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Carolina Lucchesi | Medicina UNIT Angina Estável Isquemia significa “desequilíbrio entre oferta e consumo de oxigênio”. A doença isquêmica do miocárdio é caracterizada pelo surgimento de isquemia em uma ou mais porções do músculo cardíaco. A cardiopatia isquêmica estável (CIE) é causada mais frequentemente por placas de ateroma que obstruem ou estreitam gradualmente a luz de uma ou mais artérias coronárias epicárdicas A doença isquêmica do miocárdio secundaria a arterosclerose pode ter três apresentações clínicas: Assintomática: Paciente portador de fatores de risco para aterosclerose, porém os indícios de isquemia miocárdica só podem ser detectados através da realização de exames complementares Aguda: Paciente evolui em curto período espaço de tempo com sinais e sintomas de isquemia progressiva, que acaba manifestando em repouso. A causa desse problema é a instabilidade da placa de ateroma. Existem três síndromes coronarianas agudas diferentes: Angina Instável, IAM sem supra desnível do segmento ST e IAM com supra desnível do segmento ST Crônica: “Angina estável”. Sinais e sintomas de isquemia durante o esforço, mas em repouso essas manifestações desaparecem. Não a instabilidade da placa de ateroma, mas ela é grande o suficiente para obstruir a maior parte do lúmen coronariano (>50%) Definição de Angina: A angina é uma síndrome clínica caracterizada por dor ou desconforto em quaisquer das seguintes regiões: tórax, epigástrio, mandíbula, ombro, dorso ou membros superiores. É tipicamente desencadeada ou agravada com a atividade física ou estresse emocional, e atenuada com uso de nitroglicerina e derivados. A angina usualmente acomete portadores de DAC com comprometimento de, pelo menos, uma artéria epicárdica. Entretanto, pode também ocorrer em casos de doença cardíaca valvar, cardiomiopatia hipertrófica e hipertensão não controlada. Pacientes com coronárias normais e isquemia miocárdica relacionada ao espasmo ou disfunção endotelial também podem apresentar angina Epidemiologia Baseado em dados do Framingham Heart Study, o risco de desenvolver DAC sintomática após os 40 anos de idade é de 49% nos homens e 32% nas mulheres. 12%-14% dos homens com idade entre 65-84 anos são portadores de angina estável A OMS estimou que em 2020 o número global de mortes por DAC terá aumentado de 7,6 milhões em 2005 para 11,1 milhões A doença isquêmica do miocárdio já é a maior causa de óbito no Brasil Em mulheres a prevalência de doença coronariana só se torna significativa após a menopausa Fisiopatologia O tecido miocárdico é o tecido com a maior taxa de extração de O2 do organismo. Essa taxa é a fração do conteúdo arterial de oxigênio captada pelos tecidos quando da passagem de sangue pela microcirculação. (miocárdio em torno de 75%, não há muita margem Carolina Lucchesi | Medicina UNIT para aumento) Se não há como aumentar a taxa de extração de O2, a única forma de aumentar o aporte de O2 ao tecido cardíaco é aumentando o fluxo de sangue pelo leito coronariano. Isso é realizado através das da reserva coronariana **Reserva coronariana: As arteríolas pré-capilares do leito coronário são capazes de se dilatar de acordo com a necessidade de oxigênio **A vasodilatação das arteríolas pré-capilaresse dá em resposta a produção endotelial de Óxido Nítrico e outros fatores miorrelaxantes Assim, se a obstrução do lúmen das coronárias dor aguda ou grave (>80% do lumen), mesmo com a vasodilatação arteriolar máxima, o fluxo ficará tão baixo que não sera suficiente para suprir a necessidade de oxigênio basal. Isso ocorre nas síndromes coronarianas agudas Se a obstrução for mais gradual e não tão grave (entre 50%-80%), a reserva coronariana será parcialmente utilizada no estado de repouso, sobrando uma cerca capacidade de dilatação. Se houver qualquer aumento de demanda miocárdica, aquele “pouquinho” de reserva coronariana residual não será suficiente para suprir a demanda de O2, justificando o