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Resumo - Geografia Humana Sociedade, Espaço e Ciência Social

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Geografia Humana
Sociedade, Espaço e Ciência Social
· Introdução: geografia humana, mudança social e ciência social
Derek Gregory, Ron Martin e Graham Smith
	A tarefa principal desse livro consiste em apresentar os paradigmas da geografia humana em relacionamento com o restante das ciências sociais. O livro está divido em duas partes principais: a PARTE I diz respeito ao “cerne de nosso mundo geográfico” (segundo os autores, à economia, ao estado e à sociedade), e a maneira pela qual as teorias desses mundos “interligados” podem ajudar nas investigações geográficas. Na PARTE II desse livro, por sua vez, realiza-se um exame sistemático de perspectivas geográficas selecionadas que cruzam fontes de poder econômico, político e social, apresentando ao leitor temas contemporâneos de análise em geografia humana. 
PARTE I: O NÚCLEO DA GEOGRAFIA HUMANA
· Teoria econômica e geografia humana
Ron Martin
Nesse capítulo, Ron Martin aponta as relações entre a teoria econômica e a geografia humana. O autor argumenta que desde os anos 1970 vem ocorrendo rupturas em série na constituição da economia de espaço e no nosso modo de pensar a respeito, como reflete no que tem sido comumente identificado como uma fase nova qualitativamente diferente do desenvolvimento capitalista, em associação com, entre outras coisas, o advento de novas tecnologias de informação e comunicação, padrões de consumo mais diferenciados e individualizados e a renegociação dos limites e relações entre mercados econômicos e nações-estado, entre esferas públicas e privadas da atividade econômica. Essas mudanças estimularam uma série emaranhada de atividades teóricas que desafiam os modos tradicionais de pensar a respeito da economia e do espaço. Ao conduzir o leitor por uma crítica dessa reformulação teórica, incluindo a teoria da regulamentação e o pós-modernismo, este capítulo sustenta que, se devemos compreender a maneira como tais mudanças e alterações estão modificando o significado e o funcionamento da economia capitalista, então, as tarefas-chave devem ser a construção de uma economia contextual e de uma geografia econômica nas quais a inteligação sócio-espacial é deslocada para o centro do palco em vez de rebaixada a uma eventual participação secundária. 
	
Preâmbulo: a geografia humana na encruzilhada
	O autor argumenta que muito embora a geografia econômica tenha existido como subdisciplina, foi somente a partir da Segunda Guerra Mundial que sua história intelectual foi mais cuidadosamente modelada pela economia. Nos anos 1980, a geografia econômica dava mostras de ter se constituído num campo estável e bem estruturado, organizado em torno de dois programas básicos e interligados de pesquisa, utilizando os conceitos da economia neoclássica, de Marx e de Keynes: a dinâmica da localização industrial e o processo de desenvolvimento regional desigual. O autor argumenta que apesar do fato dessa trigemonia teórica produzir análises conflitantes e contrastantes, havia princípios, pressupostos e aspirações partilhados (ainda que não assumidamente) que serviram para dar uma unidade à geografia econômica durante sua evolução dos anos 1950 até a metade dos anos 1980. 
	A economia capitalista moderna era vista como um sistema industrial, com padrões e trajetórias de localização regulares e um desenvolvimento regional “bem-comportado” e previsível. Essa ordem observada proporcionava a justificativa para interpretações essencialistas, onde os processos formadores da economia espacial eram atribuídos a forças irreversíveis de desenvolvimento e mecanismos comportamentais – uma visão que ajudou muito na ambição de formular leis genéricas e universais de localização industrial e de desenvolvimento regional, tornando a moderna geografia econômica objetivista, em detrimento da dimensão subjetiva. Nos últimos anos, entretanto, o que se tem visto é que as teorias, premissas e princípios da geografia econômica moderna foram progressivamente questionados, levando à reformulação dos seus dois principais programas de pesquisa.
	O que o autor propõe para esse capítulo é analisar as razões que levam a essa ruptura; são três as fontes para esse movimento, segundo Martin: surgimento de “novas realidades econômicas”; (justamente por conta da fonte anterior) crise na e em economia, nenhuma das escolas de economia explica adequadamente os acontecimentos e mudanças das últimas duas décadas; contestação das bases ontológicas e epistemológicas da investigação teórica propriamente dita. O autor considera que a geografia econômica encontra-se em uma encruzilhada decisiva com relação tanto ao seu modo de teorizar, quanto a seu conteúdo empírico.
A economia em mutação
	Muitas opiniões diferentes têm surgido acerca do que consistem as mudanças na economia capitalista a partir dos anos 1970. Uma das mais profundas transformações é o advento de um novo “paradigma tecno-econômico” baseado em informação – enquanto o paradigma do pós-guerra era baseado em petróleo de baixo custo, maquinária elétrica etc., as bases do novo paradigma são as tecnologias da informação e da comunicação, microeletrônica, computadorização etc.; trata-se de uma mudança tanto na organização técnica, corporativa e social da produção, como também os padrões de demanda, consumo e distribuição. A segunda mudança consiste na aceleração da “terciarização” do desenvolvimento econômico – serviços de setor privado, o produtor, o consumidor, o setor financeiro, o setor cultural e de lazer, todos se expandiram, enquanto a indústria estagnou ou mesmo desindustrializou-se. A terceira mudança é o que vem sendo chamado “hiper/superconsumismo”, a nova cultura do consumo de massa (individualizada, crédito instantâneo, mídia e publicidade, “indústria da cultura” etc.). A quarta grande mudança é a da globalização, sobretudo nos âmbitos corporativo (“teias empresariais” globalmente descentralizadas) e financeiro (economia supranacional de “moeda sem pátria”). Finalmente, o autor chama atenção para o novo método de regulamentação econômica que levou a uma renegociação dos vínculos e fronteiras entre Estados e mercados, entre a esfera pública e privada da economia [pág.36 e 37, as consequências dessas mudanças].
