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9 2. Conceitos Fundamentais 2.1 A Idéia do Fluido Contínuo Ao se apresentar algumas propriedades do fluido no capítulo anterior, não houve qualquer referência ao fato de que estes materiais se constituem de moléculas e que aquelas propriedades representam macroscopicamente a manifestação de grupos de moléculas. Note que o interesse da engenharia ao analisar problemas de escoamento não reside em compreender os fenômenos intermoleculares e sim em quantificar e relacionar estes efeitos macroscópicos. Na análise destes problemas, são propriedades como a temperatura (proporcional ao nível de agitação molecular), a pressão (efeito das colisões moleculares sobre uma determinada superfície), a densidade (quantidade média de moléculas contidas em uma unidade de volume) ou a viscosidade (efeito da migração de moléculas entre grupos com diferentes quantidades de movimento) que devem ser quantificadas e relacionadas entre si para efeito de dimensionamento e estudo de situações onde um fluido escoa. Esta forma de avaliar o comportamento de um fluido não se utiliza de ferramentas como a teoria cinética dos gases, a mecânica ou a termodinâmica estatísticas apropriada quando se objetiva analisá-lo do ponto de vista molecular. Perceba que esta metodologia de estudo passa a considerar o fluido como um meio contínuo onde não existe a ocorrência de vazios ou pontos de descontinuidades (ou variações abruptas) na matéria. Admite-se que, em qualquer ponto de uma massa fluida, há sempre um número médio de moléculas suficiente para que as propriedades macroscópica possam ser medidas. Esta hipótese tem como conseqüência principal a continuidade destas propriedades em qualquer ponto fluido posicionado em relação a um sistema de coordenadas independentemente do instante de tempo considerado. As funções que descrevem como estas propriedades (ρ, por exemplo) variam de valor no espaço e no tempo são, portanto, funções contínuas das coordenadas espacial e temporal ( , onde f é uma função contínua). ρ = f x y z t( , , , ) Há, no entanto, que se resolver um problema: como determinar os valores destas propriedades em cada ponto sem que se passe a trabalhar no domínio molecular ? E mais, como medir propriedades associadas a identificação de volumes ou superfícies, como a densidade e a pressão, respectivamente, em pontos matemáticos que, por definição, não têm dimensão ? Conceitos Fundamentais 10 Buscando responder estas questões, considere o ponto P da ilustração seguinte onde procura- se determinar a densidade do fluido. Conforme introduzido anteriormente, a densidade representa a quantidade de massa contida em um determinado volume. Na tarefa de medir ρP da forma mais precisa possível, poder-se-ia partir do próprio volume total do recipiente que contém o fluido calculando-a pela razão entre a massa de fluido contida e este volume. Em um processo de elaboração desta estratégia, o volume de fluido a ser considerado pode ser continuamente reduzido (δV) para que, mais e mais, se restrinja ao ponto P. Volume V Massa m Volume δV Massa δm δm δV δVδV’ ρP P (a) (b) Figura 2.1 - Determinação da densidade em um ponto fluido (a) e efeito da redução contínua do volume δV sobre o valor da densidade (b). Em função da discussão inicial desta seção, este processo deve ter como limite um volume (δV’) onde as oscilações moleculares passem a se manifestar sob a forma de rápidas flutuações no valor da densidade ρP. Matematicamente, pode-se sumariar este raciocínio na expressão ρ δ δδ δP V V m V = → ′ lim (2-1) onde δV’ representa o limite de validade da hipótese do contínuo. Este volume identifica o que de agora por diante denominar-se-á partícula fluida. O conceito de partícula fluida associa-se, portanto, a menor porção de fluido identificada em um escoamento onde a hipótese do contínuo permanece válida. Do ponto de vista matemático, associa-se a uma partícula fluida somente um conjunto de propriedades (ρ, P, T, por exemplo) identificadas em um determinado instante por um ponto de coordenadas espaciais definidas. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 11 2.2 Forças nos Fluidos e Campos de Tensões Na busca da compreensão de como os meios fluidos escoam, percebem-se algumas diferenças entre a dinâmica dos corpos rígidos estudados na mecânica clássica e a dinâmica de materiais fluidos, objeto do atual curso. Na primeira, o movimento é causado por forças aplicadas de forma pontual ou distribuída e forças associadas a campos (eletromagnético ou gravitacional, por exemplo) que as converte internamente em tensões. A força de coesão molecular nos meios sólidos é suficientemente forte para que o efeito de uma força aplicada em um determinado ponto se transmita por todo o corpo. Figura 2.2 - Tipos de força presentes na mecânica clássica. Nos fluidos, as interações moleculares são bem mais tênues, não se verificando a possibilidade de forças localizadas tornarem-se agentes de seu escoamento. Identificam-se, desta forma, apenas dois tipos de esforços: as forças associadas a um campo e as forças distribuídas transmitidas ao fluido através de uma superfície de contato. Organograma 1.1 - Forças Atuantes nos Fluidos Normal Tangencial Forças de Superfície Gravitacional Eletromagnética Forças de Campo ou de Massa Tipos de Força O organograma acima identifica estas forças denominando-as de forças de campo ou de massa (em função do campo agir igualmente sobre cada unidade de massa do fluido) e força de superfície por razão bastante óbvia. Perceba que imposição de forças ao fluido através de uma superfície pode ocorrer de forma tangencial (placa deslizando sobre uma camada de óleo) ou normal (como no caso do êmbolo da Figura 1.4). Cada uma destas forças de superfície converte-se em tensões através da área de aplicação sobre o fluido transmitindo-se através do mesmo. Uma definição precisa destas tensões forçosamente deve envolver, além das forças, a precisa identificação da área em relação a qual ela é definida. Conceitos Fundamentais 12 C δ r F δ r A C δ r F t n δA δFt δFn (a) (b) Figura 2.3 - Porção fluida sob a ação de esforço de superfície (a) e direções normal e tangencial em C (b). Para expressar as tensões tangencial e normal sobre a partícula fluida C identificada na massa fluida da Figura 2.3, devem-se conhecer os vetores força e área a serem considerado. A primeira vista pode soar estranho se relacionar uma área ao conceito de vetor, mas não há nenhuma imprecisão nesta afirmação. O vetor área δ r A tem módulo igual à área δA (ver Figura 2.3(b)) e orienta-se sempre segundo a direção normal para fora de δA. Decompondo a força nas direções normal e tangencial, definem-se as tensões em cada uma destas direções por σ δ δδn A nF A = → lim 0 (2-2) τ δ δδn A tF A = → lim 0 (2-3) designadas pelas letras σ e τ, respectivamente. Nestas definições, apesar de se aplicar o limite com δA → 0, lembre-se que este zero é puramente matemático, tendo em vista a discussão sobre meios contínuos. σyy y dx dz τxy τyx τyz σxx τzy x d y τzx τxz σzzz Figura 2.4 - Identificação de campo de tensões sobre elemento cartesiano. