Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 1/87 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 2/87 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 3/87 Dados de Catalogação na Publicação (CIP) Internacional (Câmara Brasileira do Livro, SP, Brasil) Bruit, Héctor H. B916i 0 imperialismo / Héctor H. Bruit. - 2. ed. - São Paulo: Atual; 2.ed. Campinas, SP: Editora da Universidade Estadual de Campinas, 1987. (Discutindo a história) Bibliografia, 1. Imperialismo 2. Imperialismo - História I. Título. II. Série. ' e CDD-325.32 87-0269 -352.3209 índices para catálogo sistemático: 1. Imperialismo: Ciência política325.32 2. Imperialismo: História: Ciência política325.3209 Obra em co-edição com a EDITORA DA UNIVERSIDADE ESTADUAL DE CAMPINAS (UNICAMP) Reitor: Paulo Renato Costa Souza Coordenador Geral da Universidade: Carlos Vogt CONSELHO EDITORIAL: Alfredo Miguel Ozório de Almeida, Attílio José Giarola, Aryon DallTgna Rodrigues (Presidente), Eduardo Roberto Junqueira Guimarães, Fernando Galembeck, Humberto de Araújo Rangel, Michael MacDonald Hall, Jayme Antunes Maciel Jr., Ubiratan D'Ambrósio. Diretor Executivo: Eduardo Roberto Junqueira Guimarães Rua Cecílio Feltrin, 253 Cidade Universitária - Barão Geraldo Fone: (0192) 39-1301 (ramal 2585) 13083 CAMPINAS - SP 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 4/87 discutindo a história o imperialismo héctor h. bruit 2 . a edição coord.: jaime pinsky 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 5/87 Capa: Sylvio Ulhoa Cintra Filho Fotos da Capa e miolo: Filó Mapas: Maria Azevedo Pesquisa iconográfica: Letícia V. de Souza Reis Copyright© Héctor H. Bruit Todos os direitos reservados à ATUAL EDITORA LTDA. Rua José Antônio Coelho, 785 Fone: 575-1544 04011 - São-SP Este livro foi impresso pela llK-* t f i í l c fUMU S /cU Rod. Presidente Outra.km 214 Fone: 912-1388 Gua rulhOS L U Y L N V I 2 4 6 8 10 9 7 5 3 NOS PEDIDOS TELEGRÃFICOS BASTA CITAR O CÓDIGO ANCH0125L 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 6/87 sumário Bate-papo com o Autor 1 1. O que é imperialismo? 5 2. O Imperialismo na África 14 3. O Imperialismo na Ásia 30 4. A América latina Entra em Cena 44 5. O legado: Sangue, Desprezo e Miséria 58 Bibliografia 72Cronologia 75 Discutindo o Texto 78 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 7/87 bate-papo com o autor Héctor Hernán Bruit é chileno, mas adotou o Brasil há vários anos. Já lecionou em Marüia, Tupi e em Santa Catarina — entre outras cidades — e atualmente é professor junto ao Departamento de História da UNICAMP. Segundo filho de uma família de sete, fez o curso secundário à noi te e, durante esse período, desempenhou funções bastante distantes do in telectual que acabou se tornando, a partir de 1968, como docente da Uni versidade do Chile — onde se licenciara quatro anos antes. Primeiro traba lhou durante três anos como operário de uma fábrica de papel fotográfico e depois notificou protestos de duplicatas como funcionário de um cartó rio. Pós-graduado em História da América pela Universidade do Chile e Doutor pela USP, Bruit hoje em dia sente-se mais um professor do que um intelectual, "talvez porque", diz ele, "eu sempre tenha acreditado que a prática pedagógica também é uma forma de militância política renovadora, marcante e transformadora, e menos elitista do que a profissão de intelec tual". Para Bruit, ser professor também implica realizar "aquelas aspirações que não puderam concretizar-se, aspirações estéticas como o teatro e a dança, formas de expressão corporal que de alguma forma o professor pra tica a um nível mais modesto". E a dança moderna, que é um de seus hobbies, é justamente uma for ma de enfrentar o excesso de racionalismo que alimenta o mundo moder no: "A dança é para mim uma verdadeira terapia; ela me desintoxica do in- telectualismo asfixiante, me liberta das teorias alienantes." Além de inúmeros artigos e comentários críticos, Bruit é autor dos livros Acumulação Capitalista na América Latina e Estado e Burguesia Nacional na América Latina (este ainda no prelo), do qual é também orga nizador. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 8/87 A seguir, Hernán Bruit responde a cinco questões: P. Brasileiro por adoção, chileno de origem, qual sua relação pessoal com o tema deste livro? R. O fato de ser latino-americano, de viver o continente como experiência individual e pensá-lo teoricamente, implica um envolvimento total, vital e político com o tema. Não há dúvida de que ser latino-americano significa ser antiimperialista, e esta prática permite pensar o continente como uma unidade social e política dentro do capitalismo mundial, compreender a história dramática dos povos submetidos e empunhar a única bandeira de luta possível: o socialismo. P. Seu tema é o imperialismo, mas nada vimos sobre a espoliação atual de que são vítimas as nações latino-americanas, espoliadas pelos banqueiros e FMs da vida. Ou isso não é uma manifestação imperialista? R. O fato de não avançar para a época atual tem uma razão técnica: o li mitado espaço disponível da própria coleção. Escrever sobre o imperia lismo é aproximar-se da história mundial, o que não deixa de ser um pou co pretensioso. Desse modo, o assunto foi encarado muito mais historica mente que politicamente, quer dizer, era necessário delimitar o tema a par tir de suas próprias determinantes ideológicas, ajustadas ao contexto histó rico que as define; descrever aquele processo que os historiadores chama ram de "época do imperialismo", ou a partilha física do mundo. Este pro cesso, que poderíamos chamar de "imperialismo clássico", tem uma cro nologia definida, cinqüenta ou sessenta anos que se estendem entre fins do século passado e início do atual. Isto não significa que o fenômeno impe rialista tenha acabado. Muito pelo contrário, ele persiste, vive e se alimen ta com uma força demolidora. Entretanto, nos últimos quarenta anos, a história do mundo é outra, as forças em ação são diferentes, o sentido da política internacional tem outras características. Agora existe o mundo socialista dominado pelos soviéticos, usando e abusando de seus próprios métodos imperialistas; os países colonizados pelo imperialismo clássico fi zeram sua independência; a China construiu seu socialismo, e a América Latina foi remexida pela revolução cubana e nicaragüense. Então, o imperialismo atual merece uma abordagem diferente, centrada na ação das em presas multinacionais, na estruturação de um sistema econômico mundial, numa guerra fria cada vez mais quente, onde os antigos imperialistas euro peus não são mais que apêndices do imperialismo norte-americano. Alguns autores chamam tudo isto de "ultra-imperialismo", e bem mereceria um tí tulo nesta coleção. + P. Por que nações oprimidas não se juntam para lutar contra o imperialis mo ? Afinal, muitos fracos podem ter mais força que alguns fortes... R. As nações não se juntam para lutar contra o imperialismo porque as na ções não são mais que abstrações, particularmente no mundo atual. A luta contra o imperialismo se dá ao nível da estrutura de classe, forma parte da 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 9/87 luta entre os que defendem o sistema capitalista e os que o combatem. No interior de qualquerpaís latino-americano, existem os grupos burgueses in ternacionalizados que marcham ao lado das multinacionais; os grupos bur gueses que ainda acreditam melancolicamente num capitalismo nacional e independente; os trabalhadores com interesses que os colocam em confron to com os dois primeiros, e ainda outros grupos sociais perdidos no tecido cotidiano da história. Em outras palavras, a união das nações oprimidas passa necessariamente pela revolução político-social. P. A doutrina Monroe (América para os americanos) é o pretexto da inter venção estadunidense na Nicarágua, Granada, El Salvador? R. A doutrina Monroe não é mais lembrada. Desde a Segunda Guerra Mun dial, o intervencionismo ianque está fundado na defesa das instituições e valores norte-americanos ameaçados pelo comunismo internacional. Se fos se necessária uma doutrina para essa paranóia, teríamos que indicar a dou trina Truman de 1947, que declarou guerra ao comunismo supostamente infiltrado em todas as instituições norte-americanas. Esta doutrina foi o caldo de cultivo que permitiu a aparição desse pitoresco político chamado McCarthy, que colocou dúvidas no general Marshall e nas forças armadas. A paranóia anticomunista, o medo doentio de que a União Soviética destruiria o mundo ocidental orientou, desde então, toda a política inter nacional dos Estados Unidos. Eisenhower ordenou a intervenção na Gua temala, em 1954, porque este país estava infestado de comunistas. A cam panha eleitoral de Kennedy esteve fundada num verdadeiro terror psicoló gico de que os Estados Unidos seriam destruídos pelos comunistas. A mes ma coisa com o governo Nixon para justificar a intervenção no Vietnã, no Chile, etc. É uma hipocrisia armar uma guerra contra a Nicarágua em nome da democracia, porque jamais os Estados Unidos se importaram com a demo cracia na América Latina. Pelo contrário, apoiaram todas as ditaduras he diondas que se instalaram nestes países, nada fizeram, nem sequer uma voz de protesto, contra o genocídio praticado pelos generais na Argentina, e nada dizem sobre a massacrante ditadura no Chile. P. Lutar contra multinacionais é uma forma de enfrentar o imperialismo? R. Evidentemente que sim, porque o imperialismo atual, como ficou dito numa resposta anterior, está centrado na ação das multinacionais que cria ram um sistema econômico