	O autor faz notar como, geograficamente, o panorama econômico tem mudado radicalmente. Enquanto algumas indústrias e serviços estão se desconcentrando e descentralizando, outras fazem o caminho inverso. Da mesma forma, áreas economicamente abandonadas de grandes cidades foram transformadas em novos espaços de consumo, espetáculo e comércio, acirrando as dificuldades econômicas e sociais de outros bairros. Também, ele argumenta que a paulatina internacionalização e integração das economias nacionais/regionais/locais tem provocado uma progressiva desarticulação no seu funcionamento interno. 
	O argumento principal salientado pelo autor é que as alterações e mudanças em andamento estão modificando o sentido e o funcionamento da economica capitalista. No novo capitalismo, a economia “simbólica” da moeda e crédito domina a economia dos bens e serviços, ou seja, o dinheiro e as finanças ficaram “protegidos”, negociados e especulados em busca de lucro sem estarem vinculados à produção de bens e serviços (capitalismo “administrador de dinheiro”). Esse processo tem levado a uma redefinição das economias “nacionais” (para não falar das “regionais” e “locais”). O autor nota que um momento crítico como o presente ocorreu pelo menos duas outras vezes antes em economia, as “revoluções” econômicas dos anos 1870 (da economia clássica a neoclássica) e de 1930 (da economia neoclássica a keynesiana), mas que por a geografia econômica ser subdesenvolvida nesses momentos esta não foi afetada pelas transformações. Na atual conjuntura, por sua vez, não há como “escapar”.
	Segundo Martin, o que está em questão propriamente não é a primazia da interpretação das correntes do pensamento econômico, mas sim a “historicidade dos conceitos”. Como geógrafos econômicos, estamos interessados em formular teorias de desenvolvimento regionaldesigual que tenham uma orientação explicitamente histórica. Em um contexto de velozes e intensas transformações, à medida que a natureza e a organização do capitalismo mudam, o mesmo acontece com o conteúdo de conceitos como “mercados”, “capital”, “trabalho” etc. Em suma, não podemos esperar que os mesmos conceitos e teorias se aplicassem a diferentes épocas do desenvolvimento econômico capitalista. 
Novas perspectivas para novas realidades
	 
	À medida que as perspectivas tradicionais das principais correntes do pensamento econômico foram questionadas, ocorreram movimentos que buscaram renovar o seu conteúdo (neokeynesianos, neomarxistas e ‘neo’neoclássicos). Além dessas reformulações, nesse momento surgem diversas novas escolas, atentas as novas características do contexto econômico (neo-sraffiana, organizacional, evolucionária, neo-schumpeteriana etc.). No âmbito da geografia econômica, algumas dessas novas abordagens foram adotadas, sendo o enfoque básico o de obter uma teorização sinótica geral das novas realidades, um novo conceito mestre de larga escala da economia espacial capitalista que fosse capaz de indentificar os “grandes processos e estruturas” em operação e demonstrasse a interconexão de padrões diversos de mudança e transformação. No entanto, todos os modelos criados apresentam uma forte tendência à generalização, apresentando uma estrutura interpretativa em que tanto as antigas como as novas realidades são altamente estilizadas e idealizadas por meio de “tipologias opostas”. Esses modelos tendem a impor uma fachada de coerência sobre o que de fato é uma realidade muito mais confusa, complexa e desestruturada, quando na verdade nenhum deles é suficientemente desenvolvido para oferecer uma nova fundamentação teórica convincente para a geografia econômica [págs. 41-46 exemplos de insuficiência analítica dos modelos da geografia econômica em face às transformações do capitalismo]. 
	O que o autor busca salientar é que a geografia econômica, apesar de toda reavaliação e reformulação dos últimos anos, continua sendo preponderantemente uma geografia industrial, tendo como consequência uma visão bastante restrita das novas realidades econômicas, que se estendem muito além do domínio da indústria. “As geografias de dinheiro, informação, tecnologia, consumo, serviços e regulação estatal são todas de igual importância e cada uma suscita seus próprios problemas e questões”. 
A epistemologia pós-modernista e o panorama econômico
	Segundo Martin, o desafio não consiste apenas em achar novas estruturas teóricas mais apropriadas para as realidades econômicas em mutação, mas também o de confrontar a crítica pós-modernista, que põe em questão a própria ideia de teoria em si. O modernismo repousa na crença de que o mundo pode ser compreendido (e em alguma medida controlado) pela aplicação da ciência e da razão, que por debaixo do aparente caos da vida econômica e social, percebem-se tendências universais e pontos em comum, que cabe ao cientista social revelar. O pós-modernismo contesta essas suposições, incitando que vejamos o mundo como uma pluralidade de espaços e temporalidades heterogêneas – segundo o autor, complexidade, indeterminância, contextualidade e incerteza são as palavras-chave. A epistemologia pós-moderna refuta as categorias totalizantes e explicações racionalistas em favor de micro-narrativas ricas em contexto, conhecimento local e explicações particulares.
	Primeiramente, o pós-modernismo colocou em dúvida a metodologia e epistemologia das teorias e correntes principais modernistas, atacando suas fundações científicas, essencialistas e verificacionistas. Em segundo lugar, promoveu um interesse pela economia como discurso. Em terceiro lugar, começou a desafiar o conteúdo e as categorias centrais da matéria. No âmbito da geografia econômica, existe igualmente um crescente interesse pelas práticas discursivas que permeiam as diversas teorias e explicações da paisagem econômica, além do que, a virada pós-modernista foi também fundamentada na convicção de que um dos sinais do novo capitalismo é a fragmentação generalizada (geradora de diversidade econômica, social e espacial) que supostamente solapa o escopo da teorização genérica. Nesse contexto, a particularidade espacial, o contexto local e a especificidade do lugar assumiram proeminência como referências analíticas, o que, para o autor, é uma nova maneira de focalizar a “diferenciação de área”. 
