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introducao_aos_estudos_historicos (1)

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Introdução aos estudos históricos
LUCIANA LAMBLET
1ª Edição
Brasília/DF - 2018
Autores
Luciana LAMBLET
Produção
Equipe Técnica de Avaliação, Revisão Linguística e 
Editoração
Sumário
Organização do Livro Didático....................................................................................................................................... 4
Introdução ............................................................................................................................................................................. 6
Capítulo 1
O que é História? .......................................................................................................................................................... 7
Capítulo 2
O ofício do historiador ..............................................................................................................................................14
Capítulo 3
História: fatos, causalidade e verdade .................................................................................................................25
Capítulo 4
A relação entre História e memória .....................................................................................................................36
Capítulo 5
A história também tem sua História ....................................................................................................................48
Capítulo 6
Historiador no Brasil: debates contemporâneos .............................................................................................62
Referências ..........................................................................................................................................................................68
4
Organização do Livro Didático
Para facilitar seu estudo, os conteúdos são organizados em capítulos, de forma didática, objetiva e 
coerente. Eles serão abordados por meio de textos básicos, com questões para reflexão, entre outros 
recursos editoriais que visam tornar sua leitura mais agradável. Ao final, serão indicadas, também, 
fontes de consulta para aprofundar seus estudos com leituras e pesquisas complementares.
A seguir, apresentamos uma breve descrição dos ícones utilizados na organização do Livro Didático.
Atenção
Chamadas para alertar detalhes/tópicos importantes que contribuam para a 
síntese/conclusão do assunto abordado.
Cuidado
Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o 
aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado.
Importante
Indicado para ressaltar trechos importantes do texto.
Observe a Lei
Conjunto de normas que dispõem sobre determinada matéria, ou seja, ela é origem, 
a fonte primária sobre um determinado assunto.
Para refletir
Questões inseridas no decorrer do estudo a fim de que o aluno faça uma pausa 
e reflita sobre o conteúdo estudado ou temas que o ajudem em seu raciocínio. 
É importante que ele verifique seus conhecimentos, suas experiências e seus 
sentimentos. As reflexões são o ponto de partida para a construção de suas 
conclusões.
5
ORgAnIzAçãO DO LIvRO DIDátICO
Provocação
Textos que buscam instigar o aluno a refletir sobre determinado assunto antes 
mesmo de iniciar sua leitura ou após algum trecho pertinente para o autor 
conteudista.
Saiba mais
Informações complementares para elucidar a construção das sínteses/conclusões 
sobre o assunto abordado.
Sintetizando
Trecho que busca resumir informações relevantes do conteúdo, facilitando o 
entendimento pelo aluno sobre trechos mais complexos.
Sugestão de estudo complementar
Sugestões de leituras adicionais, filmes e sites para aprofundamento do estudo, 
discussões em fóruns ou encontros presenciais quando for o caso.
Posicionamento do autor
Importante para diferenciar ideias e/ou conceitos, assim como ressaltar para o 
aluno noções que usualmente são objeto de dúvida ou entendimento equivocado.
6
Introdução
Neste Livro Didático, você terá a oportunidade de conhecer a História como ciência, suas 
interseções com outros campos de conhecimento e a natureza do ofício do historiador.
Mais do que saber fatos sobre o passado, a História nos instrumentaliza a compreendê-los. Mas 
não entenda a História como uma ciência que olha apenas para trás; você perceberá neste Livro 
Didático que ela também tem instrumentos que o ajudam a compreender o tempo presente.
Objetivos
Este Livro Didático tem por objetivos:
 » Discorrer sobre objetos, fontes e ofício do historiador.
 » Compreender os conceitos de fatos, causalidade e verdade.
 » Refletir sobre a relação entre História e memória.
 » Conhecer a história da História.
7
Apresentação
Quando você contou aos seus amigos e familiares que faria Faculdade de História, provavelmente 
alguns deles lhe fizeram a seguinte pergunta: por que e para que se estuda História? Questionamentos 
que normalmente não são feitos aos estudantes de Medicina, Direito ou Arquitetura. A dificuldade 
de muitas pessoas em compreender o sentido de se pensar historicamente e de conhecer o 
passado tem inúmeras origens; porém, cabe a nós, professores da disciplina, diminuir essa 
distância entre o conhecimento histórico produzido academicamente e o conhecimento que 
circula entre os diletantes.
Isso somente ocorrerá quando tivermos clareza sobre o que faz o historiador, qual o seu ofício, 
quais as especificidades do campo da História, o que nos une e o que nos aproxima das demais 
ciências humanas e como podemos atuar cotidianamente nas nossas salas de aula e fora delas.
Este primeiro capítulo pretende ser uma contribuição às respostas a tais questionamentos, 
visando compreender o que é História e qual o papel do historiador.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo deste capítulo, você seja capaz de:
 » Definir o que é História. 
 » Compreender o campo específico do historiador.
Como definir História?
Definir História pode, a princípio, nos parecer algo fácil. De forma geral, as pessoas associam os 
estudos históricos ao estudo do passado. Mas será mesmo apenas isso? Em primeiro lugar, estamos 
falando em passado do quê ou de quem? O que significa afirmar que estudamos o passado? 
1CAPÍTULOO QUE É HIStÓRIA?
8
CAPÍTULO 1 • O QUE É HIStÓRIA?
Provocação
De forma geral, nos é questionada a importância e a relevância da História para o cotidiano e para os dias atuais. Por que 
olhamos para trás? Em que o passado pode ajudar o presente?
A seguir seguem trechos de um artigo do historiador britânico Eric Hobsbawm, em que serão levantadas algumas 
provocações sobre tais questionamentos.
O que a História tem a nos dizer sobre a sociedade contemporânea?
[...] Durante a maior parte do passado humano – na verdade, mesmo na Europa Ocidental, até o século XVIII –, supunha-se que 
ela pudesse nos dizer como uma dada sociedade, qualquer sociedade, deveria funcionar. O passado era o modelo para o presente 
e o futuro. [...]. Daí o significado do velho, que representava sabedoria não apenas em termos de uma longa experiência, mas da 
memória de como eram as coisas, como eram feitas e, portanto, de como deveriam ser feitas. [...]
[...] Admito que, na prática, a maior parte do que a história pode nos dizer sobre as sociedades contemporâneas baseia-se em 
uma combinação entre experiência histórica e perspectiva histórica. [...]
[...] Por que [...] todos os regimes fazem seus jovens estudarem alguma história na escola? Não para compreenderem sua 
sociedade e como ela muda, mas para aprová-la, orgulhar-se dela, serem ou tornarem-se bons cidadãos dos EUA, da 
Espanha, de Honduras ou do Iraque. E o mesmo é verdade para causas e movimentos. A história como inspiração e ideologia 
tem uma tendência embutida a se tornar mito de autojustificação. Não existe venda para os olhos mais perigosa que essa, 
como demonstra a História de nações e nacionalismos modernos.
É tarefa dos historiadores tentar remover essas vendas ou pelo menos levantá-las um pouco, ou de vez em quando,e, à 
medida que o fazem, poder dizer à sociedade contemporânea algumas coisas das quais ela poderia se beneficiar, ainda que 
hesite em aprendê-las. [...] 
(HOBSBAWM, Eric, 1998, p. 37-48)
A partir dos trechos anteriores, seguem algumas questões para uma reflexão inicial:
Se a História não deve ser vista como um modelo, nem para o passado e nem para o futuro, o que é e para que serve a 
História?
De que forma a História pode ser utilizada por nações e nacionalismos, como aponta Hobsbawm?
Como as sociedades contemporâneas poderiam se beneficiar com o conhecimento histórico?
O historiador francês Marc Bloch (1997) contribuiu muito para que repensássemos o ofício do 
historiador. Em primeiro lugar, Bloch critica a tradicional visão de que História é simplesmente a 
ciência do passado, pois tal afirmativa retira do historiador os seus dois objetos centrais: o homem 
e o tempo. Dessa forma, o autor sugere que entendamos a História como a ciência dos homens 
no tempo. Ou seja, nosso objeto é o homem, mas não qualquer homem, como um ser único e 
comum, mas o homem em um determinado tempo histórico, na sua temporalidade específica.
Tal assertiva merece, ainda, que nos debrucemos sobre ela, pois estudar os homens no tempo 
não é tão simples assim. Esse exercício exige de nós uma série de cuidados que perpassará toda 
a nossa disciplina. 
O primeiro cuidado que devemos ter é o que Bloch chama de “ídolo das origens”: a tentativa 
de explicar um fenômeno histórico buscando no passado a resposta, num eterno movimento 
9
O QUE É HIStÓRIA? • CAPÍTULO 1
de causalidade. Segundo o autor, se seguirmos esse caminho chegaremos a Adão e Eva para 
explicarmos nosso contexto atual. O que Bloch pretende nos dizer é que encontramos a explicação 
de um determinado fenômeno histórico dentro do estudo do seu momento e não fora dele. 
Vamos a um exemplo? Se quisermos compreender o contexto europeu que levou à Grande Guerra 
devemos buscar as respostas na Europa oitocentista e nos anos iniciais do século XX, nos seus 
conflitos, nas suas tensões e animosidades, nos sistemas econômicos, sociais e políticos que 
regem seus países e nas relações internacionais entre eles. Pouco nos ajudaria retornarmos às 
disputas napoleônicas ou à Revolução Francesa e seus ideais espalhados pelo território europeu. 
Muito menos seria vantajoso nos remeter à formação das monarquias absolutistas europeias 
e às disputas territoriais entre esses Estados Nacionais. É o próprio contexto da Grande Guerra 
que nos ajudará a compreendê-la. É no momento em que ela se deu que estarão as respostas 
para o caminho do conflito mundial.
Essa ideia de Marc Bloch parte do princípio na crença em um provérbio árabe: “Os homens se 
parecem mais com o seu tempo que com os seus pais” (BLOCH, 1997, p. 94). Com isso, o autor 
acredita que as pessoas são frutos do seu tempo histórico, sem esquecer que, ao mesmo tempo 
em que se parecem com seu tempo, também constroem um novo tempo, uma nova sociedade. 