mundial. Mas a luta não pode ser a mesma de trinta anos atrás, quando o imperialismo impunha, nos países periféricos, a monoprodução de matérias-primas, a importação de produtos industriais e exportava capitais para equilibrar o balanço de pagamentos. O imperialis mo atual não é mais aquele definido por Lênin. Primeiro, porque as multi nacionais internacionalizaram a produção industrial: o sudeste asiático, cer tas áreas da África e América Latina são regiões privilegiadas pelo investi mento industrial das multinacionais, pois os custos são muito baixos como 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 10/87 conseqüência da abundante e barata mão-de-obra. Em segundo lugar, por que os investimentos no Exterior, particularmente no caso dos Estados Unidos, não saem deste país, mas de mercados financeiros como Brasil, países da Europa etc. Isto significa que existem movimentos de fundos das filiais de países pouco desenvolvidos para as filiais de países desenvolvidos, todas integradas na mesma empresa. Se usarmos a definição de Lênin pode mos dizer que somos nós, da América Latina, os imperialistas, pois de algu ma forma exportamos capitais... O fato de que as multinacionais fazem seus investimentos em regiões diversas, com graus de desenvolvimento diferentes, com regimes políti cos e sociais distintos, cria uma base econômica comum e consegue a inte gração mundial que rompe as fronteiras tradicionais entre nacional e in ternacional, entre países desenvolvidos e subdesenvolvidos e, mesmo, en tre economias capitalistas e socialistas, na medida em que elas também atuam em alguns países da Europa Oriental. O significativo de tudo isto é que as multinacionais apresentam um tal grau de autonomia, que são capazes de desenvolver estruturas de gestão em escala mundial e de alguma forma começam a superar ou, pelo menos, a colocar em risco o poder do Estado-nação. Entretanto, o governo dos Estados Unidos tem usado o poder das multinacionais como instrumento de política externa. Basta lembrar a cri se de 1960, que levou à invasão da baía dos Porcos e ao problema dos mís seis. Tudo começou no conflito entre Cuba e as empresas de petróleo que operavam neste país. As empresas negaram-se a refinar o óleo cru importado a baixos preços da URSS. O governo de Fidel respondeu com a na cionalização. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 11/87 1. o que é imperialismo? Entre 1870 e 1914, a Europa Ocidental e os Estados Unidos arquite taram a conquista política, econômica e cultural da África, Ásia, Oceania e América Latina. Repartiram o mundo entre si e organizaram poderosos im périos coloniais que só tinham em comum o desenvolvimento da acumula ção capitalista. A média de expansão territorial, durante este período, foi de 560.000 km 2 por ano. Este período ficou conhecido como imperialista e as causas desta ex pansão foram diversas. No entanto, todas se relacionam com o desenvol vimento do capitalismo industrial nos países imperialistas. Efetivamente, o desenvolvimento capitalista destes países, unidos a um crescimento demográfico que se processava desde o século XVIII, sig nificou uma transformação acelerada na estrutura econômica e nos hábi tos sociais destes países. O desenvolvimento industrial ampliou a demanda de matérias-primas, muitas das quais se produziam em condições mais vantajosas fora da Europa e Estados Unidos, e, ao mesmo tempo, o aumento na produção de artigos industriais ia ampliando a necessidade de merca dos exteriores que consumissem os excedentes. Por outro lado, o cresci mento das populações urbanas fez aumentar a demanda de aumentos, cu ja produção na Europa havia diminuído pelo êxodo rural ou simplesmente porque se tornara mais barato comprá-los em mercados externos. A este conjunto de processos denominou-se imperialismo comercial, na medida em que foi o comércio das matérias-primas, alimentos e bens ma nufaturados que estimulou os países industrializados a penetrar, controlar e dominar vastas regiões do mundo. Contudo, o imperialismo tinha outras máscaras e razões mais sutis e menos transparentes. A conquista militar e política de milhões de seres hu manos de outras raças e culturas era induzida pela exportação de capitais que não rendiam juros suficientes na Europa. Esta forma de penetração é conhecida como imperialismo financeiro, comandado por poderosos mo nopólios de banqueiros, investidores e industriais. Em 1902, o economista inglês John A. Hobson abria o jogo ao escre ver: "O fator econômico mais importante, a grande distância dos demais, do imperialismo é a influência que tem nos investimentos. O crescente cos- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 12/87 6 Cartaz alemão de 1919 com os seguintes dizeres: "Sem nossas colônias, não teríamos matéria-prima." 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 13/87 mopolitismo do capital constituiu-se na mudança econômica mais notável que se registrou nas últimas gerações. Todas as nações industrialmente de senvolvidas trataram de colocar uma grande parte de seu capital fora dos 7 limites de sua própria área política, em países estrangeiros ou em colônias, e de receber uma renda cada vez mais alta por este investimento". E mais adiante arremata: "A riqueza destes grupos financeiros, a magnitude de suas operações e suas ramificaçõesorganizativas espalhadas por todo o mundo convertem-nos em elementos decisivos e fundamentais na marcha da política imperial. Têm mais interesses do que ninguém nas atividades imperialistas e os maiores meios de impor sua vontade às decisões políti cas nas nações". Anos depois, outros autores retomaram as idéias de Hobson e tor naram-nas mais precisas. Lênin, em um famoso livro publicado em 1916, O Imperialismo, Etapa Superior do Capitalismo, definia este processo his tórico da seguinte forma: "O imperialismo é um capitalismo na fase de desenvolvimento, quando tomou corpo a dominação dos monopólios e do capital financeiro, quando ganhou significativa importância a exportação de capitais, quando se iniciou a partilha do mundo pelos trustes interna cionais e terminou a repartição de toda a terra entre os países capitalistas mais importantes". Isto significava prognosticar um período de guerras e revoluções co mo conseqüência da luta entre os países imperialistas, entre os monopólios internacionais, pelos mercados externos e melhores condições para arran car lucros maiores. De fato, os grandes trustes internacionais, muitos dos quais dariam origem às grandes empresas multinacionais de hoje em dia, nasceram em fins do século XDC. Antes de 1914, existiam 122 trustes de origem ameri cana, 60 ingleses e 167 franceses, alemães e suíços. Particularmente, os monopólios que associavam grandes industriais e poderosos bancos foram um fenômeno característico da economia ameri cana e alemã dessa época, e, de forma menos intensa, na Grã-Bretanha e 'rança.Além do mais, em todos esses países existia um grande excedente de apitais para ser exportado. Em 1885, os quatro maiores investidores mun diais — em ordem de importância, Grã-Bretanha, França, Alemanha e Es tados Unidos — haviam colocado no exterior 2.681 milhões de libras es terlinas. Em 1914, esta cifra foi para 7,659 milhões. Um empresário americano, em 1898, dizia: "Quem escreve isto não é um advogado do imperialismo por sentimentalismo, mas não teme sê-lo se isso significa que os Estados Unidos defenderão seu direito a mercados li vres em todos os velhos países que estão se abrindo para os recursos exce dentes dos países capitalistas e obtendo por isto os benefícios da civiliza ção moderna. Que esta política leve consigo o governo direto dos arquipé- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 14/87 lagos semi-selvagens pode ser objeto de discussão, mas do ponto de vista econômico só há uma opção: entrar, de alguma forma, na competição, em pregando capitais e empresas norte-americanas nestes países..." Além destes fatores de ordem econômica, outros de natureza políti- co-estratégica, diplomática e nacionalista intervém na expansão imperia- lista. A idéia de que um país deve transformar-se em uma potência mundial não só está ligada à própria natureza do capitalismo como sistema mundial, mas também se vinculou ao pensamento político de certos governantes, grupos de intelectuais e políticos nacionalistas em geral. Esta idéia de po tência mundial tinha muito a ver com o prestígio da nação, o equilíbrio político europeu e a influência que a nação podia e devia exercer no mundo. Desde 1870, quando a Itália e a Alemanha acabavam de unificar-se politicamente, a concorrência internacional e as relações entre os países ha viam se tornado mais complexas. Surgem, neste período, grandes blocos depoder. Os Estados, levados a uma concorrência política crescente com os vizinhos, estabelecem alianças para evitar o isolamento. A primeira aliança internacional foi a austro-alemã de 1879, que se transformou em Trípli ce Aliança em 1882, com o ingresso da Itália. A França, totalmente isola da, buscou seus próprios aliados: primeiro a Rússia, com a qual firmou uma aliança em 1894, e em seguida, em 1904, a Grã-Bretanha. Finalmente o acordo anglo-russo de 1907 fez surgir a Entente Cordiale. Os blocos be ligerantes da I Guerra Mundial estavam formados. Este jogo político significou que qualquer mudança de posição, de poder, dentro e fora da Europa, prejudicaria o vizinho. Neste sentido, a formação de um império colonial por parte de um país foi vista como instrumento de força e prestígio que podia romper o equilíbrio entre as potências. Um exemplo claro disto, como