	Deve-se dizer, no entanto, que grande parte do “pensamento pós-modernista” não levou a construção de uma economia pós-moderna identificável ou geografia econômica pós-moderna. Muito embora os teóricos pós-modernos tenham lançado valiosa luz sobre as novas tecnologias, sobre o hiperconsumo e sobre a mercantilização cultural e informacional que caracterizam o novo capitalismo, nenhum ofereceu uma análise ou conceitualização da economia ou de seu relacionamento com o estado e a globalização. Para Martin, três questões inter-relacionadas, oriundas dos comentários dos pós-modernos, merecem uma discussão específica: a) o desafio pós-moderno nos obriga a um exame crítico apurado quanto ao significado de “realidade econômica” e seu relacionamento com os vários modelos teóricos e modos de discurso usados por nós – “a economia e a geografia econômica são inescapavelmente ideológicas”; b) o pós-modernismo dirige a atenção para a inconclusividade e o relativismo de nossas explicações e análises ao afirmar que tudo que existe são múltiplicidades de conhecimentos fragmentados, parciais e igualmente válidos; c) os eventos econômicos são necessariamente contextuais, isto é, encravados em estruturas espaciais de relações sociais. 
	“de várias maneiras o ‘desafio pós-moderno’ está fazendo com que os geógrafos econômicos examinem com mais afinco sua maneira de explicar e teorizar. Embora isso não ofereça por si só uma visão satisfatória da economia, nem uma orientação programática quanto à elaboração ou conteúdo da teoria econômica ou geográfica, obriga-nos a atribuir uma maior importância epistemológica ao caráter pluralístico da economia espacial contemporânea, não apenas no sentido de reconhecer a diversidade de suas formas de superfície, como também no sentido de incorporar essa diversidade explicitamente em nossas categorias conceituais e modos de explicação. Também nos obriga a questionar a autoridade e o posicionamento de nossas pretensões de conhecimento”.
	
Poslúdio: em direção a uma geografia econômica de múltiplas dimensões, perspectivas e vozes
	O autor buscou apresentar um panorama representativo dos desafios e mudanças que atualmente afetam a geografia econômica. Ele argumenta que é necessário pensar novos conceitos e teorias que se apliquem as novas realidades do capitalismo global. Como ele demonstrou no decorrer do texto, as tentativas de reformular as teorias das principais correntes do pensamento econômico moderno não estiveram a altura do desafio, não que elas sejam completamente destituídas de valor. Para Martin, o programa de trabalho deveria ser o da reconstrução da geografia econômica em termos multidimensionais, multivocacionais e de múltiplas perspectivas. Uma geografia econômica multidimensional procuraria oferecer uma análise dos diferentes níveis ou campos do processo econômico e as maneiras pelas quais estes campos interagem para produzir uma configuração específica de desenvolvimento desigual (considerando simultaneamente os problemas em face das suas relações escalares: microeconomia dos indivíduos e empresas; a macroecnomia da nação-estado; a economia do capital e finanças transnacionais; a economia global mundial). Por uma geografia econômica multivocal, o autor entende uma disciplina preocupada em reconhecer e atribuir substancial importância teórica aos diferentes grupos sociais que constituem a “economia”, considerando suas experiências e papeis específicos. Por fim, ele argumenta que cabe aos geógrafos econômicos buscar uma integração entre os fenômenos “macro” e “micro”, mas sem abandonar a pretensão de uma teoria,refutando assim as “fragmentadas microperspectivas” e interpretações pós-modernistas. 
		
· Teoria política e geografia humana
Graham Smith
Interligadas, mas não simplesmente redutíveis à reconstituição da economia do mundo capitalista, foram as importantes mudanças na constituição de políticas e na forma territorial mais poderosa assumida pela política, a nação-estado. Processos de globalização e políticas com base local estão desafiando o significado de soberania, sobre a qual repousa um importante locus de poder do estado. Como Graham Smith sustenta em seu capítulo sobre teoria política e geografia humana, tais desafios à soberania do estado significam que, como geógrafos, precisamos repensar nossas teorias de estado-cidadão e como essas noções de identidade-cidadão e direitos-cidadão estão passando por uma redefinição em consequência do que ele chama de uma nova espacialidade de política. Ele ilustra esse fato considerando uma variedade de movimentos sociais empenhados na renegociação dos limites sociais e geográficos da cidadania, que vão desde movimentos etno-regionais até movimentos ambientais. Dentro de um contexto global, esses movimentos sociais, ele afirma, são sintomáticos de contextos sócio-espaciais divergentes ligados a determinadas transformações sociais que estão agora em curso no primeiro, no segundo e no terceiro mundos.
	Após relatar a renovação do interesse pela teoria política na geografia, a partir dos anos 70, Smith apresenta o tema que ele vai se dedicar nesse capítulo. O argumento principal sustentado é o de que a empreitada central com que esta “nova geografia política” se defontra agora é dedicar-se às até então relegadas maneiras pelas quais as atuais transformações afetam a nação-estado, reconhecido como o agente político individualmente mais importante da organização territorial do mundo, e que está passando por desafios mais profundos do que em qualquer época da história moderna, trazendo implicações não só para a geografia política, mas também para o estudo mais geral da geografia humana. 
Mapeando a condição política
	Smith afirma que no âmago do desafio ao estado-nação está a questão da soberania política – entendida como a noção de que é a comunidade política do estado a que exerce autoridade suprema sobre uma jurisdição territorial. Ele afirma que nós nos acostumamos a interpretar o mundo político com base nessa visão, como se esta fosse a imagem apropriada de como o espaço político deveria ser organizado, demarcado e teorizado. Dois pressupostos da noção de soberania política: a) é reforçado por um relacionamento simbiótico entre o estado e seus cidadãos nacionais; e b) em adição aos próprios limites territoriais, o estado está em relação com outros estados soberanos. O que atraiu de alguns teóricos políticos, com pouca participação dos geógrafos, é a maneira pela qual esses conceitos de soberania e a sua associação com a nação-estado são desafiados. Para o autor, estes desafios emanam tanto “de cima” (processos globais), quanto “de baixo” (formas localizadas de ação coletiva, descentralizadas e baseadas na comunidade) – perspectiva do estado-nação. Segundo o autor, essas são as duas impressões acerca dos desafios do estado-nação. 
