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1 ROMANTISMO Introdução O trabalho apresentado tem como objetivo fazer uma breve análise acerca do capítulo IV da obra A Pata da Gazela (séc. XIX), de José de Alencar, que é considerado um dos principais autores do Romantismo brasileiro. Apontar-se-á algumas características de tal escola literária. Para isso, analisaremos como a linguagem é empregada no referido capítulo, como a personagem é descrita e, ainda, a preocupação do narrador em qualificar a personagem por meio da adjetivação. Será utilizada como referencial teórico- para falar sobre os aspectos do Romantismo - a obra Introdução à Literatura no Brasil, de Afrânio Coutinho; mais especificamente, o capítulo O Movimento Romântico. COMENTÁRIOS SOBRE O CAPÍTULO IV DE A PATA DA GAZELA No capítulo quatro é enfatizado, pelo narrador onisciente, o amor idealizado que Leopoldo sente por Amélia mesmo antes de conhecê-la. O mancebo a tem como um ser puro e que merece ser amado a todo custo, ainda que este amor não seja correspondido. O amor idealizado, a mulher colocada como um ser divinal, o subjetivismo e o sentimentalismo são as características principais do Romantismo. Estes aspectos podem ser observados no capítulo aqui estudado, como no trecho em que Leopoldo vê a sua amada na carruagem Se eu soubesse ao menos para que lado mora ela!... Esse ponto seria o meu horizonte, o meu céu. Me voltaria para ali quando adorasse a Deus e quando conversasse com ela. Amaria as estrelas, as nuvens e até as borrascas dessa banda do firmamento; amaria as ruas, as calçadas e até a poeira desse arrabalde da cidade. (p.17, grifo meu) Note-se que o mancebo vê a mulher como um ser divino. O seu amor e a sua admiração por ela são tão elevados que ele a idealiza como uma criatura que seria capaz de levá-lo aos céus e fazê-lo amar todas as coisas maravilhosas criadas por Deus. A linguagem utilizada é carregada de subjetivismo, eloquência e lirismo. Esses aspectos revelam a confissão de um personagem apaixonado e de um amor platônico. O narrador não a descreve, neste capítulo, com detalhes. No entanto, sobre as qualidades de Amélia, o mancebo diz: “O que eu admiro nela, o que me enleva, é sua 2 beleza celeste; é o anjo que transparece através do invólucro terrestre; é a alma pura e imaculada que se derrama de seus lábios em sorrisos, e a envolve como a cintilação de uma estrela”. (p.19, grifo meu) As palavras grifadas mostram como a mulher é qualificada; é a adjetivação das palavras, característica muito marcante no Romantismo, visto que para se fantasiar um mundo ou uma mulher perfeita, o romântico utiliza-se de uma linguagem metafórica e carregada de qualificações, o que explica os excessos de Leopoldo ao falar de Amélia. Sobre o Romantismo Coutinho (2001) aponta, de acordo com um trabalho de Hibbard (1942), algumas qualidades que caracterizam o espírito Romântico. Dentre elas, cabe citar aqui o escapismo, que segundo o autor “É o desejo do romântico de fugir da realidade para um mundo idealizado, criado, de novo, à sua imagem, à imagem de suas emoções e desejos, e mediante a imaginação. “ (p.146, grifo meu). É o que se observa neste capítulo, no qual Leopoldo cria um mundo elevado, de acordo com suas idealizações da mulher perfeita, e foge da sua realidade: um amor, por hora, não correspondido. O seguinte trecho revela outra característica do Romantismo O amor é um magnetismo; eu acredito que o magnetismo se resume nele; que a lei da atração não é senão a lei da simpatia; os pólos são a cabeça e o coração, na terra como no homem. Se ela for a mesma que eu vi com os olhos de minha alma, a mesma que se revelou à minha paixão, aquela a que devo unir-me eternamente para formar um ser mais perfeito, eu caminharei para ela, como ela para mim, impelidos por uma força misteriosa, por mútua aspiração. (p. 17) Neste fragmento vê-se o exagero na fala de Leopoldo: a imagem de uma vida sem defeitos. Não há vestígios de um mundo violento ou mecanizado, mas sim a criação de um mundo utópico, característico das obras Românticas. Sobre o exagero, Coutinho (2001) afirma: “Na sua busca de perfeição o romântico foge para um mundo em que coloca tudo o que imagina de bom, bravo, belo, amoroso, puro, situado no passado, no futuro, ou em lugar distante, um mundo de perfeição e sonho. “ (p. 147, grifo meu). Ou seja, no Romantismo o que predomina é a ideia de um amor lapidado e de uma mulher divinal; o subjetivismo e um sentimentalismo, que é colocado de maneira exagerada. Todos estes aspectos evidenciam-se nos trechos aqui apontados. 