Buscar

RITMOS BIOLÓGICOS

Prévia do material em texto

@vidadefisio_study 
 
RITMOS BIOLÓGICOS 
CLASSIFICAÇÃO DOS RITMOS BIOLÓGICOS 
Os ritmos biológicos podem ser classificados em 3 grandes grupos, de acordo com o período de recorrência do 
evento considerado: 
 Ritmos circadianos: cujas flutuações se completam a cada 24 h aproximadamente (período de 24 ± 4 h). 
Praticamente todas as variáveis fisiológicas e comportamentais de um mamífero apresentam ritmicidade 
circadiana 
 Ritmos ultradianos: que apresentam mais de um ciclo completo a cada 24 h (período menor do que 20 h). 
Muitas variáveis fisiológicas apresentam ritmicidade ultradiana, como, por exemplo, as secreções hormonais 
 Ritmos infradianos: cujo período de repetição é maior do que 28 h. O ciclo menstrual feminino, assim como 
outros processos reprodutivos, na maioria das espécies, apresenta uma flutuação anual ou sazonal. 
 
CARACTERÍSTICAS GERAIS DA RITMICIDADE CIRCADIANA 
 As estruturas biológicas capazes de gerar os períodos dos diversos ritmos observados são denominadas 
osciladores endógenos, marca-passos ou relógios biológicos. Os osciladores endógenos circadianos têm a 
propriedade de poderem ser sincronizados por fatores cíclicos ambientais, fenômeno chamado de sincronização 
ou arrastamento. Estes fatores ambientais capazes de ajustar o período e a fase dos osciladores endógenos são 
denominados agentes sincronizadores, agentes arrastadores ou zeitgebers (um neologismo alemão que significa 
doador de tempo). O sincronizador ambiental mais poderoso para a maioria dos seres vivos é a alternância entre 
o claro e o escuro, o dia e a noite. 
 Mesmo em condições especiais, em que não ocorram flutuações cíclicas dos possíveis agentes sincronizadores 
ambientais, os ritmos circadianos continuam a se expressar. Esta situação é conhecida por livre-curso, e, nela, os 
ritmos expressam, de modo relativamente fiel, as características endógenas dos osciladores. Os períodos dos 
ritmos circadianos em livre-curso tornam-se ligeiramente diferentes do período expresso em condições de 
arrastamento (que é de exatamente 24 h). 
 Tanto em condições de arrastamento quanto em determinadas situações de livre-curso, os ritmos endógenos 
mantêm entre si relações temporais constantes. Essa relação temporal estável entre todas as funções de um 
organismo é chamada de ordem temporal interna. 
 
Os ritmos biológicos se caracterizam por alguns parâmetros básicos: 
 Período: intervalo de tempo entre repetições (ciclos) do evento considerado 
 Amplitude: diferença entre o valor médio da variável e seus valores de máxima ou mínima 
 Ciclo: todos os valores de uma variável biológica assumidos ao longo de um período 
 Fase ou ângulo de fase: qualquer instante ao longo de um ciclo. 
 
ORGANIZAÇÃO CELULAR E MULTICELULAR DO SISTEMA CIRCADIANO DE TEMPORIZAÇÃO 
 Quando se discute a organização do sistema circadiano de temporização e, eventualmente, os seus aspectos 
bioquímicos e moleculares, devem-se ter em mente as distinções existentes entre organismos unicelulares, 
organismos pluricelulares e células isoladas de seres pluricelulares. No primeiro caso, a célula é o maior nível de 
organização biológica do ser vivo considerado. Desta maneira, é, ao nível da organização intrinsecamente 
celular, bioquímica e molecular, que podem ser entendidos os fenômenos típicos das expressões rítmicas 
 
