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1 ATIVIDADE INDIVIDUAL Matriz de análise Disciplina: Recuperação Judicial e Falência Módulo: Recuperação Judicial e Falência Turma: PGO-0121 Tarefa: Individual Introdução PARECER JURÍDICO 1. BREVE SÍNTESE Trata-se de consulta formulada por (possível cliente), a respeito de um processo de recuperação judicial das empresas Star Steel Metais S/A, Invest Construções S/A e Investstar Investimentos e participações Ltda. Apenas para contextualizar, o pedido de recuperação judicial foi ajuizado no dia 20 de janeiro. Com a petição inicial foram apresentadas quatro relações de credores, uma para cada sociedade, além de uma relação consolidade de todo o passivo do grupo. Na relação consolidada, haviam três classes de credores, quais sejam: a) Classe II – 3 credores, com créditos no valor total de R$ 126.506.221,89; b) Classe III – 197 credores, com créditos no valor total de R$ 789.665.989,27; c) Classe IV – 38 credores, com créditos no valor total de R$ 7.856.444,56 Com relação aos credores trabalhistas, as devedoras alegaram que serão pagos perante a justiça do trabalho, por meio de Plano Especial de Execução, razão pela qual não foram relacionados, mas tão somente as reclamações e execuções em trâmite. Após o deferimento do processamento do pedido de recuperação judicial, as recuperandas pleitearam uma liminar para que fosse permitida a contratação com o poder público sem a apresentação de certidões negativas. Este pedido foi 2 deferido, porém o Ministério Público interpôs Agravo de Instrumento que ainda encontra- se pendente de julgamento. Ato contínuo, o plano de recuperação judicial foi proposto, em síntese, nos seguintes termos: a) Todos os créditos de até 50 salários mínimos na data do pedido seriam pagos em até 60 dias após a decisão de homologação do plano de recuperação judicial, sem juros ou correção monetária; b) Os demais credores poderiam optar entre duas propostas de pagamento, sendo: (i) Deságio de 80% para pagamento em 2 anos e em tranches (trimestrais), com carência de 18 meses, juros de 3% ao ano e correção pela TR; e (ii) Deságio de 60% para pagamento em 10 anos e em tranches (trimestrais), com carência de 24 meses, com juros de 3,5% ao ano e correção pela TR. Foram apresentadas várias objeções, dentre as quais, destaca-se a do Banco do Brasil S/A, detentor de 85% do crédito de sua classe (garantia real). Assim, a Assembleia foi designada para o dia 30 de setembro, em primeira convocação, e para o dia 26 de outubro, em segunda convocação, porém, no dia 23 de setembro as recuperandas apresentaram um pedido de prorrogação do stay period, bem como de adiamento da AGC, tendo em vista que trabalhavam em um aditivo ao plano que mudaria significamente as condições de pagamento. Isso porque, o plano passaria a oferecer uma terceira opção aos credores de receberem integralmente seus créditos por meio de uma dação em pagamento de um precatório do Estado. O magistrado, por sua vez, deferiu o pedido de prorrogação do stay period, bem como de adiamento da AGC, designando novas datas para os dias 09 de janeiro, em primeira convocação e 31 de janeiro, em segunda convocação. O Ministerio Público também interpôs Agravo de Instrumento em face desta decisão. Ato contínuo, questiona-se o seguinte: a) Está correta a decisão do juízo de autorizar as recuperandas a participarem de licitações públicas sem a apresentação das certidões negativas? Quais são as chances de recurso ministerial perante o Tribunal de Justiça e perante o Superior Tribunal de Justiça? b) O pagamento linear de 50 salários mínimos deve atingir apenas os créditos até esse valor ou também deve abranger os demais créditos? c) Como a jurisprudência vê a proposta de deságio nos patamares alinhados no plano, de 80% e 60%? d) Caso o Banco do Brasil mantenha a sua posição contrária à aprovação do plano de recuperação, o juízo pode desconsiderar o seu voto e homologar o plano aprovado pela maioria dos demais credores? e) A