surgimento de isquemia esforço-induzida. Isso é o que ocorre na angina estável. Manifestações Clínicas A angina estável é um desconforto no peito ou em áreas adjacentes causado por isquemia do miocárdio. É usualmente precipitada pelo esforço e está associada com um distúrbio da função miocárdica. Ou seja, ocorre isquemia miocárdica transitória, esforço- induzida, que melhora com o repouso. Paciente descreve um desconforto (pressão leve, aperto ou queimação, mas raramente “dor”). O local do desconforto é usualmente retroesternal, mas a irradiação é comum e ocorre geralmente ao longo da superfície ulnar do braço esquerdo; o braço direito e as superfícies externas de ambos os braços também podem ser envolvidos O episódio típico de angina pectoris começa usualmente de forma gradual e alcança a sua intensidade máxima em um período de minutos antes de se dissipar. Caracteristicamente, pacientes com angina preferem descansar, sentar ou suspender a caminhada durante os episódios. O desconforto no peito durante caminhadas no frio ou durante subidas é sugestivo de angina A angina pectoris típica é aliviada em minutos (1- 5min) pelo repouso ou pelo uso de nitroglicerina de ação curta. Uma demora de mais do que 5 a 10 minutos para obter alívio com repouso ou nitroglicerina sugere que os sintomas não sejam isquêmicos ou, entretanto, sejam causados por isquemia grave, como com IAM agudo ou angina instável. **Equivalentes anginosos como dispneia, lipotímia, astenia e eructações são comuns, particularmente em mulheres e idosos. A angina pós-prandial, causada presumivelmente por redistribuição do fluxo sanguíneo coronário, pode ser um marcador de DAC grave. Quando solicitamos ao paciente que localize o desconforto isquêmico, ele esfrega a mão difusamente sobre o esterno ou coloca o punho cerrado no meio do peito (“Sinal de Levine”) Angina Instável Angina em crescendo: Paciente com angina prévia, porém, diminuição progressiva do limiar anginoso Angina de início recente: Angina de início há no máximo dois meses, que evoluiu de forma rápida até a classe III da CCS Angina de Repouso: angina em repouso com > 20min de duração ocorrendo há no máximo uma semana Carolina Lucchesi | Medicina UNIT Classificação da Angina estável Canadian Cardiovascular Society (CCS) é uma modificação da classificação funcional da New York Heart Association (NYHA) Diagnóstico Exame Físico Pode ser absolutamente normal Entretanto, durante o episódio anginoso, pode fornecer indícios valiosos a respeito da existência ou não de DAC. Quando é possível realizar o exame físico do paciente na vigência de dor, Terceira Bulha (B3), Quarta Bulha (B4) ou galope, sopro de regurgitação mitral, desdobramento paradoxal de Segunda Bulha (B2) e estertoração pulmonar bibasal indicam achados sugestivos preditores de DAC ** Hipofonese das bulhas cardíacas, assim como rubor facial, pode indicar doenças do pericárdio e/ou pleura contígua ao coração Exames Laboratoriais São frequentemente detectadas alterações metabólicas que configuram fatores de risco para o desenvolvimento de DAC. Incluem hipercolesterolemia e outras dislipidemias, intolerância a glicose e resistência insulínica Solicitar: Hemograma, lipidograma função renal, glicemia/hemoglobina glicada, pesquisa de microalbuminúria e, no contexto clínico apropriado, função tireoideana Dosagem de proteína C reativa: Este reagente na fase aguda é considerado fator de risco independente para morbimortalidade cardiovascular em coronariopatias ECG de Repouso O ECG de repouso é normal em aproximadamente metade dos pacientes com CIE, mesmo aqueles com DAC grave. Durante um episódio de angina pectoris, o ECG apresenta-se anormal em 50% ou mais dos pacientes com ECGs de repouso previamentenormais. A alteração mais comum é a depressão do segmento-ST, embora possa ocorrer elevação do segmento-ST com normalização posterior, ou normalização de depressão prévia do segmento ST ao repouso (pseudonormalização) Assim, o ECG é indicado nos pacientes com