@vidadefisio_study 
 
circadianas: os mecanismos geradores de tempo (os relógios circadianos), as estruturas e vias que garantem os 
efeitos sincronizadores de agentes físicos ambientais sobre os osciladores celulares, assim como as vias 
bioquímicas que acoplam esses osciladores aos diferentes sistemas funcionais da célula, garantindo sua 
temporização circadiana. 
 No caso de seres multicelulares, deve-se considerar que o nível de organização celular está, necessariamente, 
subordinado aos níveis de organização hierarquicamente superiores, como os tecidos e os sistemas fisiológicos. 
Assim, apesar de as células isoladas poderem apresentar expressões rítmicas circadianas, comandadas pelos 
clock genes (p. ex., quanto a atividade enzimática, divisão celular, crescimento, respiração, síntese e secreção 
etc.), no conjunto do organismo, estas não são autônomas, pois dependem de agentes moleculares 
extracelulares, neurais e/ou humorais, que trazem a informação dos osciladores mestres do organismo. 
 As únicas células de seres pluricelulares que, com algumas restrições, apresentam similaridades com os seres 
unicelulares, quanto à sua organização rítmica, são as células dos marca-passos centrais. 
 uma outra diferença está no fato de o relógio circadiano de um ser unicelular temporizar, diretamente, por 
intermédio de vias bioquímicas, as funções celulares, enquanto as células de um oscilador central de seres 
multicelulares têm que lançar mão de transformações bioquímicas e moleculares que coloquem em ação 
sistemas neurais e/ou endócrinos de modo a comandar funções a distância distribuídas por todo o organismo. 
NÚCLEOS SUPRAQUIASMÁTICOS 
 recentemente, as abordagens para estudar os processos de geração da ritmicidade circadiana têm incluído 
métodos de biologia molecular e genética molecular. Foram identificados hamsters mutantes em que o período 
endógeno de seus ritmos difere do período encontrado nos animais “selvagens” ou normais. Esses animais 
mutantes, denominados mutantes tau, apresentam um período em livre-curso menor (22 h para os 
heterozigotos tau/+ e 20 h para os homozigotos tau/tau) do que o dos animais normais (período de 24 h). 
Transplantes de tecidos dos NSQ desses mutantes em hamsters selvagens com seus núcleos supraquiasmáticos 
lesados restauram a ritmicidade no hospedeiro com o período do ritmo do doador. Mutações induzidas que 
afetam a função do relógio têm sido identificadas em outros mamíferos (camundongos – mutante clock) e não 
mamíferos (Drosophila melanogaster, Neurospora crassa, Cyanobacteria). 
 Nessa perspectiva de compreensão dos mecanismos do relógio biológico ao nível celular, a demonstração da 
presença de ritmicidade circadiana na atividade elétrica de neurônios isolados dos NSQ, com períodos 
diferentes, reforçou a busca por mecanismos geradores da ritmicidade circadiana ao nível molecular. Alças 
regulatórias da transcrição e tradução gênicas dos chamados genes do relógio (clock genes) têm sido postuladas 
como modelo para a geração dos ritmos circadianos. 
 Assim, a ritmicidade circadiana, em nível celular, parece depender de ciclos bioquímicos que envolvem 
processos de transcrição, tradução, interação proteica, processos de fosforilação, degradação proteica, 
translocação para o núcleo e interação com o material genômico, fechando alças de regulação positiva ou 
negativa da expressão gênica. Esses processos estão organizados temporalmente de tal modo que são capazes 
de gerar ciclos de aproximadamente 24 h. 
RITMOS CIRCADIANOS NOS DIVERSOS SISTEMAS FISIOLÓGICOS E CONCEITO DE HOMEOSTASE 
 Os estudos cronobiológicos demonstram que praticamente todas as variáveis fisiológicas apresentam flutuações 
regulares e periódicas em sua intensidade ao longo das 24 h do dia. Demonstram, também, que, além dessa 
variação quantitativa, os diversos sistemas fisiológicos respondem de forma diferente a um mesmo estímulo de 
acordo com a hora do dia. Essa ritmicidade circadiana, filogeneticamente incorporada e endogenamente gerada, 
teria a finalidade de preparar, antecipadamente, os organismos para enfrentar as alterações e estimulações 
ambientais estreitamente vinculadas às flutuações do dia e da noite. A essa capacidade regulatória, cuja 
qualidade e intensidade são ritmicamente moduladas, dá-se o nome de homeostase preditiva. Já o fenômeno 
homeostático clássico, isto é, a capacidade que os sistemas fisiológicos têm de ajustar uma determinada variável 
em torno de um certo valor médio, é denominado homeostase reativa. 
 
