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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI Curso: Direito - 1 Período Disciplina: História do Direito - Noturno Professora: MSc. Melissa Mendes de Novais Acadêmicos: Betina De Gasper, Cristiano Zeilmann, Nilvo Airton Rodrigues Júnior e Vanessa R. Guimarães. Data: 24/04/2018 ESTUDO DIRIGIDO 2 – DIREITO MEDIEVAL 1) A fim de facilitar a abordagem da experiência jurídica medieval, Paolo Grossi estabelece alguns instrumentos metodológicos. Trata-se de algumas características peculiares ao direito medieval: a incompletude do poder político, a indiferença do poder político pelo direito, o pluralismo jurídico e a factualidade / historicidade do direito. Explique tais elementos. A incompletude do poder político ocorre devido ao desmoronamento da estrutura estatal romana cria-se um vazio político, a ausência de um Estado e de um poder soberano, que propicia uma nova experiência jurídica. Com a crise do Império Romano, no início do século IV tem início a ordem política medieval, que tem como característica principal a ausência do “Estado” no cenário político. Isto se dá após a época de Diocleciano, quando o Estado romano morre por inanição e desgaste interno, crises econômica, política e social, além de regressão demográfica devido as pestes e retorno ao paganismo, religiões provenientes dos povos bárbaros que invadiram sucessivamente o Império Romano. Neste cenário de incapacidade que permite o surgimento de diversas formas de regime, portanto, mas nunca um organismo totalitário como o Estado, para regular e controlar o território. A civilização medieval não sentiu necessidade de preencher o vazio deixado pelo desmoronamento do edifício estatal romano e nem poderia sentir, devido a fragmentação de diversos elementos coesivos que antes se faziam ligados através do Império. De um lado a sociedade germânica não era propensa a sufocar autonomias de grupos e de outro a igreja temia a reorganização de um poder centralizador. Fatores que proporcionaram condições ideais para uma imensidão de entidades fragmentadas de gestão política, mas nenhum deles chegou a qualidade de ser classificado como Estado. Contudo, o fim de Estado não é o fim do direito. O Estado é um programa global, ou com tendência globalizante, característica que falta ao mundo medieval. De maneira que apenas produzir e efetivar leis não atribui a uma estrutura política caráter estatal. Ademais, as leis produzidas nos reinos e comunas da Idade Média eram desorganizadas desprovidas de projeto que visasse ao longo alcance. Na verdade no espaço não preenchido pela queda do Império Romano, surgiu a possibilidade de que criasse uma experiência jurídica completamente nova no medievo. A ausência de um poder totalizante abre espaço ao pluralismo que à sombra de um aparato centralizador completo, isto seria impossível. Essa ausência de monopólio do poder propicia a criação de um direito que é voz da sociedade e de inúmeros grupos sociais. Um direito autônomo, das realidades autônomas, onde o caráter essencial da autonomia é a relatividade. Ao invés de estar totalmente desvinculada do restante, a sociedade está imersa em uma trama de relações com outras autonomias. O mundo político-jurídico é um mundo de ordenamentos jurídicos, por ser um mundo de autonomias. A imagem de um “Soberano” que ter o poder de agir, controlar e guiar aos outros não se aplica. Exceto com relação ao extraterreno, cuja soberania absoluta, ilimitada e incontestável é a de Deus. A indiferença do poder político pelo direito é consequência do vazio político criado pela crise da estrutura estatal Romana O Estado sempre considerou a relevância do direito para a realização de seus objetivos "totalitários". Já o mundo político medieval, de modo diferente, estava inclinado a uma indiferença pelo mundo jurídico. O detentor do poder não concebe o direito como objeto necessário de seu regime, sua atenção se volta apenas ao exército e à manutenção do poder. Os aspectos políticos referentes à "constituição", administração pública, ao direito civil, comercial e agrário, recebem atenção esporádica. A noção de autonomia é relativa ao regime político que está em transição, significa que o direito não é expressão de um ou outro regime, é fruto de uma pluralidade e da variedade de forças que compõem a sociedade civil. Significa desvencilhar-se das forças específicas particulares. O vínculo do poder ao direito é parcial e turvo, não havia uma "voz" dominante que ditasse