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O TERRORISMO NA HISTÓRIA Francisco de Assis Penteado Mazetto, Professor Adjunto do Departamento de Geociências, Instituto de Ciências Humanas e Letras – UFJF. franciscoppm@bol.com.br Após o 11 de Setembro de 2001, o terrorismo passou a ocupar o centro das atenções da política de segurança nacional da nação hegemônica da atualidade. O século XXI começa com mudanças no quadro geopolítico global, onde as posições unilaterais dos EUA passam a ditar a nova ordem mundial. O terrorismo ganhou uma dimensão inédita neste início de século, antes restrito a regiões ou países com cismas sociais, econômicos, culturais, éticos ou religiosos. Agora, o tema é colocado como pauta obrigatória na agenda da relações internacionais. Porém, o ato terrorista, muitas vezes tem sido confundido, de modo incauto ou premeditado, com ações de luta armada, movidas por ideais legítimos e como reação ou resistência à repressão do agressor. As definições sobre terrorismo que encontramos nas enciclopédias se mostram imprecisas e incompletas. Para Larousse, é o "Conjunto de atos de violência cometidos por grupos políticos ou criminosos para combater o poder estabelecido ou praticar atos ilegais" e também, "Regime de violência instituído por um governo". Para a Delta Universal, o "Terrorismo é o uso ou a ameaça de violência, com o objetivo de aterrorizar um povo e enfraquecer sua resistência" e também exemplifica a ação terrorista: "Entre os atos mais comuns de terrorismo estão o assassinato, o bombardeio e o seqüestro" . Recorrendo ao dicionário comum, para um rápido exame etimológico, o Novo Aurélio diz: "Modo de coagir, ameaçar ou influenciar outras pessoas ou impor-lhes a vontade pelo uso sistemático do terror" e, em uma segunda definição, se aproxima das anteriores: "Forma de ação política que combate o poder estabelecido mediante o emprego da violência". A luta armada contra o poder estabelecido não pode, a priori, ser considerada como uma ação terrorista. O poder estabelecido pode ser totalmente ilegítimo, usurpador, sem respaldo democrático ou das tradições e costumes do povo que está submetido a este poder. Seguindo a definição enciclopédica, a Resistência Francesa, durante a II Guerra Mundial, seria classificada como uma organização terrorista, visto que lutava contra o poder estabelecido pelos nazistas na zona ocupada ao norte da França e o governo colaboracionista de Vichy. A definição de "praticar atos ilegais" como sendo característica da ação terrorista também não se sustenta. A ordem legal institucional pode ser imposta por um poder ilegítimo e, portanto, como se pode exigir legalidade dentro da ilegalidade. Outra confusão freqüente é aproximar o crime comum ao terrorismo. Assim, teríamos autores de crimes contra o patrimônio ou contra a pessoa humana, movidos por interesses pessoais ou passionais no mesmo naipe de crimes com alvos discriminados ou indiscriminados, com motivos políticos e ideológicos, vitimando inocentes. Como método de coação ou ameaça para impor seus princípios, a ação terrorista se encaixa nas definições clássicas mas, encontra sérios obstáculos, na contrapartida da ação anti-terror, geralmente desencadeada por instituições controladas pelo Estado. Neste caso, temos exemplos clássicos como a luta anti- terrorista em relação ao IRA na Irlanda do Norte e ao ETA no País Basco. Para uma definição mais específica, o Dicionário do Pensamento Social do Século XX (OUTHWAIT e BOTTOMORE, 1996) classifica o terrorismo em dois tipos principais. No primeiro, o agente usa um método de ação para atingir objetivos precisos. Para este caso, a violência aplicada é pragmática, mais ou menos sob o controle do agente que, pode mudar de estratégica, não necessariamente com uso de violência. No segundo tipo, o terrorismo pode ser uma lógica de ação. Nesse caso, os fins justificam os meios, e o agente apresenta uma ação sistemática e em cadeia, muitas vezes só interrompida pelo uso da força, através da