3 NATURALISMO Introdução O presente trabalho tem como intuito fazer uma breve análise sobre o capítulo V da obra Bom-Crioulo (séc. XIX), de Adolfo Caminha. A obra não foi bem recebida na época de sua publicação (1895) por abordar o tema da homossexualidade e, ainda, por ter como personagem principal um ex-escravo negro. Para tecer um comentário acerca das características do Naturalismo presentes no referido capítulo, atentaremos para a maneira como os personagens são tratados, como as mazelas, doenças e os transtornos humanos são expostos por meio da linguagem. O referencial teórico utilizado para se desenvolver tal comentário será Introdução à Literatura Brasileira, de Adolfo Caminha, mais especificamente, o sub-tópico Definição e Caracteres do Naturalismo. COMENTÁRIOS SOBRE O CAPÍTULO V DE BOM CRIOULO Bom Crioulo é narrado em terceira pessoa por um narrador onisciente. O capítulo cinco, objeto de nossa análise, conta como Amaro e Aleixo se relacionam e descreve alguns momentos íntimos dos dois. A relação que eles mantém são contadas com detalhes utilizando uma linguagem “grosseria” e sem floreios, o que é característico do naturalismo, destacando-se a sexualidade humana, como no trecho Porque Bom-Crioulo não se contentava em possuí-lo a qualquer hora do dia ou da noite, queria muito mais, obrigava-o a excessos, fazia dele um escravo, uma mulher-a-toa propondo quanta extravagância lhe vinha à imaginação. Logo na primeira noite exigiu que ele ficasse nu, mas nuzinho em pêlo: queria ver o corpo... (p.70, grifo meu). Note-se que esta relação é homossexual, ou seja, o narrador fala sobre os “desvios sexuais”. Não que tal relação seja um problema, mas para a época em que foi publicada a obra, era um escândalo, por isso a rejeição do público. Esse é justamente um dos temas preferenciais do Naturalismo: a sexualidade e os desvios humanos. Observe as palavras destacadas, não há metáforas para embelezar o que se quer dizer, a linguagem é simples e evidencia exatamente os desejos da carne, os desejos do homem. Sobre estas características do Naturalismo, Coutinho (2001) afirma: “[...] os naturalistas procuraram a verdade, desdenharam do sentimentalismo [...] Aumentaram o interesse pela sociedade e sobretudo pelas suas camadas mais baixas, e puseram mais ênfase na liberdade de expressão. “ (p.189, grifo meu). Há de 4 se reconhecer que há um sentimentalismo na obra em si, mas o que se destaca é o prazer da carne, colocado de maneira explícita. Amaro é ex-escravo, homossexual e pertence à camada mais baixa da sociedade e a obra se mostra como um meio de liberdade de expressão justamente por retratar tal realidade, por trazer para o centro personagens que sempre estiveram à margem da sociedade. Outro tema abordado no Naturalismo concerne às mazelas e às doenças. Há uma exploração dos temas patológicos, os quais revelam realidades que podem causar repulsa a quem lê. Do capítulo aqui analisado, extraiu-se alguns fragmentos que retratam exatamente estas situações O quarto era independente, com janela para os fundos da casa, espécie de sótão, ruído pelo cupim e tresandando a ácido fênico. Nele morrera de febre amarela um portuguesinho recém chegado. Mas Bom-Crioulo, conquanto receasse asfebres de mau caráter, não se importou com isso, tratando de esquecer o caso e instalando- se definitivamente. (p.68, grifo meu) As palavras em negrito revelam as condições de penúria nas quais Amaro vive, o que se caracteriza como uma forma de denúncia dos problemas sociais. O Naturalismo coloca os personagens da camada mais baixa, neste caso um ex-cativo, e mostra sob quais condições (até as mais sórdidas) esse indivíduo vive. Ressalta-se, ainda, as doenças que massacravam os indivíduos naquela época, tema marcante no Naturalismo e bem acentuado em Bom crioulo: “Pela noite, desde o escurecer, o odor pestilento aumentava e então não havia remédio: a marinhagem toda precipitava-se para fora, como um formigueiro alvoroçado tapando o nariz: Foge! foge! olha a febre amarela!” (p.74, grifo meu). A doença da febre amarela aparece neste capítulo de maneira veemente e é colocada em vários trechos justamente para se dar ênfase aos