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Webaula 04 a partir 07/12 Codecademy Gamificação tem a ver com jogo? É curioso perceber como os casos que aparentam obter mais sucesso com a gamificação são sites que propõem algum tipo de aprendizado. Possivelmente isso acontece devido à relação íntima entre jogo e educação. Praticamente qualquer conteúdo que exija um aprendizado mais extenso pode ser reformulado em forma de desafios, brincadeiras e sistemas de experimentação. Por isso vamos analisar este tipo de empreitada com o site Codecademy, que se propõe a ensinar programação aos seus usuários. A questão que queremos discutir aqui é que o funcionamento lúdico do Codecademy, e que julgamos ser efetivo, está ligado a uma lógica de aprendizado. Aprender a programar é uma dinâmica que facilmente pode ser esquematizada em um sistema de regras que nos propõe desafios (assim como aprender uma língua estrangeira, exemplo que analisaremos na atividade posteriormente). Aprender a programar é aprender as regras que regem esse processo. Os desafios e tarefas propostas pelo Codecademy tentam nos comunicar como elas funcionam através de enigmas que respondemos a partir de raciocínio lógico. E, é claro, a interface também se aproveita de recursos externos como as medalhas e pontos, por exemplo. Em outras palavras, como destacado por Steffen P. Walz (2012), nem todos os processos são gamificáveis. Seria ideal poder transformar em jogo uma atividade como comprar em uma loja online. No entanto, propomos aqui que isso tornase extremamente complicado se não existe nesta dinâmica um ou mais traços que apontamos em jogos ao longo das últimas aulas. Seja uma lógica de aprendizado progressivo; a possibilidade de unir peças em diferentes combinações para gerar diferentes efeitos; o prazer de movimentar objetos através da interface etc. Codecademy: gamificação tem a ver com jogo? Assim como o uso improvável de achievements em Incetipede e Team Fortress 2, uma atividade que aparentemente é impossível de gamificar pode acabar sendo gamificada por alguém munido de criatividade suficiente. Sempre podemos achar conexões escondidas em sistemas ativos. Basta achar alguma semelhança, mesmo que pareça impossível, entre o que se quer gamificar e a lógica lúdica/procedimental. Por exemplo, uma loja de roupas pode criar uma interface na qual o usuário cria combinações de peças, muda cores, cria coleções etc. Outra conclusão que podemos tirar disso é que, na verdade, o processo de jogo já está escondido na atividade gamificada. Assim como uma criança pode brincar com a área de trabalho de um computador, um adulto pode brincar com uma interface que possibilita combinar cores e peças de roupa. O trabalho da gamificação seria potencializar as possibilidades da “brincadeira”, criar novas ferramentas de ação, indicálas de forma efetiva e facilitar a navegação do usuário no sistema. O problema é que muitas vezes é difícil achar conexões entre processos de jogo e processos aparentemente distantes. É um trabalho que deve ser cuidadoso e que, em geral, leva tempo. Isso é confrontado com tentativas de acelerar o processo, o que resulta no uso de fórmulas fáceis: criar perfis para os usuários e premiálos com medalhas a cada 10, 20, 30, 100 compras. Criar níveis numerados para os perfis e dar pontos de experiência cada vez que uma compra é realizada ou cada vez que o usuário acessa o site. Criar uma barra de progresso que é completada aos poucos e que demonstra o “progresso” do usuário, incitandoo a realizar mais tarefas obsoletas apenas para “conseguir mais um nível”. Não podemos nos esquivar da questão: existe um conflito talvez até ético no uso dessas ferramentas. Como vimos na segunda aula, o sistema behaviorista procura incentivar ações através de recompensas. Se ele funciona? Talvez: sempre dependerá de quem é o alvo e de como o processo é aplicado. No entanto, reforçar comportamentos que queremos que os usuários realizem através de prêmios pode ser uma tática funcional apenas a curto prazo. O jogo FarmVille usava mecanismos manipulativos para prender a atenção dos jogadores e forçalos a compartilhar atualizações e convites. A tática deu certo durante meses, mas em pouco tempo esgotou seu arsenal e a empresa Zynga sofreu as consequências. Estudo de caso de Harvard: o jogo da negociação No estudo de caso feito pela Harvard Business School, um processo comum no dia a dia de quem atua no mercado é, o tempo todo, comparado com jogos. Esse