repressão, prisão ou morte. Ainda segundo a obra, existe uma tese corrente inspirada no funcionalismo, na qual, o terrorismo surge quando existe uma crise, principalmente uma crise política. Os objetivos precisos de uma ação terrorista também apresentam uma delimitação bastante vaga. Operações que procuram atingir alvos militares do poder estabelecido geralmente são apontadas como exemplo. No caso do Iraque ocupado, as ações contra as forças norte-americanas poderiam ser classificadas neste modelo. Porém, visto de outro ângulo, essas ações seriam caracterizadas como resistência contra a potência invasora. Além disso, essas ações podem extrapolar os objetivos precisos quando aumentam em demasia a magnitude de suas operações. O ataque desferido pelo Hezbollah em 1983 ao quartel-general da marinha dos EUA em Beirute, onde morrerem 241 fuzileiros com a explosão de um carro-bomba, causou tal impacto na política e opinião publica mundial, que jamais poderia ser classificado como de objetivo preciso. Quando a ação terrorista é encarada como uma lógica de ação, os alvos são selecionados sem um direcionamento ou exclusão prévia. Qualquer segmento social ou instituição do inimigo se torna um alvo em potencial. Os atentados de autoria do Hamas e Jihad Islâmica contra civis israelenses, inclusive crianças, poderiam ser incluídos nesse tipo de ação. Os atentados atribuídos à Al Qaida, apresentados como exemplos típicos de terror em escala global, chegaram a um limite inimaginável antes do 11 de setembro. O maior atentado terrorista da história apresentou as duas características anteriores ao mesmo tempo. Atingiu alvos com objetivos precisos: o Pentágono como representante do poder militar; o World Trade Center como representante do poder econômico e, a tentativa de atingir a Casa Branca, representando o poder político do inimigo. No entanto, no bojo desses alvos específicos, pereceram milhares de vítimas inocentes, fato que aproxima essa ação àquelas que atentam contra alvos indiscriminados, procurando aumentar o impacto e repercussão de suas ações. Fazendo um breve retrospecto histórico, verifica-se que os atos de terror, estão presentes desde o início da civilização. O Fato mais surpreendente é que o agente mais letal nas ações de terror foi o próprio Poder Estabelecido, ora contra nações inimigas, ora contra seu próprio povo como forma de repressão. Para CARR (2002), o Império Romano utilizou táticas de terrorismo contra os povos dominados, com a finalidade de baixar o moral e enfraquecer a resistência das tropas inimigas. O autor salienta que a expressão utilizada na época era "guerra punitiva" que, mais tarde, foi substituída por "guerra destrutiva". Entre os atos inomináveis praticados pelas legiões romanas estavam os estupros e saques, como forma de recompensa aos soldados, já que eram extremamente mal remunerados. Naturalmente, complementa o autor, os romanos também sabiam gerenciar a pax romana, pois não conseguiriam manter um império apenas com atos de violência. Então, o chamado "terrorismo de Estado", tem raízes históricas e está presente até os dias atuais, embora nenhum poder estabelecido reconheça oficialmente a utilização desses métodos como um recurso estratégico. Sem dúvida é um tema polêmico, pois é mais fácil atribuir ou reconhecer o ato terrorista em um indivíduo ou numa organização clandestina. Recorrendo novamente à História, o final das Guerras Púnicas, com a implacável destruição de Cartago pelos romanos, que não poupou mulheres, velhos e crianças, foi uma forma de utilização da tática do terror com o objetivo de apagar qualquer resquício do inimigo que, por tanto tempo, ousou desafiar o poder de Roma. Este procedimento foi muito comum na Idade Antiga, sendo observado na Grécia, no Império Egípcio e nas Civilizações da Mesopotâmia. O colapso do Império Romano do Ocidente em 476dC foi fruto, em grande parte, da própria deterioração das instituições políticas e sociais e da outrora eficiente máquina administrativa do