeitos com pouco convívio com as artes. O que está em destaque na obra de arte para os sujeitos é o tema, além dos recursos mais chamativos usados pelo artista como as cores e as formas. Geralmente, os sujeitos neste estágio emitem julgamento de juízo pautado em opiniões superficiais devido à pouca intimidade com a temática trabalhada pelo artista. Segundo Estágio: Constructive (construtivo) O sujeito tenta relacionar seu conhecimento de mundo com a obra de arte, ele tenta abordar em sua apreciação seu pouco conhecimento dos elementos técnicos utilizados pelo artista. O sujeito tenta estabelecer uma relação da obra com elementos pertencentes ao seu espaço na necessidade de buscar significado e respostas as suas percepções estéticas. Há uma sede em tentar entender as intenções do artista. Terceiro estágio: Classifying (classificativo) Encontra-se nesse estágio o sujeito que procura pensar no quem e no porquê está em contato com a obra de arte. Ele busca nas suas experiências, na história da arte e na própria obra, informações que considera re levantes para interpretar e compreender a obra sem envolver suas emoções. Quarto estágio: Interpretative (interpretativo) O sujeito se relaciona efetivamente com a obra de arte, tem consciência dos diferentes significados que a obra pode representar a cada preceptor. Estabelece-se nesse estágio uma relação entre o conhecimento de mundo e a obra em si. Quinto estágio: Re-creative (re-criativo) Neste estágio, o sujeito procura ver a obra por dentro e por fora, posiciona-se perante ela de forma crítica e reflexiva, ele é capaz de “refletir sobre o objeto de arte, sobre si próprio e sobre a experiência estética” (ROSSI, 2001). Relaciona-se com a obra em sua totalidade por meio da fruição, podendo desencadear a “re-criação” com base no que percebe. Cada sujeito encontra-se em um estágio de formação estética, dependendo da sua experiência, do seu interesse e das habilidades desenvolvidas durante sua vida. Também é importante destacar que a percepção estética varia de acordo com a relação entre o objeto e a mediação com o sujeito. QUADRO 1 - CLASSIFICAÇÃO DOS ESTÁGIOS DA COMPREENSÃO ESTÉTICA FONTE: Neitzel et al. (2012, p. 48-51 apud SOARES, 2017). CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS TÓPICO 4 EDUCAÇÃO ESTÉTICA E A MEDIAÇÃO CULTURAL NOS DIFERENTES ESPAÇOS 1 INTRODUÇÃO Muitas são as maneiras de mediação, porém a aproximação do sujeito com o objeto observado, no sentido de olhar, perceber, conhecer o máximo possível que aquele objeto permitir é fundamental para a condução de uma apreciação que contemple a formação estética para um viver a humanidade em sua plenitude. A mediação cultural que aqui se refere está relacionada ao contexto contemporâneo, quando aborda que: A mediação pode ser encontro, ampliação de conhecimento, conexão de conteúdos e interesses, ir além, ir ao encontro de um repertório cultural e aos interesses do outro, aproximação, reflexão, percepção aflorada, experimentação, diálogo, conversação, provocação, recepção, compartilhamento, reflexões que se desdobram em novas provocações artísticas e estésicas (SOARES, 2017, p. 147). A mediação cultural compreende o conhecimento e a interação com aspectos culturais, com aspectos que valorize a identidade do sujeito e sua história de vida com o povo. Convidamos você a entender um pouco mais desse processo de mediação cultural que valoriza a estética das linguagens em busca de uma educação transformadora. 2 MEDIAÇÃO CULTURAL COMO PROVOCAÇÃO ESTÉSICA A apreciação do espectador com aquilo em que ele está se permitindo ver, tocar, ouvir e/ou sentir, seja um objeto exposto em uma galeria, museu, rua, casa ou a apreciação de uma apresentação e exposição, pode provocar inúmeros pensamentos, reflexões que possibilitam aprendizagem e conhecimento. Esta relação entre sujeito e objeto é entendida como mediação, ou seja, [...] “é um percurso – olhar o outro, o próprio, ampliar através das imagens, sons ... Relacionar com as linguagens” (MARTINS, 2005, p. 53). Quando se pensa em mediação é justamente o contato do sujeito com o objeto propositor, CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS ou seja, é importante ir além da visualidade de imagens em livros didáticos, tela de computador, para ir ao encontro dele nos espaços não formais, como museus, galerias, entre outros. O sujeito é carregado de interesses que permitirão ou não se estesiar com aquilo que ele está apreciando. A mediação, neste sentido, pode ser o encontro e a ampliação do conhecimento entre sujeito e o que está sendo observado. No entanto, ao entrar em um espaço cultural, segundo Soares (2005, p. 161), “não há como sair sem afetamento, nem que seja por um estranhamento, um distanciamento de interesses, um incômodo ou um repúdio diante do observado. Há sempre grandes possibilidades de ocorrer um afetamento!”. Tudo que se observa está carregado de signos, símbolos em que necessita de um estudo semiótico para compreender. Ao ir de encontro com aquilo que se deseja observar, nem sempre se tem a certeza que será uma experiência que irá agradar, mas também será preciso estar consciente de que poderá desagradar, e este afetamento que agrada ou desagrada é considerado como estésico, pois mesmo não permitindo emoções prazerosas, está permitindo provocar múltiplas sensações. Portanto, o processo de mediação: “Há de ser provocativo, instigante ao pensar e ao sentir, à percepção e à imaginação. Um ato capaz de abrir diálogos, também internos, ampliados pela socialização dos saberes e das perspectivas pessoais de cada fruidor” (MARTINS; PICOSQUE, 2012, p. 33). Esta mediação pauta-se a estimular o sujeito a conhecer outras culturas, outras histórias, outras realidades sociais existentes a partir da apreciação. Isto porque entende-seque a partir do conhecimento de aspectos culturais dos diferentes povos, motivados a conhecer suas particularidades, será possível promover a formação plena do indivíduo, afastando preconceitos e pensamentos discriminatórios. A educação estética, nesse sentido, vem contribuir para a sensibilização do sujeito na sua formação pessoa e social. CURSO LIVRE - EDU. EST. COMO POSSIBIL. MEDIADORA NO PROCESSO DE HUMANIZAÇÃO NOS DIFERENTES ESPAÇOS REFERÊNCIAS SOARES, A. F. A cultura e a arte na escola e outras histórias. Curitiba, Appris, 2017. LARROSA, J. Tremores: escritos sobre experiência. Belo Horizonte: Autêntica Editora, 2016. LENZI, L. R. A estética de Schiller nos grupos filarmônicos e na educação. Blumenau – SC. Universidade Regional de Blumenau – FURB, 2012. MARTINS, M. C. Mediação: provocações estéticas. São Paulo: Universidade Estadual Paulista, Instituto de Artes, 2005. 1. v., n. 1. MARTINS, M. C.; PICOSQUE, G. 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