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 13 Para a partícula fluida limitada pelo paralelepípedo diferencial cartesiano dx.dy.dz da Figura 2.4, emprega-se uma notação indicial para identificar tanto a área em relação a qual a tensão é definida, como também a direção em que a mesma atua. Um primeiro índice indica a direção normal à área considerada e um segundo encarrega-se de definir a direção segundo a qual a tensão atua. Desta forma, a tensão τxy é a tensão tangencial queatua numa superfície cuja normal é paralela à direção x orientada segundo a direção y. Esta necessidade da tensão estar correlacionada a uma área faz surgir uma nova entidade matemática denominada de tensor. Enquanto os vetores são completamente especificados pelo módulo, direção e sentido, os tensores necessitam ainda da área em relação a qual eles estão definidos para complementar sua definição. Aos vetores, costuma-se atribuir a designação de tensor de 1a ordem e às grandezas tensoriais a de tensores de 2a ordem. Vetor (ou tensor de 1a ordem) ⎧ ⎨ ⎩ Módulo Direção Sentido Tensor (ou tensor de 2a ordem) ⎧ ⎨ ⎪ ⎩⎪ Módulo Direção Sentido Área de Definição As nove componentes do tensor tensão da Figura 2.4 são usualmente representadas sob a forma de matriz, conforme a equação seguinte, e a barra dupla sobre o símbolo de identificação do tensor tem a mesma função da seta sobre os vetores, ou seja, informa que a grandeza assim denotada é tensorial. T xx xy xz yx yy yx zx zy zz = ⎡ ⎣ ⎢ ⎢ ⎢ ⎤ ⎦ ⎥ ⎥ ⎥ σ τ τ τ σ τ τ τ σ (2-4) 2.3 Classificação Reológica dos Fluidos Conforme visto no capítulo anterior, o critério de definição sobre a natureza fluida de um determinado material é baseado no seu comportamento quando submetido a esforços tangenciais. Este tipo de esforço impõe ao material deformações angulares que, mantido o nível de tensão aplicada, ocorrem de forma diferenciada para cada tipo de fluido. Um experimento bastante simples pode ser empregado para demonstrar as distintas respostas dos fluidos sob cisalhamento, conforme ilustrado a seguir. Conceitos Fundamentais 14 Figura 2.5 - Fluido em escoamento unidimensional sob deformação angular. δl P’M’ P M O N y x δFx; δu δα t t + δt δy δx O espaço entre duas placas planas é preenchido por um fluido, permanecendo a inferior fixa e a superior movendo-se com velocidade constante δu. Para que este movimento ocorra, uma força δFx é aplicada para vencer a resistência viscosa que o fluido interpõe ao movimento da placa superior. Admite-se escoamento a baixa velocidade de forma que efeitos turbulentos não se fazem presente6. Nesta condição, as camadas fluidas deslizam umas em relação às outras nos pontos entre as duas placas e, nas interfaces fluido-contorno das placas, vale a condição de não escorregamento. Esta condição afirma que a camada fluida imediatamente em contato com a superfície sólida encontra-se agregada a mesma e movimenta-se com a mesma velocidade desta superfície. Esta condição tem sido confirmada experimentalmente em todas as situações onde a hipótese do contínuo pode ser admitida. Alguns estudiosos a interpretam como sendo resultado da iteração entre as moléculas do fluido e da superfície limitante do sólido que encontram-se desbalanceadas do ponto vista de equilíbrio de forças moleculares (ver discussão sobre a tensão superficial no item 1.3). Estas moléculas atraem as moléculas do fluido para o contorno sólido buscando se estabilizar do ponto de vista da interação molecular. Existe ainda aqueles que atribuem esta condição à própria característica viscosa do fluido que tenderia a se fixar a um contorno sólido ao entrar em contato com a mesmo. De qualquer forma, o fluido em contato com a placa superior desloca-se solidário à mesma, enquanto que a camada fluida sobreposta à placa inferior permanece imóvel. Na situação em análise, a cada intervalo δt, o fluido deforma-se de um ângulo δα em função da ação da tensão tangencial τ δ δδyx A x y x yy F A dF dA = = → lim 0 (2-5) 6 Ver item 2.5, letra v) para maiores detalhes sobre regimes de escoamento laminar e turbulento. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 15 transferida pela placa superior. É obvio que a velocidade de deformação verificada depende das características constitutivas do fluido entre as placas. Matematicamente, esta taxa de deformação angular ( ) é expressa por &α & limα δα δ α δ = = →t t d dt0 (2-6) onde, pela geometria do problema, identifica-se tg δα = δ δ l y (2-7) Convertendo este experimento para uma situação onde duas camadas fluidas movimentam-se em torno de um ponto (limite com δy → 0 implicando em δu → du) e buscando identificar a taxa de deformação instantânea no tempo t (limite com δt → 0, ou seja, δl → dl e δα → dα), obtém-se da equação anterior lim ( ) ( ) . δ δα α α α t tg tg d d d dy dy d → = ≅ = ⎧ ⎨ ⎪ ⎩⎪ ⇒ = 0 dl l (2-8) Para esta situação, o deslocamento dl se deu durante um intervalo dt a uma velocidade relativa du. Assim, dl = du.dt = dy.dα ⇒ d dt du dy α = (2−9) O resultado expresso pela equação (2-9) informa que, para determinar a taxa instantânea de deformação angular em qualquer ponto entre as duas placas, basta conhecer a “intensidade” com que a velocidade varia com a cota y representada pela derivada no segundo membro daquela equação. Formuladas a tensão e a deformação sofrida pelo fluido, resta conhecer qual a relação que existe entre elas. Com esta função, surgiu a ciência da reologia cuja finalidade consiste em estudar o comportamento dos materiais e estabelecer suas relações constitutivas onde as deformações angulares