	A primeira é a que entende que o mundo está se tornando cada vez mais interligado dentro de um contexto de globalização. Um dos impactos desse processo foi o questionamento e o desgaste dos poderes autônomos do estado-nação, onde o destino das localidades é cada vez mais determinado além da jurisdição territorial do estado (UE, OTAN, FMI, OIM, OPEP, entre outros). A segunda das impressões está fundamentada em um sentimento de que o “bem político comum”, no qual se fundamenta a autoridade do estado democrático soberano, não deveria simplesmente ser interpretado com a prerrogativa do estado-nação (ONGs transnacionais, movimentos LGBT, movimentos ambientais, movimento pela paz mundial, entre outros). Resumo da tese do autor: “estes desafios ‘de cima’ e ‘de baixo’ não estão apenas questionando se o estado-nação é apropriado como comunidade política mas também refletem o que quero denominar de uma nova espacialidade à política”.
	Estes processos locais e globais de reforma espaço-política podem ser conceitualizados da seguinte maneira: a) os processos de globalização estão permitindo maior integração e capacidade de interconexão entre estados e localidades; b) formas localizadas de ação-política coletiva também estão desafiando o estado-nação; c) este duplo desafio ao estado-nação levanta questionamentos acerca da forma mais apropriada de “comunidade política” no mundo moderno, em particular o significado de cidadania. O restante do capítulo ele dedica a esboçar a nova espacialidade da política.
Globalização e teoria de sistemas-mundo
	O que sustenta a teoria dos sistemas-mundo é que o capitalismo, desde o príncipio, nunca foi um sistema restrito às amarras do estado-nação, mas sim um sistema com aspirações globais. É, portanto, o capitalismo que sustenta a lógica de um sistema mundial interdependente e interestatal em que os processos econômicos e sociais de todo o mundo são sistematicamente interelacionados. Nessa concepção, o sistema interestatal e a competição entre estados só podem ser compreendidas dentro de um contexto estrutural de relações de mercado, onde o estado tem por objetivo final de assegurar a acumulação do capital. O impacto da globalização é desigual pois a lógica espacial do capitalismo favorece algumas localidades em detrimento de outras – base da distinção de Wallerstein dos estados-nação entre centro, semiperiferia e periferia. De acordo com essa teoria, o “motor” da economia capitalista é justamente essa competição entre os estados, e a sua posição nessa “hierarquia” é referente ao “potencial” de cada uma delas de agir, com diferentes graus de sucesso, nos processos globais. 
	Segundo Wallerstein, dois tipos de movimento contestatório ascenderam durante os primeiros dois terços do séc. XX, os socialismos de estado e as independências nacionais. Com o sucesso político desses movimentos ocorreram mudanças em todo o sistema-mundo – nos países do primeiro mundo, foi implantado o estado de bem-estar social (welfare state); no dito “segundo mundo” criaram-se estados socialistas empenhados na melhoria do bem-estar dos seus cidadãos, se bem que as expensas de seus direitos civis e políticos; no terceiro mundo, ou na periferia, lograram êxito diversos movimentos de independência nacional, estabelecendo a condição de estados soberanos e conquistando certo grau de desenvolvimento econômico e social. Com a crise no capitalismo global nos anos 80, as mudanças também ocorreram em termos de um sistema-mundo: no primeiro mundo o estado de bem-estar social perdeu espaço para o neoliberalismo; as economias socialistas de estado naufragaram, culminando na queda do muro de Berlim; e no terceiro mundo a crise solapou o desenvolvimento, o que levou a substituição do “imperialismo formal” pelas condições de austeridade do FMI. Esses processos deram margem ao surgimento de diversos movimentos contestatórios em todas as partes do mundo, de movimentos feministas da Escandinávia até células jihadistas fundamentalistas nas Filipinas.
	Graham Smith em seguida traz as contestações para a teoria de sistemas-mundo como estrutura para compreender as ligações entre globalização, estado-nação e lutas sociais. Segundo ele, três dimensões exigem maior grau de elucidação: a natureza multidimensional do desafio da globalização, o relacionamento entre nação-estado e democracia e o ressurgimento de recentes movimentos sociais. 
O desafio da globalização
	Um dos principais problemas da teoria de Wallerstein diz respeito a sua concepção de globalização, reduzida à lógica do sistema capitalista e a competição entre os estados-nação por recursos escassos. Segundo Smith, a globalização tem um âmbito mais amplo e multidimensional, estando sujeita a uma intensidade dinâmica mais latente na natureza de sua capacidade de interligação, que a teoriade sistemas-mundo não revela. Três aspectos são particularmente cruciais: a) o papel desempenhado por certos atores principais não-estado como as corporações e instituições transnacionais na globalização da produção e das finanças; b) o papel desempenhado por formações de blocos de poder no processo de globalização; e c) um aspecto adicional da globalização inserido na noção de “uma cultura global”, associada a difusão de valores e estilos de vida ocidentais (com peculiaridades que a distinguem das velhas formas de imperialismo cultural, notadamente, o caráter comercial e não-nacionalista).
O estado-nação, soberania e democracia
	“Um dos problemas da teoria de sistemas-mundo é a tendência de encarar a natureza dos regimes de estado como sendo, em grande medida, uma função do seu lugar dentro da economia mundial. Entre outras coisas, isto marginaliza o papel que os atores autônomos locais e nacionais, diferentes culturas políticas e geopolíticas desempenham na determinação da natureza das formações de estado”. Smith aponta duas grandes tendências em relação às democracias representativas contemporâneas, cada qual com uma proposição distinta para o papel do estado: a “Nova Direita”, desejosa de uma menor participação do estado e defensora das liberdades e potencialidades individuais, e a “Nova Esquerda” que, por reconhecer o papel do estado no sistema de acumulação capitalista, defende que seu papel deva ser justamente o de intervir em favor dos mais vulneráveis, provendo serviços coletivos. Ele nota também uma tensão por conta da transferência de compromissos do cidadão do interesse público para o privado, considerandos uma ameaça ao estado-nação tanto quanto os movimentos de protesto. Por fim, há o problema de determinar se a democracia representativa é mais bem servida pela criação de um conjunto homogêneo de cidadãos ou pelo atendimento em seprado das necessidades particulares de “grupos subordinados”.