contagem do stay period é em dias úteis ou corridos? É possível a sua prorrogação. É o relatório. Segue parecer. Desenvolvimento 2. ANÁLISE JURÍDICA 2.1. CONSIDERAÇÕES INICIAIS Ab initio, antes de se adentrar nos questionamentos centrais da presente consulta, convém que se faça uma breve análise sobre o todo o procedimento de recuperação judicial. Pois bem. De maneira bem suscinta e objetiva, tem-se que a recuperação judicial é um procedimento de reestruturação administrativa, econômica e financeira da empresa, feita via judicial, a fim de evitar a falência de empresas viáveis. Todo o procedimento da Recuperação Judicial vem estabelecido na Lei 11.101/05, recentemente alterada pela Lei 14.112/2020. Ao pedir sua recuperação judicial, a empresa deverá explicar detalhadamente as razões de sua crise econômica, apresentando documentos 4 contábeis, relação de credores para que se possa verificar seu passivo, relação de bens, certidões de protesto, dentre outros. Depois que o magistrado analisa os autos e autoriza o processamento da recuperação judicial, publica-se um edital com a relação de credores, contendo o valor do crédito de cada um e sua classificação. Ademais, é nomeado um administrador judicial que passa a ser o profissional responsável por ser o auxiliar do juízo. É ele quem vai enviar correspondência aos credores, conferir a documentação apresentada pela empresa, bem como todos os créditos arrolados. Ato contínuo, passam a ficar suspensos por 180 dias os processos e execuções contra a empresa devedora. É o chamado stay period, antes improrrogável, mas que, com as novas alterações passou-se a permitir a prorrogação por uma vez e pelo mesmo período (180 dias). Em até 60 dias após o início do processo, a empresa recuperanda deve apresentar seu Plano de Recuperação Judicial, que deve descrever todas as medidas que a empresa pretende adotar para se recuperar financeiramente (alienação de ativos, cisão, fusão, parcelamento de dívidas e etc). Além disso, o Plano de Recuperação Judicial deve conter de forma clara, as condições de pagamento dos credores (deságio, parcelamento, carência, juros e correção monetária e etc). Em seguida, os credores avaliam as propostas e, se concordarem, o plano é homologado. Caso contrário, podem apresentar objeção e o juiz deve convocar Assembleia Geral de Credores para discussão do plano. A nova legislação trouxe a possibilidade de apresentação de um plano pelos próprios credores, em caso de rejeição daquele proposto pela empresa, em 30 dias, com possibilidade de prorrogação do stay period uma segunda vez (art. 6º, §4º e 4º-A da Lei 11.101/05). Na AGC, os credores são divididos de acordo com suas classes, podendo ser: a. Classe I – trabalhistas; b. Classe II – Garantia real; c. Classe III – Quirografários; e d. Classe IV – Quirografários ME e EPP Via de regra, todas as classes devem aprovar o plano de recuperação judicial, porém, a lei traz algumas exceções que permitem a aprovação do plano mesmo com uma classe em desacordo. É o chamado Cram Down (art. 58, §1). O resultado da Assembleia é levado ao juiz, que é o responsável por homologa-lo. Caso o plano seja aprovado, é proferida uma decisão de homologação e de concessão da recuperação judicial à empresa requerente. Ou seja, somente nesse momento é que a empresa está de fato em Recuperação Judicial. Com a aprovação e homologação do plano, acontece a novação das dívidas, sendo que as condições de pagamento passam a ser aquelas descritas no plano de recuperação judicial. No caso de reprovação do plano de recuperação, o juiz decreta a falência da empresa devedora. Assim, a companhia encerra as atividades, e seus ativos são vendidos para o pagamento das dívidas. 