veremos mais adiante, foi a dis puta do Egito entre Grã-Bretanha e França. Enfim, para muitos governantes, políticos e militares a condição de potência implicava a necessidade de ter colônias, protetorados, bases navais em todos os continentes, única forma de proteger os co-nacionais, não apenas dos governos desses lugares, como também da ação das outras po tências ocidentais. O temor de que uma potência estrangeira ameaçasse uma possessão colonial, estimulava a conquista de uma fronteira mais extensa. Este ele mento, que alguns historiadores chamaram de um "acumulativo processo preventivo", esteve muito presente na expansão britânica sobre a índia, co mo será visto, detalhadamente, mais adiante. Por outro lado, a condição de potência mundial estava ligada à pos sibilidade de controlar matérias estratégicas tais como cobre, ferro, borracha, petróleo etc. Também é necessário lembrar outras motivações que, parcialmente, 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 15/87 constituem outras tantas explicações do processo de colonização mundial. Assim, foi notória a visão de que a colonização era uma missão civilizado- ra de uma raça superior, a branca. Esta convicção baseava-se na superiori- 9 dade que o europeu e o americano viam em suas instituições políticas, na organização da sociedade, no desenvolvimento industrial. Ao mesmo tem po, esta imagem era estimulada por doutrinas marcadamente racistas, co mo a elaborada pelo filósofo inglês H. Spencer, conhecida por "darwinis- mo social". Segundo essa filosofia, a Teoria da Evolução de Darwin podia ser aplicada perfeitamente à evolução da sociedade. Assim como existia uma seleção natural entre as espécies, ela também existia na sociedade. A luta pela sobrevivência entre os animais correspondia à concorrência ca pitalista; a seleção natural não era nada além da livre troca dos produtos entre os homens; a sobrevivência do mais capaz, do mais forte era demons trada pela forma criativa dos gigantes da indústria que engoliam os compe tidores mais fracos, em seu caminho para o enriquecimento. O sucesso dosnegócios demonstrava habilidade superior de adaptação às mudanças; o fracasso indicava capacidade inferior. Por estas razões, a intervenção do Es tado era prejudicial, já que interrompia o processo pelo qual a natureza im pessoal premiava o forte e eliminava o fraco. Em outras palavras, se a luta pela existência resultava na sobrevivên cia e predomínio dos animais e plantas mais capazes, como afirmara Dar win, uma luta semelhante se produzia entre as raças humanas e as nações com idênticos resultados. Esta dura concorrência em âmbito internacional, que justificava a conquista e destruição de sociedades inferiores, era fei ta em nome do progresso. Um autor da época, Edmond Desmolins, escrevendo sobre o conflito com os boêres da região do Cabo, na África, formula a questão da seguin te forma: "Quando uma raça se mostra superior a outra nas manifestações da vida nacional, de modo inevitável, termina por dominar a vida política e impor, de modo permanente, sua superioridade. Seja que esta superiori dade se reafirme por meios pacíficos, seja pela força das armas, chega um momento em que fica estabelecida oficialmente. Afirmei que esta lei é aúnica que explica a história da raça humana e as revoluções dos impérios e que, além disso, esclarece e justifica a apropriação, pelos europeus, do territórios da Ásia, África e Oceania, e todo o processo de nosso desenvol vimento colonial". Escrevendo sobre a vida e façanhas de Hubert Hervey, alto funcioná rioda British South African Chartered Co., o conde Grey acaba concluindo que o branco, e particularmente o inglês, é o único que sabe governar, o que lhe outorga direitos indiscutíveis para dominar as raças de cor eviden temente inferiores: "Provavelmente todo mundo estará de acordo que um inglês tem direito a considerar que sua forma de entender o mundo e a vi da é melhor que a de um hotentote ou um maori e ninguém se oporá, em 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 16/87 princípio, a que a Inglaterra faça o possível para impor a estes selvagens os critérios e modos de pensar ingleses, posto que são melhores e mais eleva- 10 dos. Há alguma probabilidade, por remota que seja, de que num futuro previsível possa desaparecer o abismo que agora separa os brancos dos ne gros? Pode haver alguma dúvida de que o homem branco deve impor e im- porá sua civilização superior sobre as raças de cor?..."No entanto, como os darwinistas sociais estabeleceram, não só o Mulheres africanas acorrentadas, no Congo de Leopoldo II. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 17/87 branco é superior ao homem de cor, como tem o direito indiscutível de apoderar-se de tudo o que o negro, o índio e o amarelo não sabem usar convenientemente. Este princípio é usado em nome da humanidade e não 11 se discutem os meios. A natureza foi injusta porque repartiu de forma desi gual os recursos, deixando em mãos de povos inferiores riquezas que os po vos mais capacitados não podem aproveitar. É justo que tal estado de coisas se prolongue indefinidamente? Esta é a pergunta que se formula um dos mais intransigentes defensores do imperialismo francês, Albert Sarrault, respondendo que, em nome da humanidade, esta injustiça não pode ser ad mitida. A desigualdade criada pela natureza deve ser eliminada em nome da humanidade, ainda que isto crie a desigualdade entre os homens. Em um livro publicado em 1931, Grandeza y servidumbres colonia- les, Sarrault expôs seus argumentos com fria e cega convicção. Vejamos al guns trechos: "Em nome do direito de viver da humanidade, a colonização, agente da civilização, deverá tomar a seu encargo a valorização e a circula ção das riquezas que possuidores fracos detenham sem benefício para eles próprios e para os demais. Age-se, assim, para o bem de todos. A Europa não abandonará, absolutamente, sua autoridade colonial. Apesar de alguns perigos e de algumas servidões que a Europa deve suportar e de algumas compulsões para abdicar que recebe, não deve desertar de sua linha colo nial. Ela está no comando e no comando deve permanecer. Eu nego com todas minhas forças e repudio com toda a energia de meu coração todas as tendências que procuram, tanto para a Europa como para meu país, o des pejo da tutela ocidental nas colônias". Representantes da Igreja defenderam este princípio de "direito de colonização" que na realidade é um "direito à violência" contra o mais fra co. E isto não é surpreendente, pois a teologia espanhola do século XVI formulou toda uma teoria para justificar a conquista da América. Alguns dos princípios formulados por Francisco de Vitoria em Relecciones teo lógicas, particularmente o da "guerra justa", serão retomados por leigos e eclesiásticos da época do imperialismo moderno. Por exemplo, as seguin tes palavras do reverendo padre Müller, transcritas por um católico defensor do imperialismo francês, J. Folliet, doutor em filosofia tomista: "A hu manidade não deve, nem pode aceitar mais que a incapacidade, a negligên cia, a preguiça dos povos selvagens deixem indefinidamente sem emprego as riquezas que Deus lhes confiou, com a missão de utilizá-las para o bem de todos. Se forem encontrados territórios mal-administrados por seus pro prietários, é direito das sociedades — prejudicadas por esta administração defeituosa — tomar o lugar destes administradores incapazes e explorar, em benefício de todos, os bens dos quais eles não sabem tirar partido". Poder-se-ia pensar que estas idéias não passavam de simples curiosi dades arqueológicas européias, mas, em um país tão novo como os Esta dos Unidos, a visão racista da colonização foi alimento nacional. Ali, a 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 18/87 Exótica decoração de um teatro ao ar livre francês no início do século XX. doutrina do Destino Manifesto, inspirada do darwinismo social, serviu para justificar todo o expansionismo do século XIX, primeiro contra os índios para conquistar as terras do Oeste, depois para construir um império eco nômico e político no ultramar. A doutrina era uma espécie de sentimento com vistas a um objetivo final, com a proteção da Divina Providência. Em 1885, o pastor Josiah Strong escreveu que os anglo-saxões estavam encarregados pela divindade de ser os guardiães da espécie humana e que Deus os havia preparado para a guerra final entre as raças. Os anglo-saxões deviam estender-se sobre toda a superfície terrestre, começando pelo México, América Central e do Sul, sobre a África e sobre todo o mundo. O historiador John Fiske endossava essas idéias em um ensaio inti tulado Manifest Destiny, de 1885. Como veremos mais adiante, este princípio racial da expansão colo nial foi levado à prática pelo aventureiro norte-americano William Walker 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 19/87 que, em 1855, conquistou a Nicarágua, Honduras e El Salvador para cum prir os desígnios ou o destino de uma raça superior. Walker fundamentou sua saga com as seguintes palavras tomadas de seus escritos doentios: "Só 13 os néscios falam de estabelecer relações duráveis sem o emprego da força entre a raça americana pura, tal como existe nos Estados Unidos, e a raça mestiça hispano-índia, tal como se encontra no México e na América Cen tral. A história do mundo não oferece uma visão tão utópica como a de uma raça inferior submetendo-se mansa e pacificamente à influência domi- nadora de um povo superior". Poder-se-á dizer que uma minoria trabalhou com essas idéias e que a maioria dos europeus e americanos lhes foi indiferente, mas o que o impe rialismo fez na África, Ásia e América Latina constitui a prova mais irre futável de que aqueles teóricos interpretaram acertadamente o sentir coti diano de qualquer branco que vivia em Londres, Paris ou Nova Iorque. Bastou que alguma dessas personagens chegasse a estes continentes, como sol dado, funcionário, comerciante ou simples turista, para sentir-se interpre tado por aquelas extravagantesteorias. Como veremos mais adiante, o imperialismo aglutinou todos estes elementos econômicos, políticos, racistas etc; porém em todos os casos o • que estava por trás era a expansão a nível mundial das relações capitalistas de produção. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 20/87 2. o imperialismo na áfrica A África foi, provavelmente, o continente que mais sofreu com a de vastadora ação do imperialismo, talvez porque fosse o mais débil ou, ao contrário, como aconteceu em algumas áreas, a resistência que opôs signi ficou um esmagamento maior. Em todo o caso, foi o único continente a ser dividido sem que se respeitasse a unidade lingüística e cultural de seus povos. Por estas razões, a penetração imperialista tem de ser examinada por partes ou áreas de conquista. O imperialismo na África 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 21/87 A Caverna de Aladim A penetração européia np mundo muçulmano, norte da África e Ori ente Próximo, foi iniciada gradualmente desde o começo do século XIX. Em primeiro lugar, através detratados comerciais com as sociedades ára bes. Em 1830, os franceses obtiveram um tratado de comércio com a Tunísia. Em 1838, realizou-se a convenção comercial com o Império Otomano, que cancelou os monopólios do sultão e outorgou grandes benefícios e li berdades aos comerciantes ingleses. Em 1856, os ingleses conseguem um tratado semelhante com o Marrocos. O sistema dos tratados de comércio, garantias diplomáticas etc. per mitiu ao capitalismo europeu extrair desses países os produtos necessários à indústria, desequilibrar a economia doméstica, influenciar o sistema polí tico, para logo transformá-los em colônias. Outro instrumento de penetração e domínio foi a política de melho rar as comunicações desses países, seja por via marítima, fluvial ou terres tre, o que permitia aplicar os capitais excedentes da Europa. Desde 1834, uma linha de navegação inglesa unia Suez, no Egito, a Bombaim, na índia. Em 1845, outra companhia de navegação une Alexandria e Constantino- pla. Em 1872, o Egito estava unido a Constantinopla pelo Mediterrâneo e o estreito dos Dardanelos; a Odessa, pelo Bósforo e mar Negro; ao Iraque pelo golfo Pérsico; à índia e à China pelo mar Vermelho e oceano Indico; à França, Itália e Inglaterra, por 21 linhas marítimas, das quais 17 eram eu ropéias. A navegação a vapor ganha os rios. Desde 1839, o Tigre e o Eufrates, no Iraque, são navegados por quatro vapores ingleses. Em 1869, é inaugurado o canal de Suez. Em 1870,486 navios nave gam pelo canal. Em 1910, são 4.500 navios que transportam mais de 16 milhões de toneladas de mercadorias. A primeira grande estrada do Oriente Médio construída por uma companhia francesa é inaugurada em 1863 e faz a ligação entre Damasco e Beirute. Em 1869, inaugura-se outra, de Jerusalém a Jafa. Estas duas cidades serão unidas por estrada de ferro em 1889. O mesmo farão os france ses, entre Damasco e Beirute. De 1900 a 1908, constrói-se a ferrovia Da- masco-Medina. Dentro do mundo muçulmano, o norte da África exerceu grande atração sobre os europeus, por várias razões, entre as quais a mais decisiva, era o caráter estratégico dessa região na política mundial. A proximidade com a Europa, através do Mediterrâneo e, desde 1869, com o canal de Suez, que unia esse mar ao mar Vermelho e ao oceano Índico, era de grande importância para a Inglaterra e para a França, países que acabaram domi nando a região. Outro elemento importante era o estado de organização social e po- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 22/87 lítica bastante superior ao resto da África. Isto permitiu a instalação dos europeus, sem grandes dificuldades, para fazer o comércio, emprestar di nheiro e construir ferrovias. O Império Turco, também conhecido por Otomano, devido ao nome da dinastia reinante, fundado pelo sultão Osmã no início do século XIV, depois do esplendor e poder que o levaram a conquistar a península Bal cânica, na Europa (1354-1453), e no século XVI o norte da África, caiu na mais profunda decadência durante o século XIX. Apesar de sua impor tância, passou a merecer o título de "homem doente", dado pelos russos, por dominar a região dos estreitos entre os Bálcãs e a Ásia Menor. Se para os russos era importante destruir o império para obter uma saída para o Mediterrâneo, para os ingleses e austríacos era importante mantê-lo para frustrar a política russa. As potências foram destruindo o Império Otomano aos poucos, des membrando primeiro as partes européias, Grécia, Sérvia, Bulgária etc, de pois as províncias africanas. Com exceção do Marrocos, os outros países, Trípoli, Tunísia, Ar gélia e Egito, eram províncias do império, fraco demais para exercer qual quer autoridade efetiva sobre essas regiões. Desde 1847 o Egito conseguira sua independência formal, e para os europeus estava claro que os demais seguiriam o mesmo caminho. Esta perspectiva permitiu aos banqueiros facilitar o dinheiro necessário para a independência.A Argélia constitui um caso especial, pois foi conquistada pelos fran ceses em 1830, mais por razões de política interna francesa que por inte resses econômicos. Na verdade, a conquista foi decidida por esses acidentes que não se adaptam a nenhuma teoria: uma bofetada no rosto do cônsul francês, da da pelo governante árabe, por causa de uma dívida de 13 milhões de fran cos da França para com o país árabe. O prestígio político do reino de Car los X, muito deteriorado e estando próximo de uma revolução, não pode ria suportar tal injúria. Evidentemente que existiam outros velhos motivos como a pirataria, sediada em Argel, que perturbavam o comércio francês no Mediterrâneo. De qualquer forma, a conquista da Argélia permitiu aos franceses ori entar toda a política imperialista sobre o norte da África e o interior do Sa ara. Desde 1830 os franceses tiveram que enfrentar uma resistência cons tante das populações árabes, entre as quais se destaca a guerra liderada por Abd-el-Kader, entre 1834 e 1847, denotado com o esforço de um exército de mais de 100 mil soldados. As sucessivas insurreições que colo cavam em perigo as fronteiras da colônia obrigaram a França a conquistar a Tunísia em 1881 e o Marrocos em 1911. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 23/87 É importante assinalar que além dos interesses econômicos o impe rialismo da França foi dinamizado por uma política preventiva que resistia a qualquer ameaça mais séria a suas possessões coloniais. Nesse sentido, a 17 Argélia representou também o que se denominou de imperialismo mili tar, isto é, o prestígio internacional fundado sobre as glórias do exército. A conquista da Tunísia pelos franceses representa um bom exemplode imperialismo financeiro, sem menosprezar o interesse estratégico, não apenas por se situar na fronteira oriental da Argélia, como porque a Itá lia, Grã-Bretanha e Alemanha também tinham interesses no país. Vejamos, porém, a questão financeira em primeiro lugar. Em 1859, a dívida pública tunisiana era de 12 milhões de francos; em 1862, era de 28 milhões; em 1863, de 35 milhões; e em 1867 a dívida chegava a 160 mi lhões. O governo tunisiano havia contratado empréstimos sobre emprésti mos para pagar os juros e amortizações dos antigos. Este foi o mecanismo mais transparente do imperialismo. Quando o governo tunisiano percebeu que não tinha nenhuma condição para pagar sequer os juros atrasados, os países credores, França, Itália e Inglaterra organizaram uma comissão in ternacional para administrar a dívida e as rendas do país. De fato, o gover no real passou às mãos dos europeus, ainda que formalmente o país con tinuasse independente. Evidentemente havia uma infinidade de outras razões que faziam do país árabe um objeto de política internacional. Os intrincados meandros do jogo diplomático não podem ser expostos em todos os detalhes. Apon temos apenas alguns deles. A Itália não só tinha interesses econômicos, como um interesse sen timental que não pode ser desprezado: a antiga Cartago havia sido parte do Império Romano. Quanto à França, a posição geográfica da Tunísia era fundamental para a estratégia política no Mediterrâneo e a segurança da Argélia. O país interessava à Alemanha e à Grã-Bretanha porque viam nele um ponto de equilíbrio do sistema internacional. Os dois países estavam de acordo em que a França deveria ocupar a Tunísia para compensá-la — man tendo o equilíbrio de forças — pela aquisição do Chipre pelos ingleses — ar rancado da Turquia — e pela Alsácia-Lorena que os alemães haviam tirado dos franceses ao final da guerra franco-prussiana de 1870. Da mesma for ma que se repartiam brindes, no Congresso de Berlim de 1878, reunido pa ra discutir a questão dos Bálcãs criada pela guerra russo-turca, Alemanha e Grã-Bretanha decidiram que a França deveria ocupar a Tunísia. Não é menos importante o fato de que o próprio governo tunisiano, comofizeram outros países em vias de ser transformados em colônias, ex plorou as diferenças entre as potências, às vezes com uma finalidade estri tamente mercantil de algum de seus ministros. Assim, quando em 1880, um grupo financeiro francês decidiu comprar uma fazenda de 90.000 