sofridas são associadas às tensões aplicadas. Desde então, a reologia tem se deparado com os mais variados tipos de relação tensão-deformação onde destacam-se: 2.3.1 Fluidos Newtonianos São fluidos onde a relação tensão-deformação é linear e o fluido se deforma por menor que seja a tensão aplicada. Os fluidos incluídos nesta classificação (ar, água, glicerina, melaço e Conceitos Fundamentais 16 alcatrão, por exemplo) apresentam relação de proporcionalidade entre as tensões aplicadas e as deformações observadas, ou seja, τyx α du dy . Observa-se, no entanto, que quando diferentes fluidos são submetidos a um mesmo esforço tangencial, taxas de deformação de valores distintos são verificadas. Este comportamento particular de cada fluido é associado, portanto, a uma propriedade física dos mesmos denominada de viscosidade absoluta ou dinâmica μ. Introduzindo-a na relação de proporcionalidade escrita anteriormente, obtém-se τyx = μ. du dy (2-10) que representa a relação constitutiva dos fluidos newtonianos. 2.3.2 Fluidos Não-newtonianos Todo material que não apresenta comportamento tal qual o dos fluidos newtonianos ou que, dependendo das condições impostas aos mesmos, se comporte como fluido pode ser incluído neste tipo de classificação. Os hidrocarbonetos de cadeias longas (derivados de petróleo, por exemplo), em sua maioria são exemplos deste tipo de fluido. Em boa parte dos materiais assim classificados, não se verifica relação tensão-deformação linear e as equações constitutivas apresentam-se da seguinte forma τyx = k. du dy k du dy du dy n n ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ = − . . 1 (2-11) onde, para se obter uma equação semelhante a dos fluidos newtonianos, define-se a viscosidade aparente η por η = k du dy n . −1 (2-12) Perceba que, de acordo com a definição anterior, a viscosidade aparente não mais representa uma propriedade unicamente associada à constituição física do fluido, passando a depender também das caraterísticas do escoamento. De forma simplificada, a equação constitutiva de fluidos não-newtonianos é escrita por τyx = η du dy (2-13) Existem, no entanto, alguns fluidos não-newtonianos que se assemelham bastante aos sólidos enquanto o seu estado de tensão mantém-se abaixo de um determinado limite crítico denominado Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 17 tensão de escoamento (τ0). Superado este limite, o material passa a escoar continuamente apresentandorelação linear entre a tensão e a deformação. A este tipo de comportamento associa-se a denominação de plástico ideal ou plástico de Bingham, cuja equação constitutiva pode ser expressa genericamente por τyx = τ0 + k du dy (2-14) Inclui-se nesta classificação o creme dental, suspensões de argila, fluido de perfuração de poços e tinta a óleo. (a) (b) Figura 2.6 - Perfis típicos de alguns fluidos em diagramas Tensão x Taxa de Deformação (a) e Viscosidade Aparente x Taxa de Deformação(b). Além da não-linearidade descrita, alguns fluidos apresentam comportamento com dependência em relação ao tempo. Desta forma, é instrutivo apresentar outros exemplos de fluidos não-newtonianos subdividindo-os de acordo com este critério. Dentre aqueles que independem do tempo, destacam-se os fluidos denominado de pseudoplástico e dilatante. Enquanto a viscosidade aparente do primeiro diminui com a deformação, os fluidos dilatantes aumentam a resistência ao escoamento à medida que este ocorre, ou seja, η cresce com a deformação. Desta forma, a equação constitutiva destes fluidos apresentam, respectivamente, expoente (n) menor e maior que a unidade. Taxa de Deformação du dy Dilatante Newtoniano Pseudoplástico Taxa de Deformação du dy τ Plástico Ideal ou de Bingham Plástico Real Newtoniano Dilatante Pseudoplástico τ0 Conceitos Fundamentais 18 Como exemplo de pseudoplásticos, podem ser citadas as soluções polímeras, como graxa, tinta de impressão e BPF, soluções coloidais e a polpa de papel diluída em água. Já as suspensões de amido e de areia, bem como o silicato de potássio, constituem exemplos de fluidos dilatantes. Em relação aos fluidos com comportamento variável com o tempo, podem ser citados os al o fluido é submetido a um determinado esforço são fatores importantes na determinação do estado de deformação atual. Estes são os fluidos com r e de dependência em relação aos estados o de propriedades tais como a densidade, a mper idade, acelerações, tensões e forças), necessariamente deve-se determinar como estes p Resolver o escoamento, portanto, consiste em determinar as relações de dependência que e a ao tempo. Exemp velocidade, busca-se determinar o campo expresso matematicamente por = (x,y,z,t) = u.î + v. + w. tixotrópicos, cuja viscosidade aparente diminui com o tempo, e os reopéticos, que apresentam comportamento oposto. Algumas tintas são classificadas no primeiro grupo e os materiais que contém solventes voláteis (como colas e vernizes) constituem exemplos do segundo. Existe ainda fluido em que além do estado atual de deformação e das tensões atuantes no mesmo não determinam completamente o escoamento. O histórico de deformação do fluido, assim como o intervalo de tempo durante o qu memória ou viscoelástico onde as características não-linea de deformação anteriores estão presentes. 2.4 Representação Matemática dos Escoamentos Ao apresentar o conceito de partícula fluida associando-o à idéia do contínuo, foi postulado que cada partícula apresenta um único conjunt te atura, a pressão, etc, em um determinado instante. Este raciocínio também deve ser estendido àquelas propriedades intrinsecamente associadas ao escoamento tais como a velocidade, a aceleração e as tensões que atuam em cada ponto. Nos capítulos e seções que seguem, ficará bastante claro para o iniciante no estudo do movimento fluido que, para determinar todas as variáveis de interesse para a análise da dinâmica do escoamento (veloc arâmetro dependem das coordenadas espaciais (x, y e z, no caso cartesiano) em cada instante de tempo. Diz-se, assim, que os campos de velocidade e das demais grandezas de interesse devem ser determinados. estas variáveis apresentam m relação ao esp ço e lificando para o caso da r V r V $j $ ( , , , ) ( , , , ) ( , , , ) k u u x y z t v v x y z t w w x y z t = = = ⎧ ⎨ ⎪ ⎩ ⎪ (2-15) Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 19 2.4.1 Operações Vetoriais em Mecânica dos Fluidos No estudo da mecânica dos fluidos, freqüentemente se necessita expressar e trabalhar variáveis com características vetoriais e tensoriais, como visto na apresentação do campo de tensões e do campo de velocidade. Na formulação dos princípios de conservação, estas variáveis são correlacionadas e expressas genericamente sob a forma de equações vetoriais que independem do sistema de coordenadas considerado, onde novos operadores vetoriais são incluídos ao lado de operações já conhecidas como os produtos escalar (ou interno) e vetorial. Objetivando relembrar o conceito destas operações e apresentar novos operadores envolvidos na mecânica dos fluidos, considere os vetores r V = u.