as regras, porém os vínculos relacionados às estruturas econômicas e espirituais eram poderosos. O príncipe serve como um juiz, somente julgando, mas não fazendo as leis. O Direito vem da sociedade e não do poder. Pluralismo jurídico se dá pela crescente impotência do mecanismo estatal romano, onde surge um direito "vulgar" no sentido de usar forças alternativas, "não oficiais" para preencher, em parte, o vazio deixado pela desagregação política e dar respostas às novas idealidades e necessidades, começam a resolver os problemas por conta própria. Em um plano sociocultural, significa a pluralidade de valores, e no plano jurídico, dá-se por uma pluralidade de tradições e fontes de produção em um mesmo ordenamento jurídico. Neste contexto, do direito produzido pelo social, há diversas ordens convivendo ao mesmo tempo. Em um primeiro momento do medievo, caracteriza-se pela pessoalidade do direito, a linhagem e os laços consanguíneos possuíam valor indiscutível, e todas as pessoas neste mesmo regime político, particulares do grupo étnico tinham seus direitos específicos e diferenciados. No segundo momento do medievo, a Idade Média sapiencial, o pluralismo político caracteriza-se pela pluralidade de tradições coexistentes com vigência e aplicação no mesmo território - Sejam os chamados iura propria, isto é, as normas particulares consolidadas pelo costume ou promulgadas em âmbito local por monarcas e por cidades livres. Seja o ius commune, isto é, o majestoso sistema jurídico universal elaborado sobre a plataforma romana e canônica por um grupo muito destemido de juristas, patrimônio científico presente em todas as partes, fornecendo esquemas interpretativos, invenções técnicas, soluções para os muitos casos não previstos no âmbito local pela miopia dos legisladores. A pluralidade de tradições é respeitada pelo poder político, sendo o direito é produzido pela sociedade. Este pluralismo não é apenas um conjunto de culturas jurídicas, mas se concretiza, num plano tipicamente técnico, em um conjunto de fontes de produção. A Factualidade / Historicidade do direito se fazem em um contexto em que o príncipe contribui minimamente para a produção da produção jurídica medieval, devido a indiferença do poder político pelo direito, que neste momento, de certa liberdade, encontra suas fontes e bases no tecido social, nascendo dos fatos e se edificando a partir deles. Nesse contexto da Idade Média, o direito se destaca por sua “factualidade”, não nasce do fato, mas o fato possui uma carga vital que pode se tornar a única condição de se demonstrar dotado de efetividade, como fato normativo, podendo ser o protagonista de vários ordenamentos. A ordem jurídica medieval se origina partir do século V, com o clima naturalista que domina o Ocidente; dita que a natureza das coisas físicas e sociais pode conter em si a regra jurídica e atribui um papel importante aos fatos. O panorama histórico local se dava com o contexto dos problemas no Império. Essa descontinuidade faz parte da factualidade do direito, que tentava buscar a solidez, além do convencional e do artificialismo. A ordem jurídica medieval nasce neste contexto, lidando com os problemas e fatos concretos da época, é um novo modo de conceber o direito, nascido de uma nova experiência, dos fatos. O direito não é mais a voz do poder, é feito o resgate jurídico, onde o social e arealidade percebida como ela é estão na essência dos fatos, e estas forças são tão profundas que se fazem acima do poder. Devido a sua factualidade, o direito torna-se plástico, molda-se ao contexto, o costume rege esse fato. É análogo ao regime de sedimentação aluvial em movimento, está em constante modificação, é assistemático, incerto e variável de uma época a outra. O direito medieval possui uma intensa politicidade, que significa historicidade, e especifica apenas a fidelidade da forma para o social e econômico, para as idealidades e necessidades que circulam na cidade da sociedade civil. A historicidade do direito se dá pela fidelidade da representação jurídica às forças presentes na sociedade e mantém-se junto com as necessidades que surgem à sociedade a ele vinculada, pois o direito é um fruto e um participante vivo da história, devendo originar-se no social e do social, e não sofrer artifícios de uma elaboração burocrática, não sendo instrumento coercitivo desta civilização, mas sim o seu espelho e intérprete. 