hec- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 24/87 tares para especular com a terra e o crédito agrícola, o primeiro-ministro tunisiano tentou benefícios ilícitos atraindo os italianos e colocando obs táculos à compra francesa. Este fato exasperou a diplomacia francesa que considerou abalado seu prestígio no país. Algo semelhante ocorreu com o monopólio ferroviário. O governo árabe, através de uma política duvidosa, não fez mais do que enfrentar uma dura luta diplomática contra franceses e italianos. Finalmente, a revolta tunisiana de 1881 deu motivo à ocupação mili tar. O Tratado de La Marsa, assinado em 1883, tornou o país um proteto- rado francês. O Marrocos era outro país árabe que interessava às potências por ra zões estratégicas — uma provável influência sobre o estreito de Gibraltar - por razões comerciais e financeiras. Ali a penetração européia foi muito difícil, pois este Estado islâmico, independente e bem organizado, opôs forte resistência a qualquer tipo de contato com os infiéis. A não ser alguns tratados comerciais muito limitados, os europeus nada conseguiram do país. Só no começo do século XX é que se apoderam do Marrocos. A conquista do Marrocos colocou em conflito França e Alemanha, enquanto a Espanha, com interesses no país desde o século XVI, ficou em segundo plano. A França tinha um interesse especial porque este país era vizinho ocidental da Argélia e abrigava os movimentos de insurreição contra o colonialismo francês.A Alemanha se opunha a um protetorado francês ou de qualquer ou tra potência, justamente porque podia ou pretendia com esta política ob ter vantagens. Em 1905, o imperador Guilherme II, em um discurso pro nunciado em Tânger, declarou que a Alemanha daria proteção à indepen dência do Marrocos. Esta política remontava à época de Bismarck, mais precisamente 1887, quando o chanceler alemão apoiou os "acordos medi terrâneos" entre Inglaterra, Itália, Áustria e Espanha para manter o status quo neste mar e com isto impedir a expansão francesa na área, especial mente sobre o Marrocos. Contudo, a política alemã de manter isolada a França não daria os resultados esperados, pois em 1894 assinava-se o tratado franco-russo. Além do mais, a política agressiva da Alemanha na China e o desenvolvi mento industrial separaram-na definitivamente da Grã-Bretanha. Um ano antes do discurso de Guilherme II em Tânger, em 1904, a Grã-Bretanha e a França assinaram a Entente Cordiale que, entre outras coisas, regulamentava os conflitos coloniais. A França renunciou defini tivamente a qualquer pretensão sobre o Egito, e a Inglaterra aceitava apoiarum protetorado francês no Marrocos. Os interesses espanhóis no Marrocos remontam ao século XVI. No entanto, na época do imperialismo moderno a Espanha não era uma potên- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 25/87 A corrida para o Marrocos, em 1906, segundo o chargista Assus. Biblioteca Nacional, Paris. cia mundial, e por isso teve que se conformar com alguns acordos que lhe permitiam manter suas antigas possessões. Em 1904 assinou com a França, um tratado que lhe deu o controle da parte norte marroquina. Em 1906, foi assinado o Tratado de Algeciras entre o governo do Marro cos, França e Espanha, que permitia aos países europeus manter uma po lícia militar nos portos para combater a pirataria, com a condição de que o interior do país continuasse sob as ordens dos soldados árabes. Em 1911, a França rompeu este acordo ao ter que intervir no inte rior do país, acolhendo pedido do governo marroquino. A Alemanha se va leu deste fato para enviar um navio de guerra a Tânger e forçou a França a um acordo segundo o qual a Alemanha aceitava o protetorado francês so bre o Marrocos, em troca de uma parte do Congo francês. Em 1912 o sultão do Marrocos aceitou o protetorado francês. "Do alto destas pirâmides cinco mil anos os contemplam" Palavras de Napoleão a seus soldados acampados junto às pirâmides de Gizé, logo após a ocupação do Egito (1798-1801). Estas palavras encer ravam uma admiração e uma curiosidade científicas que bem poderiam re sumir o que mais tarde se transformaria nos "interesses culturais" france ses por este país. De fato, a mal-sucedida conquista napoleônica — pois a destruição da esquadra francesa pelos ingleses deixou Napoleão preso em 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 26/87 sua própria conquista — serviu para desencadear, durante o século XIX, uma série de estudos e escavações sobre o passado milenar da civilização egípcia. Sábios franceses como Berthollet, Champollion, Mariotte etc. ini- ciadores da egiptologia, criaram nos franceses e no mundo do século XIX este interesse pelas coisas do Egito. Antes da ocupação britânica de 1882, o Egito era uma província doImpério Turco que havia conseguido a independência virtual sob o reinado de Muhammed Ali, que governou entre 1811 e 1847. Sob este governo ini ciou-se a modernização do país: ampliaram-se as comunicações, estimula ram-se as exportações, melhorou-se o sistema de recolhimento de impos tos. Além do mais, estabeleceu-se o poder egípcio sobre o Sudão Oriental e o mar Vermelho. Até 1860 o Egito era considerado na Europa como um integrante do sistema econômico europeu. Naquela época, havia no país cerca de 100.000 europeus dedicados ao comércio, sistema bancário e melhoria dos serviços públicos. O país contava com 1.500 km de vias férreas, 8.000 km de telégrafos e 13.000 km de canais de irrigação. A Alexandria e o Cairo eram centros de civilização européia. As inversões de capital europeu adotaram em sua maior parte a for ma de empréstimos ao governo a juros de 12%, que era o dobro do normal, resgates através de bônus e obrigações que constituíram a dívida pública egípcia. Em 1880 essa dívida era de 90 milhões de übras egípcias e seus ju ros consumiam totalmente as rendas públicas. Novamente os interesses culturais, políticos, estratégicos e econômi cos estiveram estreitamente misturados, determinando, em conjunto e, às vezes, em separado, cada momento da intensa luta diplomática pelo país. Sem dúvida, o desastre financeiro egípcio comandou os momentos decisivos. Em 1875, o governo teve que vender suas ações no canal de Suez para poder pagar parte da dívida atrasada. No ano seguinte, a falência era iminente. Para evitá-la, a Grã-Bretanha e a França criaram o "Controle Dual" formado por um interventor inglês e outro francês, que fiscalizariam as finanças e que, de fato, passariam a governar o país, enquanto o que- diva\ fingiria governar através de um gabinete formado exclusivamente por egípcios. Além disso criou-se a Comissão Internacional de Liquidação da Dí vida, formada por dois britânicos, dois franceses, um alemão, um austría co e um italiano. Sua função era utilizar os fundos proporcionados pelos interventores para pagar os juros e liquidar a dívida. Como definiu um his toriador importante, "a verdadeira intenção do plano em conjunto era cla ramente política. A Grã-Bretanha e a França podiam controlar o governo Quediva: título próprio do vice-rei do Egito.(N. do T.) 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 27/87 Disraeli comprando do quediva as ações da Sociedade do Canal de Suez, o que asseguraria o controle inglês sobre a rota da índia. Punch, 26 de fevereiro de 1876. egípcio por meio dos interventores e dominar a Comissão da Dívida graças à sua maioria de quatro membroscontra três". Os interesses franceses no Egito eram financeiros e culturais. A influ ência da cultura e tecnologia francesas remontavam à época em que Napo leão invadiu o país. Engenheiros franceses haviam construído o canal; a maioria das obrigações financeiras egípcias estava em mãos dos investido res franceses e o comércio com Marselha havia se desenvolvido desde o sé culo XVIII. Para os britânicos, o Egito era um objetivo político-estratégico. A política britânica no Mediterrâneo Oriental e os fortes interesses no oceano Índico projetaram essa política sobre o mar Vermelho, Suez e, conseqüentemente, sobre o Egito. Foi justamente este domínio que induziu os ingle ses a comprar as ações egípcias no canal e foi a justificativa do primeiro-mi nistro Disraeli perante o Parlamento: o canal tinha muito mais importân cia política que financeira para o Império Britânico. A ocupação militar do Egito pelos britânicos deveu-se, basicamente, ao temor do governo inglês de que a França ocupasse o país, pressionada pelos investidores franceses. Com efeito, as dificuldades financeiras levaram o governo egípcio a reorganizar a administração, destituindo os funcionários europeus que ad ministravam a dívida pública. Isto desagradou a França e assustou os acionistas. Foi neste momento que a Grã-Bretanha pressentiu a interven- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 28/87 ção. Para o primeiro-ministro alemão Bismarck, que não tinha interesse es pecial no país, a situação era grave e era necessária uma intervenção coleti va que pudesse conter os franceses. Além do mais, o país começava a ser agitado pelos nacionalistas que resistiam ao poder estrangeiro. Dentro da administração a luta era con tra os funcionários europeus; no exército, contra os oficiais turcos que ti nham o comando; no campo, contra os pesados impostos. O movimento nacionalista foi liderado por um grupo de oficiais egípcios dirigidos pelo coronel Arabi. Era um movimento que não tinha uma ideologia política definida: era xenófobo, mas nunca exigiu a saída dos estrangeiros do país; pedia reformas políticas, mas não chegou a pro por uma nova constituição; reclamava contra a situação econômica, mas nunca propôs a