î + v. + w. e = a$j $k ra x.î + ay. + a $j z. e o escalar ρ. As principais operações envolvendo um vetor nas equações de conservação que formulam o escoamento fluido são resumidamente apresentadas em seguida. Para não ser repetitivo, aquelas operações já familiares ao estudante de engenharia foram simplesmente expressas, resguardando-se os comentários para aquelas agora introduzidas. $k Figura 2.7 - Vetores exemplo para demonstração de operações vetoriais. a) Produto de um escalar por um vetor ρ. = ρ ara x.î + ρ ay. $ + ρ aj z. $k (2-16) b) Produto Escalar ou Interno r V •ra = r V . ra .cosθ (2-17) • = (u.î + v. $ w. $k •(a r V ra j + ) x.î + ay. $j a+ z. $k = u.a) x + v.ay + w.az (2-18) c) Produto Vetorial r rVxa = r V . ra .senθ (2-19) r r V a x = (v.az - w.ay)î + (w.ax - u.az) + (u.a$j y - v.ax) (2-20) $k $k θ r rVxa $j raî r V Conceitos Fundamentais 20 d) Derivação de Vetores Menos comum nos textos de matemática até então estudados, a derivação de vetores é uma operação que é fartamente utilizada em mecânica dos fluidos, muito embora a expressão r r a dV dt = seja nenhuma novidade para aqueles que já se deparam com a mecânica clássica. Por definição, a derivada de um vetor consiste simplesmente na derivação de suas componentes, ou seja, não ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ r V x u x i v x j w x k= + +$ $ $ (2-21) e) Divergente de Vetores Antes de introduzir esta operação, cabe apresentar o operador envolvido na mesma, o operador nabla ( ). Trata-se de uma designação de um grupo de termos bastante encontrado nas equações da mecânica feita com o intuito de torná-las mais concisas contribuindo para a agilização da linguagem matemática aqui empregada. A equação (2-22) apresenta a definição deste operador aplicado a uma grandeza qualquer (...) e, pela quantidade de termos do primeiro e segundo membros, já se percebe a vantagem de empregá-lo quando escreve-se equações que envolvem os termos do segundo membro. r ∇ (...) = r ∇ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ (... ) $ (... ) $ (...) $ x i y j z k+ + (2-22) Lembre-se que, apesar da equação (2-22) expressá-lo para a geometria cartesiana, este operador apresenta definições distintas para cada sistema de coordenadas considerado, algumas delas apresentadas no apêndice B. Perceba também que, de acordo com esta mesma equação, r ∇ é um vetor assim definido. O divergente representa a operação do produto escalar entre o operador nabla e um vetor qualquer resultando, portanto, em um valor escalar. Para o vetor r V, por exemplo, o divergente resultaria na expressão r ∇• r V u x v y w z = + + ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ (2-23) f) Rotacional de Vetores A exemplo do divergente, esta operação também se utiliza do operador nabla empregado desta vez como um dos vetores envolvido do produto vetorial que a define, tal como segue. r r ∇ = − ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟ + − ⎛ ⎝⎜ ⎞ ⎠⎟ + − ⎛ ⎝ ⎜ ⎞ ⎠ ⎟xV w y v z i u z w x j v x u y k ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ ∂ . $ . $ . $ (2-24) Mecânica dos FluidosAplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 21 Mais uma vez, a motivação para a criação de tal operação teve por base a concisão dos textos e equações. vale lembrar que o resultado desta operação é um vetor. g) Gradiente de Escalar Por último, quando o operador é aplicado sobre um escalar, resulta na identificação do vetor gradiente deste escalar definido para o escalar ρ por ρ = r ∇ ∂ρ ∂ ∂ρ ∂ ∂ρ ∂x i y j z k$ $+ + $ (2-25) 2.5 Classificação dos Escoamentos A configuração de um escoamento depende de uma série de parâmetros onde pode-se destacar as características do próprio fluido que escoa, à geometria por onde o mesmo ocorre, ao nível de velocidade observado, dentre outras. De acordo com as peculiaridades de cada caso, os escoamentos podem ser classificados de acordo com uma série de parâmetros que muitas vezes induzem, por exemplo, em simplificações das equações de conservação e na adoção de formulações mais adequadas às suas características. De forma geral, os escoamentos podem ser classificados de acordo com os seguintes parâmetros: i) Número de Coordenadas do Problema Unidimensional: somente uma coordenada espacial é necessária para a descrição do campo de velocidades como nos tubos retilíneo de seção constante; Bidimensional: duas coordenadas espaciais são necessárias para a descrição do campo de velocidades (dutos formados por duas placas divergentes); Tridimensional: todas as três coordenadas espaciais são necessárias para a descrição do campo de velocidades como acontece na maioria dos escoamentos reais. ii) Variação do Perfil Velocidade Escoamento Uniforme: o módulo da velocidade é constante ao longo da seção de escoamento. Trata-se de uma simplificação da condição clássica de não escorregamento do fluido em contato com um contorno sólido e é normalmente adotada quando não há Conceitos Fundamentais 22 interesse na distribuição de velocidade ou como condição de contorno na entrada de uma tubulação. Além da velocidade, esta classificação também pode ser adotada em relação a outras propriedades do fluido ou do escoamento; Campo Uniforme de Escoamento: a velocidade apresenta os mesmos módulo e sentido em todos os pontos do escoamento, ou seja, u, v e w apresentam o mesmo valor em todo o campo. iii) Dependência em Relação ao Tempo Escoamento em Regime Permanente: caracteriza-se pela invariância das propriedades do fluido e do escoamento em relação ao tempo, ou seja, ∂φ ∂t = 0, onde φ = , ρ, T, P, etc. Estas propriedades podem, no entanto, apresentar variação no domínio