2) Quais as circunstâncias sócio-políticas do Ocidente que permitem a formação do direito medieval? O Império Romano encontrava-se em decadência por diversos fatores. A centralização das funções judiciais e legislativas vai acarretar na queda do Império Romano, A crise econômica, a redução da população devido às diversas pestes, a falta de saneamento, a invasão e a desumanidade dos bárbaros (o direito dos bárbaros não utilizavam as leis romanas), a pessoalidade do direito que se aplica conforme a etnia (onde etnias diferentes não se misturam, assim como seus costumes e tradições - específica da alta idade média), também não tinham domínio de técnicas agrícolas e a regressão ao paganismo (onde o cristianismo perde a sua hegemonia, devido às religiões bárbaras e místicas das florestas e a descentralização da igreja católica). Devido à essas circunstâncias se deu a crise e não consegue avançar e começa ruir internamente, ou seja, um colapso interno na política e sociedade, com sua burocracia e desgastes políticos internos e seus exércitos, não mais se sustentava. Neste contexto é onde surge o pressuposto do direito medieval. 3) A querela das investiduras marca um momento decisivo na história do direito canônico. Discorra sobre como esse evento mudou a estrutura da Igreja do Ocidente e influenciou a formação do direito canônico. O processo do ius commune é criação dos canonistas. Os canonistas formulam critérios de racionalização e formalização do direito, em se tratando de cultura. A primeira classe de juristas profissionais eram cânones, sob a burocracia eclesiástica. O direito canônico é conectado com as disputas pelo poder que se deram a partir do século XI entre a Igreja e o Império. A reforma Gregoriana é o evento que consagra a passagem do direito canônico. Até o início do século XI a igreja do Ocidente havia sido uma comunidade sacramental, espiritual, não jurídica e muito mais uma federação de igrejas nacionais do que uma rígida monarquia centralizada em Roma. A autoridade papal era mais tradicional e moral que jurídica, e politicamente ineficaz. A partir do recomeço da expansão do ocidente começam as mudanças que irão refletir no campo do direito. Gregório VII institui medidas para que nasça um estado, uma dominação burocrática, racional, legal e formal. Com esse esforço, desenvolve-se o direito canônico, aliado ao direito romano clássico e ao direito inglês (common Law), tendo em comum a organização jurisdicional com propósitos políticos determinados com a proposta de se libertar a Igreja Ocidental inteira do poder secular. A partir deste momento, o direito canônico se faz efetivo, surgindo os institutos de direito canônico, desenvolvimento de um direito racional e formal do processo canônico, que será seguido por reis, príncipes e senhores. Através do direito dos cânones, a Europa reencontrará a sua tradição jurídica racionalizante e formalizante. A guerra das Investiduras foi um conflito entre Gregório VII e Henrique IV. Gregório VII foi eleito papa e possuía espírito renovador, em 1075 iniciou sua reforma, organizando o Dictatus Papae, um conjunto de 27 princípios que visavam dar liberdade e independência para a Igreja. Estas propostas revolucionaram toda a Cristandade latina, além das terras do império. Este documento foi tornado público e enviado a Henrique IV. Inicia-se a querela das Investiduras, que transforma a Europa, colocando fim ao modelo carolíngio de relação entre a Igreja e o Estado. A Reforma Gregoriana, afirmava que o rei/imperador estava dentro da Igreja e não acima dela, dentro da igreja havia a autoridade maior, o papa. A reforma era contra a concepção de que o império seria uma entidade militar/espiritual e não geográfica, pois neste momento o Império era somente um poder e não um território. Não havia a figura do Estado e nem uma capital que centralizaria o poder, e o princípio da pessoalidade das leis se fazia muitas vezes presente com a força dos costumes locais. A querela das Investiduras resultou na Concordata de Worms, na qual o papa seria incumbido de conceder cargos aos bispos, mas o imperador deveria estar presente nestas eleições. A Reforma de Gregório VII é considerada a primeira revolução do mundo Ocidental, foi total, universalizante, socioeconômica. O caráter da Reforma Gregoriana foi além de seguir um projeto, foi violenta e rápida, mas nunca se consolidou senão num espaço de mais e uma geração, e sempre trouxeram um direito novo que se firma e substitui o direito velho. Da concepção de Igreja de Gregório começou a nascer o Estado burocrático, criou-se um poder de legislação e uma ambição de universalidade. Gregório afirmava que as leis se faziam supremas sobre os costumes. A baixa idade média foi um período muito importante para história do direito, tal como na esfera das instituições e cultura jurídica, ou seja, a ius commune (junção do direito canônico e romano). 