império. Poroutro lado, também foi desencadeado pelas táticas de terror dos povos bárbaros, apreendidas através dos contatos destes com os romanos. As seguidas invasões e saques em Roma tiveram início em 410dC com Alarico, rei dos Visigodos, cujas tropas eram formadas, em boa parte, por bárbaros que serviram no exército romano. O conceito de "guerra justa" ganha respaldo ideológico nessa época, durante o desmantelamento do Império Romano do Ocidente. Segundo CARR, as obras de Santo Agostinho, principalmente "A Cidade de Deus", enfatiza que a guerra, para ser justa, deve sempre visar e trazer a paz. O filósofo cristão ressaltava que quando a vitória pendia para o lado cuja causa era mais justa, era motivo de regozijo, pois sempre seria sucedida pela paz. No entanto, o autor salienta que a Pax Dominus, preconizada por Agostinho, foi adulterada pela paz do vencedor, nem sempre ungida por Deus e pelos ideais cristãos. Santo Agostinho escrevendo A Cidade de Deus. Miniatura do séc. XV. Crédito da Ilustração: Nova Cultural, 1998. A expansão do Islã no Oriente Médio, África do Norte e Europa, a partir do século VII, também invocou os princípios da guerra santa ou jihad para converter os infiéis para a nova fé. Partindo do Califado de Medina, quando o poder temporal e espiritual estavam unificados sob uma só autoridade, vários povos das regiões conquistadas foram submetidos a um regime de força. O Império Bizantino Cristão sucumbiu aos ataques do Islã, representados pela facção otomana, depois de mais de quatrocentos anos de disputa. A Paz de Deus foi estabelecida formalmente pela Igreja Católica a partir do século X e, era constituída por uma série de proibições contra as ações beligerantes, principalmente contra os não-combatentes e seus bens, destacando-se entre eles os clérigos, os camponeses, os comerciantes, as mulheres, as crianças e os idosos. A Idade Média também foi pródiga em atos de terror, desencadeados principalmente pelo fundamentalismo religioso, cristão e muçulmano que, por vezes, encerrava interesses econômicos de ambas as partes. A intolerância religiosa sempre foi um grande fomento para ações terroristas do poder estabelecido, seja de um Estado Teocrático e Pseudo-Teocrático ou da própria instituição religiosa. A ascensão de grupos religiosos ultra-radicais ao poder pode ser verificada atualmente, principalmente no Oriente Médio. A grande questão que se coloca é: até que ponto esses grupos podem ser considerados verdadeiramente religiosos? Os textos sagrados, de todas as grandes religiões, vedam o uso da violência contra o próximo. As Cruzadas, ocorridas nos séculos XII e XIII, constituíram campanhas militares desenvolvidas pelos cristãos da Europa Ocidental, com objetivo de libertar os cristãos do oriente e os lugares santos do domínio "infiel" muçulmano. Mas, logo abandonaram os ideais religiosos da Pax Dominus, concentrando-se mais nos fins políticos e econômicos. Não foram poucos os massacres praticados tanto por cristãos como por muçulmanos, cujas principais vítimas eram as populações civis das cidades conquistadas e reconquistadas. Tomada de Antioquia na I Cruzada em 1098. Crédito da Ilustração: Nova Cultural, 1998. Um episódio de terror medieval que não pode ser esquecido é a Santa Inquisição, cujos julgamentos condenaram inúmeros inocentes à morte acusados de feitiçaria. Entre os sacrificados mais famosos estão Joana d'Arc e Giordano Bruno. O poder unilateral da igreja impunha seus dogmas e preceitos a ferro e fogo. A conquista da América, desenvolvida no início pelos países ibéricos a partir do século XVI, ficou marcada pelo genocídio dos povos indígenas do Novo Mundo. Posteriormente, o modelo agro-exportador escravista implantou uma política de terror sobre os povos cativos, nunca antes registrada com tamanha intensidade. A transferência das riquezas da América para a Europa incentivou o surgimento da pirataria no Atlântico, constituída por mercenários de vários países europeus. Em grande medida, os métodos dos piratas