espacial do problema ou, de acordo com a notação matemática adotada, φ = φ(x,y,z); r V Escoamento Transiente: refere-se ao escoamento quando o campo de velocidades e as demais variáveis ainda encontram-se em desenvolvimento e são funções do tempo. iv) Presença de Efeitos de Compressibilidade Escoamento Compressível: nesta condição, a pressão, além de se constituir em um agente do escoamento, atua sobre a densidade do fluido (ρ = ρ(P,T) gerando compressão do fluido em determinadas regiões do escoamento. Esta é a classificação na qual se enquadra a maioria dos escoamentos a alta velocidade, onde o critério do número de Mach (Ma = V/s)7 maior ou igual a 0,3 é empregado como limite entre os escoamentos compressível e incompressível. Em função de suas constituições, tais efeitos são mais freqüentes em gases do que em líquidos. Na abordagem de veículos que viajam em escala sub, super ou hipersônica, os efeitos de compressibilidade obrigatoriamente devem ser incluídos no modelo de escoamento; Escoamento Incompressível: a densidade não apresenta variações em função da pressão, podendo ser admitida constante em todo o domínio de problemas onde não se verifica ou não se está avaliando a transferência de calor. Para efeito de estudos envolvendo 7 Nesta definição, V é a máxima velocidade do escoamento e s é a velocidade do som no meio fluido considerado. Para o ar, onde s = 343 m/s nas condições padrão, a partir do limite de 1234,8 km/h, a compressibilidade torna-se importante na análise do escoamento. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 23 unicamente a mecânica dos fluidos onde não há transferência de calor, esta classificação implica em ρ constante. v) Regime de Escoamento Escoamento Laminar: o fluido escoa em camadas sobrepostas, deslizando umas sobre as outras, sem cruzamentos de partículas fluidas entre as mesmas. É neste tipo de escoamento que a equação constitutiva dos fluidos newtonianos (2-10) é válida; Escoamento Turbulento: caracteriza-se pelo movimento aleatório de partículas que apresentam, no entanto, uma determinada orientação de escoamento. Um dos modelos de turbulência mais difundidos tem por base a subdivisão do campo de velocidade (u, por exemplo) em uma parcela responsável pelo movimento global na direção preferencial (u ) e uma parcela relacionada às flutuações e efeitos de vórtices e aleatoriedade do escoamento (u’), ou seja, u = u + u’. A tensão cisalhante apresenta uma componente viscosa e uma parcela turbulenta, onde a primeira predomina nas regiões próximas a uma interface sólida. A maioria dos escoamentos reais acontecem de forma turbulenta. vi) Existência de Superfície Limitante Escoamento Interno: a orientação e a seção por onde o fluido escoa são determinadas por uma superfície limitante sólida e na maior parte das aplicações impermeável. A grande diferença em relação aos escoamentos externos diz respeito a conservação da massa quando o domínio global do problema é considerado que impõe que a vazão mássica entre duas seções de um escoamento permanente se conserva. Escoamentos no interior de tubos, dutos, bocais e difusores são exemplos desta categoria. Escoamento Externo: o fluido escoa livremente e não há limitação nem orientação imposta pela existência de paredes sólidas. Massas fluidas não limitadas interagindo com contornos sólidos são observadas, por exemplo, na análise da placa plana, aerofólios e outros corpos completamente imersos na mesma denominados corpos bojudos; Escoamento em Canal: algumas características dos escoamentos interno e externo são percebidas quando um fluido escoa através de uma tubulação ou canal aberto não preenchendo completamente a seção disponível para tal. O fluido além de interagir com Conceitos Fundamentais 24 uma parede sólida mantém interface com um outro fluido em sua superfície livre. Tubos não preenchidos e canais de uma forma geral estão incluídos neste item. vii) Viscosidade do Fluido Escoamento Invíscido ou de Fluido Perfeito ou Ideal: admite-se a hipótese de fluido de invíscido ou de viscosidade (μ) nula. Apesar de não corresponder fielmente à realidade, a análise deste tipo de situação produziu importantes conclusões a respeito da natureza dos escoamentos fluidos. Os teóricos matemáticos dos primórdios da hidrodinâmica a introduziram para tornar possível a resolução matemática das equações de conservação do escoamento8. Escoamento Viscoso: escoamento onde os efeitos viscosos são percebidos e representam importante termo na conservação da quantidade de movimento. Com o advento dos primeiros computadores e o desenvolvimento de técnicas numéricas adequadas, as equações de conservação com todos o seus termos puderam ser resolvidas tornando a hipótese de fluido perfeito desnecessária. Tais desenvolvimentos têm sido aplicadas em várias áreas, destacando-se o estudo de problemas como a aerodinâmica de automóveis de competição e o projeto de aeronaves (Boeing 737, ônibus espacial) e meios de transporte de alta velocidade (trem-bala japonês ou o Train a Grant Vitesse - TGV francês). 2.6 Representação Gráfica e Visualização de Escoamentos Existem vários métodos de visualização disponíveis para tornar visíveisos escoamentos e alguns de seus fenômenos complexos como recirculações, vórtices e redemoinhos. Seja para aplicação em gases (injeção de fumaça e gases visíveis, fiapos, birefrigência ótica, etc), como para líquidos (bolhas de hidrogênio e corantes, por exemplo), todos este métodos geram imagens9 que devem ser interpretadas sob a luz dos conceitos das linhas identificadas nos fluidos. Entre estas linhas, existem as imaginárias (trajetória e linha de corrente) e aquelas que realmente se consegue ver no interior da massa fluida que escoa (filete e linha de emissão). A trajetória consiste de uma linha imaginária que descreve o caminho percorrido por uma determinada 8 No quinto capítulo do presente trabalho, tais equações são desenvolvidas passo a passo, originando para os fluidos newtonianos as famosas equações de Navier-Stokes. 9 Alguns dos métodos citado são fartamente empregados no vídeo Flow Visualization do Nationall Committee for Fluid Mechanics Films. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 25 partícula. Em ar parado, a fumaça descarregada pelos aviões da esquadrilha da fumaça em suas apresentações configurariam um exemplo em que é possível visualizar-se a trajetória percorrida pelos mesmos. A linha de corrente, por sua vez, é uma linha também imaginária que em cada instante são tangentes ao vetor velocidade (ou direção do escoamento) em cada ponto do escoamento. Das linhas reais, o filete é de domínio mais comum e consiste de uma linha formada por partículas igualmente identificadas ou marcadas (por corante, fumaça, bolha de hidrogênio, ou outro método) a partir de um mesmo ponto do escoamento. As linhas de emissão, apesar de menos conhecidas, constituem ferramenta importante na visualização de fenômenos invisíveis a olho nu, tal como as mudanças no perfil de velocidade quando o escoamento ocorre em dutos com estreitamento ou ampliação de seção. Por definição, estas linhas são formadas por um conjunto de partículas fluidas identificadas em um mesmo instante em pontos diferentes do campo de escoamento. Vale como exemplo desta ferramenta de ilustração de escoamento, a deposição de pó (de madeira, por exemplo) com densidade inferior a do líquido que escoa com superfície aberta como em tanques, canais e rios. 2.7 Escoamento Viscoso e Camada Limite A esta altura do curso, já se sabe que a presença de um contorno em contato com um fluido que escoa influencia a disposição deste escoamento tanto em função da condição de não deslizamento, como pela característica viscosa dos fluidos. Resta ainda avaliar como a "informação" da existência deste contorno, percebida inicialmente pela porção de fluido imediatamente em contato com a mesmo, se propaga através das outras regiões do fluido. Para explicar este fenômeno, considere o escoamento laminar de fluido incompressível sobre uma placa plana estacionária que se aproxima da mesma com perfil uniforme U∞, de acordo com a ilustração. Para associar esta situação a um caso presente no dia-a-dia de todos, imagine que a superfície de uma escrivaninha representa a placa plana e que esta peça mobiliária encontra-se no interior de uma sala estanque onde inexistem correntes de ar entrando ou saindo da mesma. O ar no seu interior encontra-se estático e circunda toda a superfície da escrivaninha. Imagine agora que um ventilador de dimensões bem maiores que as da escrivaninha seja acionado e que o ar se aproxime da superfície da mesma com perfil uniforme, como ilustrado acima. U∞UB∞ B Borda da y u = u(x y) Camada Conceitos Fundamentais 26 Figura 2.8 - Desenvolvimento de camada limite e perfil de velocidade sobre placa plana. A camada fluida adjacente à esta superfície encontra-se estacionária e, a medida que o fluido escoa sobre a mesma a partir da borda de ataque (origem do sistema de coordenadas x-y também denominado de ponto de estagnação em função da velocidade ser nula nesta posição), a informação de que ali existe uma superfície estacionária é transferida à camada fluida imediatamente superior. A viscosidade é o agente envolvido nesta transmissão que tende a desacelerar o fluido que antes se deslocava com velocidade U∞. Se forem consideradas outras posições na direção do escoamento x, mais e mais fluido passa ser perturbado pela presença da placa permanecendo, no entanto, sempre uma região afastada da mesma que não é afetada. Conforme representado na Figura 2.8, existe em cada ponto x uma posição y a partir da qual as camadas fluidas viajam todas à mesma velocidade (U∞) e, conseqüentemente, não verifica a ocorrência de efeito viscosos. O fluido nesta região pode ser tratado como ideal e as equações desenvolvidas nos primórdios da hidrodinâmica servem para sua formulação. Por outro lado, a região do escoamento entre a superfície e esta posição "limite" y é fortemente influenciada pelo contorno através da força viscosa. A visualização do escoamento tal como descrito foi realizada originalmente por Prandtl em 1904 ao introduzir o conceito de camada limite. Este autor a define como uma camada imaginária que limita a região do escoamento próxima à interface entre o fluido que escoa e um outro corpo onde os efeitos viscosos determinam a configuração do escoamento. No interior da camada limite, o perfil de velocidade varia entre o valor nulo na parede até a velocidade de escoamento não perturbado, conforme esboçado na Figura 2.8 para duas posições x. Note a semelhança entre estes perfis e que, a rigor, a única diferença entre eles é a posição y que identifica a borda da camada limite, também chamada de espessura da camada limite. Apesar desta apresentação do conceito de camada limite ter considerado por hipótese o escoamento como laminar, ele continua válido também para casos onde fenômenos associados à turbulência (tais como vórtices e redemoinhos) são percebidos. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 27 Neste caso de placa plana, o fluido têm sua inércia "consumida" apenas por efeitos viscosos, sendo a velocidade e a quantidade de movimento do fluido determinada apenas por estes dois parâmetros. A pressão, que normalmente é o principal agente do escoamento, foi admitida constante para efeito didático na apresentação da camada limite. (a) (b) Figura 2.9 - Comportamento de escoamentos em torno de cilindro trans- versal para fluidos real (viscoso) (a) e ideal (invíscido) (b). [Extraída de FOX et McDONALD, 1985] Para visualizar ainda mais as divergências entre os escoamentos real e ideal, considere o caso do escoamento externo sobre um tubo cilíndrico transversal. A ilustração anterior apresenta, sob a forma de corte transversal, a configuração típica das linhas de corrente dos escoamentos real (a) e potencial associado ao fluido invíscido (b). Ao contrário do caso de placa plana, a seção de escoamento do fluido é reduzida pela disposição do cilindro transversalmente ao escoamento o que no mínimo força o fluido a se desviar desta resistência imposta, mesmo para o escoamento de fluido ideal (Figura 2.9(b)). Esta ilustração merece ainda uma outra observação sobre a disposição das linhas de corrente. Perceba que há uma aproximação entre as linhas de corrente a medida que o fluido se desvia do tubo. Como a linha de corrente é sempre tangente ao vetor velocidade, por definição, não há escoamento através de uma linha de corrente e a vazão10 entre duas linhas de corrente permanece constante. Desta forma, uma aproximação entre duas linhas de corrente representa uma redução na seção de escoamento e, para que se mantenha a vazão, uma