2.2. DOS QUESTIONAMENTOS LEVANTADOS Uma vez compreendido o roteiro básico aser seguido pelo processo de Recuperação Judicial, convém analisar os pontos questionados, o que se fará em tópicos, para facilitar a compreensão. i. Está correta a decisão do juízo de autorizar as recuperandas a participarem de licitações públicas sem a apresentação das certidões negativas? Quais as chances do recurso ministerial perante o Tribunal de Justiça e o Superior Tribunal de Justiça? Antes da entrada em vigor da Lei 14.112/2020, a redação da Lei 11.101/05 era cristalina no sentido de que ao deferir o pedido de recuperação judicial, o juiz determinaria a dispensa da apresentação de certidões negativas, exceto para contratação com o Poder Público. Veja-se: Art. 52. Estando em termos a documentação exigida no art. 51 desta Lei, o juiz deferirá o processamento da recuperação judicial e, no mesmo ato: II – determinará a dispensa da apresentação de certidões negativas para que o devedor exerça suas atividades, exceto para contratação com o Poder Público ou para recebimento de benefícios ou incentivos 6 fiscais ou creditícios, observando o disposto no art. 69 desta Lei; Acontece que, na prática, essa vedação acabava por prejudicar a recuperação das empresas que, muitas das vezes, tem sua maior receita decorrente da contratação com o Poder Público. Logo, a jurisprudência passou a adotar o entendimento de que essa exigência de apresentação de certidões negativas desconsiderava o próprio interesse público de preservação da atividade econômica e dos empregos, dificultando ainda mais a recuperação da empresa em crise. Assim, o próprio Superior Tribunal de Justiça fixou entendimento de que tal exigência era dispensável. Veja-se: Sociedade empresária em recuperação judicial. Participação em licitação. Possibilidade. Certidão de concordata. Previsão na Lei n. 8.666/1993. Interpretação extensiva. Descabimento. Aptidão econômico-financeira. Comprovação. Necessidade. [...]. Dessa forma, a interpretação sistemática dos dispositivos das Leis n. 8.666/1993 e n. 11.101/2005 leva à conclusão de que é possível uma ponderação equilibrada entre os princípios nelas imbuídos, pois a preservação da empresa, a sua função social e o estímulo à atividade econômica atendem também, em última análise, ao interesse da coletividade, uma vez que se busca a manutenção da fonte produtora, dos postos de trabalho e dos interesses dos credores. Assim, a apresentação de certidão positiva de recuperação não implica a imediata inabilitação, cabendo ao pregoeiro ou à comissão de licitação diligenciar a fim de avaliar a real situação de capacidade econômico-financeira da empresa licitante” (AREsp 309.867-ES, Rel. Min. Gurgel de Faria, por unanimidade, julgado em 26/06/2018, DJe 08/08/2018). Original sem grifo. Ato contínuo, acolhendo a esse posicionamento dominante dos Tribunais Estaduais e Superiores, a Lei 14.112/2020 tratou de excluir a exigência de certidões negativas de débitos fiscais para contratação com o Poder Público. Desse modo, uma vez deferido o processamento da recuperação judicial, o juiz deve determinar a dispensa de certidão negativa de débitos para a prática da atividade empresarial pelo devedor. Ou seja, pode a empresa recuperanda continuar prestando serviços e/ou fornecendo bens e produtos ao setor público ainda que existam débitos fiscais. A única ressalva trazida pela redação do inciso II, do art. 52 é a de que o devedor deve estar em dia com a seguridade social, na forma do art. 195, §3º da Constituição Federal. Em sendo assim, in casu, verifica-se que o magistrado agiu corretamente em deferir o pedido de dispensa das certidões negativas para participação de licitação pelas recuperandas uma vez que, ainda que o pedido de RJ tenha sido feito sob a vigência da antiga norma, o fato é que os Tribunais já tinham entendimento consolidado sobre a validade da dispensa. Logo, o Agravo de Instrumento do Ministério Público tem remota ou até mesmo nenhuma chance de êxito. ii. O pagamento linear de 50 salários mínimos deve atingir apenas os créditos até esse valor ou também deve abranger os demais créditos? Como se sabe, a igualdade de tratamento entre os credores é princípio basilar tanto no processo de recuperação judicial quanto na falência. É o chamado