4) Alguns dos principais legados deixados pelo direito canônico são no campo da jurisdição e do processo, contribuindo sobremaneira para a sua formalização e racionalização. Quais foram as características e institutos herdados do direito canônico nesses campos? O direito canônico influencia o campo da jurisdição e do processo. A partir dele nota-se as divergências entre a Europa continental e a tradição Inglesa. É do direito canônico que parte a reorganização completa da vida jurídica europeia. As cortes, tribunais e jurisdições leigas, civis, seculares, principescas serão mais cedo ou mais tarde influenciadas pelo direito canônico. Algumas características foram que trata-se de um processo conduzido por profissionais do direito; reconhece um sistema de recursos que permitia a uniformização, a concentração e a centralização do poder; adquiriu uma natureza inquisitorial mais do que acusatória (dualística); impôs a escrita sobre a oralidade. Também houve duas distinções pelos canonista 1º separação das jurisdições; 2º Formalização do processo (incluindo a racionalização das provas) com base em critérios bem objetivos: ex ratione personarum - em razão das pessoas; ex ratione materiae - em razão da matéria. As cortes seculares também desejavam intervir e com isso houve uma longa disputa entre eles. Ex ratione personarum dizia ser da jurisdição canônica e eclesiásticas a causa que envolvesse os clérigos. Era chamado privilegium fori absoluto assim como os estudantes e professores eram clérigos, pois as escolas e universidades eram anexadas nas catedrais, conventos e mosteiros. Outros que aproveitaram do privilégio eclesiásticos os miseráveis que compunham de mendigos, pobres, órfãos, viúvas que se multiplicavam no medievo. No foro eclesiástico, eram atendidos por advogados nomeados pelo bispo. E por fim os peregrinos, mercadores e os judeus eram beneficiadoscomo a Paz de Deus. Ex ratione material: neste item deveriam ser julgados por tribunais eclesiásticos e suas causas que envolveram os sacramentos (inclusive o matrimônio), daí a grande importância da disciplina canônica do direito da família. A matéria relativa a testamentos julgavam pelo direito canônico e vem daí parte de contratos e dívidas. Finalmente toda a matéria de pecados públicos que podia incluir na simonia, usura, adultério, heresia etc... Desta jurisdição foi especialmente regras da família, sucessões, contratos, processo penal. Outro item a jurisdição prorrogada: muitos particulares por contratos se submetiam livremente aos tribunais ou arbitragens, em que se aplicavam regras pelo direito canônico. O processo canônico teve um papel disciplinador, os profissionais do ramo implantaram a práxis e foi crescentemente autônomo na resolução de controversos marcados pelo novo racionalizador e formalizador da filosofia eclesiástica, tal como, aprendeu com o processo e a argumentação jurídica. O fato que é o processo canônico opôs-se com clareza à experiência anterior na solução de controvérsias. No processo civil foi introduzido a escrita que era feita pelo os notários, isto é, memoria (termos, autos) do processo. Outro item a organização da fases do processo com clareza. O autor apresenta seu libellus ao oficial, que convoca o réu e na sua presença lê os termos escritos. Assim por diante consistirá na apresentação das exceções, ou seja, a matéria da defesa que hoje se diz “preliminar”. As exceções seriam, portanto, dilatórios ou peremptórios, conforme o andamento da demanda. E também surge a figura do advogado, ou seja, jurisqueiro. Entretanto, verifica-se que na contemporaneidade já é realidade, pois no direito secular ocidental há vários conceitos e institutos jurídicos criados pelo direito canônico, exemplo disso é a teoria da pessoa jurídica, que não foi, de forma alguma, construída pelos romanos, mas pela própria igreja, que inseriu o direito canônico na universidade e, em certa altura da idade média, preocupou-se em enfrentar problemas relacionados a patrimônio comum, representação e responsabilidade. 