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GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros Gastrite crônica atrófica – Bonatto e convidados DEFINIÇÃO: é a inflamação da mucosa gástrica avaliada por endoscopia digestiva alta e o estudo anátomo patológico, pode ser aguda ou crônica (gastrites específicas). É preciso o olhar clínico + olhar endoscópico + olhar histológico para avaliação correta do paciente. CLÍNICA • Dor epigástrica • Queimação • Distensão do abdome superior • Distúrbios inespecíficos no abdome superior • É preciso atenção a sintomas extra TGI, como cefaleias pós prandiais • Infecção (Helicobacter pylori) • Medicamentos ou intoxicantes (AINE e bebidas alcóolicas) • Excessos alimentares • Fenômenos autoimunes • Transtornos psicossomáticos (várias causas a serem avaliadas) • Importante afastar DRGE como diagnóstico diferencial DIAGNÓSTICO: Classificação de Sydney 1. Avaliação normal. 2. Enantema 3. Enantema e exudado 4. Erosões planas 5. Erosões elevadas 6. Sinais de hemorragia 7. Atrofia da mucosa 8. Hiperplasia de pregas e doença de Ménétrier 9. Gastrite por refluxo (cirurgia de gastrectomia, com refluxo da bile para o estômago) GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros Na atrofia há o desaparecimento gradual de glândulas. O estroma e as células inflamatórias passam a predominar nos “espaços vazios”. A presença de neutrófilos na gastrite crônica significa presença de doença, ou seja, não é uma gastrite aguda. Inicialmente há pouco espaço entre as glândulas, e à medida que a gastrite avança, essas glândulas dão espaço a células inflamatórias e fibrose. Um dos definidores de cronicidade é a presença de células inflamatórias crônicas. Além disso, há metaplasia intestinal nas gastrites crônicas, com o aumento progressivo das células caliciformes e da atrofia. TRATAMENTO É preciso avaliar se é gastrite aguda, crônica, específica ou funcional. Importante a abordagem comportamental do paciente: alimentação, atividade física, sono e saúde mental. É preciso avaliação clínica, endoscópica e histológica. Medicamentos sintomáticos: é preciso avaliar quais medicamentos e em que quantidade o paciente utiliza, pois podem estar causando os sintomas de gastrite. Gastrite aguda por agressão de mucosa: antiácidos, IBP. Gastrite crônica por infecção de H. pylori: poucas evidências que a erradicação melhora os sintomas, há melhora da mucosa, portanto a erradicaç~çao visa à prevenção de neoplasias. Medicamentos específicos: gastrite crônica, pregas hiperplásicas, linfocítica, eosinofílica, varioliforme por citomegalovírus (CMV), GAVE, Crohn etc. GASTRITE CRÔNICA ATRÓFICA (CAAG) • Caracterizada pela presença de autoanticorpos contra a célula parietal → a atrofia se restringe ao corpo do estômago • Ocorre inflamação crônica da submucosa, que se estende para a lâmina própria da mucosa, ocasionando a destruição progressiva das glândulas gástricas (células parietais que produzem HCl) e zimogênicas (que produzem pepsina), as quais são substituídas por metaplasia intestinal • Consequências: o Hipocloridria devido à destruição das células parietais e hipertrofia das células G (gastrina) o Hipercrescimento bacteriano no intestino delgado devido à alteração de pH o Deficiência de vitamina B12 (por deficiência do fator intrínseco) → absorvida no íleo terminal o Má absorção de Fe → anemia megaloblástica ou perniciosa (VCM >90) o Deficiências nutricionais (Ca, vitamina D, vitamina C, ácido fólico B9) o Tumores carcinoides → hiperplasia de células enterocromafins (produzem histamina e serotonina) → glândulas sobre a atrofia do corpo gástricos o Aumento do riso para câncer gástrico em 3x ou mais • Herança autossômica dominante → pode estar associada a outras doenças autoimunes: DM tipo 1, doença de Addison e vitiligo, tiroidites, doença celíaca GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros Tipos de atrofia: distribuição multifocal da gastrite atrófica (extenso) na curvatura menor do corpo e no fundo gástrico quando relacionada à infecção por H. pylori. Quando se refere à gravidade de um local nessa distribuição multifocal, esses locais podem apresentar maior