Isso porque não somos meros reflexos da sociedade à qual pertencemos, somos também agentes 
históricos, influenciamos e somos influenciados pelos sistemas econômico, político e social aos 
quais pertencemos. Marc Bloch não percebe a sociedade de forma estática, parada, mas em um 
eterno movimento que é realizado pelos seus agentes históricos: nós mesmos e nossos homens 
no tempo (nossos objetos de pesquisa).
Para refletir
A tentativa de compreender o que é História não vem apenas dos historiadores. Poetas, compositores e dramaturgos também 
contribuíram para compreender melhor a nossa disciplina. Veja, a seguir, o exemplo da canção interpretada por Chico 
Buarque de Hollanda:
E quem garante que a História
É carroça abandonada
Numa beira de estrada
Ou numa estação inglória
A História é um carro alegre
Cheio de um povo contente
Que atropela indiferente
Todo aquele que a negue
É um trem riscando trilhos
Abrindo novos espaços
Acenando muitos braços
10
CAPÍTULO 1 • O QUE É HIStÓRIA?
Balançando nossos filhos
Canción por unidad latinoamericana
Pablo Milanés – versão de Chico Buarque/1978
O que você achou dessa definição de História?
Por que o compositor afirmaria que a História atropela quem a negar?
Além de já ter ouvido que a História é a ciência do passado, provavelmente já lhe disseram que 
estudamos História para compreender o nosso presente. Tal afirmativa não está de toda incorreta; 
na verdade, podemos dizer que ela está incompleta. Se, como nos diz Bloch, a ignorância do 
passado nega a compreensão do presente, também ela compromete a ação futura. Se não 
compreendemos o nosso presente, como podemos refletir criticamente sobre ele e propor ações 
e alternativas futuras? 
O historiador espanhol Josep Fontana escreveu um livro intitulado História: análise do passado, 
projeto social (1998), que resume bem a ideia lançada por Bloch. O conhecimento e a análise 
do nosso passado nos permite lançar bases para um projeto que desejamos para nós e para as 
gerações posteriores. Essa é a relação que podemos traçar entre História, passado, presente 
e futuro. Portanto, cuidado! Muitas vezes nossos alunos nos questionam sobre a “função” da 
História e é por aí que podemos encaminhar a nossa resposta. Também é muito comum sermos 
indagados se conhecendo o passado podemos prever o futuro. E a resposta claramente é não, 
não fazemos previsões futurísticas. E por quê? Porque, como vimos, as sociedades estão em 
constantes transformações, não são as mesmas; por isso, a História não se repete, não se dá 
como em um ciclo. 
A relação entre História e presente não se encerra aí. Ela é uma estrada de mão dupla. Ao mesmo 
tempo em que conhecer o passado contribui para a nossa compreensão do presente, conhecer o 
presente também corrobora para a compreensão do passado. Como? A resposta está no próprio 
sujeito do conhecimento: quem analisa o passado é o historiador, e ele é uma pessoa do presente 
e que, portanto, sofre influências e influencia a conjuntura em que vive. Assim, quando esse 
historiador olha para o passado, ele olha a partir da sua visão de mundo, do seu contexto histórico 
e faz perguntas ao passado a partir das suas vivências e experiências. 
Você conseguirá compreender melhor essa questão ao longo do curso, quando perceber que a 
um determinado fenômeno histórico podem ser atribuídas diversas análises, até mesmo bastante 
contraditórias. Isso porque a História é escrita por pessoas que carregam em si subjetividade. 
Quando estudamos e escrevemos sobre algum assunto, não deixamos para trás quem nós somos. 
Embora tentemos buscar o máximo de objetividade possível, sabemos que não conseguiremos 
alcançar a objetividade pura. Isso porque a História não é uma ciência pura, completamente 
objetiva. Ela carrega consigo um quê de subjetividade e de interpretação.
11
O QUE É HIStÓRIA? • CAPÍTULO 1
Prova disto é a afirmativa de Marc Bloch que o historiador faz escolhas. Tais escolhas se iniciam 
logo no primeiro momento da pesquisa: qual será meu corte cronológico? Que região abarcarei? 
Qual base teórica escolherei? Que metodologia seguirei? Estudarei grandes personagens ou 
trabalhadores anônimos? Optarei por História política, econômica ou cultural? Farei uma História 
a partir da perspectiva de gênero? Todas essas questões implicam realizar escolhas. E todas as 
escolhas envolvem subjetividade. Portanto, seria muito improvável escrever História puramente 
a partir de critérios objetivos.
Atenção, isso não quer dizer que a História possa ser escrita como um livro de literatura, um 
romance ou poesia. História não é ficção, ela se utiliza de métodos (assunto que será estudado 
por você em outra disciplina) por rigor acadêmico, por pesquisa científica. Ela não é invenção, 
mas é, também, interpretação e análise, portanto, carrega um pouco de subjetividade. 
Provocação
Como estamos discutindo, a História não é uma ciência neutra, puramente objetiva. Não negamos a ela o toque – e até 
mesmo a importância – da subjetividade. Issonos leva a outras questões: se não há objetividade absoluta, quem “decide” 
quais datas são importantes e se transformam em feriado? De onde vêm nossos heróis? Quem os escolhe? 
Essas questões são importantes para serem lançadas aos nossos alunos e ajudam a desnaturalizar as “datas importantes” e os 
feriados cívicos.
Observe a charge a seguir e reflita sobre a crítica ali inserida. Qual a relação entre a galeria de heróis e as ovelhas? O que o 
autor da charge está querendo nos dizer?
(http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=5455, último acesso em 20/08/2014)
A seguir, seguem trechos em que o historiador Jamie Pinsky (2013) levanta pontos interessantes para essa discussão:
De heróis e de História
[...] Mitos de origem não são, pois, privilégios das nações – já que ocorrem nas religiões e nas famílias -, mas é aí que vemos 
o passado idealizado ser mais cultuado. Grandes nações não se conformam com um presente brilhante, precisam elaborar 
uma origem diferenciada, especial. Histórias fantásticas são criadas para sustentar passados desejados, nomes de pais e 
12
CAPÍTULO 1 • O QUE É HIStÓRIA?
mães da pátria são repetidos geração após geração, a ponto de fazer parte do imaginário coletivo. Heróis são glorificados 
(até santificados, como no caso de Joana D’Arc), sua presença é tão viva e próxima que questionar a perfeição deles provoca 
comoção e revolta entre a maioria de seus adoradores incondicionais. Há mesmo que se tomar certo cuidado ao se discutir a 
humanidade – e, portanto, as falhas – desses heróis.
E no Brasil? Os mais velhos haverão de se lembrar de uma série de atividades assim chamadas “cívicas” que permeavam a 
vida dos estudantes há mais de quarenta anos: estudavam-se hinos, não só nosso belo, mas longo hino principal, como os da 
bandeira, da Independência e muitos outros. Nosso pendão (ou lábaro, como se dizia) era hasteado em diversas ocasiões, e 
as pessoas sabiam de cor o hino apropriado a cada solenidade. Dia 7 de setembro, na Sorocaba da minha adolescência, era 
dia de todos os colégios desfilarem: metade da cidade assistia, sob um sol inclemente, aos milhares de alunos que estufavam 
o peito e batiam com força o pé esquerdo no ritmo da fanfarra.
O regime militar, instaurado em 1964, levou esse “civismo” ao extremo, diminuindo as aulas de História e criando uma 
aberração típica de ditaduras chamada “educação moral e cívica”. Como dizia o nome, o conceito era inculcar aquilo que 
os militares e seus aliados consideravam moral e cívico, com destaque para a comemoração dos feitos de Caxias e do 
aniversário do que eles chamavam de “Revolução” de 31 de março. [...] A tentativa de militarização do civismo resultou, a 
médio prazo, na negação do próprio civismo, tido e havido como coisa de militares reacionários e chauvinistas. O resultado 
da ópera é que, confundindo o bebê com a água do banho, as escolas e a população, como vingança, desenvolveram pouco 
apego à bandeira, não sabem cantar sequer o Hino Nacional e as pessoas acabam não cultivando as representações da 
identidade nacional. [...]
Afinal, com todos os defeitos que possam ter tido, figuras como Tiradentes e José Bonifácio dedicaram grande parte do seu 
tempo e energia em favor de interesses coletivos. Suas figuras podem voltar a funcionar como elementos definidores do 
nosso passado comum – e a consciência do passado comum é que identifica os cidadãos de uma nação. Claro que junto a 
esses devemos trabalhar com figuras igualmente representativas de diferentes setores de nossa população, talvez alguém 
como Zumbi, Anita Garibaldi, elementos representativos das culturas indígenas e dos imigrantes que ajudaram a construir 
este país, assim como gente da cultura tipo Carlos Gomes e Villa-Lobos, Machado de Assis e Graciliano Ramos, e por aí afora. 
Agora, em pleno estado de direito, já é hora de repensar nossos símbolos. Exaltar nossos heróis, oferecê-los como traço 
positivo de união nacional e motivo de orgulho não precisa ser algo que faça referência a governantes ou mesmo ao Estado. 
Pode, simplesmente, estreitar os elos entre o povo e sua nação.
(PInSKY, 2013, pp. 44-46)
Pense no seu tempo de aluno do ensino básico e reflita acerca de símbolos e heróis que foram exaltados. Que importância e 
significado tais elementos tiveram na construção da sua identidade nacional e da sua cidadania?
Como professor de História, você acredita na importância da construção de símbolos e heróis para a aprendizagem do 
processo histórico do Brasil? Por quê?
Em suma, como Bloch nos apontou, podemos afirmar que as experiências do presente contribuem 
para a reconstrução do passado. O que quer dizer que o passado em si não se modifica, mas o 
conhecimento do passado é coisa em progresso, em mudança, em movimento. Ele se transforma 
porque os historiadores se transformam, possuem diferentes visões de mundo, estudaram em 
diferentes universidades, experimentaram diversas realidades materiais, escreveram e estudaram 
em espaços e tempos diferenciados. 