A geografia política e os movimentos sociais
	Um dos problemas principais da teoria dos sistemas-mundo, segundo Smith, é a redução dos movimentos sociais a meras derivações da economia capitalista global e a maneira como as ações dos estados-nação estão confinadas por seu lugar dentro da economia mundial capitalista. Smith argumenta que os movimentos sociais contemporâneos – definidos como “um ator coletivo constituído por pessoas que se entendem e têm interesses comuns, e, por pelo menos uma parte significativade sua existência social, uma identidade comum” – são múltiplos em suas formas e acabam abarcando grande quantidade de “políticas oposicionistas”. Sobre os movimentos sociais, Smith apresenta quatro ingredientes vitais: a) os movimentos sociais são tanto produto como agentes de transformações sócio-espaciais; b) eles precisam apelar pra alguma forma de identidade ou percepção coletiva (um aspecto interessante para a geografia humana é justamente essa percepção associada à localidade); c) um movimento social dedica-se à mobilização das massas como uma fonte primordial de sanções sociais e, portanto, de poder; d) a associação é captada a partir de grupos subordinados que constituem um movimento social precisamente porque eles traduzem sua exclusão e alienação em uma ação social concreta. O que se torna evidente é que a natureza dos movimentos sociais e as questões que eles levantam dependem, entre outras coisas, do impacto diferencial da globalização, cultura política, desenvolvimento sócio-econômico e a natureza do estado aos quais estão ligados. 
Da sociedade industrial à sociedade pós-industrial
	A suposta transição do modelo de produção capitalista (fordista para o “pós-fordismo”) foi tida como causa para a proliferação dos novos movimentos sociais mundo afora. Smith aponta diversos autores que partilham essa premissa, para depois relatar de forma mais detalhada as ideias de Offer a esse respeito. Segundo ele, os novos movimentos sociais estariam insatisfeitos com o binômio “crescimento-segurança”, predominante nas democracias ocidentais do pós-guerra, e que por conta disso levantariam questões baseadas em valores alternativos aos do crescimento econômico e da segurança geopolítica – qualidade de vida, participação individual, preservação ambiental, paz, entre outros. Smith, no entanto, faz ressalvas quanto a suposta novidade desses movimentos, alegando que muitos deles (feminista, ambientalista etc.) tem suas raízes no séc. XIX, não tendo se desenvolvido em um vácuo histórico. Para Smith, a novidade desses movimentos sociais reside em quatro elementos: a) sua escala geográfica de ação comunitária e política não está confinada à especificidade político do estado-nação; b) os novos movimentos sociais não são baseados em políticas de classes ou na divisão do trabalho; c) ao contrário dos movimentos sociais tradicionais que consideravam o estado como meio para conquistar objetivos ou assegurar o poder, os novos movimentos sociais não pautam suas atividades exclusivamente pelo estado; e d) os novos movimentos sociais são muito abrangentes e suas origens e processos são contextuais e variadas. 
Da sociedade socialista à sociedade pós-socialista
	Segundo Smith, os movimentos sociais no dito “segundo mundo” são um fenômeno novo, amplamente associado com o colapso do socialismo de estado e com a transição para sociedades pós-socialistas. Smith distingue esses movimentos sociais do ex-bloco socialista daqueles de tipo ocidental (como descritos acima), afirmando também que é reducionista entendê-los na ótica da teoria dos sistemas-mundo, onde são vistos somente enquanto movimentos (capitalistas) anti-sistêmicos. Foram três acontecimentos que acarretaram o crescimento dramático da atividade desses movimentos na antiga União Soviética e no resto da Europa Oriental, a partir dos últimos anos da década de 80: a) baixa credibilidade do socialismo de estado nesses países, que falhava em se colocar como alternativa superior ao capitalismo e à modernidade; b) impacto gradual da mudança social associada à urbanização da sociedade e, em particular, com o surgimento de uma intelligentsia urbana, opositora dos quadros tradicionais do estado; e c) a “abertura da sociedade civil” dos países do bloco socialista – glasnost e democratização do período Gorbatchev –, que forneceu as bases sócio-territoriais para movimentos de mudança da sociedade.
	Para ele, a característica mais marcante desses movimentos sociais foi sua condição de demarcação, majoritariamente étnico-regional, e os fortes clamores nacionalistas – o levante era dirigido contra cinco décadas de socialismo soviético imposto, sendo os movimentos pró-soberania e anticentristas. Nas repúblicas não-russas do extinto império soviétivo, a russificação, o socialismo e a sovietização eram considerados ligados à violação colonial dos direitos nacionais , de modo que os “movimentos populares” dessas localidades reuniam uma ampla variedade de grupos e organizações – étnico-regionais, ecológicos, feministas, religiosos etc. – sob a crença partilhada de que a salvação residia na soberania territorial ou na independência. 
Conclusões
	Smith buscou delinear nesse capítulo as principais agendas de interesse em teoria política, o futuro do estado-nação e a maneira em que os processos “globais” 	 e “locais” estão transformando o significado da soberania. Segundo ele, estes processos estão ligados “com uma espacialidade em política em que os processos globais têm implicações para as políticas de lugar e o modo como o lugar da política, pelo menos nas tardias democracias modernas, está cada vez mais sendo conduzido em termos ‘pós-nacionais’ e em esferas ‘pós-nacionais’”. 