5) Como se caracteriza o processo inquisitorial de origem canônica? A inquisição medieval origina-se nos decretos do papa Lúcio III, em 1184 e à medida que a Igreja conquistava mais adeptos durante a Idade média, houve a necessidade de normatizar. Assim criou-se uma instituição com autonomia para investigar e julgar a heresia, ou seja, o método inquisitorial associou-se à nova forma de exercer o poder. De origem religiosa e administrativa (estatal) tornou-se uma técnica de poder e administração. A vida medieval dava-se dentro de corporações definidas: O cristão deveria viver como cristão e a heresia um problema espiritual, mas político contra as autoridades religiosas e contra o braço secular (o Rei e príncipes). O inquérito significou o surgimento de novos personagens - um investigador e acusador oficial, representando o Estado, que procede de forma ordenada e racional, entretanto no processo inquisitorial que surge o personagem do advogado de defesa obrigatória, isto é, o juiz inquisidor era obrigado dar-lhe um advogado se o réu negasse as acusações. A heresia no contexto medieval, não significava somente um problema espiritual, mas, sobretudo um problema político, um desrespeito às autoridades religiosas, reis e príncipes. Logo se permite o uso formal de métodos de tortura para obter a confissão dos suspeitos. A inquisição nasceu num contexto de revoltas: muitas heresias cresceram no meio da crise do clero e dos pobres, devido a isso impôs-se o poder central do papa. A Inquisição Medieval tornou-se infelizmente famosa por outras duas características, a transformação num tribunal de exceção e dirigiu-se a uma espécie mais específica de delito. E foi um tribunal de exceção, pois conduzia por legados do papa e saía da jurisdição do bispo. Por isso a inquisição serviu de um instrumento de centralização monárquica da igreja. 6) Qual a importância da recuperação dos textos do direito romano na Baixa Idade Média e qual em que contexto jurídico e cultura eles são resgatados? Os textos de Justiniano se fazem em um universo de homens letrados, na grande maioria homens de tradição. Esses textos vindo do passado valiam muito para os medievais (era uma cultura de reverência em relação à tradição). Haviam aprendido a organizar e copiar os textos dos gregos e latinos (patrística) tendo entre eles diferenças e mesmo assim, reconhecendo a todos a autoridade, selecionando os que podiam ser contados entre os legítimos representantes da tradição cristã. Os textos de tradição e de autoridade: Bíblia, patrística, deliberações e cânones conciliadores. O Corpus Iuris Civilis, a recompilação Justinianeia, é agregada, à sua maneira, os textos de autoridade e de tradição. Não há nesse tempo de Europa Medieval, um Estado centralizador suficientemente forte para pretender qualquer monopólio militar ou jurídico, o ambiente normativo é plural: providos diversos costumes de região para região, de local para local, numa sociedade estamental e de ordens, também regras diversas para diferentes estamentos. Os textos de direito romano foram reunidos no século VI, em Constantinopla, no Império Romano do Oriente a pedido do imperador Justiniano, que acreditava que a jurisprudência de seu tempo era decadente, portanto, com a finalidade de salvar os clássicos, pois para ele, o que estava no passado era bom e sua missão seria restaurar o passado. o direito clássico. Foi feita a compilação de constituições antecessoras (Codex) e nova (Novellae), textos dos jurisconsultos (Digesto ou Pandectas) e o manual de ensino jurídico (Instituta). 7) Explique o que era o ius commune, quais as suas características e em que ele se diferencia da common law. O processo do Ius Commune, que dominará a Europa até o século XVIII, é fundamentalmente criação dos canonistas. Tem caráter transacional no ensino jurídico; caracteriza-se por ser o direito comum a todos, que é o direito romano interpretado pelos doutores. Mesmo quando se formam os estados nacionais, o ius commune continua a ter um papel de harmonização que desaparecerá finalmente só no século XVIII. Desde então, exceto na Inglaterra, os juristas serão letrados. Desenvolve - se sobre uma comunidade de cultura, diferentemente do direito inglês (common law) que está ligado ao progresso do poder real à existência de tribunais reais fortemente centralizados. O jus commune é um monumento edificado por uma ciência europeia, que visa, ao fornecer aos juristas modernos, um vocabulário e métodos, orientá-los na procura de soluções de Justiça. É por isto algo diferente da common law, que representa um direito uniforme e aplicado pelos tribunais reais na Inglaterra. Por outro lado, notar-se-á, relativamente