Tal fato é fácil perceber quando estamos em uma livraria. Se solicitarmos um livro sobre escravidão 
no Brasil, por exemplo, provavelmente o atendente trará vários títulos, de diversos autores, sendo 
eles historiadores ou não, brasileiros ou estrangeiros. Faça o teste de casa mesmo. Entre no site 
de uma boa livraria e escreva uma palavra-chave, como escravidão ou escravo, e veja quantas 
13
O QUE É HIStÓRIA? • CAPÍTULO 1
opções de compra você terá. Isso ocorre porque nenhum tema se esgota em si mesmo e, no caso 
citado, do século XIX até os dias atuais muitos historiadores em diferentes contextos olharam 
para a escravidão carregando consigo suas experiências e vivências. 
Para refletir
Observe o quadrinho a seguir. Nela, Calvin afirma que “História é uma ficção que nós criamos para nos persuadirmos que os 
eventos são conhecíveis e que a vida tem ordem e direção”. 
(http://www.educadores.diaadia.pr.gov.br/modules/mylinks/singlelink.php?com_mode=flat&com_order=0&lid=21282&cid=13, último acesso em 15/08/2014)
O que você acha dessa afirmação?
Você concorda com ela?
Por quê?
Sintetizando
Vimos até agora:
 » A História é a ciência do homem no tempo. Isso significa que a disciplina possui 
metodologia científica e que seu objeto de estudo é o homem em um determinado 
tempo histórico.
 » A História se relaciona com o passado, o presente e o futuro. Sendo análise do passado, 
a disciplina contribui para o conhecimento do presente (sem esquecer da relação de 
mão dupla). Conhecendo melhor o nosso presente, podemos traçar projetos para o 
futuro de forma mais consciente.
 » O historiador é alguém que atua no presente; por isso, conhecer a própria realidade 
contribui para a compreensão das perguntas que fazemos ao passado. 
 » O historiador é uma pessoa que, como qualquer outra, carrega subjetividades. Assim 
sendo, não há a possibilidade de uma História neutra, plenamente objetiva.
14
Apresentação
Neste capítulo discutiremos um ponto fundamental para o ofício do historiador: as fontes 
históricas e como devemos trabalhar com elas. É importante salientar que, por ora, a disciplina 
apenas o introduzirá na discussão das fontes, que será aprofundada em outras disciplinas, tais 
como Teoria e Metodologia da História. 
A forma como o historiador escolhe, trabalha e analisa as suas fontes irá influenciar diretamente 
na sua escrita e pesquisa histórica. Da mesma forma, um professor que consiga apresentar 
essas fontes históricas aos seus alunos e estimular a sua análise também perceberá mudança 
significativa no processo de ensino-aprendizagem. 
A seguir, discutiremos aquilo que o historiador Marc Bloch (1997) denominou “os pecados do 
historiador”, ou seja, perspectivas que devemos evitar quando estamos analisando as nossas 
fontes, seu tempo histórico e as relações sociais ali presentes.
Ao final, propomos a você que pense e analise algumas fontes históricas: cartas, músicas e peças 
teatrais.
Objetivos
Esperamos que, após o estudodo conteúdo deste capítulo, você seja capaz de:
 » Identificar o que é uma fonte histórica.
 » Diferenciar o ato de compilar do ato de analisar fontes.
 » Compreender a necessidade de evitar julgamentos e anacronismos no estudo da História.
 » Perceber as diversas possibilidades de fonte histórica.
2CAPÍTULOO OFÍCIO DO HIStORIADOR
15
O OFÍCIO DO HIStORIADOR • CAPÍTULO 2
As fontes históricas
Um ponto central no que diz respeito ao ofício do historiador é a sua relação com as fontes 
históricas. O que são fontes históricas? O que pode ser considerada fonte histórica? E o que não 
pode ser considerada fonte histórica? Quais são os critérios para selecionarmos uma fonte? 
Podemos começar a responder tais questões retornando ao capítulo anterior. Se a História é a 
ciência dos homens no tempo, as fontes históricas podem ser tudo aquilo que o homem produziu 
em seu tempo. E produção aqui não se resume apenas à transformação de matéria-prima em 
bens de consumo, mas tudo o que ele tocou e transformou. Nesse sentido, leis, manuscritos, 
discursos oficiais têm o mesmo valor para nós historiadores que cartas, diários, música, cinema, 
teatro e literatura. Pintura, dança, jornais, revistas, selos, enfim, tudo que a humanidade produziu 
se transforma em fonte histórica na mão do historiador. 
Já a seleção dessas fontes em uma determinada pesquisa histórica dependerá de múltiplos 
fatores: qual o seu objeto de pesquisa? Qual a sua problematização? Qual a sua base teórica e 
metodológica? Tais questões você aprofundará em outras disciplinas, como a de Metodologia. 
O que é importante considerarmos aqui é que não há uma hierarquia “natural” das fontes. Um 
manuscrito oficial, produzido por um determinado governo, não é mais “verdadeiro” e “confiável” 
que um poema escrito por um jovem trabalhador. Importante compreender que não há um grau 
de valoração entre as fontes; nenhuma é mais importante que a outra por princípio. O que irá 
determinar a seleção das fontes será o seu objeto de pesquisa e a sua metodologia, não o valor 
intrínseco do corpus documental.
Um ponto fundamental levantado por Marc Bloch (1997) em relação às fontes é que a investigação 
histórica não é simplesmente um registro do que dizem as testemunhas. Ou seja, um bom 
historiador não é simplesmente um compilador de fontes, ele deve ir além da junção dos 
testemunhos: ele deve questionar as fontes, deve fazer perguntas a elas. Isso porque as fontes 
não falam por si mesmas, elas devem ser interrogadas. O que quer dizer que não há observação 
passiva: o historiador não olha para a sua fonte esperando que ela lhe diga alguma coisa, pois 
elas só falam se soubermos interrogá-las.
Um exemplo é sempre esclarecedor. Suponhamos que daqui a duzentos anos um historiador 
deseje estudar a nossa sociedade atual. Ele escolhe começar pela nossa Constituição promulgada 
em 1988. Lá ele encontrará que o Estado deve garantir moradia e educação para todos. Se ele 
não perguntar, não questionar, chegará à conclusão que no Brasil, na década de dez dos anos 
dois mil, não havia moradores de rua e nem mesmo crianças e adolescentes fora da escola. É 
isso mesmo que ocorre? 
16
CAPÍTULO 2 • O OFÍCIO DO HIStORIADOR
Se for um bom historiador, escolherá outras fontes (jornais, por exemplo) e verá que mesmo 
com garantias constitucionais havia ainda moradores de rua e jovens sem estudar. E poderá 
se questionar: por que a lei não se fazia cumprir? Quais as dificuldades? Quais os interesses e 
conflitos que estavam por trás do não cumprimento da Constituição? 
Agora, observe a tirinha a seguir:
(http://www.gramsci.org.ar/mafalda/mafalda.htm, último acesso em 30/08/2014)
Nela, a personagem Mafalda lê no dicionário a definição de “Democracia”, solta uma gargalhada 
e não consegue mais parar de rir. Por que você acha que isso ocorreu? Porque ela observou que 
a definição da palavra não condiz com a realidade em si. Podemos dizer que, de certa forma, 
Mafalda fez a crítica da fonte. Ela não aceitou simplesmente o que estava escrito, ela observou o 
real e chegou à conclusão de que os dois aspectos (a definição e a sua realidade) não condiziam.
O fundamental é não olharmos para um testemunho como uma fonte de verdade inquestionável, 
pois “até o policial mais ingênuo sabe que não se deve forçosamente acreditar naquilo que 
as testemunhas dizem” (BLOCH, 1997, p. 122). Bloch aqui nos alerta para algo essencial: a 
importância de saber duvidar. A dúvida deve estar na pergunta mais básica: essa fonte é verídica 
ou construída posteriormente, falsificada? Até nas questões mais profundas: quem a elaborou? 
Para quem? Quais interesses estavam por trás? Quem é o emissor, qual a mensagem e quem foi 
o receptor? É a isso que o historiador francês chama de crítica das fontes.
Para refletir
O historiador Jaime Pinsky também se preocupa com a necessidade de questionar as fontes e não somente reproduzi-las. Nos 
trechos a seguir, retirados do livro Por que gostamos de História (2013), você poderá analisar um exemplo dessa perspectiva, 
ainda que o autor se refira a um trabalho jornalístico:
17
O OFÍCIO DO HIStORIADOR • CAPÍTULO 2
Notícias de jornal
[...] Para que a dignidade do registro não fique comprometida, o jornalista não pode reproduzir acriticamente releases de 
empresas, governos, ONGs, órgãos de classe e demais materiais produzidos por assessores de imprensa. Esse material pode 
ser ponto de partida para a elaboração da matéria, nunca ponto de chegada. E a prova de que esses releases são utilizados 
com muita frequência se evidencia em diversas matérias publicadas nos jornais não só com a mesma informação, ou 
orientação, mas até mesmo com a mesma redação. Copiar e colar é um comodismo que não condiz com o compromisso, 
com a verdade. 
Exemplo recente disso? Um conhecido e respeitado jornal da capital paulista, no início de 2011, estampava o resultado de 
uma pesquisa realizada pela fundação Perseu Abramo, segundo a qual teria havido, de alguns anos para cá, uma queda 
no número de mulheres agredidas por seus parceiros: “apenas” cinco a cada dois minutos, contra oito nos mesmos dois 
minutos, em pesquisa realizada anos atrás. O jornal ainda “informava” que um dos principais motivos das agressões era “o 
ciúme”.
Não conheço a pesquisa, mas mesmo que ela tenha apontado o ciúme como uma das principais razões das agressões, 
não é difícil entender que ciúme não mata nem agride; o que mata e agride é o sentimento de propriedade que muitos 
homens ainda têm com relação às suas esposas, companheiras ou namoradas (algo que se estende a muitas ex-esposas, ex-
companheiras e ex-namoradas).