exemplo serve cristalinamente para provar nosso ponto principal: a gamificação não é a inclusão de elementos de jogo em um processo, mas sim a percepção de quais etapas de um processo podem ser encaradas como elementos de jogo. O estudo começa descrevendo uma aproximação saudável para quando se quer negociar: precisamos saber quando aproveitar uma chance de cooperação mútua com quem negociamos; mas também necessitamos de atenção para não confiar em quem não vale a pena. Tanto a perda de uma cooperação mútua quanto a confiança em alguém indigno podem custar muito caro. Assim como o contrário é recíproco: se julgarmos de forma correta, somos recompensados com uma negociação de sucesso. Por si só, este já é um processo que lembra um jogo. O texto que o analisa o compara com o Poker e com o xadrez. No poker, precisamos prever as intenções e os recursos que nossos adversários possuem. No xadrez, precisamos interpretar jogadas como sinais da estratégia de nosso adversário, podendo prever suas próximas jogadas e nos proteger contra elas. Tanto uma falha de especulação no poker quanto uma falha de leitura de estratégia no xadrez podem ter consequências desastrosas. Numa negociação, da mesma forma, essas são habilidades que devem ser empregadas corretamente para um resultado proveitoso. Seguindo adiante, o estudo de caso ainda aponta que para obter êxito em uma negociação, precisamos exercitar nossa capacidade de reconhecer padrões. Dessa forma, podemos analisar a situação de negociação em três níveis: 1. A predisposição da contraparte: A pessoa com a qual estamos negociando está disposta a cooperar? 2. Oportunidades de virar o jogo: Quais os melhores momentos para agirmos de forma a reverter o jogo ao nosso favor? 3. Introspecção: Qual a nossa própria estratégia? É preciso estar ciente das ações que executamos e por que as escolhemos. Esses três níveis possibilitam a criação de uma estratégia de negociação. O texto ainda propõe um exercício de pensamento em forma de jogo. Cada jogador possui um adversário, e cada um de nós pudesse escolher entre “cooperar” e “recusar”. Eis as regras: 1. Se ambos cooperarem, você ganha $ 2; 2. Se você cooperar e a outra parte recusar, você perde $ 2; 3. Se você recusar e a outra parte cooperar, você ganha $ 3; 4. Se ambas as partes recusarem, você perde $ 1. Essas regras iniciam o planejamento de um jogo baseado na experiência real de negociar. O que o autor do estudo fez foi procurar indícios nos processos de negociação que pudessem ser simulados. Devido à natureza do processo de negociação, existem similaridades naturais com processos de jogo: êxito e falha em uma negociação são como vitória e derrota em um jogo; a contraparte é como um adversário; e as diretrizes que tornam o sucesso mais provável podem ser traduzidas em regras como as acima. Se quiséssemos, portanto, gamificar o processo de negociação, esta seria a atitude adequada: achar as “regras” e a lógica do processo que poderia ser configurada em forma de jogo: um sistema controlado por regras no qual elementos podem agir para cumprir objetivos (no caso, conseguir mais “$” com suas escolhas de negociação). Se um processo não possui similaridades com elementos de jogo (ou se não conseguimos encontralas), é difícil sistematizar a gamificação dessa forma, o que é um dos motivos pelos quais acabase recorrendo a medidas externas ao processo: pontos, medalhas, rankings etc. Atividade proposta: A partir do que vimos nesta aula, vamos analisar mais um exemplo de gamificação, o site Duolingo: O site funciona como um catálogo de cursos de idiomaque funcionam como jogos. Com isso em mente, experimente o site rapidamente e tente dissertar sobre os seguintes itens: • Quais elementos de gamificação do site possuem efeitos apenas externos ao processo de jogo/aprendizado? • Quais elementos possuem efeito direto no processo de jogo em si? Nesta aula, você: Propôs a ideia de gamification como uma estratégia para engajar o usuário da interface; Analisou elementos de jogo internos e externos ao processo, e repensou seus usos como forma de engajamento. Propôs, finalmente, o processo de gamificação de um processo como a identificação de regras e elementos de jogo já presentes neste processo (e considerou algumas mecânicas como elementos externos, como pontos e medalhas). objetivos 1. Analisar a proposta da gamificação e apontar quais ferramentas estão escondidas nas suas aplicações mais comuns; 2. Confrontar essas ferramentas com exemplos