suspensão do pagamento da dívida externa. O movimento dirigido por Arabi recebeu apoio de todos os setores do país e organizou levantamentos populares no Cairo e Alexandria. Esta última cidade foi bombardeada pela frota anglo-francesa em 1881 pa ra conter a revolta. De fato, até 1881, era Arabi quem governava o país, através da Câ mara de Notáveis composta por 65 latifundiários árabes. Em 11 de junho de 1882, estalou em Alexandria um violento motim popular que deixou como saldo o assassinato de 46 europeus. Em 15 de ju lho, os britânicos ocuparam Alexandria e em 13 de setembro, o exército de Arabi era derrotado em Tell-el-Kabir. A organização de um novo governo, o saneamento das finanças, a pacificação da população não foram tarefas fáceis. Em 1883, os ingleses te riam que enfrentar a ameaça militar do movimento nacionalista do Sudão, que começava a expulsar e destruir a ocupação egípcia. A conquista do Egito foi um fato fundamental para a orientação do imperialismo britânico na África Oriental, região sobre a qual os ingleses não tinham interesses definidos. A África Oriental era a chave do Alto Nilo. Do Cabo ao Cairo Unir a colônia do Cabo, na África do Sul, ao Cairo, no norte da Áfri ca, foi provavelmente um grande sonho estratégico dos ingleses, especial mente do conquistador da África do Sul, Cecil Rhodes. Este projeto foi-se concretizando paulatinamente, à medida que era induzido por outros fatos construídos pelo próprio imperialismo. Na Áfri ca Oriental, adquiriu importância inusitada, como já foi dito aqui, logo após a ocupação militar do Egito. Contudo, o avanço de norte a sul e de sul a norte simultaneamente não foi coisa fácil, pois os obstáculos políticos e militares foram muito maiores que os imaginados pelos visionários. No Sul, guerras cruentas com as populações autóctones, bosquímanos, ho- 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 29/87 tentotes, bantus; uma sangrenta guerra de dois anos com os boêres, abrin do uma passagem através dos territórios reivindicados pelos portugueses. No Norte, o eterno temor da influência francesa sobre o Alto Nilo, as rebe liões sudanesas; e, no coração da África Oriental, a disputa com os alemães que afinal impediram a tão sonhada comunicação. Os ingleses estavam na região do Cabo desde 1806, ocupada pelosholandeses desde o século XVII. Em 1815 o Congresso de Viena ratificou o domínio britânico sobre a região e os.holandeses, emigraram para o nor te, onde instalaram dois Estados independentes: a República Livre de Oran- ge e a República de Transvaal, mais conhecidas com o nome de repúblicas bôeres. O interesse dos ingleses pelo Cabo era fundamentalmente estratégico, pois assegurava as comunicações oceânicas com a Índia. Além do mais, o domínio sobre esta região, com autonomia política desde 1872, permitia o acesso à África Central na região da Becuanalândia, que estava na mira dosalemães, dos portugueses de Angola e das repúblicas bôeres. O governo britânico, como costumava fazer, entregou a um particu lar, Cecil Rhodes, uma carta de privilégio real para ocupar e governar as re giões da órbita do rio Zambeze, que com o tempo tornaram-se Rodésia do Sul e do Norte. Até rheados da década de 80, Rhodes já era um personagem famoso na Europa pela imensa fortuna conseguida na exploração de diaman tes em Kimberley, na fronteira de Orange, e de ouro em Rand, região do Transvaal. Para colonizar a região do Zambeze, Rhodes fundou a British Suda- frican Company. A empresa e os projetos deste aventureiro satisfaziam as aspirações dos ingleses do Cabo, isto é, de. exercer um domínio até o nor te. Satisfaziam também as aspirações do governo britânico de neutralizar a influência alemã e portuguesa na África Central e administrar Becuanalân dia sem gastos para o contribuinte inglês. A pretensão de ampliar a influência da colônia do Cabo até o norte se chocou frontalmente com as repúblicas bôeres, dando início a uma guerra que começou em 1899 e terminou em 1902. As causas da guerra dos bôeres eram complexas pois não só estavam em jogo milhões de libras investidas na exploração do ouro, como uma de licada situação política que afetava tanto a estabilidade da colônia inglesa, como o próprio poder britânico em toda essa região. Por outro lado, o governo de Transvaal exercia um estreito controle sobre a exploração, através do sistema de monopólio sobre certos instru mentos necessários à produção, como, por exemplo, a dinamite, cujo mo nopólio de venda era concedido a particulares — como os Nóbel — com a obrigação de entregar ao Estado uma parte dos benefícios. O Estado tam bém cobrava elevados impostos sobre os lucros, transporte ferroviário etc. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 30/87 Esta situação foi criando fortes tensões entre as companhias e o go verno bôer. As companhias julgavam ter direito a uma participação, atra- 24 vés dos direitos políticos, no governo de Transvaal. Outro elemento que ajudou a crise foi o transporte do metal precio so. Até 1890, o único meio de transporte era a ferrovia que unia Pretória ao Cabo. Isto significava uma dependência dos bôeres aos ingleses do Cabo. Para romper essa dependência das exportações, o governo bôer apoiou a construção de uma linha férrea que comunicasse Pretória com a baía de Delagoa em Moçambique, terminada em 1894. Desta forma, o eixo comer cial de Transvaal se deslocou para uma região que não estava controlada pelos britânicos do Cabo. Posteriormente construiu-se outra linha até Na tal, colônia inglesa ao sul de Delagoa.As razões políticas da guerra ficaram evidentes como conseqüência dos contatos econômicos dos bôeres com os portugueses de Moçambique.Essa aproximação foi abertamente estimulada pelos alemães, pois era uma forma de quebrar o predomínio britânico na região. Além disso, a pequena república bôer, situada em território virtualmente controlado pelos britâ nicos, Becuanalândia, passava a dominar economicamente toda a região e punha em perigo a independência do Cabo, que assegurava as comunica ções oceânicas com a Índia. O imperialismo britânico devia neutralizar politicamente os bôeres. Primeiro, impedindo qualquer apoio internacional. Como veremos mais adiante, a Grã-Bretanha já havia conseguido pôr-se de acordo com os ale- Cavalaria bôer durante a Guerra do Transvaal, L'Illustration, 6 de janeiro de 1900. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 31/87 mies na África Oriental. Em 1898 assinaram um acordo segundo o qual ambos os países facilitariam empréstimos a Portugal, que estava em situa ção econômica delicada. Como supunham que estes empréstimos não se riam pagos, cobrariam das colônias portuguesas. A Alemanha se compro metia a não intervir na questão bôer e a não permitir a intervenção de ou tra potência.Contudo, o imperialismo britânico se frustraria, pois os portugueses não quiseram vender a baía de Delagoa e abriram créditos na França. Assim, o outro caminho do imperialismo foi estimular os ingleses que viviam em Transvaal a exigir os direitos políticos. O governo bôer aceitou dar o direito de voto aos ingleses com residência de cinco anos, e entregar um quarto das cadeiras no Parlamento aos distritos mineiros, em troca do reconhecimento, por parte da Grã-Bretanha, da soberania das duas pequenas repúblicas. Como os ingleses não aceitaram esta última con dição, a l i de outubro de 1899 os comandos bôeres iniciaram a guerra que os ingleses acabaram ganhando. A guerra bôer mostra bem a natureza e os interesses do imperialis mo: a interação dos fatores econômicos, políticos e estratégicos é tão clara como água. Os interesses privados das companhias se sobrepõem aos inte resses políticos e fiscais dos dois pequenos Estados de origem européia e arrastam a nação imperialista à guerra, justificada por razões estratégi cas. À sombra do imperialismo ficaram os povos e a terra africana, cober tos de sangue e miséria. A África Oriental, situada entre o Egito ao norte, Madagascar ao sul e o vale do Nilo a oeste, foi repartida entre Inglaterra, Alemanha e Itália, depois de 1884, apesar de já ter sofrido uma divisão provisória entre a In glaterra e a Alemanha, em 1866. Sem grandes interesses comerciais, a Grã-Bretanha interviera nesta região para convencer o sultão de Zanzibar a pôr fim ao tráfico de escra vos negros para a Arábia, o que conseguiu finalmente em 1873. De fato, como já dissemos, a Grã-Bretanha era a potência com maio res interesses nesta região. Desde 1815, estendera sua influência política, baseada no poderio naval, por todo o oceano Índico, desde os Estados islâmicos do golfo Pérsico até o cabo da Boa Esperança, e não desejava.a influência de outra potência. Conseguiram eliminar a França que, domi nando Madagascar, projetava-se sobre a África Oriental. Firmou-se um acor do em 1862 que obrigava os dois países a respeitar a independência do sul tão de Zanzibar e de seus territórios na costa oriental da África. A França ficava excluída desta região. Com os alemães as coisas foram diferentes, porque entenderam rapi damente as pretensões inglesas, isto é, de abrir um corredor de comuni cação entre o Cabo e o Cairo. A bem da verdade, antes da década de 80, nem a Inglaterra nem a 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 32/87 Alemanha tinham um interesse oficial na África Oriental. A região era ex plorada por duas companhias privadas, uma alemã e outra inglesa, dedi cadas à especulação com terra, e nenhuma das duas recebeu apoio oficial até então. Só a partir de 1884, quando a iniciativa de capitalistas alemães, liderados por Carl Peters, organizou uma