Um jornalista (e um editor?) um pouco mais cuidadoso diria, no mínimo, que ciúme foi o motivo alegado pelos agressores, 
o que muda muito, não é? Se o número de mulheres agredidas baixou, será que o sentimento de ciúmes teria baixado 
ou a sociedade está tendo sucesso em reprimir a violência, ou ainda, será que, finalmente, uma parcela de homens está 
percebendo que relações homem-mulher não podem mais ser baseadas em sentimentos e manifestações de posse? Mesmo 
assim, fazendo uma simples continha “de vezes”, continuamos tendo no Brasil cerca de 1 milhão e meio de mulheres 
agredidas por ano! Mas nada disso parecia relevante para o jornal.
O historiador, necessariamente, deve lidar com esses dados (de fontes primárias e devidamente checados) dentro de uma 
perspectiva mais ampla da relação homem-mulher na história. Trabalhando com séries de dados confiáveis poderá entender 
o que se passou e, talvez, perceber tendências. E arriscar. Afinal, não só os economistas têm o direito de errar sobre o futuro.
(PInSKY, 2013, pp. 38-39)
A partir da leitura anterior, reflita: 
O jornalista realizou a crítica das fontes? Por quê?
Ao transcrever apenas o que as testemunhas disseram no que isso pode ter prejudicado a análise?
Como o historiador deveria abordar a questão, segundo Pinsky?
Assim, o que está por trás desta relação entre historiador e fonte histórica é “o que procuramosconhecer”. Para explicar essa questão, Bloch recorre à metáfora do médico. Segundo o historiador, 
um médico, ao adentrar o quarto de um paciente, percebe seu estado, afere sua pressão, confere 
sua temperatura, examina seus olhos, garganta e reflexos. Provavelmente, ao sair do cômodo 
não saberá descrever a cor da cortina, os quadros, ou maiores detalhes do quarto. Isso porque 
apenas somos capazes de ver e ouvir bem aquilo que procuramos conhecer. Assim deve acontecer 
também com o historiador em relação à sua fonte, ao seu objeto de pesquisa: deve ver e ouvir 
profundamente em busca daquilo que deseja conhecer. 
18
CAPÍTULO 2 • O OFÍCIO DO HIStORIADOR
De forma geral, Bloch nos atenta que não há uma receita pronta para a crítica das fontes. 
Inicialmente, o que devemos “testar” é o princípio da contradição e o afastamento da prática 
comum: a escrita de tal testemunho é compatível com a forma de escrever de sua época? Ao 
contrapor com demais testemunho há contradições? Que tipo de contradições? Como elas 
aparecem e como afetam a pesquisa histórica? 
Saiba mais
Em geral, olhamos os museus, centros de cultura e galerias de arte como espaço que abrigam fontes históricas. Assim, 
estariam depositados ali material para a análise de historiadores e visitantes. 
No entanto, tais espaços por si mesmos podem ser compreendidos como fontes históricas. Sim, podemos ter como análise a 
própria história e estrutura física do museu como objeto de pesquisa. O historiador Peter Burke em uma coluna para o jornal 
brasileiro Folha de São Paulo nos brinda com algumas reflexões acerca dessa temática.
Observando museus
Da próxima vez que entrar num museu, seja o do Ipiranga, o Louvre ou o Britânico, reserve algum tempo para observá-lo em 
si. Os museus são muito mais do que mero receptáculos dos objetos exibidos. Têm história e podem nos contar muita coisa 
sobre a época em que foram construídos.
Um museu era orginalmente um lar para as Musas. A partir do Renascimento, o termo foi aplicado a coleções particulares 
de antiguidades, pinturas e criaturas exóticas, como crocodilos, tatus e peixes tropicais, que os europeus consideravam 
maravilhas da natureza. As coleções de alguns reis atingiram proporções enormes. Depois de 1789, porém, houve um 
movimento para abrir as galerias reais, aristocráticas e eclesiásticas e tornar seus tesouros mais disponíveis ao público (mais 
ou menos identificado com a classe média). [...]
O sistema clássico precisa ser colocado na perspectiva histórica. Foi estabelecido por uma mistura de razões. Havia o ideal 
revolucionário de democratizar as artes, de arrebatar a cultura dos príncipes e torná-la disponível para um público mais 
amplo. [...]
Os principais arquitetos eram empregados para projetar esses edifícios. O museu do Ipiranga, com suas estátuas dos heróis 
da história nacional e suas esferas de vidro contendo água dos principais rios brasileiros, faz parte de uma tendência 
internacional, a da construção de edifícios majestosos com a função de reforçar a identidade de uma nação (ou império), 
colocando seus tesouros em exibição pública.
As novas instituições também refletiam uma preocupação dos líderes nacionais com a educação do povo, especialmente da 
classe operária urbana. O Victoria and Albert Museum foi fundado pelo casal real na época da Grande Exposição de 1851 a 
fim de encorajar as artes aplicadas, ou industriais, tornando exemplos tradicionais mais acessíveis aos artesãos. [...]
Os principais museus eram apresentados ao público como palácios da cultura, templos para o culto das artes, locais 
sagrados ao qual os visitantes chegavam como peregrinos seculares, geralmente aos domingos, levando os filhos, mas 
tentando mantê-los quietos. Os objetos ali apresentados geralmente exemplificavam a alta cultura [...].
A arquitetura dos museus frequentemente revela as concepções dos fundadores com clareza. O museu Britânico, por 
exemplo, foi desenhado para parecer um templo grego antigo, enquanto o Victoria and Albert Museum se parece – em parte, 
pelo menos – com um palácio italiano do Renascimento. A decoração dos novos edifícios também nos diz muita coisa sobre 
as concepções contemporâneas de cultura. [...]
Hoje, o cânone tradicional dos grandes escritores e artistas é rejeitado por muitos professores nos Estados Unidos e em 
outros lugares por causa daquilo que exclui – a cultura popular, o trabalho das mulheres, das minorias étnicas e assim por 
diante. Existem também críticas à exibição em redoma de objetos arrancados dos contextos originais em igrejas ou casas, 
assim como houve muitas críticas às tentativas de separar a esfera da arte da vida social. Poderíamos dizer que o museu
19
O OFÍCIO DO HIStORIADOR • CAPÍTULO 2
clássico do século XIX está se transformando numa peça de museu – mas uma peça que certamente é tão merecedora do 
nosso interesse e de nossa atenção quanto os objetos que contém.
(BURKE, 2009, 290-293)
Os “pecados” do historiador
Marc Bloch aponta para dois erros comuns entre os historiadores que acabam por enfraquecer 
a análise histórica: o julgamento e o anacronismo. Vamos compreender esses dois “pecados” 
separadamente.
É comum, quando dizemos que estudamos História, ou mesmo em sala de aula com nossos 
alunos, nos perguntarem algo como: afinal, Vargas foi bom ou ruim? Qual foi o melhor presidente? 
Quem você acha pior, Stalin ou Hitler? Os Estados Unidos erraram ao apoiar o Golpe Civil-Militar 
de 1964? 
Certo, errado, bom, mau, melhor ou pior são julgamentos de valores. E a História não é um tribunal. 
Não iremos redimir, absolver ou condenar ninguém. Não temos esses poderes e não objetivamos 
tê-los. Porque a tarefa do historiador é compreender e não julgar. Por mais que nos pareça óbvio 
repudiar o assassinato de cerca de seis milhões de judeus ocorrido durante o domínio nazista, 
ganharemos mais e colaboraremos mais com a sociedade se conseguirmos compreender por 
que ele ocorreu. Como pudemos chegar a esse ponto? Responder essa questão contribuirá mais 
do que simplesmente dizer que os nazistas eram maus, errados e injustos. 
Segundo Bloch, quando julgamos perdemos o gosto de explicar e a realidade humana, tão 
complexa e rica, ficaria reduzida a um quadro em preto e branco, dividido simplesmente entre 
heróis e bandidos, certos e errados, justos e injustos, bons e maus. 
O anacronismo – o mais imperdoável dos pecados, segundo Bloch – deve ser motivo de cuidado 
constante por parte do historiador. Tal pecado ocorre quando lançamos conceitos, visões de 
mundo e experiências de uma época para outro contexto histórico e acabamos por tentar 
compreender uma sociedade à luz de fenômenos históricos que não a pertenceram. De forma 
geral, o anacronismo leva ao julgamento, pois ao “exigirmos” de uma época aquilo que ela não 
pode nos “dar”, acabamos por julgá-la. 
Mais uma vez, seria interessante exemplificarmos. Suponhamos olhar para a guerrilha urbana 
que ocorreu no Brasil durante a ditadura militar. Passadas décadas, os próprios militantes em 
suas entrevistas geralmente afirmam a improbabilidade da vitória, pois não havia suficiente apoio 
popular para realizar a revolução, a repressão possuía um poder bélico e logístico muito superior ao 
deles, enfim, as condições históricas não eram favoráveis a um movimento daquela envergadura. 
Hoje, pode-se interpretar assim. Mas um historiador que for analisar a opção pela guerrilha nas 
20
CAPÍTULO 2 • O OFÍCIO DO HIStORIADOR
décadas de 1960 e 1970 não deve dizer que as escolhas foram mal feitas, que os revolucionários 
não compreendiam o contexto da época. Isso seria anacrônico. Os guerrilheiros vivenciavam uma 
realidade de Guerra Fria, num país repressor e autoritário, com movimentos sociais em expansão 
pela América Latina e a vitória da revolução Cubana, logo ali, lembrando a possibilidade de derrotar 
o “Grande Irmão”. Portanto, taxá-los simplesmente de sonhadores, inconsequentes ou até mesmo 
irresponsáveis não ajudaria muito na análise histórica. O ideal nessecaso seria tentar compreender 
a conjuntura histórica que possibilitou que muitos jovens acreditassem na via revolucionário para 
dar fim ao governo militar e transformar a realidade brasileira. 
Outro exemplo podemos retirar do quadrinho a seguir:
(http://crv.educacao.mg.gov.br/sistema_crv/index.aspx?&ID_OBJETO=31830&tipo=ob&cp=000000&cb=, 
último acesso em 15/07/2014)
Perceba que o aluno considera Colombo um “burro” por afirmar que a terra era redonda, embora 
os estudos da época afirmassem o contrário. Além do erro do próprio aluno, tais termos pejorativos 
não são incomuns nas salas de aula e devemos ficar atentos a eles, contribuindo para que nossos 
alunos não incorram no anacronismo.