à sua natureza e à sua autoridade puramente persuasiva, a flexibilidade deste ius commune europeu. A rigidez da common law, sistema de direito positivo ligado à considerações de processo, tornou necessária a elaboração de regras, na Inglaterra, ditas regras de equity, destinadas a completar e corrigir a common law. 8) Explique o que era a escola dos glosadores e dos comentadores. As duas escolas se formaram ao longo dos séculos XII e XV, despreocupadas com o direito justinianeu, na medida em que sabiam se tratar de direito racional. Tinham como texto tradicional o corpus de direito romano enquanto ratio scripta. As escolas influenciaram seriamente, inúmeras áreas do direito, processo civil e penal, o segundo materializado em algumas inovações do direito canônico. No direito comercial, ajudaram nas justificativas às práticas e invenções dos mercadores. Influíram também, em matérias de direito internacional, em direito de família, uso da terra, pessoas jurídicas (“teoria dascorporações e suas autonomias”). Sendo a primeira grande escola, os glosadores, tiveram um trabalho mais tímido, limitado, em relação ao texto. Mesmo sendo conhecedores de todo o conteúdo dos textos, suas glosas eram comentários que seguiam a ordem do texto. “Não queriam usá-lo na vida prática, queriam comprová-lo como instrumento de razão da verdade da autoridade”. O iniciador desta tradição, Irnério, consolidou o Corpus Iuris Civilis de Justiniano, além de editor de uma cópia, foi também autor de um formulário notarial e de um ensaio sobre as ações. Os integrantes desta escola, dada o baixo nível de conhecimento da população medieval, se apropriaram de um papel proeminente dentro da sociedade, já que eram capazes de ler, escrever, redigir documentos em jargão jurídico. Considerados novos clérigos, estamento insurgente, respeitado e até temido, nas comunas e cidades, por serem conselheiros de senhores e mercadores, usufruindo de seus treinamentos na nova arte do “direito douto”. Obra desta mesma escola, temos por Acúrsio, une todas as glosas anteriores e une-as na chamada “Magna Glosa”. Produzindo assim, uma autoridade a mais, tornando possível conhecer o direito não somente em sua literalidade, mas também, por meio de Acúrsio. Os glosadores determinam um estilo relativamente simples de estudo, inicial, com grande reverência ao texto romano. Só os juristas do século XIV, com um saber mais consolidado, tinham mais liberdade, enorme avanço legislativo sobre o costume, possuíam diversas cópias dos textos romanos, até mesmo pela reforma gregoriana da Igreja. A segunda escola, dos comentadores, é composta por aqueles que se tornaram conselheiros dos príncipes, das comunas e dos particulares, emitindo pareceres e auxiliando na harmonização dos direitos locais, espalhados pela cristandade. Por meio do Ius Commune, se esforça em conciliar os direitos locais, acaba por viabilizar a convivência das tradições feudais com as novas tendências da vida europeia, monetarização da vida, comércio, e proporciona certa flexibilização nas transferências de terras e sucessões. Os comentadores, antecedidos por sucessores dos glosadores, são do século XIII e XIV, são possuidores de tarefas mais práticas e mais livres, na medida em que tratam dos temas sem seguir à risca os textos, e respondem à indagações e consultas, tem grandes nomes, como: Cino de Pistóia (1270-1336), Bártolo de Sassoferrato (1314-1357), entre outros. Bártolo, compositor de tratados e comentários, escreveu sobre diversas áreas do direito, privado e público, redigiu um tratado sobre o governo das cidades (Tractatus de Regimine Civitatum, entre 1355-1357). A geração intermediária entre os comentadores e glosadores, já discutia livremente as glosas, segundo Solmi. A influência da escola de Bolonha se dá como cultural, seus alunos influirão na cultura jurídica das sociedades, criando sua própria maneira de estudar o direito (mos italicus). Se conflitam com os humanistas no pé de que não buscam o texto romano puro, mas sim seu valor contemporâneo, usando do que se possuía advindo da Antiguidade, para seus próprios interesses de pesquisa. Existentes também na França (mos gallicus), onde combateram a Igreja, à serviço do Rei. Na Alemanha, criaram uma classe de juristas comuns independentes de fronteiras geográficas. Na Itália foram conselheiros dos Podestá e Signorie, arbitrando disputas territoriais. Se constituíram diplomatas e administradores, fornecendo aos príncipes a “teoria da soberania”, cobertura ideológica e política. Puderam redigir documentos e criaram um aparelho administrativo. 