suspeita de causa cardíaca para dor torácica (Grau de recomendação I, Nível de evidência B); durante um episódio de dor torácica (Grau de recomendação I, Nível de evidência B) Teste Ergométrico O Teste Ergométrico (TE) é o método não invasivo utilizado com maior frequência na angina estável, Carolina Lucchesi | Medicina UNIT visando especialmente à confirmação diagnóstica, à determinação prognóstica e à definição de conduta terapêutica. As variáveis mais preditivas relacionadas ao diagnóstico de obstrução coronariana são depressão do segmento ST ≥ 1 mm (medido a 0,80 segundo do ponto J), com configuração horizontal ou descendente, e a presença da dor anginosa. Ou seja, Infradesnível do segmento ST≥ 1 mm **Na ausência de contraindicações, costuma ser o método confirmatório de primeira escolha Protocolo mais utilizado é o Bruce, em que a velocidade e a inclinação da esteria são aumentados a cada três minutos Radiografia de Tórax A radiografia de tórax normalmente representa a primeira modalidade de imagem realizada nos pacientes com dor torácica O Rx é indicado nas seguintes situações: pacientes com DAC e sinais ou sintomas de insuficiência cardíaca congestiva (Grau de recomendação I, Nível de evidência B); pacientes com sinais e sintomas de doença pulmonar (Grau de recomendação IIa, Nível de evidência B); outros pacientes (Grau de recomendação IIb, nível de evidência B) Ecocardiograma A ecocardiografia constitui importante subsídio, tanto para a elucidação diagnóstica como para a avaliação do prognóstico, em pacientes com doença arterial coronária crônica Como a ecocardiografia possibilita a avaliação em tempo real da motilidade ventricular esquerda, técnicas que utilizam estresse pelo esforço físico ou farmacológico, seja ele inotrópico ou vasodilatador, permitem a documentação da extensão e da gravidade das alterações transitórias da motilidade ventricular esquerda A ecocardiografia com contraste ultrassônico à base de microbolhas representa um avanço no diagnóstico desses pacientes. Essas microbolhas medem aproximadamente de 3µ e se comportam no sangue como hemácias, sendo capazes de mapear toda a perfusão tecidual por meio de ultrassonografia. Elas preenchem a cavidade ventricular esquerda, permitindo precisa avaliação de alterações da motilidade segmentar e, após preencherem a microcirculação coronariana, permitem a avaliação do fluxo sanguíneo intramiocárdico, ou seja, da perfusão miocárdica Ecocardiografia sob estresse. A ecocardiografia sob estresse é um método não invasivo, estabelecido para a avaliação de pacientes com DAC obstrutiva suspeita ou conhecida. O estresse cardiovascular causa isquemia miocárdica em regiões supridas por uma artéria com grau significativo de estenose, e esse fenômeno é manifestado por alteração transitória da contração segmentar. Ressonância Magnética Atualmente é considerada o padrão-ouro para a quantificação dos volumes ventriculares, da fração de ejeção e da massa miocárdica. A principal indicação formal da cardio RNM seria nos pacientes que apresentam limitações para a realização de todos os outros métodos. (exemplos de limitações: indivíduos muito obesos e mulheres com mamas grandes) Angiotomografia coronariana A Angiotomografia Computadorizada das Artérias Coronárias (angio-TC) permite a avaliação da luz das artérias coronárias de maneira não invasiva. Não é solicitada de rotina, mas se utiliza na suspeita de anomalias congênitas na origem ou trajeto desses vasos Angiografia coronariana As lesões coronarianas são significativas quando há obstrução de uma ou mais artérias epicárdicas, com, no mínimo, 70% de estenose e/ou TCE com, no mínimo, 50%, sendo tais obstruções avaliadas e mensuradas pela CATE, exame diagnóstico com baixas taxas de complicações Alguns pacientes devem ser submetidos ao estudo invasivo, por ser o método mais acurado para diagnóstico de lesões coronarianas obstrutivas e também, em casos incomuns, causas não ateroscleróticas para angina, como espasmo