@vidadefisio_study 
 
 
 A vantagem da complementação do conceitode homeostase com a chamada homeostase preditiva é entender 
que o “valor médio”, em torno do qual se dá a regulação fisiológica clássica, varia de modo rítmico ao longo das 
24 h do dia. Da mesma maneira, varia também a própria capacidade regulatória dos diversos sistemas 
fisiológicos. 
 
RITMOS DAS SECREÇÕES HORMONAIS 
 Cada um dos hormônios circulantes apresenta seu pico de máxima produção e secreção em momentos 
diferentes do dia, de acordo com as necessidades típicas da espécie. Assim, para a espécie humana, tipicamente 
de atividade diurna, os corticosteroides suprarrenais, que no conjunto de suas funções preparam o organismo 
para a vigília e a interação ativa com o meio ambiente, têm seu pico máximo de produção e secreção no fim da 
noite de sono, precedendo o despertar. Da mesma maneira, a insulina é produzida e liberada em maior 
quantidade, além de agir mais intensamente, de manhã e no começo da tarde, quando as necessidades 
energéticas na espécie humana são maiores. 
 Além da variação circadiana na produção e secreção desses hormônios, demonstra-se, também, que a 
reatividade de seus sistemas funcionais é diferente em distintos momentos do dia. Assim, estímulos estressantes 
produzem seu máximo efeito nos momentos circadianos de menor produção de corticosteroides e efeitos 
mínimos nos instantes de sua máxima produção e secreção. Da mesma maneira, a quantidade de insulina 
liberada por uma carga oral de glicose é máxima de manhã e mínima à noite, de que se pode inferir que a 
glicemia resultante será maior e mais duradoura à tarde e à noite do que de manhã. 
 Outra secreção hormonal que apresenta uma distribuição circadiana bem evidente é a do hormônio de 
crescimento. Seu pico de máxima para os seres humanos se dá no primeiro terço da noite de sono, 
coincidentemente com a maior incidência de sono sincronizado de ondas lentas (fases 3 e 4), momento este em 
que o metabolismo proteico cerebral é máximo. Vale ressaltar que, da mesma maneira que para os 
corticosteroides suprarrenais, as relações entre os ciclos circadianos de vigília-sono e a concentração plasmática 
de hormônio de crescimento são principalmente temporais e não causais. 
 Também, para várias outras secreções hormonais, está demonstrada a existência de ritmicidade circadiana: 
tireotropina, prolactina, aldosterona, renina e testosterona. 
 Quanto aos hormônios foliculestimulante (FSH) e luteinizante (LH), nota-se, igualmente, uma tendência 
circadiana na sua concentração plasmática. No entanto, para o LH e o hormônio liberador de LH (LHRH), são 
muito mais evidentes e fisiologicamente importantes as suas produções e secreções infradianas (obedecendo 
aos ciclos estrais) e pulsátil (obedecendo a um ritmo ultradiano que, no ser humano, tem um período entre 1 e 2 
h). 
RITMOS DA FUNÇÃO RENAL 
 A excreção renal de água e eletrólitos apresenta nítidas flutuações circadianas. Nos seres humanos, a excreção 
urinária de água, potássio, cálcio e hidrogênio é máxima de manhã e no começo da tarde, enquanto a excreção 
de sódio é maior à tarde. Da mesma maneira, as regulações do volume de líquido extracelular e da concentração 
de eletrólitos plasmáticos pelos mecanismos renais variam de acordo com a hora do dia. 
 É possível demonstrar que, quando todos os outros fatores interferentes estão controlados, a resposta diurética 
humana à ingestão de água é consideravelmente maior de manhã do que à tarde. Demonstra-se, em seres 
humanos, que o aumento do retorno venoso provocado pela passagem da posição ereta para a posição deitada 
causa, de dia, um aumento imediato da diurese e da natriurese e, de madrugada, uma resposta quase 5 vezes 
menor. Mostra-se, ainda, que o organismo humano tem uma capacidade maior de livrar-se de uma sobrecarga 
de potássio de dia do que de noite. 
 