práticos, a fim de compreender sua relação com os jogos digitais e os usuários/jogadores. Interfaces gamificadas, de uma forma geral, buscam soluções para tentar “prender” o usuário. Os elementos de jogo que supostamente adicionam seriam ferramentas para facilitar e/ou tornar a experiência mais prazerosa. Isso é feito, no contexto digital, principalmente através da mudança na linguagem da interface. Caso a interface comunique apenas através de ações pragmáticas, o prazer lúdico emerge com muitíssima dificuldade. Se o usuário está interagindo com a interface apenas para conseguir um prêmio, isso significa que sua mente está desconectada da experiência atual e focada na recompensa. O flow state, pelo contrário, mantem a concentração do usuário no que ele está fazendo: seu interesse nem é enfraquecido pela facilidade excessiva nem espantado por uma dificuldade frustrante. O flow state não é a única maneira através da qual os jogos convencem seus jogadores a continuar jogando. Existem outras formas de agir no sistema que exploram sensações de prazer, curiosidade, criatividade etc. Com isso em mente, considere as seguintes afirmações: I. A interface pode simular a propriedade dos jogos eletrônicos de permitirem o controle de objetos através de botões. O usuário pode controlar seu peso, velocidade etc. gerando uma sensação lúdica. II. O sistema gamificado pode ser composto por diversas peças que podem ser unidas em diferentes combinações para gerar diferentes resultados, o que incentiva a criatividade do jogador. III. A interface pode não gerar nenhuma dificuldade, mas pode esconder possibilidades e incentivar o jogador a descobrilas, gerando um processo lúdico. Uma recompensa não é um elemento de jogo por si só. A segunda alternativa demonstra esse fenômeno: no jogo, uma recompensa é como o fechamento de um ciclo de ações que compõem um processo lúdico (como montar um quebracabeça ou ganhar uma corrida). Na lógica behaviorista, ela funciona apenas como estímulo para incentivar ações que podem até mesmo ser monótonas e/ou repetitivas mas que, por algum motivo, queremos que o usuário realize. Tentamos mostrar que ferramentas como pontos, medalhas e itens colecionáveis podem ser usados para incentivar a ludicidade (o prazer de jogar) ou como simplesmente como formas de incentivar a realização de ações. Quando ela funciona apenas como incentivo, podemos dizer que é externa ao jogo, pois não se conecta com os processos em movimento. Dentre as opções abaixo, qual exemplifica um elemento de engajamento externo? Uma interface pode estipular níveis numerados. Cada vez que o jogador realiza 10 ações determinadas, ele ganha 50 pontos de experiência. Cada nível exige uma quantidade progressivamente maior de pontos para ser ultrapassado. A quinta alternativa exemplifica um recurso que separa as ações da recompensa. As ações realmente não importam, o que importa é que elas sejam realizadas. Para isso, criase um mecanismo de incentivo que não se conecta com o processo de interação. o aprendizado é um processo comum no design da interação no videogame, já que o usuário precisa agir no jogo. Cada sistema de regras pede um tipo de estratégia de ação. Da mesma maneira, aprender uma língua estrangeira ou a programar exige a apreensão de uma série de mecanismos e regras. Uma interface que tenha esse objetivo possui uma ligação imediata com jogos digitais, bastando apenas intensificar essa relação através da criação de objetivos, desafios etc. Se a interface do Codeacademy possui uma intenção mais alinhada com processos lúdicos, existem outras intenções menos alinhadas. Como seria possível identificar uma interface com menos possibilidades lúdicas, baseandose na sua intenção geral (criar um sistema de vendas para um site, por exemplo)? É preciso observar a dinâmica das ações que o usuário executará na interface. O exemplo da questão oferece poucas formas de inserir nesta dinâmica elementos de jogo, como aprendizado ou sensação de movimento. Quando falamos de jogo, falamos de ações e processos de interação. Se quisermos gamificar uma interface, devemos observar que tipo de ações são realizadas nela e buscar alguma conexão entre estas ações e uma possível organização lúdica: desafios que estabeleçam um aprendizado/flow state, a sensação de controlar objetos com peso e movimento, a possibilidade de conectar e reconectar pedaços do sistema para possibilitar a criatividade etc.
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