Assim, mais uma vez vale relembrar que ao historiador cabe a responsabilidade da análise e da 
compreensão histórica. Não julgamos pessoas, ações ou governos e também não os legitimamos, 
buscamos apenas compreender como ocorreram, quais fenômenos históricos possibilitaram a 
sua realização e as consequências trazidas pelos processos históricos. 
Pensando as fontes – exemplos
No decorrer do seu curso de graduação você terá contato com diversos tipos de fontes históricas: 
entrevistas, documentos, leis, periódicos, músicas, literatura, teatro etc. Como vimos, toda a 
produção humana pode ser considerada fonte histórica e contribui para o conhecimento de 
um determinado período. Além de observar a diversidade do corpus documental utilizado por 
um historiador, também é importante que você perceba a forma como o estudioso interpretou e 
analisou as fontes escolhidas. E este é um verbo importante: escolher. O historiador seleciona as 
21
O OFÍCIO DO HIStORIADOR • CAPÍTULO 2
fontes com as quais ele vai trabalhar e isto já diz muito acerca da sua percepção sobre o processo 
histórico e do seu fazer historiográfico.
Assim, propomos a você uma breve reflexão sobre algumas fontes históricas que vamos apresentar 
agora. Pense um pouco sobre elas, imagine quais perguntas você faria às fontes e em qual 
caso você as utilizaria. Não deixe de dividir suas questões nos fóruns e espaços de debate, pois 
a análise das fontes é provavelmente o processo mais importante do ofício do historiador. 
Além disto, o trabalho com fontes em sala de aula contribui muito para o aprendizado dos nossos 
alunos, ajudando a elucidar questões mais complexas. Mas, para utilizá-las no ambiente escolar, 
é preciso que o professor tenha domínio sobre o manuseio das fontes e, para isso, tal exercício 
é fundamental. Vamos lá?
*Cartas
A seguir, duas missivas da década de 1870, nos Estados Unidos da América, em que mães solicitam 
às freiras que abriguem seus filhos:
Nova York, terça-feira
Bondosas Irmãs,
As senhoras vão encontrar um menino que completa um mês de idade amanhã o pai não vai fazer nada e ele é um 
pobrezinho a mãe dele precisa trabalhar para sustentar outros três e não pode fazer nada com este o nome dele é Walter 
Cooper e ele ainda não foi batizado as senhoras tenham bondade de fazer isso eu não gostaria que ele morresse sem batismo 
pode ser que algum dia a mãe queira ele de volta sou casada há cinco anos e casei direitinho e não pensei que meu marido 
fosse um homem mau eu tive de deixar ele e não podia deixar as crianças com ele agora eu não sei onde ele está se não eu 
dava o menino para ele eu quero que as senhoras cuidem dele por três ou quatro meses e se ninguém aparecer para buscar 
ele nesse prazo podem ter certeza de que a mãe não pode sustentar ele pode ser que algum dia eu mande um dinheiro para 
ele não esqueçam o nome dele
Respeitosamente,
Sra. Cooper
(USHER, 2014, p.77)
Irmã Superiora,
Sou uma pobre mulher e fui enganada com a promesa de cazamento; no momento estou sem condições e sem ninguém 
para sustentar meus filhos. E assim eu imploro pelo amor de deus que fique com meu filho até eu arrumar um emprego e ter 
o suficiente para poder criar ele. Espero que a senhora tenha a bondade de aceitar meu bebê e vou rezar pela senhora.
Sua humilde servidora
Teresa Perrazzo
Nova York, 3 de dezembro de 1874
(USHER, 2014, p. 78)
22
CAPÍTULO 2 • O OFÍCIO DO HIStORIADOR
Uma observação importante antes de passarmos para o próximo exemplo: quando transcrevemos 
uma fonte reproduzimos mesmo com seus erros de grafia e/ou gramaticais. Tais erros fazem 
parte da fonte e, por vezes, até mesmo da análise dela. Por isso, transcrevemos a fonte anteriores 
com seus erros originais, ok?
Agora você poderá ler a carta de fãs de Elvis Presley solicitando ao presidente dos Estados Unidos 
da América a liberação do cantor do serviço militar. Na época, Presley havia sido convocado para 
servir na Alemanha ocidental:
Caixa Postal 755
Noxon, Mont
Prezado presidente Eisenhower,
Minhas amigas e eu estamos escrevendo de Montana, Achamos que já é horrível Elvis Presley ter de servir o Exército, mas 
se cortarem as costeletas dele nós vamos morrer! O senhor não sabe o que sentimos por ele, eu realmente não entendo por 
que ele tinha de ir para o Exército, mas nós imploramos, por favor, por favor, por favor, não cortem o cabelo dele como o dos 
outros recrutas, ah, por favor, por favor! Se fizerem isso nós vamos morrer!
Adoradoras de Elvis Presley
Linda Kelly
Sherry Bane
Mickie Mattson
(USHER, 2014, p. 118)
Por último, propomos que você reflita sobre a carta enviada por Galileu Galilei a Leonardo Donato, 
doge de Veneza, apresentando sua mais nova invenção:
Príncipe Sereníssimo,
Galileu Galilei, humílimo servo de Vossa Alteza, sempre vigilante e provido de toda a boa vontade não só para satisfazer o 
tocante à cátedra de matemática em Pádua, como para escrever sobre a decisão de apresentar a Vossa Alteza um telescópio 
que será de grande serventia em atividades marítimas e terrestres. Asseguro-vos que guardarei segredo sobre essa invenção 
e a mostrarei unicamente a Vossa Alteza. O telescópio foi construído para o estudo mais acurado de objetos distantes. Esse 
telescópio tem a vantagem de permitir avistar navios inimigos duas horas antes de se tornarem visíveis a olho nu e de 
distinguir seu número e sua qualidade, avaliar sua capacidade e preparar-se para persegui-los, combatê-los ou fugir deles; 
em terra, em campo aberto, permite ver todos os seus detalhes e distinguir cada um de seus movimentos e preparativos.
(USHER, 2014, p. 134)
Após a leitura das cartas, retorne ao enunciado e reflita sobre as questões propostas. Compartilhe 
suas ideias e reflexões!
*Músicas e Peças Teatrais
O historiador Gustavo Alonso em seu livro Cowboys do asfalto (2015) discute a relação entre 
a música sertaneja e o processo de modernização do Brasil. Na obra podemos acompanhar a 
23
O OFÍCIO DO HIStORIADOR • CAPÍTULO 2
polêmica que diferencia uma suposta música autêntica caipira dos sertanejos que incorporavam 
novos instrumentos musicais, novas temáticas e, por vezes, flertes com os governos constituídos. 
De Tonico & Tinoco, passando por Leandro & Leonardo, até chegar a Michel Teló, Alonso nos 
traz uma análise desse gênero musical, muitas vezes rechaçado pelos intelectuais dos grandes 
centros urbanos.
O importante aqui é perceber que, para além das questões puramente artísticas e musicais, o 
historiador contribui para a compreensão do longo e árduo processo de modernização do país 
que se inicia ainda nos governos autoritários da ditadura militar e se estende pelo processo de 
democratização até aos dias atuais. Assim, a ligação entre cultura e política econômica se faz 
presente no livro. 
Com este exemplo, esperamos que você possa refletir sobre a produção cultural, como algo 
intrinsicamente ligado ao modo de o artista ver o mundo, de senti-lo e de experimentá-lo. Sendo 
ele um sujeito social, o que o envolve – a conjuntura de sua época, as questões daquele momento 
histórico – estarão de certa forma presentes na criação artística. 
Sendo produto e produtor de cultura, o sujeito histórico é influenciado e influencia o seu meio 
social. Isso também pode ser percebido nas peças teatrais. Vamos a dois rápidos exemplos:Calabar: elogio à traição (1973), de Chico Buarque e Ruy Guerra, aqui no Brasil, e As bruxas de 
Salém (1953), de Arthur Miller, nos Estados Unidos da América.
As duas peças teatrais se apropriam de eventos históricos ocorridos em seus respectivos países. 
Calabar se passa durante a invasão holandesa no nordeste brasileiro, enquanto As bruxas de 
Salém se refere à perseguição por suposta bruxaria às mulheres de Massachusetts; ambos 
acontecimentos têm o século XVII como cenário.
Podemos, então, concluir que os dramaturgos se apropriaram de fatos passados e os transformaram 
em peças. Seria a História se tornando teatro. Porém, uma análise aprofundada do texto nos 
aproximaria mais do contexto histórico dos escritores (segunda metade do século XX) que daquele 
encenado (século XVII). Ambos os textos estão carregados da crítica de Buarque, Guerra e Miller 
ao seu próprio tempo e não àquele apresentado na peça. 
Em Calabar, a discussão da traição está permeada por críticas ao patriotismo propagandeado 
pela ditadura militar no Brasil e sua repressão, enquanto As bruxas de Salém visam denunciar as 
perseguições e limitações à liberdade de expressão que estavam ocorrendo durante a década de 
1950, nos Estados Unidos, em decorrência da Guerra Fria e do suposto perigo do comunismo.
Assim, os dramaturgos utilizaram-se de eventos passados, de metáforas, analogias e alegorias 
para tecer críticas ao seu próprio contexto, à sua própria realidade. O olhar do historiador deve 
estar sempre atento a essas questões. No caso do teatro e das músicas, precisamos ir para além 
24
CAPÍTULO 2 • O OFÍCIO DO HIStORIADOR
das letras, do que está escrito. É necessário compreender o que está nas entrelinhas, o contexto 
que envolve aquela escrita, aquele artista.
Agora, sugiro que você reflita sobre algum gênero musical que você goste e pense como poderia 
trabalhar historicamente com ele. Há dramaturgos de sua preferência? Já analisou o contexto 
histórico de sua escrita? Procure os textos de Calabar e As bruxas de Salém e tente realizar uma 
análise das fontes. Que perguntas você faria a essas peças?