males aos quais o ser humano está sujeito, e que muitos negligenciam. O Naturalismo preocupou-se em abordar assuntos deste aspecto e com esta linguagem, os quais não seriam abordados no Romantismo, por exemplo. Este é um dos fatores que diferenciam ambos. Em relação aos transtornos manifestados pelo homem, mais especificamente pelo personagem, destaca-se o seguinte fragmento: “Renasciam-lhe os zelos; aquela separação brusca e inesperada irritava-o, acordando no fundo de sua alma um egoísmo exacerbado, uma desconfiança vaga no futuro. ” (p.78, grifo meu). Tais perturbações desencadearão outras atitudes do personagem, revelando assim o lado 5 animal do homem: Amaro chegará ao ponto de matar o companheiro. A prosa Naturalista evidencia isso, os aspectos biológicos e psicológicos do homem; é uma literatura escrita para provar um mundo violento, de mazelas, doenças e transtornos. Para ratificar as análises que foram feitas sobre as características do Naturalismo, citar-se-á Coutinho (2001, p. 190), que diz O espírito da objetividade e imparcialidade científicas faz com que o naturalista introduza na literatura todos os assuntos e atividade do homem, inclusive os aspectos bestiais e repulsivos da vida, dando preferência às camadas mais baixas da sociedade. Pelo método documental, pelo uso da linguagem simples, direta, natural, coloquial, mesmo vulgar, e dos dialetos das ciências e profissões, o Naturalismo procura representar toda a natureza, a vida que está próxima da natureza, o homem natural. É justamente desta maneira que os personagens são colocados na narrativa: em seus aspectos mais bestiais, representando o homem natural tal qual a realidade. Vê-se em Bom Crioulo uma linguagem objetiva e direta, que é utilizada para descrever e narrar modos de vida e elementos que podem causar repulsa em certas pessoas e em determinadas sociedades, como: a relação sexual entre dois homens e as doenças contraídas pelos marinheiros. CONCLUSÃO O trabalho apresentado teve como objetivo fazer uma breve análise acerca do capítulo IV da obra A Pata da Gazela, de José de Alencar, analisando como a linguagem é empregada no referido capítulo, como a personagem é descrita e, ainda, a preocupação do narrador em qualificar a personagem por meio da adjetivação. Concomitante a isso, buscou-se também fazer uma análise sobre o capítulo V da obra Bom Crioulo, de Adolfo Caminha, atentando-se para a maneira como os personagens são tratados, como as mazelas, doenças e os transtornos humanos são expostos por meio da linguagem. A primeira obra é do Romantismo e a segunda do Naturalismo. O intuito do trabalho, por meio destas análises, foi fazer uma comparação entre as características do Romantismo e do Naturalismo, identificando as principais diferenças entre estas duas escolas literárias. 6 No Romantismo o que predomina é a subjetividade, o sentimentalismo, a idealização da mulher e de uma vida perfeita. Todos estes aspectos são construídos por meio de uma linguagem subjetiva e metafórica, transformando substantivos em adjetivos para dar maior expressividade ao que está sendo dito. Em contraposição, no Naturalismo, o que predomina e a objetividade, a descrição da realidade tal qual é vivida pelo homem. A linguagem é objetiva e dura, evidencia um mundo cruel, violento, de mazelas e de transtornos. O Naturalismo revela aspectos e coloca no centro o que estava na periferia do Romantismo, expressando assim, elementos que não seriam abordados nesta escola literária. Foi possível perceber tal contraste ao seu comparar o amor de Leopoldo por Amélia e o amor de Amaro por Aleixo: aquele: idealizado, perfeito e divinal; este: concreto, com transtornos, natural e mundano. Dessa forma, observou-se a mudança na forma como é representada a vida do homem por meio da literatura. São mudanças que marcam a revolução das ideias e, consequentemente, da maneira de se escrever sobre a sociedade. REFERÊNCIAS ALENCAR, José de. A Pata da Gazela. Versão eBook. Disponível em: <http://www.virtualbooks.com.br/v2/ebooks/pdf/00054.pdf>. Acesso em: 07 março 2017. P. 16-21. CAMINHA, Adolfo. [1867-1897]. Bom Crioulo [1895]. Versão para eBook. Disponível em: < http://www.ebooksbrasil.org/adobeebook/bomcrioulo.pdf>. Acesso em: 07 março 2017. P. 68-78. COUTINHO, Afrânio. Introdução à literatura no Brasil. 17ª ed. Rio de Janeiro: Bertrand Brasil, 2001, p. 139-188.