· Teoria social e geografia humana
Derek Gregory
No capítulo final da Parte I, Derek Gregory explora o terreno da teoria social e seu relacionamento com a pesquisa geográfica. Exige-se que nossas pesquisas se desloquem para arenas de pensamento mais ricas e de definição menos estreita de pensamento e de interpretação de nosso mundo e do mundo de outros povos. Isso significa reconhecera natureza problemática da construção teórica baseada no eurocentrismo, da qual nem a geografia como ciência espacial nem a geografia marxista conseguiram se desvencilhar com êxito. Através da visão geométrica da geografia como ciência espacial, os lugares e sua população eram interpretados dentro de um esquema teórico que enfatizava a generalidade através da abstração homogênea e uma liberação otimizada das lutas e preocupações cotidianas. De fato, o envolvimento dos geógrafos com o marxismo foi, em parte, uma resposta a uma ciência espacial incapaz de enfrentar um mundo de injustiça social. Mas a tendência de recorrer ao marxismo clássico, aquele que analisava cenários de acumulação de capital produzido por processos sociais em espaços materiais, refletia, em parte, um envolvimento com o marxismo que parecia insensível às ricas tradições intelectuais que enfatizavam a importância da cultura, da moralidade e da política. O que isto significa é que presicamos reformular nossa teoria social onde os envolvimentos com o materialismo histórico, a teoria da estruturação e a teoria feminista oferecem, de diferentes maneiras e em graus variados, blocos de construção mais ricos para geografias mais envolventes e compromissadas.
Montanhas e ilhas
	Gregory busca, neste capítulo, apresentar algumas das relações entre teoria social e geografia humana. Por teoria social entende-se uma série de discursos sobrepostos, argumentativos e contraditórios que procuram de várias maneiras e com vários propósitos ponderar explicitamente e mais ou menos sistematicamente sobre a organização da vida social, tornar inteligíveis as práticas sociais e intervir em sua conduta e consequências (a teoria social não se limita a uma disciplina específica). Segundo a interpretação e o uso de Gregory, a teoria social não é um tratado expositivo sobre a vida social, mas uma intervenção na mesma, sendo (sempre e em todo lugar) fundamentada, elaborada para atender circunstâncias particulares, comprometida em constelações de poder, conhecimento e espacialidade. Segundo o autor, a teoria social está em constante movimento, e no seu deslocamento acaba agregando uma série de pressupostos que acarretam em transformações. As ciências não escapam às mútuas imbricações de poder e conhecimento envolvendo-se em um manto de objetivismo.
	O propósito de Gregory é pensar nas implicações mais amplas do interesse contemporâneo na teoria social e geografia humana, cuja consequência mais direta, na opinião do autor, é um interesse em lugar, espaço e paisagem como uma das preocupações centrais das humanidades e ciências sociais como um todo – indicando que o discurso da geografia tornou-se mais amplo do que a disciplina. O autor argumenta que essa aproximação não se dá unicamente pelo contato entre a teoria social e a geografia humana, havendo outras fontes de diálogo transdisciplinar e, também, que o debate intelectual constantemente cruza as fronteiras disciplinares, não sendo “propriedade” de nenhum campo científico. Desse modo, o discurso da geografia não está confinado a uma disciplina em particular, nem mesmo aos vocabulários acadêmicos especializados. Sendo a aproximação entre a teoria social e a geografia humana pouco explorada, Gregory se propõe a realizar um “mapa-esboço” dessa relação. 
Ciência espacial e o mundo-como-exposição
	Em meados do séc. XX a disciplina da geografia foi reformulada como “ciência espacial” e definida em termos de uma focalização própria sobre a organização e ordem espacial. Gregory afirma que essa concepção corresponde ao que Mitchell denominou de “mundo-como-exposição”, que diz respeito, em termos gerais, a uma ordem imanente, constituindo um quadro independente dos objetos por ele enquadrados. Nas décadas seguintes ao pós-guerra o mesmo conceito de ordem constitui-se enquanto ponto central da ciência espacial anglo-americana (anos 1960, momento de apogeu da new geography) – segundo Haggett, geógrafo desse movimento, “a ordem não depende da geometria do objeto que vemos, mas da estrutura organizacional em que o colocamos”. A análise locacional assim concebida buscou organizar o espaço em séries de geometrias abstratas (movimentos, redes, nódulos, hierarquias e supercífices). A ciência espacial prometia engajar tanto a geografia física quanto a geografia humana na exploração conjunta das estruturas espaciais, tendo Hagget, inclusive traçado um paralelo entre a geografia moderna e a física moderna.
	As versões mais adiantadas da ciência espacial não eram unicamente determinadas pela contemplação geométrica, mas focalizavam modelos parciais ou gerais de um panorama econômico ou “economia de espaço”. Segundo Gregory, essa concepção de ordem espacial que eles supunham inerente ao panorama humano (inspiradas na economia neoclássica) acabou por fortalecer as conexões com a ciência física. Se isto produziu uma geografia humana conceitualmente apartada do social, esta geografia repercutiu no social através de seu ensino e programas de pesquisa – foi uma forma de racionalidade direcionada para a alocação de meios para os fins. Gregory faz notar como, embora as narrativas raramente tenha se dado conta do envolvimento da ciência espacial na racionalização da ação social, o conhecimento disciplinar da ciência espacial foi sistematicamente conectado ao poder disciplinador. Ao usar as ciências físicas como modelo, esta visão da geografia humana endossou (“naturalizou”) efetivamente as estruturas existentes da vida social – a exemplo das crescentes exibições gráficas de sistemas de informação geográfica (SIG) e outras tecnologias políticas.
Os contornos do marxismo
	Gregory faz notar que a geografia humana foi um dos últimos ramos das ciências humanas a levar a sério o marxismo. Isso se dá por duas razões, primeiro o contexto dos anos 60 (Vietnã, interesse pelos direitos civis, movimentos estudantis etc.) e ainda pelo momento intelectual do programa dominante de pesquisa, apontado por Harvey, como incapaz de fornecer explicações satisfatórias para a realidade de então. No entanto, neste novo cenário a economia mantem um papel de extrema relevância, como tivera em relação à ciência espacial, deixando de fora o interesse de outros planos (político, cultural) na constituição da economia capitalista. Porém, as estruturas espaciais não eram mais geradas por modelos de processos de pontos em espaços matemáticos e a geografia humana passou a analisar os panoramas de acumulação de capital produzidos por processos sociais em espaços concretos. Desse momento em diante, crise e contradição eram conectadas à produção e reprodução do espaço, sendo as transformações não mais meras operações topológicas, mas complexas consequências de processos e conflitos sociais. O materialismo histórico marxista teve um importante na relocalização do estudo das dinâmicas geográficas, tirada dos laboratórios das ciências físicas e alocada nos campos das humanidades. “A partir do momento em que a geografia se liberta da jogada naturalizante de ciência espacial, e uma vez que as particularidades delinquentes do mundo foram desvinculadas de uma linguagem antes restrita a “desvio” e “resíduo”, tornou-se possível pensar nas práticas sociais em outros termos e imaginar outros cenários”.