princípio par conditio creditorum. Incluse, tamanha a importância deste princípio, que o art. 172 da Lei 11.101/01 estabelece como crime falimentar “praticar, antes ou depois da sentença que decretar a falência, conceder a recuperação judicial ou homologar plano de recuperação extrajudicial, ato de disposição ou oneração patrimonial ou gerador de obrigação, destinado a favorecer um ou mais credores em prejuízo dos demais: Pena – reclusão de 2 (dois) a 5 (cinco) anos, e multa.” Pois bem. In casu, verifica-se que o plano de recuperação judicial previu o pagamento, à vista, de todos os créditos de até 50 salários mínimos, beneficiando, portanto, os menores credores. É certo que a empresa recuperanda pode negociar condições de 8 pagamento com seus credores, porém, essa liberdade de negociação não pode, via de regra, causar desigualdade de tratamento entre os credores, sob pena de ferir o princípio da par conditio creditorum. Logo, não há qualquer impeditivo de que a recuperanda pague à vista, valor equivalente à 50 salários mínimos. Entretanto, essa disposição deverá beneficiar a todos os credores e não apenas aqueles que tenham créditos iguais ou inferiores a esse valor. Assim, no caso dos credores maiores, ou seja, cujos créditos ultrapassam o montante de 50 salários mínimos, deve o excedente ser recebido na forma prevista pelo Plano de Recuperação Judicial. Em outras palavras, o credor quirografário com crédito de R$ 1.000.000,00, por exemplo, receberá à vista, valor equivalente a 50 salários mínimos, sendo que o remanescente seguirá a proposta de pagamento de sua classe. iii. Como a jurisprudência vê a proposta de deságio nos patamares alinhados no plano, de 80% e 60%? Como se sabe, a Lei nº 11.101/05 tratou de conferir o papel de protagonista aos credores no processo recuperacional, uma vez que lhes atribuiu o poder de, em assembleia-geral, aprovar, propor alterações ou rejeitar o plano apresentado pelo devedor. Assim, via de regra, todas as disposições constantes no plano, aprovado em Assembleia, são válidas, uma vez que deve ser respeitada a vontade dos credores. Apesar disso, inobstante a natureza contratual do plano, a crise de uma empresa importa não apenas à devedora, mas aos diversos credores e à própria coletividade, dada sua função social. Assim, tendo em vista esta pluralidade de interesses, é dever do Estado-juiz zelar pela preservação de empresas viáveis. Por consequência, não cabe ao juiz atuar como mero homologador do plano aprovado pelos credores, mas sim promover um efetivo controle quanto a licitudes das disposições lá aprovadas. Tanto é verdade, que o Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp nº 1.314.209 reconheceu a possibilidade do controle judicial do plano de recuperação aprovado pela Assembleia Geral de Credores, destacando que a “soberania” da assembleia não implica na impossibilidade de controle judicial do referido Plano. Veja-se: “RECURSO ESPECIAL. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. APROVAÇÃO DE PLANO PELA ASSEMBLEIA DE CREDORES. INGERÊNCIA JUDICIAL. IMPOSSIBILIDADE. CONTROLE DE LEGALIDADE DAS DISPOSIÇÕES DO PLANO. POSSIBILIDADE. RECURSO IMPROVIDO. 1. A ASSEMBLEIA DE CREDORES É SOBERANA EM SUAS DECISÕES QUANTO AOS PLANOS DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. CONTUDO, AS DELIBERAÇÕES DESSE PLANO ESTÃO SUJEITAS AOS REQUISITOS DE VALIDADE DOS ATOS JURÍDICOS EM GERAL, REQUISITOS ESSES QUE ESTÃO SUJEITOS A CONTROLE JUDICIAL. 