companhia de exploração que ne gociou vários tratados com o sultão de Zanzibar, o governo alemão se interessou oficialmente pela região. Bismarck apoiou resolutamente a inicia tiva de Peters. Em conseqüência, a companhia inglesa pressionou o governo britânico a adotar uma postura oficial. Os dois países chegaram a um acordo em 1890: criava-se oficialmen te a África Oriental alemã, na medida em que o governo alemão passava a administrar e governar a colônia — funções anteriormente exercidas pela companhia de Peters. Em troca, os alemães renunciavam a qualquer in fluência no Alto Nilo. Por sua vez, os ingleses renunciavam ao corredor entre o lago de Niassa e Uganda, que permitira a união por ferrovia entre o Cabo e o Cairo. No entanto, apesar da frustração, os britânicos estavam livres para ocupar uma vasta região compreendida entre a costa, o lago Al berto e o Sudão egípcio. Em 1894, o governo inglês estabeleceu oficialmente o protetorado sobre Uganda. O branco trocou a Bíblia pela terra A penetração e a conquista da África Ocidental e equatorial lembra a conquista da América. O maior obstáculo foi o geográfico: climas inóspi tos, selvas impenetráveis. O segundo, a organização das sociedades africa nas, muitas das quais viviam do comércio de escravos. Até 1830, só havia algumas feitorias européias na costa do Senegal, Gâmbia e Serra Leoa, mais alguns portos comerciais ingleses e holandeses na Costa do Ouro. O conhecimento do interior se devia, em grande parte, aos missio nários e aos expedicionários como Brazza, Stanley, Gallieni, Livingstone, que, após grandes dificuldades conseguiram alguns acordos com os reis ne gros. Conta-se que Savorgnan de Brazza andou perdido 4.000 km antes de chegar ao Congo. Gallieni vai do Senegal a Niger por ordem do rei Amadu e ali pára por dez meses, abatido pela disenteria que o deixa prostrado. O interesse dos europeus pela África Ocidental nasceu pela produção e exportação do azeite vegetal que servia para a fabricação de sabão e para usos industriais. O amendoim era produzido em abundância em Gâmbia e no Senegal, e o azeite-de-palma na Costa do Ouro e no delta do Niger. O desenvolvimento crescente do comércio desses produtos estimu lou o desenvolvimento das marinhas mercantes européias. A primeira linha 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 33/87 regular de vapores foi estabelecida pelos ingleses em 1852. Daí para a fren te, outras linhas escandinavas, holandesas e francesas passaram a percor rer o trajeto. A^perietração pelos rios até o interior colocou os comerciantes euro peus em contato direto com os produtores, eliminando-se os intermediá rios africanos. A transformação desta região em colônias européias ocorreu paulati namente por meio de controles oficiosos, protetorados, áreas de influên cia etc. Os britânicos ocuparam Lagos, na Nigéria, em 1861. Dez anos de pois já ocupavam boa parte da Costa do Ouro. Os franceses, da mesma for ma, foram ocupando todas as áreas vizinhas do Senegal, Costa do Marfim, Niger médio etc. Recepção do rei Makoko, que aceitou o protetorado da França, registrada durante a viagem de Savorgnan de Brazza na direção do Congo. L'Illustration, 1882. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 34/87 Por volta de 1880, a rivalidade franco-britânica pelo comércio do azeite vegetal chegou a um ponto particularmente delicado no norte de Serra Leoa, na região ocidental de Lagos e no Niger. A guerra entre as companhias comerciais no interior da África Ocidental está tão cheia de detalhes intrincados, em que os interesses econômicos e as políticas oficiais se entrecruzamde forma complexa, que não é possível expô-los aqui. Contudo, os estudiosos da questão admitem que aqui se desenvolveu o imperia lismo em sua forma mais pura. Deixemos um historiador autorizado con cluir sobre o que aconteceu nesta região africana. "Uma breve revisão do papel da Grã-Bretanha na repartição sugere que desde o princípio até o final as considerações econômicas ditaram a política. Era o imperialismo econômico em sua forma mais pura, virtual mente não compreendendo considerações de prestígio nacional ou estra tégia e só marginalmente afetado por outros aspectos da situação africana, tais como a do Egito. Até meados da década de 1890 o comércio foi o cri tério da política e de maneira significativa os interesses comerciais levaram consigo muito pouca ampliação em termos de territórios." (David K. Field- house, Economia e Império - La Expansion de Europa, 1830-1914.) Foi justamente depois de 1880 que os franceses lançaram-se decidi damente à conquista de grande parte da África Ocidental e equatorial, sendo precisamente o Senegal o ponto de partida. Neste sentido, o subim- perialismo do Senegal, estruturado por alguns dos governadores da colô nia, assemelhava-se ao dos ingleses do Egito e da índia. O grande projeto francês era controlar o vasto triângulo que se es tende entre Saint-Louis, no Senegal, Bamaco no Niger, e Serra Leoa, que proporcionaria acesso direto ao delta do Niger e uma união, via Tombuctu, com a Argélia. Por outro lado, já se discutia em Paris a construção do tran- sariano que uniria a Argélia ao Senegal. Este projeto se tornaria mais ambicioso à medida que o imperialis mo francês se projetava até o Sudão Ocidental, não apenas a partir do Se negal, mas também da Argélia. Para esta grande conquista organizou-se um exército especial que foi abrindo o interior aos comerciantes. Até 1897,todo o interior da costa oeste até o Niger médio fora conquistado. Estabe lecida uma linha norte que unia Senegal, Niger e Chad, a conquista se ori entou para o sul e sudeste em uma campanha militar na qual os comandan tes, com um poder quase independente de Paris, tornaram-se heróis para os franceses e bandidos para os africanos. O frenético avanço francês intimidou as outras potências. A Alema nha rapidamente declarou o protetorado sobre o Camerum (atual Repú blica Unida do Camarão) e Togo em 1884. Os ingleses se apressaram a declarar protetorado sobre toda a costa desde Lagos ao rio dei Rei, no limi te ocidental da colônia alemã. Entre 1889 e 1891, os ingleses forçaram acordos com os franceses e 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 35/87 alemães para delimitar as fronteiras da Costa do Ouro, especialmente o in terior ameaçado pela expansão francesa e alemã no Alto Volta. O avanço francês em direção ao Sudão Ocidental foi detido pelos bri tânicos em Codoc, em 1898. As duas potências estiveram a um passo de um confronto bélico, mas preferiram chegar a um acordo razoável. No interior da África equatorial nasceu o Congo belga, colônia cons tituída como uma empresa privada do rei Leopoldo II, sem qualquer apoio do governo belga. Em teoria, tratava-se de um projeto estritamente econô mico para explorar as supostas riquezas da região do rio Congo. Contudo, devido à expansão francesa no limite norte do Congo, Leo poldo viu-se na necessidade de completar seu projeto com a possessão polí tica do território. Em 1884, conseguiu dos soberanos africanos, tratados que lhe outorgavam a plena soberania política desses territórios. Desde en tão, a região passou a ser governada pela Associação Internacional do Con go e o país passou a chamar-se Estado Livre do Congo. A Conferência de Berlim de 1885, que sancionou a partilha da Áfri ca, reconheceu a colônia belga como propriedade do rei, pois isso evitava um confronto perigoso entre França, Alemanha e Grã-Bretanha. Nessa divisão e luta por colônias na África, só dois países permanece ram livres: a Libéria, na costa ocidental, cuja independência em relação aos Estados Unidos era problemática, e a Etiópia (Abissínia), que conseguiu evitar a conquista italiana. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 36/87 3. o imperialismo na ásia Entre 1830 e 1880, quatro potências européias desenvolveram polí ticas imperialistas na Ásia: Inglaterra, Rússia e Holanda, que já possuíam territórios antes de 1830, e a França que iria adquiri-los a partir desta épo ca. Potências menores também estavam instaladas no continente desde o século XVI: a Espanha nas Filipinas; Portugal em Macau (China), nas ilhas T U R Q U E S T Ã O ÁSIA BETE handernagor(Fr.) C O R E I J j JAPÃO Hong Kong l i n ^ § FO RMO SA I N D O C H I N A O O £*:•:•%! Possessões japonesas Possessões francesas | .] Possessões alem ãs Possessões norte-americanas Possessões holandesas Possessões inglesas T A S M Â N I A N O V A Z E L Â N D I A O imperialismo na Ásia 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 37/87 Timor (Indonésia), Goa, Damão e Diu (na índia). Depois da primeira meta de do século XIX, uma nova potência ingressou ativamente no concerto imperialista: os Estados Unidos. Durante o século XIX e, particularmente desde a segunda metade, os interesses comerciais do Ocidente no continente asiático eram importantes. Por volta de 1860, a Ásia proporcionava 13,5% do total de importaçõesbritânicas e recebia 16,4% do total de suas exportações desse país. índia, China e Singapura eram os principais clientes. A índia constituía um mercado vital para o algodão e as exportações metalúrgicas britânicas. A China era outro mercado excelente para os teci dos de algodão e um grande produtor de chá, seda e outros produtos pri mários. Além do interesse comercial e das enormes possibilidades de investi mentos, a expansão imperialista foi estimulada pelos obstáculos colocados pelos governos asiáticos. A China e o Japão não permitiram o acesso direto a seus portos e muito menos aos mercados internos. Até 1842, a China só possibilitava aos estrangeiros comerciar