9) Como se formou o direito romano-germânico (civil law)? A tradição jurídica romano-germânica tem suas origens nos séculos XII e XIII, coincidindo com período do Renascimento na Europa Ocidental. Anteriormente, as leis bárbaras se faziam em vigor, regulando as relações sociais, pois o direito erudito que existia anteriormente às invasões do império pelos bárbaros, fora substituído por um direito vulgar, aplicado de modo espontâneo pela população. Neste momento, século XIII, as cidades e o comércio se reorganizavam, também se intensificou a separação entre o direito e a religião, deixando-se a parte a ligação entre religião e moral confundidas com ordem civil e direito. Juristas e Filósofos determinam que as relações sociais tenham como base o direito, um direito novo fundado sobre a justiça, que a razão permite conhecer; repudiam o apelo ao sobrenatural que reinava nos séculos passados. A sociedade civil deve ser fundada sobre o direito e este direto, agora reconhecido como autônomo, deve assegurar a ordem e do progresso na sociedade. O sistema romano-germânico firma-se no continente europeu, em uma época em que o continente não constitui uma unidade política, pois o Império Romano ruíra. Este sistema foi fundado sobre uma comunidade de cultura, surgiu e continuou a existir, independentemente de qualquer intenção política. A partir do pensamento renascentista, as universidades ganharam destaque no estudo do direito, inicialmente na Itália com a Universidade de Bolonha. São Tomás de Aquino eliminou a última barreira para que os estudos do direito romano pudessem ser realizados, rejeitando a ideia de que deveria se construir a sociedade civil sobre um modelo apostólico, dominado pela caridade. O sentimento do direito foi reestabelecido na Europa devido ao movimento renascentista, pois neste período, surge a necessidade de assegurar a ordem e visar ao progresso, há uma ordenação dos conceitos, vocabulários, categorias e regras da escola de direito romano. Este renascimento dos estudos do direito romano é o ponto crucial para que nasça o direito-romano germânico. 10) Como se formou o direito da common law? O sistema common law é um sistema de direito elaborado na Inglaterra, principalmente pela ação dos Tribunais Reais de Justiça. Teve sua formação entre os anos de 1066 e 1485, tendo o seu início com a conquista Normanda em 1066, por Guilherme, o Conquistador. Esta conquista constitui em um grande acontecimento para a história do Direito Inglês, pois acaba levando para a Inglaterra um “poder forte, centralizado, rico de uma experiência administrativa posta à prova no ducado da Normandia”. A partir desta conquista, finda-se o sistema tribal na Inglaterra e tem-se início o sistema feudal. O feudalismo instalado na Inglaterra era de caráter militar e organizado que permitirá, por oposição ao continente europeu, o desenvolvimento da common law. Surge, assim, o sistema da comune ley ou common law, para fazer oposição aos costumes locais frutos do feudalismo. Este direito, em 1066 ainda não exista. A assembleia dos homens livres aplica o costume local, limita-se de acordo com este costume e decide qual das partes deverá provar a verdade de suas declarações, submetendo-se a uma prova não racional. Aos poucos, estas são substituídas por jurisdições senhoriais de um novo tipo, que deliberarão igualmente com base na aplicação do direito costumeiro local. As jurisdições eclesiásticas que foram instituídas depois da conquista aplicam o direito canônico comum a toda a cristandade. A elaboração da comune ley, direito inglês é comum a toda a Inglaterra e será obra exclusiva dos Tribunais Reais de Justiça, vulgarmente designados pelo nome do lugar onde vão estabelecer-se a partir do século XIII, Tribunais de Westminster. A common law compreende o direito inglês, que está na sua origem, e os direitos de países de língua inglesa. Além destes, sua influência é considerável na maior parte dos países, senão em todos, que politicamente estiveram ou estão associados à Inglaterra. Estes países conservaram certos domínios, tradições, instituições e conceitos próprios. A influência inglesa marcou profundamente a maneira de pensar dos seus juristas, porque por um lado, a organizaçãoadministrativa e judiciária e por outro lado, a matéria do processo e as provas foram estabelecidas e reguladas segundo o modelo inglês.
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