2. RECURSO ESPECIAL CONHECIDO E NÃO PROVIDO. (REsp 1314209/SP, Rel. Ministra NANCY ANDRIGHI, TERCEIRA TURMA, julgado em 22/05/2012, DJe 01/06/2012)” A relatorado REsp supra, a E. Ministra Nancy Andrighi, brilhantemente explicou que: “A vontade dos credores, ao aprovarem o plano, deve ser respeitada nos limites da lei. A soberania da assembleia para avaliar as condições em que se dará a recuperação econômica da sociedade em dificuldades não pode se sobrepujar às condições legais da manifestação de vontade representada pelo plano." Nesse rumo também é o Enunciado nº 44 da I Jornada de Direito Comercial do Conselho da Justiça Federal. Veja-se: “Enunciado 44 – A homologação do plano de recuperação judicial aprovado pelos credores está sujeita ao controle judicial de legalidade. Contudo, com relação aos percentuais de deságio, os Tribunais vêm entendendo por sua não abusividade, ainda que em patamares altos como 80% ou 90%. Veja-se: 10 AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECUPERAÇÃO JUDICIAL. INSURGÊNCIA EM FACE DA DECISÃO QUE HOMOLOGOU O PLANO DE RECUPERAÇÃO JUDICIAL. PLANO DEVIDAMENTE APROVADO PELA ASSEMBLEIA GERAL DE CREDORES EM TODAS AS CLASSES. VINCULAÇÃO, POR CONSEGUINTE, DA INSTITUIÇÃO FINANCEIRA, E DE TODOS OS CREDORES, INDISTINTAMENTE. PRECEDENTES DO STJ. RECURSO CONHECIDO E NÃO PROVIDO. […] 6. No tocante ao percentual de deságio de 80% (oitenta por cento) no prazo para pagamento do crédito não vislumbro abusividade no item. A Assembleia Geral de Credores considerou o melhor aos seus interesses e aprovou por maioria dos votos o deságio do aludido percentual e o prazo para pagamento estipulado, não cabendo ao Poder Judiciário entrar no mérito, tornando inviável reprimir decisão tomada pela maioria da Assembleia. […] (TJ-CE – AI: 06267358120208060000 CE 0626735- 81.2020.8.06.0000, Relator: FRANCISCO DARIVAL BESERRA PRIMO, Data de Julgamento: 18/11/2020, 2ª Câmara Direito Privado, Data de Publicação: 18/11/2020). Assim, muito embora se reconheça a possibilidade de controle judicial do plano de recuperação judicial, o fato é que, com relação aos percentuais de deságio, os Tribunais em sua maioria não interferem no resultado Assemblear. Assim, não se verifica grandes chances de êxito no questionamento dos patamares de deságio. iv. Caso o Banco do Brasil mantenha a sua posição contrária à aprovação do plano de recuperação judicial, o juízo pode desconsiderar o seu voto e homologar o plano aprovado pela maioria dos demais credores? Como visto acima, na AGC, os credores são divididos de acordo com suas classes, podendo ser: a. Classe I – trabalhistas; b. Classe II – Garantia real; c. Classe III – Quirografários; e d. Classe IV – Quirografários ME e EPP Com relação ao voto, será proporcional ao valor do crédito de cada credor, com exceção dos titulares de créditos trabalhistas e dos titulares de créditos enquadrados como ME e EPP, cujo voto será computado por cabeça, independentemente do valor de seu crédito. Há, pela lei, a possibilidade de ser declarado nulo o chamado “voto abusivo”, que é aquele exercido manifestadamente para obter vantagem ilícita para si ou outrem (art. 39, §6º). Em outras palavras, aquele contrári ao interesse comum dos credores, que imponha um sacrifício desproporcional a uma classe ou que criem vantagens extraordinárias a um ou alguns credores. Via de regra, todas as classes devem aprovar o plano de recuperação judicial, porém, a lei traz algumas exceções que permitem a aprovação do plano mesmo com uma classe em desacordo. É o chamado Cram Down (art. 58, §1). Assim, segundo a nova lei, o juiz poderá conceder a recuperação judicial mesmo não aprovado por unanimidade o plano desde que preenchidos os seguintes requisitos cumulativamente: a. Haja voto favorável de credores que representem mais da metade do valor de todos os créditos presentes à Assembleia, independentemente de classes; b. A aprovação de 3 das classes de credores ou, caso haja somente 3 classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 2 delas ou, caso haja somente 2 classes com credores votantes, a aprovação de pelo menos 1 delas; e c. Se na classe que tiver rejeitado o plano, contar com voto favorável de mais de 1/3 (um terço) dos credores, computados na forma dos §§ 1º e 2º do art. 45 da Lei; Assim, in casu, caso o Banco do Brasil mantenha sua posição contrária à aprovação do plano de recuperação judicial, o juiz poderá sim desconsiderar seu voto, desde que preenchidos os requisitos elencados acima. v. A contagem do stay period é em dias úteis ou corridos? É possível a sua prorrogração Como se sabe, o stay period é o prazo legal no qual todas as ações e execuções ajuizadas em face da empresa em recuperação judicial ficam suspensas. 