diretamente com Cantão e todo es te comércio sofria o monopólio de uma associação oficial de comerciantes chineses, o Co-hong. O Japão só permitia o comércio com os portugueses. No caso de outros Estados como Anã, Sião e Birmânia, o comércio era realizado em condições muito difíceis para os ocidentais, pois não havia nenhuma proteção para as mercadorias e para as pessoas. O processo de penetração, persuasão e acerto de acordos comerciaisfoi lento. Em 1855, a Grã-Bretanha conseguiu um tratado satisfatório com o Sião. Em 1862, a França acertou um acordo com Anã. Os portos da Chi na se abriram aos poucos, logo após as guerras intermitentes entre 1839 e 1880. O Japão se rendeu à ameaça naval americana em 1854. Na verdade, neste longo processo, as palavras e os tiros de canhões se alternaram como argumentos. As exigências ocidentais aos governos asiáticos eram basicamente as seguintes: liberdade comercial em maior número de portos; maior liberda de de movimentos em direção ao interior; direito de estabelecer empresascomerciais no interior; autorização para construir ferrovias e serviços públi cos; melhores condições para os residentes estrangeiros, que em termos ju rídicos era o direito de extraterritorialidade, isto é, o direito de os estran geiros serem julgados por tribunais e leis de seu país de origem. Esta últi ma exigência, como veremos adiante, transformou certas cidades asiáticas em redutos ocidentais, onde as autoridades e as leis do país não tinham ação. Enquanto os governos asiáticos se dispuseram a fazer essas conces sões, as relações foram pacíficas. No entanto, quando novas exigências dei xaram de ser aceitas, as relações se agravaram. Por volta da década de 80, os problemas haviam se acumulado peri-5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 38/87 gosamente. A China mostrou-se irredutível em não permitir a construção de ferrovias e o acesso de comerciantes para o interior. A Birmânia tam bém colocou obstáculos à construção da ferrovia que uniria o rio Irawadi e a província de Iunã, no sul da China. Os franceses fracassaram em sua ten tativa de unir Tonquim com o sul da China, através do rio Mekong. A terra do desejo Assim o filósofo Hegel chamou a delia. E foi realmente o desejo dos europeus, desde a chegada de Vasco da Gama a Calicute, em 1498 na cos ta sudoeste. No entanto, até o começo do século XIX, os europeus só ha viam conseguido instalar-se em pequenas feitorias comerciais com direito apenas a exercer o comércio: os portugueses em Goa, Damão e Diu e os ho landeses em Conchim, uma praça fortificada de pouco mais de 1 km 2; os franceses tinham um entreposto em Pondichéry e as pequenas feitorias de Carical, Maé e Chandernagor; os ingleses estavam bem instalados em Sur- rate, Madras, Calcultá, Bengala e Bombaim. Dentre todos esses países foi a Grã-Bretanha que fez da índia sua colô nia principal. De 1750 a 1858, a colônia foi administrada pela Companhia das índias Orientais, que efetivamente conquistou grande parte do país. O governo despótico, o banditismo administrativo e a exploração sem li mites originaram a primeira grande rebelião hindu, a Guerra dos Sipaio* em 1858, que foi o pretexto para o governo inglês tomar em mãos o gover no da colônia.De forma geral até 1880 só a Grã-Bretanha e a Rússia tinham na Ásia interesses nacionais. A índia era uma incrustração na alma dos ingleses e assim como os russos possuíam territórios nacionais na Ásia, para os ingle ses a índia era um prolongamento asiático do território nacional. Neste sentido, manter com segurança as fronteiras era objetivo de uma política nacional. E as fronteiras da índia sempre estiveram ameaçadas por algum Estado expansionista asiático e pelas potências européias. Em grande par te, foi esta ameaça que estimulou, desde cedo, o subimperialismo de Calcu tá. Para Londres, surgia a necessidade imperiosa de dominar todo o oceanoÍndico, única forma de estruturar solidamente o vasto império que se es tendia pelo Egito, Sudão, África Oriental, Cabo, controlando as comunica ções oceânicas e os mares e golfos interiores. A necessidade de proteger a fronteira norte da índia fez com que os ingleses conquistassem as regiões do Sind (184243), Pundjab (1846-49), tentassem a anexação do Afeganistão duas vezes — em 1839-1842 e em 1878-1880 — sempre ameaçados pelos russos e, por último, acertassem a divisão do Irã em duas esferas de influência, uma inglesa e outra russa, em 1887. 2 Sipaio - soldado hindu, alistado ao serviço europeu. (N. do T.) 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 39/87 Algo semelhante aconteceu na fronteira nordeste, onde o Estado ex- pansionista da Birmânia foi ocupando sucessivamente Aracã, Assam e Sião, conquistas que colocaram em perigo a região de Bengala. Após duas guer- 33 ras, 1824-26 e 1852, os ingleses se apoderaram da Birmânia. A conquista definitiva da parte norte deste país em 1886 foi conseqüência do medo da penetração francesa em Tonquim e da necessidade de defender os interesses comerciais no sul da China. A leste de Singapura, na Malásia, os interesses britânicos eram menos definidos do ponto de vista da índia. Ali adotou-se a política de "portas abertas" e igualdade de oportunidades para o desenvolvimento comercial. As guerras com a China orientaram-se neste sentido, até se conseguir a ane- xação de Hong Kong pelo Tratado de Nanquim de 1842. Conseqüentes com esta política, os ingleses aceitaram sem temores a ocupação francesa da Cochinchina (1867). No entanto, quando os france ses se apoderaram de Tonquim (1884), a Grã-Bretanha considerou a Alta Birmânia ameaçada e com ela a índia, ocupando-a em 1886. A Cochinchina dos almirantes As causas políticas e econômicas não são suficientemente claras pa ra explicar a ocupação da Cochinchina em 1858-62 e, mais tarde, de todo o Império de Anã e parte do Camboja, em 1885. Parece que o imperialis mo francês de meados do século XIX dinamizou-se como uma resposta à frustação de haver perdido definitivamente a índia para o imperialismobritânico. Sem descartar os interesses econômicos, o interesse pela Cochinchina parece ter sido produto da necessidade francesa de possuir uma base naval no Oriente, para facilitar sua penetração no mercado da China. A ocupação de Saigon coincidiu com a terceira guerra do ópio (1858) em que a França aliou-se à Grã-Bretanha. Outro aspecto importante para explicar as origens do imperialismo na Indochina relaciona-se com as missões religiosas que atuam na península desde o século XVIII. Embora os governos franceses nunca tivessem dado um apoio real e efetivo a essas missões, encarava-as como uma forma de manifestar concretamente a presença francesa no Oriente, o que, de alguma forma, equilibrava a influência inglesa. Desde o final do século XVIII, os missionários haviam estabelecido boas relações com o governo de Anã, que se preparava para iniciar uma guerra com os reinos vizinhos e hostis de Tonquim e Camboja. Por inter médio das missões religiosas, Anã solicitou ajuda ao governo de Luís XVI, que não chegou a concretizar-se devido à revolução que irrompeu em 1789.Apesar disto, em 1802, Anã conquistara os reinos inimigos. Pelo fato de não terem recebido ajuda francesa, talvez os sucessivos governos anamitas tenham instaurado uma política hostil às missões. 5/10/2018 Hector Bruit o Imperialismo (Final) - slidepdf.com http://slidepdf.com/reader/full/hector-bruit-o-imperialismo-final 40/87 A proteção aos católicos, fossem franceses ou anamitas, foi o pretex to para os almirantes que governavam a Cocltínchina fizessem ostensivas demonstrações navais frente a Tourane, em 1847 e 1858, para intimidar o governo anamita e obrigá-lo a aceitar as disposições do Tratado de Wham- poa. Este tratado fora firmado com a China em 1844, e por ele os católi cos receberiam proteção das autoridades deste país, pois Anã se considerava um feudo da China. A essa motivação religiosa, juntou-se o interesse comercial, princi palmente com relação à China, que podia fornecer seda para a indústria têxtil francesa quase paralisada em meados do século XIX, devido à en fermidade que tomara conta do bicho-da-seda. Lion, principal centro têx til, teve que procurar outras fontes produtoras. Eram os ingleses, na Euro pa, que comercializavam a seda chinesa. Fazia-se necessário que os indus triais franceses obtivessem a matéria diretamente daquele país, para evitar o intermediário. Isto exigia uma política agressiva na Indochina, comotrampolim para a China meridional. Como os ingleses na Índia, os franceses foram conquistando a penín sula como solução para os problemas que surgiram na própria Indochina. Estabelecidos primeiro no extremo sul, Saigon e Cochinchina, avançaram até o Camboja, quando este reino pediu ajuda contra o reino do Sião. Para evitar uma possível conquista por parte do Sião, os franceses estabelece ram o protetorado sobre o Camboja em 1867. A ocupação de Tonquim (1883), no extremo norte, foi iniciada por um comerciante que vendia armas européias na China. Esta região era im portantíssima, como ponto inicial para a penetração em Iunã, província meridional da China. A ocupação do Laos se completaria em 1893, importante ponto de penetração no sul da China, através do Rio Mekong. O assalto ao Dragão A China foi um dos poucos Estados (os outros foram Turquia, Ja pão e Sião) que, agredido pelo imperialismo, pôde evitar a divisão, no es tilo africano. Em compensação, sofreu ameaças, bombardeios e humilha ções; seu povo foi submetido à destruição lenta pelos traficantes de drogas e suas cidades mais importantes foram transformadas,
Compartilhar