 
@vidadefisio_study 
 
 
TERMORREGULAÇÃO 
 A temperatura corpórea apresenta um dos mais conspícuos ritmos circadianos em mamíferos, e no ser humano 
em particular. 
 Em indivíduos adequadamente sincronizados a um esquema social de trabalho diurno e repouso noturno, a 
temperatura corpórea central apresenta seu valor máximo por volta das 17 a 18 h e seu valor mínimo por volta 
do segundo terço do sono noturno. Esse valor mínimo da temperatura corpórea aparece após o período de 
maior incidência de sono sincronizado com ondas lentas e de máxima secreção do hormônio de crescimento e 
precede os momentos de maior incidência de sono com movimentos oculares rápidos e de máxima secreção de 
corticosteroides suprarrenais. 
 Nas mulheres, a ritmicidade circadiana da temperatura corporal está modulada por um ritmo infradiano de 
aproximadamente 1 mês, que atinge o seu valor máximo concomitantemente com a ovulação. 
RITMOS DOS ELEMENTOS FIGURADOS DO SANGUE 
 Em seres humanos, vários parâmetros hematológicos, quando medidos ao longo das 24 h, mostram uma 
variação considerável que pode, quando excluídos os outros fatores, ser atribuída ao fenômeno da ritmicidade 
circadiana. Assim, a título de exemplo, o momento de máxima no número de hemácias, na quantidade de 
hemoglobina e no hematócrito ocorre por volta das 12 h. 
 Já o número total de glóbulos brancos tem seu maior valor imediatamente antes ou mesmo no início do período 
de repouso (aproximadamente das 23 às 24 h). Essa curva circadiana dos leucócitos pode ser decomposta para 
cada um de seus componentes: neutrófilos têm sua maior ocorrência por volta das 18 às 19 h, e linfócitos totais, 
em torno das 24 h (e linfócitos do tipo B têm seu valor máximo no fim da noite de sono). Por outro lado, as 
plaquetas têm seu número máximo perto das 18 h. 
RITMOS NO SISTEMA CARDIOVASCULAR 
 Praticamente todos os parâmetros cardiovasculares humanos apresentam uma flutuação circadiana regular. 
Assim, a frequência cardíaca, o débito cardíaco, o volume sistólico e as pressões arteriais sistólica e diastólica, 
além do volume circulante, apresentam valores máximos por volta das 17 às 18 h. 
 Já o tempo de ejeção ventricular, o intervalo entre sístoles, a resistência capilar e a viscosidade sanguínea ou 
plasmática apresentam seus valores máximos entre 5 e 8 h da manhã. Por meio de uma análise dessas 
flutuações circadianas, podem-se inferir os momentos de maior risco para acidentes vasculares do tipo 
isquêmico (de madrugada e início da manhã) e do tipo hemorrágico (fim da tarde e noite). 
RITMOS NO SISTEMA RESPIRATÓRIO 
 Os valores das variáveis ligadas à função respiratória apresentam uma flutuação circadiana, em seres humanos, 
de tal forma que a capacidade respiratória é mínima à noite e de madrugada e máxima durante o dia. Além do 
mais, demonstra-se que a responsividade máxima da árvore brônquica a agentes parassimpaticomiméticos 
ocorre à noite, e a agentes simpaticomiméticos, durante o dia. Este fato, associado à maior resposta alergênica, 
menor resposta anti-inflamatória, além de um maior contato com o antígeno, explicaria a maior incidência de 
crises de asma alérgica à noite. 
VARIAÇÃO CIRCADIANA NA AÇÃO DE MEDICAMENTOS | CRONOFARMACOLOGIA E CRONOTERAPÊUTICA 
 Como a fisiologia do organismo humano oscila de modo qualitativo e quantitativo nas 24 h do dia, é de se 
esperar que a interação do organismo com fármacos a ele administrados também apresente a mesma variação. 
O fato de um medicamento apresentar efeito diferente em razão do horário da sua administração deve-se a 
diversos fatores que variam de acordo com o ciclo circadiano, tipo: absorção, capacidade de metabolização, 
armazenamento, excreção, bem como número e afinidade de receptores em órgãos-alvo. 
 
@vidadefisio_study

Continue navegando