12 Antes da reforma trazida pela Lei 14.112/2020, tratava-se de um prazo de 180 dias, improrrogável. E, como a lei não dizia se o prazo deveria ser contado em dias úteis ou corridos, o entendimento que prevalecia era o de que deveria ser contado de forma corrida, por não se tratar de prazo processual. Apesar disso, na prática, o stay period era constantemente prorrogado, bastando que a recuperanda justificasse seu pedido. E, como o processo é, de fato, moroso, esses pedidos de prorrogação do stay period eram quase sempre deferidos. Assim, com o intuito de adequar a legislação à prática forense, a Lei 14.112/2020 modificou a Lei 11.101/05, de modo que o prazo de 180 dias do stay period deixou de ser improrrogável, passando a ser prorrogável por igual período, uma única vez, “desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal”. Veja-se: Art. 6º A decretação da falência ou o deferimento do processamento da recuperação judicial implica: § 4º Na recuperação judicial, as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão pelo prazo de 180 (cento e oitenta) dias, contado do deferimento do processamento da recuperação, prorrogável por igual período, uma única vez, em caráter excepcional, desde que o devedor não haja concorrido com a superação do lapso temporal. Ademais, caso haja a apresentação de um novo plano de recuperação judicial por um credor, haverá uma terceira prorrogação do stay period por mais 180 dias. Veja-se: II - as suspensões e a proibição de que tratam os incisos I, II e III do caput deste artigo perdurarão por 180 (cento e oitenta) dias contados do final do prazo referido no § 4º deste artigo, ou da realização da assembleia-geral de credores referida no § 4º do art. 56 desta Lei, caso os credores apresentem plano alternativo no prazo referido no inciso I deste parágrafo ou no prazo referido no § 4º do art. 56 desta Lei. Por sua vez, a nova lei também tratou expressamente sobre a contagem dos prazos, ao estabelecer, em seu artigo 189 da Lei 11.101/05 que “todos os prazos nela previstos ou que dela decorrão serão contados em dias corridos”. Logo, a conclusão que se chega é a de que o prazo do stay period deve ser contado em dias corridos, e pode ser prorrogado na forma da nova lei. Conclusão 3. CONCLUSÕES Como visto, considera-se a recuperação judicial como um instrumento jurídico de soerguimento de empresas em crise, por meio de um acordo com credores para pagamento de suas dívidas. Possui procedimentos e regras próprias e visa sobretudo a preservação de empresas viáveis. No caso ora em análise, verifica-se que o juízo vêm, de uma maneira geral, conduzindo o procedimento de acordo com o disposto na lei, bem como no entendimento majoritário dos Tribunais pátrios. A exceção diz respeito apenas à disposição do plano de recuperação judicial que privilegiou os menores credores, bem como quanto à disposição de contagem dos prazos em dias úteis, uma vez que, como visto, não estão de acordo com a legislação falimentar. Referências bibliográficas BRASIL, Lei 11.101 de 9 de Fevereiro de 2005. Brasília. BRASIL, Lei 14.112 de 24 de Dezembro de 2020. Brasília. A Reforma da Lei deRecuperação Judicial e Falência. Disponível em < https://genjuridico.jusbrasil.com.br/artigos/1166169442/a-reforma-da-lei-de- recuperacao-judicial-e-falencia>. Acesso em 18.02.2021 A reforma da Lei de Recuperação Judicial e Falência. Disponível em <http://genjuridico.com.br/2021/01/13/reforma-lei-de-recuperacao-judicial-falencia-2/>. Acesso em 18.02.2021 Principais alterações da Lei de Falências. Disponível em: <https://www.conjur.com.br/2021-fev-02/bayma-principais-alteracoes-lei- falenciashttps://www.conjur.com.br/2021-fev-02/bayma-principais-alteracoes-lei- falencias> Acesso em 18.02.2021
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