aceleração do fluido. Conforme também será demonstrado no sexto capítulo, a um crescimento da velocidade corresponde sempre um decréscimo da pressão no escoamento de fluidoideal. Para o escoamento em análise, a pressão apresenta um valor máximo no ponto A da Figura 2.9(b) e decresce até atingir o menor valor, quando a velocidade é máxima, no ponto D. A pressão volta a crescer entre os pontos 10 Considerando o escoamento uniforme, a vazão volumétrica pode ser obtida pelo produto entre a velocidade e a seção por onde o escoamento acontece. Conceitos Fundamentais 28 D e E, retornando o valor máximo do ponto A e o escoamento torna-se simétrico em relação aos eixos x e y. Muito embora a relação entre a pressão e a velocidade não seja descrita pela mesma equação, qualitativamente observa-se o mesmo comportamento da pressão em torno do cilindro sob a carga do fluido real da Figura 2.9(a). A pressão também cresce entre D e E, mas não atinge o valor máximo do ponto de estagnação A. É esta diferença de pressão entre as faces anterior e posterior que faz surgir uma força que tende a arrastar o cilindro na direção do escoamento conhecida como força de arrasto. Além da parcela devido a pressão, o atrito viscoso constitui outra importante fonte de arrasto sobre corpos imersos em meios fluidos. A viscosidade também impõe a formação de uma camada limite laminar a partir do ponto de estagnação A que cresce em espessura até se tornar instável onde qualquer perturbação (ruído, vibração ou transferência de calor) podem concorrer para sua transição para o regime turbulento. Este fenômeno é identificado pelo ponto B denominado de ponto de transição. A camada limite turbulenta mantém-se desenvolvendo até que ocorre o fenômeno do descolamento. Para compreender os efeitos que regulam o descolamento, considere uma partícula fluida no interior da camada limite entre os pontos A e C. Entre A e B, a partícula com uma certa quantidade de movimento é impulsionada pela diferença favorável de pressão entre estes pontos para vencer a resistência viscosa ao seu escoamento. Entre os pontos B e C, no entanto, ambas a diferença de pressão e a força de atrito viscoso reúnem-se para impedir que a partícula escoe entre estes pontos. Como a partícula já não dispõe de inércia suficiente para vencer este duplo campo contrário ao movimento, a partícula é desacelerada até o repouso e passa a deslocar-se segundo a orientação C-B, caracterizando o descolamento designando pelo ponto B na ilustração. O esboço a seguir ilustra os perfis de velocidade durante a evolução para o descolamento onde os aspectos descritos podem ser verificados. O descolamento é caracterizado pela inversão do perfil de velocidade no interior da camada , ou seja, quando ∂ ∂ u y = 0. Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 29 Figura 2.10 - Perfis de velocidade no interior da camada limite com gradiente de pressão adverso. [Extraída de STREETER et WYLIE, 1980] Após o descolamento, o escoamento torna-se completamente desordenado e ocorre a formação da esteira de vórtices que perdura até que a turbulência é amortecida por efeitos viscosos. Quanto mais intensa a perturbação da esteira de vórtices, maior a queda provocada na pressão na região posterior do cilindro após o ponto C. Figura 2.11- Disposição de escoamento sobre perfil aerodinâmico. [Extraída de FOX et McDONALD, 1985] Uma das grandes preocupações dos projetistas especializados em aerodinâmica consiste em minimizar a esteira com o fim de reduzir o máximo possível o arrasto. Tais técnicas são conhecidas como controle da camada limite e consiste manipular geometricamente os corpos para "atrasar" o máximo o surgimento da transição e do descolamento. Provocar este atraso consiste em trabalhar a geometria do perfil de modo que tanto a transição quanto o descolamento ocorram o mais próximo ao ponto equivalente ao ponto E da Figura 2.9(b). Perceba que esta providência reduz significativamente as parcelas do arrasto devido à viscosidade (a maior parte da camada limite é laminar e esta apresenta um arrasto menor) e devido à diferença de pressão (uma área menor estará submetida às pressões menores observadas na esteira de vórtices). Conceitos Fundamentais 30 Uma das primeiras metodologias capazes de produzir este efeito consiste em "adicionar contorno sólido" na direção do escoamento reduzindo o gradiente de pressão e a sua parcela da força de arrasto. A seção do corpo da Figura 2.11 e o escoamento em torno da mesma demonstra este aspecto onde verifica-se uma redução bastante acentuada da esteira de vórtices. Apesar da área de contato entre o fluido e a superfície deste corpo crescer em relação ao cilindro, provocando um acréscimo no arrasto devido ao atrito viscoso, a perfilação de corpos submetidos a escoamentos induzem à redução do arrasto total. 2.8 Métodos de Análise Da mesma forma que a mecânica de corpos rígidos clássica emprega o diagrama de corpo livre e a termodinâmica os conceitos de sistemas aberto e fechado, a mecânica dos fluidos requer que sejam adotados métodos de análise adequados às peculiaridades do meio em estudo, ou sejam, os fluidos. Ao contrário dos corpos rígidos, o material analisado aqui se deforma continuamente se contraindo e se expandindo, apresenta também distorções angulares tornando o diagrama de corpo livre inadequado para sua abordagem e formulação. Os princípios de conservação da termodinâmica associados às equações da mecânica escritas de forma conservativa se mostram mais eficientes nesta tarefa. Posteriormente, cada um destes princípios de conservação (massa, quantidade de movimento linear, quantidade de movimento angular, energia e geração de entropia - 1a e 2a Leis da Termodinâmica, respectivamente) será devidamente apresentado. Existe, no entanto, um problema a ser considerado quando da utilização destes princípios que reside no fato deles postularem a conservação de propriedades de sistemas fechados. De acordo com sua definição, este tipo de sistema encerra sempre a mesma massa que é delimitada para estudo sem que haja fluxo de massa através da superfície que o limita. Para empregar esta ferramenta, ter-se-ia que acompanhar cada partícula fluida do escoamento que se constituiria no próprio sistema. A mecânica dos fluidos, assim, tem que proceder uma adaptação destes princípios com o intuito de adequá-los às