Sintetizando
 Vimos até agora:
 » Sendo a História a ciência do homem no tempo, toda e qualquer produção humana 
pode ser considerada uma fonte histórica.
 » As fontes não falam por si mesmas, elas devem ser questionadas e interrogadas pelo 
historiador. A análise das fontes é peça fundamental do ofício do historiador e também 
pode contribuir muito para o processo de ensino-aprendizagem no ambiente escolar.
 » A História não é um tribunal, portanto, o historiador não deve julgar sujeitos, fatos ou 
ações. É nosso papel compreender os processos históricos.
 » Um dos maiores pecados do historiador é o anacronismo que, em resumo, seria exigir 
de uma época histórica aquilo que ela não pode lhe oferecer. 
25
Apresentação
Neste capítulo, daremos continuidade à tentativa de responder às questões norteadoras de nossa 
disciplina: o que é História? O que faz o historiador? 
Num primeiro momento, trouxemos as contribuições do historiador francês Marc Bloch, no que 
tange à definição de História, aos “pecados” do julgamento e do anacronismo, às fontes utilizadas 
na pesquisa histórica, à relação entre História, presente, passado e futuro.
Agora focaremos em três novas problemáticas que permeiam o ofício do historiador: os fatos, as 
causas e a relação da História com a verdade. Para tais discussões utilizaremos, especialmente, 
a obra de dois grandes pensadores: Edward Carr e Adam Schaff. 
Importante ressaltar que as visões apresentadas no Circuito 1 não são antagônicas às que vamos 
trabalhar agora, mas, ao contrário, são complementares e nos ajudam a compreender melhor a 
disciplina História e o papel do historiador.
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo deste capítulo, você seja capaz de:
 » Compreender o que é um fato histórico e a relação entre o fato, o historiador e a disciplina 
histórica.
 » Identificar o papel do fato e da causalidade na análise dos objetos de pesquisa do 
historiador.
 » Questionar a presença ou não da verdade na disciplina histórica.
3
CAPÍTULO
HIStÓRIA: FAtOS, 
CAUSALIDADE E vERDADE
26
CAPÍTULO 3 • HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE
A questão dos fatos e da causalidade na história
Não é incomum ouvirmos que o historiador é alguém que nos conta os fatos ocorridos no passado. 
No entanto, tal perspectiva se apresenta deveras reducionista. Sendo apenas esta a nossa função, 
bastaria irmos aos arquivos e bibliotecas, compilarmos as fontes e narrarmos o que lemos. De 
certo, não precisaríamos de uma formação acadêmica para realizar essa tarefa.
Duas questões se apresentam para refutarmos a ideia de um historiador que apenas “conta 
os fatos do passado”. A primeira já discutimos parcialmente nos capítulos anteriores e iremos 
aprofundar aqui. O historiador não olha passivamente para as suas fontes, ele as questiona, faz 
perguntas para elas, analisa, interpreta o contexto, pensa nas contradições e nos movimentos 
das sociedades. Nesse sentido, ele não é apenas um narrador, um reprodutor/transmissor de 
fontes produzidas no passado. Ele é alguém que pensa sobre o passado e o questiona.
A segunda questão está na ênfase nos fatos. Como veremos a seguir, os fatos são materiais 
importantes a serem trabalhados e analisados pelo historiador, porém a análise do pesquisador 
não se encerra nele. Mais do que nos fatos, a atenção do historiador deve voltar-se para o processo, 
o movimento. 
Exemplifiquemos: na virada do mês de março para abril de 1964, ocorreu o Golpe Civil-Militar, 
instalando um processo ditatorial no Brasil. Isso é um fato extremamente importante para a 
história do nosso país. Qualquer pessoa que deseja estudar o Brasil contemporâneo deve levar 
esse fenômeno histórico em conta para que sua análise ganhe consistência. 
Porém, o Golpe foi a culminância de um processo e o início de outro. Assim, o historiador deverá 
compreender quais os movimentos, as ações, as disputas e conflitos que levaram ao Golpe. Qual 
era a conjuntura brasileira da década de 1960? A resposta a essa pergunta elucidará ainda mais 
questões do que o Golpe (o fato) em si. 
Edward Carr, em seu livro Que é história? (1996), também critica a visão de que caberia ao 
historiador somente “mostrar o que realmente passou”. Isso seria reduzir o nosso ofício a apenas 
compiladores de fontes, em uma narrativa linear, em que um fato seria seguido por outro e assim 
sucessivamente. 
Essa visão estaria ainda muito atrelada aos defensores do positivismo, que estavam focados na 
necessidade de a História alcançar o status de ciência. Para isso, ela deveria se apoiar em um 
rígido modelo metodológico baseado na coleta de fontes oficiais, pois somente nelas estaria 
contida a verdade dos fatos.
Os positivistas defendiam que o historiador deveria se afastar de qualquer teor de subjetividade em 
seu trabalho. Para isso, ele precisava concentrar sua pesquisa fora do observador, independente 
dele, num processo passivo de recepção dos fatos. Assim, a História, segundo Carr, se transformaria 
27
HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE • CAPÍTULO 3
em um somatório de fatos construído a partir do fetichismo de documentos oficiais, em que, 
supostamente, encontramos a verdade. E ao historiador caberia simplesmente “organizar os 
acontecimentos do passado numa sequência ordenada de causa e efeito” (CARR, 1996, p. 122).
Edward Carr argumenta que tal pensamento contém equívocos já em sua premissa, pois nenhum 
fato fala por si, já que depende da tese e/ou interpretação do historiador. Em sua perspectiva, a 
própria escolha de que um acontecimento é um fato histórico já contém subjetividade. Afinal, 
quem define o que é e o que não é um fato histórico relevante senão os próprios pesquisadores, 
baseados obviamente nos contextos e na realidade material apresentados no fenômeno estudado? 
Em outras palavras, o fato não possui uma existência em si, ele também é uma construção 
histórica, portantohumana e, por fim, com um toque de subjetividade. O que é importante 
compreender por ora é que o fato depende do historiador para existir enquanto tal, ou seja, de 
alguém que diga que aquele fenômeno constitui um fato histórico.
Assim sendo, o historiador não é somente um compilador de fontes, mas necessariamente um 
selecionador. Sendo ele um agente desse processo, fazer História não é um ato neutro como 
desejavam os positivistas, pois há a interferência do sujeito na seleção e, especialmente, na 
análise dos fatos. Este é outro ponto ressaltado pelo autor: o historiador não apenas registra 
fatos, ele os avalia e analisa, principalmente. Para Carr, a interpretação dos fenômenos históricos 
é justamente o “sangue vivo da História”.
NESSE sentido, o fato não chega “puro” como desejaria um historiador positivista. Ele carrega 
também a subjetividade do agente da pesquisa. É por isso que Carr traz à tona a afirmação do 
filósofo italiano Benedetto Croce de que toda História é História contemporânea. Ela assim 
o é, na visão do autor, não porque trate somente do mundo contemporâneo, mas porque é 
produzida por historiadores que veem o passado por meio dos olhos do presente e à luz dos seus 
problemas. Para ilustrar essa percepção, Carr nos traz um exemplo muito interessante. Após a 
consolidação da Revolução Russa (1917), os estudos sobre a Revolução Francesa (1789) tomaram 
novos rumos, enfatizando a participação das massas, seu caráter transformador, dando ênfase 
à sua radicalidade, aos ideais de liberdade e igualdade.
Atenção
Nesses capítulos iniciais, afirmamos que o historiador não consegue ser plenamente neutro, que ele faz escolhas e que é 
alguém que, a partir do presente, olha para o passado e o questiona. Assim sendo, aqui segue uma dica importante: antes 
de começar a ler um livro de História, pesquise sobre o autor. Onde ele nasceu e estudou? Onde ele trabalha? Quais são suas 
influências? Ele milita em algum movimento social ou partido? Enfim, quem é esse sujeito da pesquisa?
Lembre-se, também, que em um livro nós podemos ter três temporalidades diferentes: a primeira se refere à temática do 
livro, a segunda liga-se à época na qual ele foi escrito, a terceira diz respeito ao tempo do leitor, ou seja, ao seu.
28
CAPÍTULO 3 • HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE
Enfim, Edward Carr propõe que olhemos a relação do historiador com os fatos, tal como a relação 
do homem com o meio. Num movimento dialético: da mesma forma que o meio influencia o 
homem, é também influenciado por ele. Assim, igualmente, ocorre com o historiador que influencia 
na construção dos fatos, ao mesmo tempo em que os fatos contribuem fundamentalmente 
para a análise histórica. Sendo assim, o fato é a nossa matéria bruta, mas o nosso ofício não se 
encerra nele.
Outro olhar muito comum sobre o ofício do historiador é compreendê-lo como alguém que 
estuda as causas dos fatos passados. Quanto ao sentido e o papel dos fatos na História vimos, 
anteriormente, agora é importante nos determos no significado das causas na História. 
Edward Carr afirma que um bom historiador faz a pergunta “por quê?” sobre os fenômenos 
históricos. Como veremos em capítulos futuros, Heródoto, considerado o pai da História, definiu 
como propósito da sua obra compreender a causa do contexto de guerra entre gregos e persas. 
Portanto, o problema não está em compreender que as causas são fatores importantes na pesquisa 
histórica. A questão está em perceber o que é e como se trabalha com as causas.