se aproximavam muito dos terroristas modernos. O objetivo maior era pilhar os galeões espanhóis que estavam carregados de ouro e prata extraído das colônias. Para tanto, arrasavam as vilas e cidades das colônias portuguesas e espanholas, locais de embarque da preciosa carga. O lendário corsário inglês, Sir Francis Drake, personificou o que poderíamos chamar hoje de terrorismo de Estado. Apoiado por Elizabeth I, comandou os saques à frota espanhola na América e à própria costa da Espanha, dividindo o botim entre a Coroa e seus mercenários. Drake desempenhou um papel importante na história pois, com sua ação, quebrou o poder marítimo da Espanha, tornando a Inglaterra a nova senhora dos mares, com a derrota da Invencível Armada de Felipe II em 1588. O terrorismo contemporâneo sofre uma interpretação errônea quando é aproximado à guerrilha ou guerra de guerrilhas. Este tipo de tática militar deve ou deveria seguir convenções semelhantes aos grandes conflitos armados. As Convenções de Genebra, iniciadas em 1864, obrigam os países signatários a seguir suas normas quanto ao tratamento dos feridos e prisioneiros de guerra e, notadamente, à proteção da população civil. A tática da guerrilha surgiu, pelo menos nos moldes modernos, durante as guerras napoleônicas, como um movimento de resistência ao domínio francês. Os ataques de surpresa contra o exército de Napoleão, com posterior recuo, ocorreram com maior relevância na Espanha, logo levando o nome de "pequenas guerras" ou guerrilhas. Para combater os ataques das guerrilhas, as forças armadas do poder estabelecido aplicam, muitas vezes, as técnicas de terror, com uso de tortura e execução sumária dos não-combatentes, acusados de dar apoio aos guerrilheiros. Este cenário pode resultar numa ação de retaliação da guerrilha, utilizando os mesmos métodos, aproximando-se assim das ações terroristas. O século XX foi repleto de exemplos de terrorismo de Estado, os casos mais inomináveis foram colocados em prática pelo regime nazista e stalinista. O ato final da II Guerra Mundial, o bombardeio atômico de Hiroshima e Nagasaki, não deixou de ser uma ação típica de terror, procurando abreviar o conflito e poupar as tropas de ocupação de uma batalha imprevisível. Ruínas de prédios em concreto no epicentro da explosão da bomba atômica em Hiroshima. Crédito da Ilustração: U.S.Army 1945. Uma prática muito comum da ação terrorista, quando exercida por organizações clandestinas, é o seqüestro e o assassinato de pessoas ou grupo de pessoas. Na era da aviação a jato, os vôos comerciais se tornaram um alvo fácil e essas ações se tornaram freqüentes nos anos 70 e 80. Não por coincidência, o seqüestro de avião foi utilizado pela Al Qaida para viabilizar os ataques de 11 de setembro. Entre os inúmeros casos de aviões seqüestrados, destaca-se o de Entebe, em Uganda, local para onde foi desviado o vôo Tel Aviv - Paris da Air France em 1976. Os seqüestradores, pertencentes à Frente Popular para a Libertação da Palestina, mantiveram 93 passageiros judeus como reféns, exigindo a libertação 53 palestinos presos em Israel. A famosa "Operação Entebe", organizada pelo governo israelense, resgatou os reféns e executou os terroristas. O seqüestro de pessoas seguido de assassinato tem se tornado uma prática recorrente dos grupos terroristas. O caso mais recente e dramático foi o seqüestro de mais de 500 espectadores do teatro Dubrovka em Moscou. Os terroristas chechenos passaram a torturar e executar os reféns. A ação anti-terror do governo russo foi a mais desastrosa possível, resultando na morte de 118 reféns e 50 terroristas, pelo uso inadequado de um gás paralisante. O assassinato em massa da população civil não se restringe somente ao Oriente Médio. O atentado atribuído à Jeemah Islamya em Bali provocou a morte de mais de 200 pessoas em outubro de 2002, em sua maioria composta por turistas australianos e europeus. Nesse tipo de ação também se classifica o atentado de Oklahoma em 1995, com168 mortos, sendo 19 crianças, praticado