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NAOMI TAKADA RA: 11201822420 O documentário ‘O veneno está na mesa’ dirigido por Silvio Tendler, lançado originalmente em 2011 traz a luz a emergência da ordem industrial na agricultura brasileira. É possível fazer uma análise detalhada de cada imagem e cada diálogo meticulosamente pensado por Tendler, de forma a expressar o apropriacionismo e como a produção agrícola foi forçada a ingressar nos complexos agroindustriais. O documentário parte de uma fala do jornalista Eduardo Galeano acerca da usurpação dos recursos naturais na América Latina e a progressão no processo de conscientização social acerca da necessidade de defender e preservar esses recursos, uma vez que essa conscientização não ocorre na mesma velocidade em que ocorre a deterioração da natureza. A partir da iniciativa de industrialização via substituição de importações no Brasil, houve a necessidade do aumento da produtividade agrícola. A Revolução Verde, como citada no documentário, que representa a integração da produção agrícola com o setor industrial, prometia comida farta e sadia na mesa dos habitantes de todo o planeta. A apropriação desse discurso para legitimação de monocultivos em extensas áreas, expulsão de famílias camponesas e a substituição de mão de obra trabalhadora por máquinas agrícolas acarretou na redução do número de produtores, mas no aumento da área cultivada e também da produção. Isso evidencia um processo de concentração do cultivo em menor número de agricultores, como aponta Paulo André Niederle e Valdemar João Wesz Jr no livro As Novas Ordens Alimentares, publicado em 2018. De forma bastante impactante, Silvio Tendler traz no documentário imagens de aviões sobrevoando plantações pulverizando agrotóxicos. Dessa forma, Tendler busca abordar o uso de agroquímicos durante e depois da segunda guerra mundial, principalmente pela indústria alemã e norte-americana. Cita a pulverização feita por aviões norte-americanos sobre densas vegetações no Vietnã para desfolhar as matas e reduzir a possibilidade de emboscadas. Com isso, atingindo a população habitante e deixando inúmeras sequelas àquela sociedade. As grandes indústrias de agroquímicos que forneceram tais produtos para finalidade de guerra não se responsabilizaram pelas consequências. O uso dos agroquímicos ou agrotóxicos foi intensificado a partir da década de 1960, com o uso de adubos químicos e venenos. O Brasil se tornou, como citado no documentário, o campeão mundial de agrotóxicos, o que só foi possível devido a regulamentações feitas por instituições do Estado com aval da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (ANVISA), que regulamentou mais de 400 tipos de agroquímicos catalogados. O governo militar no Brasil promoveu expansão da fronteira agrícola em áreas de cerrado e floresta amazônica, com objetivo de ampliar a produção para aumento de exportações e desta forma equilibrar a balança comercial, como aponta Niederle e Wesz. De acordo com o livro As Novas Ordens Alimentares, o Estado brasileiro colocou em marcha um conjunto de ações para potencializar o processo de modernização e industrialização da agricultura. O uso de instrumentos de créditos para agricultores e a Política de Garantia de Preços Mínimos (PGPM), que define preços base antes do plantio para evitar oscilações. Sendo assim, determinando de forma arbitrária o uso de sementes híbridas, uso de adubos químicos, agrotóxicos, entre outros produtos considerados “necessários” para o plantio. Somente dessa forma seria possível que os agricultores recebessem auxílio de crédito. Isso demonstra como a intervenção estatal foi elemento central na organização da ordem industrial no Brasil. De acordo com depoimentos de pequenos agricultores, tais medidas tomadas a partir de instituições governamentais inviabilizaram a continuidade de plantio de sementes ‘crioulas’ e de práticas de agriculturas tradicionais. Com isso, cria- se a falsa ideia de que para que a produção agroalimentar atenda a toda a população com preços acessíveis, faz-se necessário a produção em larga escala e uso de defensivos. Porém, a substituição da produção de alimentos pelo monocultivo de commodities é um dos fatores que hoje gera o aumentos dos preços dos alimentos e a diminuição da qualidade dos mesmos. O que não é explicitado para a sociedade que consome produtos agroquímicos sem necessariamente ter o conhecimento disso, são as consequências para a saúde pública devido ao consumo de alimentos cultivados a partir do sistema de produção agroindustrial. O documentário faz um levantamento de dados, expondo porcentagens encontradas de tais substâncias agroquímicas nos vegetais, que na maioria dos casos, excedem os valores regulamentados pela ANVISA. O que demonstra a incapacidade de controle do uso de tais substâncias no processo de produção. Por fim, conclui-se que a lógica de ação do capital na agricultura com a integração das atividades econômicas – agrícolas, industriais, comerciais e financeiras – gerou uma relação complexa de dependência e subordinação. Entretanto, não necessariamente solucionou o problema social relacionado a alimentação, uma vez que se a intenção era erradicação da fome, além de não ter sido solucionado culminou em outros potenciais problemas de crise da saúde humanitária e degradação ambiental.
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