suas necessidades. Ela o faz tendo por base os conceitos de sistema e volume de controle. Faz-se referência ao termo sistema quando qualquer quantidade fixa de fluido é isolada da sua periferia para efeitos do estudo. Apesar de impermeável ao transporte de massa, podem ocorrer fluxos de energia sob a forma de trabalho e/ou calor através da superfície do sistema. Perceba que esta definição equivale a dos sistemas fechados da termodinâmica e que, apesar da Mecânica dos Fluidos Aplicada - Prof. Raimundo Nonato Calazans Duarte 31 massa contida no sistema não variar, podem ocorrer expansões e contrações do volume que a encerra e, portanto, variações da densidade do fluido contido no mesmo ao longo do escoamento. O volume de controle, por sua vez, consiste de um volume identificado por uma superfície real ou imaginária, denominada superfície de controle, orientado em relação a um sistema de coordenadas onde calor, trabalho e massa podem fluir livremente através de sua superfície. Esta ferramenta se mostra mais adequada à análise de escoamentos e problemas correlacionados, pois limita a análise a regiões do problema, em vez de acompanhar cada partícula fluida ao longo do escoamento. A solução das equações associadas ao volume de controle que resulta nos campos das variáveis de interesse como a velocidade , a pressão, as tensões, etc. Para identificar convenientemente um volume de controle, as características do problema a ser estudado devem ser conhecidas e o domínio, no qual as variáveis do escoamento devem serobtidas, estabelecido. Em situações onde o interesse se resume ao conhecimento de comportamentos globais (vazão em duto ou taxa de renovação de ar em uma sala, por exemplo), não se faz necessária a adoção de volumes de controle diferenciais onde a distribuição espacial (ponto a ponto) das propriedades resulta da resolução do conjunto de equações diferenciais que expressam os princípios de conservação. Nestes casos, a identificação de um volume de controle que coincide com o domínio global do problema satisfaz a necessidade identificada. A solução do problema, neste caso, é gerada a partir de equações integrais também obtidas a partir dos princípios de conservação, tema do quarto capítulo do atual trabalho. 2.9 Formas de Descrição de Escoamento De acordo com a discussão do item anterior, existem duas formas de descrever os escoamento denominadas de: a) Método Lagrangiano: descreve o escoamento acompanhando cada partícula fluida individualmente. Estuda o escoamento admitindo que cada partícula fluida constitui um sistema gerando um conjunto de equações de conservação para cada um deles; b) Método Euleriano: avalia o movimento fluido atendo-se a uma determinada posição fixa no espaço. Utiliza-se do conceito de volume de controle identificado em relação a um sistema de coordenadas fixo em relação ao observador (laboratory coodinates). 2.1 A Idéia do Fluido Contínuo 2.2 Forças nos Fluidos e Campos de Tensões 2.3 Classificação Reológica dos Fluidos 2.4 Representação Matemática dos Escoamentos 2.4.1 Operações Vetoriais em Mecânica dos Fluidos 2.5 Classificação dos Escoamentos 2.6 Representação Gráfica e Visualização de Escoamentos Das linhas reais, o filete é de domínio mais comum e consiste de uma linha formada por partículas igualmente identificadas ou marcadas (por corante, fumaça, bolha de hidrogênio, ou outro método) a partir de um mesmo ponto do escoamento. As linhas de emissão, apesar de menos conhecidas, constituem ferramenta importante na visualização de fenômenos invisíveis a olho nu, tal como as mudanças no perfil de velocidade quando o escoamento ocorre em dutos com estreitamento ou ampliação de seção. Por definição, estas linhas são formadas por um conjunto de partículas fluidas identificadas em um mesmo instante em pontos diferentes do campo de escoamento. Vale como exemplo desta ferramenta de ilustração de escoamento, a deposição de pó (de madeira, por exemplo) com densidade inferior a do líquido que escoa com superfície aberta como em tanques, canais e rios. 2.7 Escoamento Viscoso e Camada Limite 2.8 Métodos de Análise Da mesma forma que a mecânica de corpos rígidos clássica emprega o diagrama de corpo livre e a termodinâmica os conceitos de sistemas aberto e fechado, a mecânica dos fluidos requer que sejam adotados métodos de análise adequados às peculiaridades do meio em estudo, ou sejam, os fluidos. Ao contrário dos corpos rígidos, o material analisado aqui se deforma continuamente se contraindo e se expandindo, apresenta também distorções angulares tornando o diagrama de corpo livre inadequado para sua abordagem e formulação. Os princípios de conservação da termodinâmica associados às equações da mecânica escritas de forma conservativa se mostram mais eficientes nesta tarefa. Posteriormente, cada um destes princípios de conservação (massa, quantidade de movimento linear, quantidade de movimento angular, energia e geração de entropia - 1a e 2a Leis da Termodinâmica, respectivamente) será devidamente apresentado. Existe, no entanto, um problema a ser considerado quando da utilização destes princípios que reside no fato deles postularem a conservação de propriedades de sistemas fechados. De acordo com sua definição, este tipo de sistema encerra sempre a mesma massa que é delimitada para estudo sem que haja fluxo de massa através da superfície que o limita. Para empregar esta ferramenta, ter-se-ia que acompanhar cada partícula fluida do escoamento que se constituiria no próprio sistema. A mecânica dos fluidos, assim, tem que proceder uma adaptação destes princípios com o intuito de adequá-los às suas necessidades. Ela o faz tendo por base os conceitos de sistema e volume de controle. Faz-se referência ao termo sistema quando qualquer quantidade fixa de fluido é isolada da sua periferia para efeitos do estudo. Apesar de impermeável ao transporte de massa, podem ocorrer fluxos de energia sob a forma de trabalho e/ou calor através da superfície do sistema. Perceba que esta definição equivale a dos sistemas fechados da termodinâmica e que, apesar da massa contida no sistema não variar, podem ocorrer expansões e contrações do volume que a encerra e, portanto, variações da densidade do fluido contido no mesmo ao longo do escoamento. 2.9 Formas de Descrição de Escoamento
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