por terroristas de extrema direita. Os atentados contra as Embaixadas dos EUA em Nairobi e Dar es Salaam em 1998, atribuído à Al Qaida, tinham alvos específicos. Mas, atingiram grande números de civis, totalizando 258 mortos, entre os quais, apenas 12 eram americanos. Em muitos casos esses grupos terroristas têm o apoio de governos de países para suas operações. Existem fortes indícios das ligações entre a ditadura de Idi Amim Dada com os seqüestradores de Entebe. O governo líbio, na pessoa de seu líder, o coronel Kaddafi, foi acusado várias vezes de manter bases de treinamento e oferecer apoio logístico e financeiro aos terroristas palestinos, do IRA e do ETA. Outro governo sempre citado como financiador de grupos terroristas foi o de Saddam Hussein no Iraque. No seqüestro individual, o alvo sempre representa o poder estabelecido ou faz parte dele. Nos anos 70, dois casos chocaram a opinião pública mundial. O primeiro foi o seqüestro de Patrícia Hearst, filha do magnata da imprensa americana, pelo "Exército Simbionês de Libertação". Neste caso, a seqüestrada "aderiu" à causa do seqüestrador, participando de suas ações nos EUA. O segundo caso, mais traumático, foi o seqüestro e assassinato do ex-primeiro ministro italiano Aldo Moro em 1978 pelas Brigadas Vermelhas. Os assassinatos praticados por terroristas, ligados a grupos organizados ou por ímpeto pessoal, também visam atingir o poder estabelecido ou pessoas que representam ideologias contrárias ao do agressor. Entre os exemplos do século XX, podem ser citados os assassinatos de Gandhi, de Martin Luther King, de John e Robert Kennedy. O assassinato do arquiduque Francisco Ferdinando em Sarajevo, em 1914, pelo terrorista sérvio Gavrilov Princip, teve conseqüências graves. Foi o estopim da I Guerra Mundial, causadora de mais de 10 milhões de mortos. O episódio histórico mostra como as organizações terroristas já eram atuantes no início do século XX e, também, o envolvimento de governos com essas organizações. O grupo terrorista denominado "Mão Negra" responsável direto pelo atentado de Sarajevo, contou com o apoio do serviço de segurança do Reino da Sérvia para concretizar o assassinato do arquiduque austríaco. O arquiduque Francisco Ferdinando um pouco antes de ser assassinado em Sarajevo, na Bósnia, em 28 de junho de 1914. Crédito da Ilustração: Nova Cultural, 1987. No elenco dos assassinatos do terror pode-se incluir os chamados "assassinatos políticos", muito freqüentes no mundo, no qual, o poder político, pode estar associado às organizações criminosas ou, ele mesmo, adquirir essas características. A série de assassinatos praticados pela Máfia na Itália e Estados Unidos, por encomenda de políticos corruptos, demonstram a dimensão desses conluios. A própria Máfia desencadeou uma campanha terrorista na Itália nos anos 80 e 90, com a série de assassinatos de juízes que davam sentenças condenatórias aos prisioneiros mafiosos. No Brasil, seguindo a tradição do coronelismo, o assassinato político é mais comum no período de campanha pelas eleições municipais, quando os ânimos ficam mais exaltados, e os oponentes são eliminados antes e após os pleitos. Nesse breve relato sobre a história do terrorismo, cabe debater as causas que motivaram as principais ações do movimento, procurando contrapor idéias de alguns autores que se dedicam ao assunto. Para HUNTINGTON, em entrevista concedida para GARDELS (2001), Osama Bin Laden "devolveu ao Ocidente seu senso de identidade comum". O autor de "O Choque das Civilizações", ainda sob o impacto do 11 de setembro, afirma, equivocadamente, que existe uma união do Ocidente, comandados pelos EUA, para se defender das agressões do Mundo Islâmico. A primeira dúvida que se coloca é a débil união ocidental, onde os sentimentos de solidariedade com os ataques ao World Trade Center foram logo substituídos por ressentimentos contra a potência hegemônica. Outro questionamento é o de hostilidade do Islã contra o Ocidente, generalizando os sentimentos de