coronariano, anomalia coronariana, doença de Kawasaki e dissecção primária da coronária. A CATE é efetiva quando o prognóstico do paciente frente ao tratamento clínico é ruim, com melhora após Carolina Lucchesi | Medicina UNIT o tratamento de revascularização, seja porangioplastia ou cirurgia. Tratamento O tratamento abrangente da CIE tem cinco aspectos: (1) identificação e tratamento de doenças associadas que possam precipitar ou piorar a angina e isquemia; (2) redução de fatores de risco coronários; (3) aplicação de intervenções farmacológicas e não farmacológicas para a prevenção secundária, com atenção particular dirigida para ajustes no estilo de vida; (4) tratamento farmacológico da angina; e (5) revascularização por intervenção coronária percutânea (ICP) baseada em cateter (Cap. 55) ou por enxerto bypass da artéria coronária (EBAC — também designada simplesmente cirurgia de revascularização miocárdica [CRM]), quando indicado. Tratar doenças associadas: anemia, ganho de peso acentuado, tireotoxicose oculta, febre, infecções e taquicardia Reduzir fatores de risco coronários Hipertensão. A hipertensão predispõe à lesão vascular, acelera o desenvolvimento de aterosclerose, aumenta a demanda de O2 pelo miocárdio, intensifica a isquemia em pacientes com DAC obstrutiva preexistente e predispõe à fibrilação atrial. Tabagismo. Em pacientes com DAC documentada angiograficamente, os tabagistas têm risco, em 5 anos, maior para morte súbita, IM e todas as causas de mortalidade, em relação àqueles que deixaram de fumar. O tabagismo pode ser responsável pelo agravamento de angina, além de progressão da aterosclerose. A cessação tabágica diminui o risco para eventos adversos coronários nos pacientes com DAC estabelecida Dislipidemia. Os resultados de ensaios de prevenção secundária de pacientes com história de CIE, angina estável ou IM prévio proporcionaram evidência convincente que a terapêutica efetiva para baixar lipídeos melhora significativamente a sobrevida global e reduz a mortalidade cardiovascular nos pacientes com DAC, independente dos níveis basais de colesterol. Obesidade. A obesidade é um fator de risco independente para CI Inflamação. A aterotrombose tem sido reconhecida como uma doença inflamatória. Tratamento Farmacológico Quanto à terapêutica medicamentosa, antiagregantes plaquetários, hipolipemiantes, em especial as estatinas, bloqueadores beta-adrenérgicos após IAM e Inibidores da Enzima Conversora de Angiotensina I (iECA) reduzem a incidência de infar to e aumentam a sobrevida, enquanto os nitratos, antagonistas dos canais de cálcio e trimetazidina reduzem os sintomas e os episódios de isquemia miocárdica, melhorando a qualidade de vida dos pacientes Betabloqueadores. Em adição às suas propriedades anti-isquêmicas, os agentes betabloqueadores são anti- hipertensivos efetivos e antiarrítmicos. Eles também mostraram redução na mortalidade e reinfarto em pacientes com IM, e redução na mortalidade em pacientes com insuficiência cardíaca. Essa combinação de ações os torna extremamente úteis no tratamento da CIE. As ações benéficas desses fármacos dependem da sua capacidade em causar uma inibição competitiva dos efeitos das catecolaminas neuronais liberadas e das circulantes nos adrenorreceptores beta O bloqueio beta reduz as necessidades de O2 do miocárdio, primariamente através da redução da frequência cardíaca; quanto mais lenta a frequência cardíaca maior a fração do ciclocardíaco ocupada pela diástole, com um aumento correspondente do tempo disponível para a perfusão coronária Os agentes betabloqueadores reduzem a demanda de O2 do miocárdio primariamente durante a atividade ou excitação, quando ocorrem surtos de atividade simpática aumentada. Os agentes betabloqueadores podem reduzir o fluxo sanguíneo para a maioria dos órgãos através de uma combinação de vasoconstrição alfa-adrenérgica sem oposição e bloqueio de receptores beta2 Carolina Lucchesi | Medicina UNIT
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