gravidade de atrofia, portanto o risco de adenocarcinoma gástrico é maior na gastrite atrófica multifocal. Anticorpos relacionados: anti-HLA-A3, anti- HLA-B27, anti-HLA-DR2 e anti-HLA-DR4. ASSOCIAÇÕES ETIOLÓGICAS NA GASTRITE CRÔNICA Infecção Helycobacter pylori – causa mais comum Auto-imune Imunológica, em associação com anemia perniciosa Outros irritantes crônicos Stress psicológico, cafeína, álccol e tabaco Pós cirurgia Antrectomia com refluxo crônico de secreções biliares duodenais Alterações mecânicas Obstrução (benzoar), atonia gástrica Radiação Doenças sistêmicas Amiloidose, rejeição enxerto-hopedeiro Gastrectomia e supressão crônica da acidez gástrica com IBP causam deficiências similares e da secreção do fator intrínseco. • Não causa sinais ou sintomas específicos • Fraqueza, astenia (diminuição do Fe), anemia • Distensão é a sensação de inchaço abdominal → excesso de gases • Sintomas neurológicos (B12): polineuropatia, demência → casos graves • pH elevado: infecções entéricas → diarreia • Hipercrescimento bacteriano → acloridria • Emagrecimento, vômitos • Outras doenças autoimunes (tireoidite, Addison, DM tipo 1, vitiligo) • Hemograma: verificar anemia → VCM > 90 • Dosagem de vitamina B12 • Gastrina • Dosagem de vitamina C, Ca, ácido fólico • Anticorpos anti-células parietais • Densitometria óssea • Helicobacter pylori • Teste respiratório de “hiperproliferação bacteriana” • Endoscopia digestiva alta → cromoscopia e magnificação → descrição endoscópica • Histologia → OLGA: Operative Link of Gastritis Assesment → biópsia do antro, das incisuras angulares, grande e pequena incisuras Na imagem: (a) GASTRITE ATRÓFICA MULTIFOCAL: é causada por infecção prolongada por H. pylori e é caracterizada por predomínio do antro ou pangastrite e vários graus de atrofia metaplásica (manchas azuis). (b) GASTRITE AUTOIMUNE: o processo inflamatório atrófico envolve exclusivamente o corpo (descoloração) e manchas de metaplasia intestinal, pseudopilórica e pancreática são encontrados em todo o corpo gástrico e fundo. GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros Locais de biópsia para diferenciar gastrite atrófica multifocal de gastrite autoimune: A1 e A3: curvaturas maior e menor do antro distal A3: curvatura menor na incisura angular C1 e C2: paredes anterior e posterior do corpo proximal EDA do corpo do estômago com pseudoglândulas, ou nodosidades e um pequeno pólipo (círculos). Diminuição expressiva das pregas gástricas. Na última imagem é possível ver o fundo do estômago por retrovisão, com sinais de vasos, mostrando como está fina a camada de mucosa (seta). Foto de EDA normal do corpo do estômago mostrando as fovéolas (orifícios) das células oxínticas ou parietais com cromoscopia. Ao lado, a mucosa está atrofiada, com desaparecimento das glândulas e das fovéolas parietais, além de vascularizações anormais ao fundo. GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros Tumor carcinoide gástrico tipo I de natureza neuroendócrina. Helycobacter pylori na mucosa gástrica: filamentos contra o fundo amarelo. A gastrite causada pela infecção por H. pylori, ou gastrite ambiental, costuma afetar a parte superficial da mucosa, causando inflamação (antigamente a gastrite ambiental era denominada gastrite crônica superficial). A gastrite autoimune afeta a região basal da mucosa. Nas imagens abaixo é possível ver essa diferença. Na imagem à direita é possível observar grandes nódulos linfoides (círculos), agregados que produzem os anticorpos responsáveis por destruir a mucosa na região basal e o predomínio de inflamação na região inferior. Na imagem à esquerda é possível verificar a ausência denódulos linfoides e inflamação na região basal, já no epitélio há processo inflamatório, além de atrofia importante com separação de glândulas (retângulo). GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros As imagens abaixo comparam o epitélio gástrico normal (à esquerda) com a gastrite atrófica (à direita). No epitélio normal é possível verificar a proximidade das glândulas no epitélio gástrico (círculo). Já nas outras imagens as glândulas se encontram afastadas (elipses), e a distância entre elas