	O cerne da crítica da geografia marxista à Nova Geografia é que esta teria separado as estruturas sociais dos montes de relações sociais que nelas estavam integradas, resultando em um retraimento generalizado da análise de estrutura espacial. Os estudos do materialismo histórico foram incorporados de tal maneira pela geografia humana que os estudos do desenvolvimento desigual do capitalismo conduzidos sob a sua bandeira, estavam não apenas apontando os contornos do desenvolvimento econômico – “maneiras pelas quais o capitalismo foi constrangido pelas paisagens sedimentadas depositada por meio de sucessivos ciclos de acumulação” – mas também uma importante lacuna na obra de Marx. O marxismo ocidental do século XX manteve um silêncio com relação à espacialidade do capitalismo, tendose dedicado muito mais as suas temporalidades. Muitos autores concordam que a produção do espaço assumiu uma proeminência no final do século XX, sendo que os processos de natureza espacial contemporâneos dão uma nova e intensificada fluidez nas estruturas político-econômicas do capitalismo. Nas palavras de Jameson, “um modelo de cultura política adequado a nossa própria situação terá que necessariamente levantar questões espaciais como uma preocupação fundamental de organização”.
	Gregory sugere uma gradual transição na geografia marxista, a medida que desponta o interesse e a apropriação por temas ligados à cultura e a política – houve uma expansão da agenda dos estudos da economia política. Os novos estudos da geografia marxista continuam firmemente interessados na dinâmica global da economia capitalista, nas novas divisões internacionais do trabalho, no surgimento de novos regimes de acumulação do capital etc., mas a sua ênfase se faz na reflexão filosófica, nas dimensões políticas, culturais e estéticas do capitalismo. Esse vago projeto coletivo faz parte do marxismo ocidental, mas está sendo conduzido a um ou mais graus de distância das bases originais. Gregory chega a falar de uma nova geografia cultural que faz uso do materialismo histórico marxista, buscando referências nas obras de críticos de arte, historiadores ou críticos culturais de língua inglesa (ex. S. Hall). O que Gregory sugere é que muitos autores se afastaram a tal ponto do materialismo histórico que se vislumbra um “pós-marxismo” em gestação. 
No rastro do pós-marxismo
	Diagrama “guia” que Gregory usa para situar a discussão do “pós-marxismo” ao leitor. No diagrama estão expressas as articulações entre o ‘marxismo clássico’, a ‘geografia humana’ e o produto, por assim dizer, dessa apropriação, o ‘materialismo histórico-geográfico’ e a relação destes com o ‘marxismo ocidental’. No outro lado do diagrama, figuram as novas perspectivas, que forçam os limites da interpretação clássica, em suas interrelações: ‘teoria da estruturação’, ‘teoria feminista’, ‘pós-modernismo’ e ‘pós-estruturalismo e pós-colonialismo’. O diagrama é emoldurado pelas questões que, de acordo com o autor, deveriam encabeçar toda teoria social crítica, servindo de orientação à elaboração de toda e qualquer geografia humana crítica: ‘articulação’, ‘espacialização’, ‘representação’ e ‘justificação’.
Espaços discursivos
	Giddens faz uma série de explorações sobre os temas da “teoria da estruturação” de Giddens e sobre a teoria feminista, ambos em relação a geografia humana. O primeiro ele analisa do ponto de vista teórico, fazendo considerações acerca de questões cruciais para esse projeto intelectual, como a relação espaço-tempo num mundo globalizado, a “perda” dos lugares etc. Sobre a teoria feminista ele analisa a maneira como a geografia humana e o pensamento marxista silenciaram as abordagens de gênero e sexualidade em seus trabalhos, produzindo teorias e partindo de pressupostos masculinizantes. Ele constata que o feminismo, por seu caráter muito mais politizado que o da teoria das estruturas, traz questões mais urgentes acerca da autoridade. 
Vozes múltiplas
	O autor discorre nessa sessão acerca do pós-modernismo e do pós-colonialismo. [pág. 114 a 117].
Conclusão (Arca de Noé)
	Gregory termina este ensaio apontando as três razões que decorrem dos argumentos estabelecidos ao longo do artigo. Em primeiro lugar, o autor afirma que a teoria social não está pronta para uso e, como qualquer outro discurso, ela introduz suas próprias suposições e seus pontos cegos. Isto é, ela é sempre parcial e essas diferentes parcialidades não devem ser ignoradas. Em segundo, Gregory defende que nenhum sistema teórico é capaz de fornecer um completo e satisfatório conjunto de respostas, porém isto não significa que devamos abandonar as metanarrativas, mas sim que precisamos aprender a conviver – crítica e criativamente – com a dissonância das mesmas, buscando identificar o que é incluído e o que é deixado de fora em cada uma. Por fim, o autor afirma que a teoria social não é um simples treino, um exercício de ginástica conceitual: a teoria social deve tratar de questões políticas relevantes buscando abarcar os interesses dos homens e mulheres comuns, ampliando assim, as nossas “geografias imaginativas”.