Em primeiro lugar, Carr alerta que o historiador precisa ter a consciência de que num único 
fenômeno histórico ele terá de lidar com uma multiplicidade de causas, ou seja, analisar diversas 
causas para o mesmo fato. Compreendido isso, o historiador deve realizar uma hierarquia das 
causas ao mesmo tempo em que precisa compreender as relações recíprocas entre elas. Isso é 
fundamental, pois, segundo o autor, o argumento histórico girará em torno da prioridade de 
causas atribuídas pelo historiador ao contexto analisado: “Esta é a sua [historiador] interpretação 
do tema; o historiador é conhecido pelas causas que invoca.” (CARR, 1996, p.124)
A questão das causas, segundo Carr, nos leva a um dilema: até que ponto as ações humanas 
são determinadas ou são baseadas no livre-arbítrio? São escolhas realizadas espontaneamente 
ou impulsionadas por fatores que determinam o comportamento? Para Edward Carr, quando 
o historiador pensar em causalidade deve levar em consideração que essas duas características 
caminham juntas, ainda que isso pareça contraditório ou antagônico. O que o historiador britânico 
defende é que em toda ação humana há causalidade que está relacionada tanto às escolhas 
quanto às conjunturas nas quais o homem atua, age, reage e/ou é impulsionado a tal por um 
contexto determinado. Carr nos traz um exemplo que pode ser interessante na compreensão 
dessa questão:
Vejamos como enfrentamos esse problema no dia a dia. No decorrer de seus 
afazeres cotidianos, você, habitualmente, encontra Smith. Você o cumprimenta 
amavelmente, com um comentário genérico sobre o tempo ou sobre a situação 
geral da faculdade ou da universidade; ele responde com uma observação 
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HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE • CAPÍTULO 3
igualmente amável e genérica sobre o tempo ou a situação geral. Mas, suponhamos 
que, numa determinada manhã, Smith, ao invés de responder ao seu cumprimento 
da maneira habitual, iniciasse uma violenta diatribe contra sua aparência ou seu 
caráter pessoal. Será que você daria de ombros e acharia que se tratava de uma 
prova do livre arbítrio de Smith e do fato de que tudo é possível quando se trata 
do homem? Acredito que não. Pelo contrário, provavelmente você diria mais ou 
menos o seguinte: “Coitado do Smith! Como você sabe, o pai dele morreu num 
hospício”. Ou então: “Coitado do Smith! Ele deve estar tendo os maiores problemas 
com a mulher”. Em outras palavras, você procuraria diagnosticar a causa do 
comportamento aparentemente inexplicável de Smith, na firme convicção de 
que deve haver uma causa. [...] Não é que algumas ações humanas sejam livres e 
outras determinadas. O fato é que todas as ações humanas são ao mesmo tempo 
livres e determinadas, de acordo com o ponto de vista de quem as considere. 
(CARR, 1996, pp. 128-129)
Nesse exemplo, alguém que você conhece superficialmente decide lhe tratar de forma grosseira, 
realizando um comentário impróprio sobre sua aparência. Segundo Carr, há grandes possibilidades 
de que você não encare isso passivamente na crença de que os homens possuem livre-arbítrio 
e, por isso, podem agir como bem entenderem. 
Ao contrário, na visão do autor, você tentaria encontrar causas que lhe ajudassem a compreender 
a ação de Smith. Estaria influenciado pela morte do pai? Teria problemas com a esposa? Seriam 
questões levantadas com o objetivo de entender melhor a ação humana. Ao mesmo tempo, 
obviamente, nem todo mundo que possui problemas sai distribuindo grosserias por aí. Nesse 
sentido, o que Carr quer nos mostrar é a complexidade das causas: ela, ao mesmo tempo em que 
está imbuída dos contextos e da realidade material, também apresenta aspectos do livre-arbítrio 
e das escolhas que os agentes sociais fazem no seu cotidiano.
Importante ressaltar também que Edward Carr nos remete à fundamental questão das causas, 
porém elas não significam inevitabilidade. O autor afirma que nada é inevitável na História e o 
historiador não deve trabalhar com essa categoria de análise, pois não há fatalidade no processo 
histórico. 
Assim, o historiador caminha na linha tênue entre a realidade material e o determinismo 
conjuntural. Em outras palavras, o historiador deve estar atento aos contextos que corroboram 
para que as pessoas tomem certas atitudes e optem por determinadas ações, ao mesmo tempo 
em que precisa se afastar do determinismo que leva à fatalidade, à ideia de que não haveria 
outra maneira para lidar com as questões apresentadas, aproximando, com isso, a Históriade 
uma visão linear. 
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CAPÍTULO 3 • HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE
Para refletir
Como estamos nesta disciplina tentando desvendar o que é História e qual o ofício do historiador, seguem mais algumas 
definições para você refletir acerca do “fazer História”.
Historiador
Veio para ressuscitar o tempo 
e escalpelar os mortos, 
as condecorações, as liturgias, as espadas, 
o espectro das fazendas submergidas, 
o muro de pedra entre membros da família, 
o ardido queixume das solteironas, 
os negócios de trapaça, as ilusões jamais confirmadas 
nem desfeitas. 
Veio para contar 
o que não faz jus a ser glorificado 
e se deposita, grânulo, 
no poço vazio da memória. 
É importuno, 
sabe-se importuno e insiste, 
rancoroso, fiel. 
(Carlos Drummond de Andrade, in ‘A Paixão Medida’)
“O historiador nunca se evade do tempo da história: o tempo adere ao seu pensamento como a terra à pá do jardineiro.”
(BRAUDEL, Fernand. A Longa Duração. In: _______ “História e Ciências Sociais”. Lisboa: Ed. Presença, 1986. p.33)
(http://grabois.org.br/portal/cdm/noticia.php?id_sessao=30&id_noticia=13180, último acesso em 01/09/2014)
A partir das nossas discussões, reflita acerca dessas definições: você concorda com elas? Por quê? O que elas contribuem para 
a compreensão do ofício do historiador?
A relação entre História e verdade
Muitos intelectuais acreditam que a História não seja uma ciência, pois em sua metodologia 
não consta a experimentação e a observação. De fato, não podemos testar nossos objetos de 
pesquisa e nem mesmo observá-los in loco. Ao mesmo tempo, vimos que o historiador precisa 
31
HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE • CAPÍTULO 3
de metodologia e rigor na análise de suas fontes, pois a História não é ficcional, não é literatura 
e não conta apenas com a subjetividade do pesquisador.
Tal questão também gira em torno da impossibilidade da História prever um futuro por meio do 
estabelecimento de leis. Na Química sabemos que, em condições normais de temperatura e pressão, 
uma água que é fervida a 100 graus celsius entrará em ebulição e passará do estado líquido para 
o gasoso. Em História, previsões desse tipo são impossíveis. Primeiro, porque a História não se 
repete, pois as sociedades estão em constantes mudanças e, segundo, porque não estabelecemos 
verdades absolutas. Essa última questão é a que nos interessa para a presente discussão.
Antes de relacionarmos História e verdade é preciso compreender o que estamos entendendo 
como verdade: o que é verdade? Reflita sobre os quadrinhos a seguir e veja como a ideia de 
verdade se apresenta para Calvin.
(http://astropt.org/blog/2009/02/27/astrologia/, último acesso em: 20/8/2014)
No quadrinho, como no senso comum, a verdade está diretamente relacionada com a realidade. 
Ou seja, com a ideia de que tal evento ou questão podem ser aceitas como verdade se houver a 
materialidade da coisa – se aquilo puder ser visto e experimentado como real. Assim, para Calvin, 
o horóscopo diz a verdade quando as suas previsões se tornam realidade. Porém, ao mesmo 
tempo, a realidade possui uma relação ambígua com a crença. E, como sabemos, acreditar e 
crer carregam subjetividades, que nunca são neutras. 
32
CAPÍTULO 3 • HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE
Agora, observemos o poema Verdade de Carlos Drummond de Andrade:
A porta da verdade estava aberta,
mas só deixava passar
meia pessoa de cada vez.
Assim não era possível atingir toda a verdade,
porque a meia pessoa que entrava
só trazia o perfil de meia verdade.
E sua segunda metade
voltava igualmente com meio perfil.
E os meios perfis não coincidiam.
Arrebentaram a porta. Derrubaram a porta.
Chegaram ao lugar luminoso
onde a verdade esplendia seus fogos.
Era dividida em metades
diferentes uma da outra.
Chegou-se a discutir qual a metade mais bela.
Nenhuma das duas era totalmente bela.
E carecia optar. Cada um optou conforme
seu capricho, sua ilusão, sua miopia.
No poema, Drummond defende a ideia de que não existe uma verdade, mas várias, divididas 
em metades. Apesar da discussão de qual delas seria a mais bela, não se chegou a nenhuma 
conclusão e, portanto, optaram por que cada um escolhesse a sua verdade mais bela, de acordo 
com “seu capricho, sua ilusão, sua miopia”. 
Interessante notar que, ao mesmo tempo em que o autor denuncia a inexistência de uma verdade 
única, ele atrela a crença em uma verdade à ideia de capricho, ilusão ou miopia. Assim, podemos 
compreender que, para Drummond, verdades são ilusórias e podem atrapalhar nossa visão para 
a complexidade do mundo. 
De outra forma, também podemos questionar juntamente com o poeta: se existem diversas 
verdades, o que significa ser verdade? Como várias verdades podem conviver? Será que elas não 
se anulam? 
Todas essas questões podem ser levantadas por meio dos quadrinhos e do poema e vão permear 
a discussão na historiografia: há a possibilidade de verdade na História, mesmo sabendo da forte 
presença subjetiva na sua construção? Que verdade pode estar relacionada à História?
33
HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE • CAPÍTULO 3
Adam Schaff (1978) ressalta que todo o processo de conhecimento é composto por três elementos: 
o sujeito que conhece, o objeto do conhecimento e o conhecimento enquanto produto da 
cognição. De forma geral, a relação entre esses três componentes fora compreendida por meio 
de três modelos:
1. O primeiro denominado mecanicista ou teoria do reflexo, em que o sujeito é visto de 
forma passiva, contemplativa e receptiva. Seu papel no processo de conhecimento seria 
apenas registrar as informações advindas do exterior, tal como um espelho (por isso 
teoria do reflexo). Nesse modelo há o predomínio do objeto sobre o sujeito.
2. O segundo modelo é chamado idealista e ativista. O predomínio agora se volta para o 
sujeito do conhecimento, que entende o objeto como uma produção sua. Schaff afirma 
que a atenção está tão concentrada no sujeito que é atribuída a ele a criação da realidade. 
3. O terceiro modelo propõe compreender o processo do conhecimento de uma interação 
mútua entre sujeito e objeto. Segundo o autor, ambos possuem uma existência real e 
objetiva; porém, ao invés do domínio de um sobre o outro, temos aqui a atuação de um 
sobre o outro. Assim, o sujeito é ativo, mas está de certa forma condicionado às suas 
realidades sociais, às suas visões de mundo etc. Nesse sentido, o homem é ao mesmo 
tempo produto e produtor da cultura.