preenchida de infiltrado inflamatório (seta curvada). Na imagem inferior à direita, é possível também observar a presença de metaplasia intestinal (células mais claras apontadas pelas setas retas). A metaplasia intestinal pode se apresentar de duas formas: Metaplasia intestinal incompleta – tipo II: igual ao cólon, apresenta apenas células caliciformes (círculo) entre células normais (retângulo) – imagem à esquerda. Metaplasia intestinal completa – tipo I (igual ao intestino delgado: células caliciformes, borda em escova e células de Paneth – imagem à direita. A metaplasia é muito importante pois está relacionada ao aparecimento do adenocarcinoma de estômago, principalmente a incompleta. GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros A avaliação histológica pelo sistema OLGA: • Severidade da atrofia (gradação histológica) • Localização endoscópica (topografia) • Etiologia da atrofia (automine, infecção por H. pylori etc.) (a) ALTERAÇÕES METAPLÁSICAS que ocorrem na mucosa oxíntica (corante hematoxilina e eosina - HE). Lesões metaplásicas intestinais e pseudo-pilóricas. Células oxínticas confirmado pela aplicação do anticorpo antipepsinogênio I. → mostra a inflamação, vista pelo afastamento entre as glândulas preenchido de infiltrado inflatório (não é possível caracterizá-lo nesse aumento) + células caliciformes (canto superior direito – “células mais claras”), que são uma metaplasia muito evidente. (b) LESÕES HIPERPLÁSICAS → imuno-histoquímica para avaliação de células neuroendócrinas. As áreas amarronzadas são metaplasia de células neuroendócrinas. (c) e (d) LESÕES LINEARES/MICRONODULARES e TUMOR CARCINOIDE GÁSTRICO TIPO I → a metaplasia (região marrom) assume o aspecto linear, diferente de (b); a natureza neuroendócrina da lesão é confirmada pela positividade anti-NSE (e) TUMOR NEUROENDÓCRINO desenvolvido a partir das lesões lineares presentes em (c) e (d). (f) NÓDULO desenvolvido a partir do tumor neuroendócrino presente em (e). • É preciso identificar os sintomáticos para dispepsia • Reposição de B12, vitamina C, vitamina D, Ca e Fe • Suporte e hidratação devido às diarreias frequentes • Probióticos para proliferação bacteriana • Remoção dos pólipos gástricos • Não é necessário diminuir o pH do suco gástrico ou o IBP ou antiácido, pois esses pacientes já não produzem ácido • A periodicidade da avaliação pode ser anual, ou mais frequente a depender da gravidade do paciente → deve ser feita pela classificação OLGA O sistema OLGA é um “medidor” das alterações, classificando em leve moderado e intenso ou severo a atrofia e a presença de metaplasias. GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros GASTRITE AGUDA EM COMPARAÇÃO À GASTRITE CRÔNICA: histologia, fatores associados • Presença de neutrófilos e erosão do epitélio • Processo inflamatório geralmente transitório na gastrite aguda • Em relação à gastrite crônica, a principal diferença é o tipo de infiltrado inflamatório: na forma crônica há bastantes células inflamatórias crônicas (plasmócitos e linfócitos) e alterações regenerativas no epitélio • Epitélio gástrico normal como referência • Epitélio gástrico com infiltrado de células inflamatórias crônicas abaixo • Relação entre as gastrites: algumas agudas evoluem para crônica, e as crônicas possuem atividade (fases de apresentação clínica semelhante à gastrite aguda) GENÉTICA DO SISTEMA IMUNE NAS DOENÇAS GÁSTRICAS GASTROENTEROLOGIA | Victória Ribeiro de Medeiros Por se tratar de uma condição autoimune, há forte correspondência genética na etiologia dessas doenças. Foi verificado que o sistema imune nos pacientes com doença gástrica possui predominância dominante, o que facilitaria a passagem dessas condições de uma geração para a seguinte, porém o que ocorre na prática são saltos de gerações. A explicação para isso é o fator ambiental necessário par desencadear a manifestação da doença, ou seja, essas doenças não são monogênicas, mas poligênicas. Nesse caso, a presença do H. pylori para o desenvolvimento de gastrite autoimune tem caráter epigenético, estando envolvido nos processos de metilação genética, assim como o tratamento também interfere nesse processo.