facções como o Taleban e a Al Qaida. O recrudescimento do fundamentalismo religioso, com destaque para o muçulmano, é apontado por HUNTINGTON como fator de instabilidade no mundo atual. O autor também ressalta a tensão causada pela intolerância das religiões monoteístas, que oscilam, em maior ou menor grau, de acordo com a evolução histórica. Em outro trecho da entrevista, o pesquisador refuta acusações de que a cultura de massa norte-americana, linha de frente o capitalismo, possa ofender os princípios islâmicos pois, não são obrigados a segui-la. Este é um pensamento bastante simplista se considerarmos que o american way of life funciona mais como uma imposição do que como uma sugestão do modo de vida da nação dominante. O historiador Paul JOHNSON (2001) demonstra ter posições mais polêmicas do que o autor anteriormente citado. Em declarações e entrevistas divulgadas após o 11 de setembro, o autor de vasta obra sobre o estudo das religiões, aponta o Islã como uma religião "ainda mergulhada na Idade Média". Para o autor, o islamismo é a única grande religião monoteísta não reformada, em contraposição ao cristianismo e judaísmo, ambas modernizadas, respectivamente, pela Reforma e Contra-Reforma dos séculos XV e XVI e pelo Iluminismo Judaico do século XVIII. O grande problema ressaltado pelo autor é que a "feição medieval" do Islã gerou Estados Feudais que sobrevivem em pleno século XXI, onde religião e política não estão separadas uma da outra. Pode-se discordar do historiador, levando-se em consideração que o mesmo ainda não se concentrou no prometido volume sobre o Islamismo. Quando se dedicar mais ao assunto, com certeza vai verificar que o Islã criou uma admirável civilização, onde a tolerância foi a tônica na maior parte do tempo e do espaço. Os grupos minoritários que se apropriam do poder e aqueles que praticam o terrorismo, não podem, de maneira nenhuma, simbolizar os valores do islamismo. Na visão do jornalista Giles LAPOUGE (2001), o terrorismo foi vencido mas não eliminado. O objetivo maior da causa terrorista, a aniquilação dos valores da sociedade democrática, jamais será alcançado. Segundo o jornalista, ataques com a amplitude do 11 de setembro podem revigorar a coalizão antiterror. Sem dúvida, os princípios da sociedade democrática, quando efetivamente estruturados, não sofrem abalos com a ação terrorista. Mas, a maior parte dos países que adotam o regime aberto e representativo, estão iniciando o longo aprendizado da prática democrática. As jovens democracias estão sujeitas a retrocessos e os terroristas sabem disso. Os ataques aos países muçulmanos que começaram o processo de democratização, como a Turquia e a Indonésia , comprovam, a incompatibilidade, entre os grupos radicais que utilizam as ações de terror, e o regime de liberdade e respeito aos direitos humanos. Nova York – 11 de setembro de 2001 – O terror ataca o World Trade Center , usando aviões civis como mísseis. Crédito da Ilustração: Agência Reuters. Este artigo não poderia finalizar sem lembrar o recente pronunciamento do secretário geral da ONU, Kofi Annan. Ele destaca que somente a força não pode derrotar o terrorismo. Annan acredita que as causas para tais ações estão nas condições sócio-econômicas injustas e disputas políticas não resolvidas. Torna-se necessário acrescentar que o mundo atual, dominado pela imposição dos valores da sociedade capitalista, cria justificáveis núcleos de resistência, nos quais, os grupos radicais, sempre encontrarão terreno fértil para o seu crescimento. _________________________________________________ BIBLIOGRAFIA BAUDRILLARD, Jean. O Espírito do Terrorismo. SP: Campo das Letras, 2002. CARR, Caleb. A Assustadora História do Terrorismo. São Paulo: Ediouro Publicações S. A. , 2002. CLAUSEWITZ, Karl von e TZU, Sun. The Book of War: On War and The Art of Warfare . Nova York: Modern Library, 2000. Enciclopédia Delta Universal, Vol.14. Rio deJaneiro: Editora Delta S/A, 1982. 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