Defensor do terceiro modelo de visão acerca do processo de conhecimento, Schaff afirma que, não 
sendo somente um “registrador passivo”, o sujeito introduz um fator subjetivo no conhecimento 
que, por sua vez, está ligado às suas determinações sociais – ao seu contexto sócio-histórico. 
Segundo o autor, é esse fator que traz diferentes interpretações, percepções, articulações e 
descrições sobre a realidade. Nesse sentido, Schaff pretende estabelecer duas definições essenciais: 
a) o indivíduo é um ser social; e b) o conhecimento é uma atividade concreta, prática.
Nesse sentido, na ciência não existiria um conhecimento objetivo e sim objetivo-subjetivo. O 
sujeito tendo, portanto, um papel ativo na construção de conhecimento faz com que este esteja 
sempre em processo, em transformação. No que Schaff afirma que nenhum conhecimento é 
um dado pronto e definitivo.
Assim, o que o autor propõe é que compreendamos a verdade como parcial, sendo variável haja 
vista estar ligada a um contexto determinado, a um espaço-tempo próprio. Entendido dessa 
forma, o conhecimento humano é percebido como cumulativo, num movimento temporal de 
desenvolvimento e mudança de várias verdades formuladas. 
A partir daí, o historiador não deve trabalhar com a ideia de uma verdade total ou absoluta, pois 
carregaria uma percepção de imutabilidade. Ao invés disso, Schaff propõe compreendermos 
o conhecimento como infinito, pois está sempre se chegando a novas verdades parciais. Tais 
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CAPÍTULO 3 • HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE
verdades parciaisseriam o ponto de partida para novos desenvolvimentos que gerariam mais 
verdades parciais e assim por diante, num processo infinito de produção de conhecimento. 
Saiba mais
A discussão sobre a verdade não está limitada à História. Outras ciências, humanas ou não, também se preocupam em 
compreendê-la.
Apresentamos aqui um trecho da obra Sobre verdade e mentira no sentido extra-moral, que traz um pouco da visão do 
filósofo Friedrich Wilhelm Nietzsche sobre a verdade:
Na medida em que o indivíduo, em oposição a outros indivíduos, se quer conservar, 
num estado natural das coisas, ele utiliza o intelecto na maioria das vezes somente para 
a dissimulação: mas porque ao mesmo tempo o homem, por necessidade e tédio, quer 
existir social e gregariamente, ele precisa de um tratado de paz e almeja que pelo menos o 
mais rude bellum omnium contra omnes [guerra de todos contra todos] desapareça de seu 
mundo. Esse tratado de paz implica algo que lembra o primeiro passo daquele enigmático 
impulso à verdade. Agora é fixado aquilo que, a partir de então, deve ser “verdade”; quer dizer, 
é inventada uma designação das coisas igualmente válida e obrigatória, e a legislação da 
linguagem institui também as primeiras leis da verdade: pois surge aqui, pela primeira vez, o 
contraste entre verdade e mentira. [...]
Somente por meio do esquecimento o homem pode chegar a presumir que possui uma 
“verdade” no grau há pouco designado. Se ele não quer se contentar com a verdade na forma 
de tautologia, ou seja, com estojos vazios, então comprará eternamente ilusões por verdades. 
O que é uma palavra? A representação de um estímulo nervoso em sons. Mas concluir 
sobre um estímulo nervoso uma causa exterior a nós é já o resultado de uma aplicação 
falsa e injustificada do princípio da razão. Se só a verdade tivesse sido decisiva na gênese da 
linguagem, o ponto de vista da certeza nas designações, como poderíamos dizer: a pedra é 
dura – como se “dura” nos fosse conhecida de outra maneira e não apenas como um estímulo 
inteiramente subjetivo! [...]
Chamamos uma pessoa de “honesta” porque hoje ela agiu honestamente? A resposta 
costuma ser: por causa de sua honestidade. A honestidade! Isso significa novamente: a 
folha é a causa das folhas. Nada sabemos sobre uma qualidade essencial que se chamaria 
“honestidade”, mas sim das ações numerosas e individualizadas e, com isso, diferentes, que, 
com o abandono do diferente, agora designamos ações honestas; por último, a partir delas 
formulamos uma qualitas oculta com o nome: “a honestidade”. [...]
Portanto, o que é a verdade? Uma multidão móvel de metáforas, metonímias, 
antropomorfismos, enfim: uma soma de relações humanas poéticas e retoricamente 
potencializadas, transpostas e ornadas e que, depois de longo uso, parecem a um povo 
sólidas, canônicas e obrigatórias: as verdades são ilusões sobre as quais se esqueceu tratar-
se de metáforas que se tornaram usadas e sem força sensível, moedas que perderam sua 
impressão e agora são consideradas apenas metal, não mais moedas 
(nIEtzSCHE, F. W. Sobre verdade e mentira no sentido extra-moral. Editora Hedra, 2008.)
Você concorda com as formulações do autor?
Todas as verdades são ilusões?
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HIStÓRIA: FAtOS, CAUSALIDADE E vERDADE • CAPÍTULO 3
Sintetizando
Vimos até agora:
 » Os fatos podem ser compreendidos como matéria-prima do historiador. Isso quer dizer 
que a História não se encerra nos fatos.
 » A relação entre fato e historiador é, ao mesmo tempo, de separação e interdependência. 
 » Uma das perguntas essenciais realizadas pelo historiador deve ser “por quê?”. As causas 
são fatores fundamentais para o conhecimento do processo histórico.
 » Para Adam Schaff, não há verdade absoluta na disciplina histórica, mas sim verdades 
parciais, construídas e superadas constantemente.
36
Apresentação
É muito comum ouvirmos que o brasileiro não tem memória. Rapidamente esquecemos nossos 
problemas, nossas crises, a corrupção de alguns políticos que são sucessivamente eleitos, das 
obras que ficam pelo meio do caminho, enfim, seríamos uma nação de desmemoriados.
Porém, é importante questionarmos sobre qual memória estamos falando. A memória não é 
uma, mas múltipla, pode ser individual ou coletiva, pode ser institucionalizada, ou pode estar 
escondida e esquecida. No campo da História, a memória pode ser fonte ou objeto de pesquisa, 
e é algo muito mais complexo do que simplesmente lembrar ou esquecer. A proposta aqui é 
problematizarmos essa questão. Duas perguntas nortearão o nosso capítulo: o que é memória? 
Qual a relação entre História e memória? 
Ao final do capítulo, propomos uma reflexão acerca do engajamento do historiador e solicitamos 
que você reflita sobre esta questão: até que ponto posicionamentos políticos do historiador 
podem/devem estar presentes em seu ofício?
Objetivos
Esperamos que, após o estudo do conteúdo deste capítulo, você seja capaz de:
 » Identificar as diferenças entre História e memória.
 » Compreender as possibilidades da utilização da memória para a História.
 » Refletir acerca dos lugares de memória da sua cidade.
4
CAPÍTULO
A RELAçãO EntRE 
HIStÓRIA E MEMÓRIA
37
A RELAçãO EntRE HIStÓRIA E MEMÓRIA • CAPÍTULO 4
Provocação
Na charge a seguir, além da crítica implícita à Lei da Anistia, há a ideia do engavetamento da História. Uma crítica à 
usurpação da História por parte dos arquivos militares. Isso vai ao encontro da nossa temática aqui, pois o foco também será 
compreender como a memória pode contribuir para “desarquivar” a História e trazer à tona muitas outras histórias.
Observe atentamente a charge e, após a leitura do capítulo, volte a ela e reflita como a memória pode contribuir para 
ampliar nosso conhecimento sobre nossa História e, portanto ampliar nossa concepção de cidadania e nosso sentimento de 
identidade. 
(http://www.rededemocratica.org/index.php?option=com_k2&view=item&id=1850:erundina-defende-mudan%C3%A7a-na-lei-da-anistia, 
último acesso, 02/09/2014)
Memória e História
Embora muitas vezes compreendidas como sinônimos, História e memória são processos 
diferenciados. Em primeiro lugar, a memória é viva num sentido amplo, haja vista aqueles que 
registram a memória como pessoas vivas, influenciadas pelas lembranças e pelo esquecimento, 
suscetíveis às sensações do momento em que expõem suas memórias. Na definição de Henry 
Rousso (2006), a memória é a presença do passado. Já a História é uma reconstrução do passado 
baseada em análise de fontes, de discurso, preocupada com criticidade e metodologia. 
 O historiador pode utilizar a memória enquanto fonte histórica que é como fazem, por exemplo, 
aqueles que usam o método da história oral e/ou trabalham com a história do tempo presente. O 
problema está em saber como devemos interpretar esse material carregado de muita subjetividade. 
Portanto, já de início, gostaríamos de enfatizar que a memória não é simplesmente a história 
contada. Nesse sentido, assim como o historiador não é somente um compilador de fontes (como 
vimos nos capítulos anteriores), também não é um colecionador de memórias. 
O primeiro cuidado que devemos ter, como nos alerta Michael Pollak (1992), é que inicialmente 
acreditamos que a memória seja um fenômeno individual. Mas ela deve ser entendida acima 
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CAPÍTULO 4 • A RELAçãO EntRE HIStÓRIA E MEMÓRIA
de tudo como coletiva e social, ou seja, construída coletivamente e submetida a constantes 
flutuações, transformações e mudanças.
Nessa mesma perspectiva, Rousso afirma que a memória é uma reconstrução psíquica e intelectual 
que gera uma representação seletiva do passado de um indivíduo. Porém, esse agente não é 
somente um indivíduo, ele está inserido em um contexto familiar, comunitário, social e nacional. 
Portanto, corroborando com Pollak, toda memória é também memória coletiva. 
Em segundo lugar, devemos ter claro quais são os elementos constitutivos da memória:
1. os acontecimentos realmente vivenciados pelas pessoas;
2. os acontecimentos

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