		
	
	
PARTE II: PERSPECTIVAS EM GEOGRAFIA HUMANA
· O desafio ambiental
Tim Bayliss-Smith e Susan Owens
A Geografia teve, evidentemente, uma preocupação longamente estabelecida, muito embora nem sempre sem percalços, quanto ao relacionamento entre o mundo natural e a sociedade. Mas, como os autores sustentam em sua contribuição, devido a sua situação especial na interface das ciências físicas e sociais a geografia acadêmica está bem posicionada para reivindicar um lugar de destaque dentro das ciências sociais para as pesquisas baseadas no ambiente. Vários debates ambientais dentro das ciências sociais foram retomados. Define-se, em primeiro lugar, o que se quer dizer por “o ambiente”. Segue-se com o exame do ambientalismo como movimento social, cujas origens modernas, que remontam ao séc. XIX, têm se tornado cada vez mais uma característica do que chamamos de cultura pós-materialista, uma cultura que, como assinala Graham Smith em seu capítulo, é sintomática de uma miríade de novas formas de oposição social, sendo a mais recente “aja localmente, pense globalmente”. Os problemas ambientais e conflitos que os cercam não podem, contudo, ser tratados de uma maneira geográficamente não-diferenciada, uma pretensão que os autores ilustram com respeito a dois exemplos importantes do “primeiro” e “terceiro” mundos. Finalmente, o papel de técnicas formais em pesquisas baseadas no ambiente, mais notadamente a determinação do impacto ambiental, é considerado e sua utilidade examinada. 
· A transformação da geografia cultural
Linda McDowell
Linda McDowell inicia este artigo examinando o legado deixado por Carl Sauer e o impacto continuado de suas obras relativas a leitura e interpretação de paisagens em termo de um conceito material da cultura. Contudo, as paisagens culturais são também impregnados por uma variedade de ricos significados que se prestam a interpretação da cultura e dos lugares que representam como significados simbólicos e como textos a serem interpretados. A explosão de interesse dos geógrafos pelos estudos culturais também foi acompanhada pelo enfoque no lugar e nos significados e imagens partilhadas, que uma associação com o lugar representa para as comunidades como uma variedade de escalas geográficas, da vizinhança local até o estado-nação. Este capítulo também explica, dentro das sociedades industrializadas do Ocidente, como novos costumes sócio-econômicos tais como novos estilos de vida, formas de trabalho e padrões de consumo romperam os significados tradicionais de lugar, causando a reconstituição do senso de identidade do indivíduo com a comunidade e o lugar, e o surgimento de novas políticas culturais, reflexo daquilo que alguns comentaristas designaram como valores pós-materialistas.
Introdução
	Segundo a autora, o foco da geografia cultural inclui a investigação da cultura material, costumes sociais e significados simbólicos, abordados a apartir de uma série de perspectivas teóricas. Nesse capítulo, ela busca dar uma ideia da diversidade do campo, mostrando como o assunto e as abordagens da geografia cultural mudaram ao longo do tempo. Ciente das complicações envolvidas em remontar o avanço do subcampo, ela propõe três conjuntos principais de abordagens, cada um com diferentes ênfases, forças e fraquezas. Primeiro, serão comentadas as ideias da Escola de Berkeley no período entre guerras; em segundo lugar ela examina uma abordagem da geografia cultural que define a cultura como conjunto de significados expressos em um lugar; em terceiro, ela analisa a abordagem da escola do paisagismo; por fim, ela demonstra como os teóricos sociais em geral tem um interesse comum e crescente em saber como as dinâmicas globais afetam as relaçõesentre identidade, significado e lugar, concluindo que uma perspectiva geográfica tornou-se central para o projeto de estudos culturais. A autora conceitua cultura como um conjunto de ideias, hábitos e crenças que dá forma às ações das pessoas e a sua produção de artefatos materiais, incluindo a paisagem e o ambiente construído. A cultura é socialmente definida e socialmente determinada. Ideias culturais são expresas nas vidas de grupos sociais que articulam, expressam e contestam esses conjuntos de ideias e valores, que são eles próprios específicos no tempo e no espaço. 
A Escola de Berkeley
	A Escola de Berkeley, a despeito de toda sua influência, foi duramente criticada na transição entre a geografia cultural “tradicional” e a “nova” geografia cultural. Entre outras coisas, os novos geógrafos culturais denunciavam uma suposta “fetichização dos objetos”, a visão neutra acerca dos produtos culturais, o caráter determinista da cultura etc. Mas de fato, os principais interesses de Sauer residiam nas maneiras como as pessoas deixavam sua marca na paisagem por intermédio de suas atividades produtivas e os seus assentamentos. Sauer sustentava que a “paisagem” é a unidade conceitual da geografia. Ele focalizou três pontos: a reconstrução de forças ambientais e humanas que formaram a paisagem; a identificação de regiões culturais distintas e homogêneas definidas por artefatos materiais tais como tipos de casas e por atributos culturais não materias tais como linguagem ou religião; e o estudo da ecologia cultural histórica onde a atenção é concentrada em como as percepções humanas e os usos da paisagem são culturalmente condicionados. Sauer tinha um interesse particular de trabalho pelas sociedades “tradicionais”, tendo demonstrado preocupação com as tendências homogeneizantes do mundo moderno – uma das principais diferenças entre os velhos e os novos geógrafos culturais, que estão mais interessados em sociedades industriais contemporâneas. 
	Para alguns comentaristas, os críticos à obra de Sauer a deturparam em alguns pontos. Primeiro, eles argumentam que pela refutação dos desenvolvimentos teóricos nas Ciências Sociais no período entre-guerras, por conta de sua antipatia com a ênfase positivistas vigente à época, faz dele um precursor da crítica da teoria social normativa, que só viria a ser desenvolvida nos anos 1970. Ademais, Sauer não era um mero colecionador de detalhes mundanos e descritivos de artefatos materiais, mas interessava-se nas interconexões entre formas culturais materiais e não-materiais. Sauer era adepto de longos trabalhos de campo, tendo desenvolvido pesquisas mais etnográficas e qualitativas que só recentemente tem adquirido importância na nova geografia cultural. No entanto, a autora argumenta que há uma evidente fraqueza na análise de Sauer no que tange ao descuido com as estruturas econômicas, socias e políticas mais amplas da sociedade e dos modos como as práticas culturais refletem, reforçam ou desafiam os padrões e normas culturais. 
	
A cultura sob a forma de práticas sociais contestadas
	Um dos resultados da guinada da geografia em direção às ciências sociais e humanidades a partir dos anos 1970 foi uma compreensão renovada de como as culturas são produzidas e reproduzidas por meio de práticas sociais ocorrendo em uma variedade de escalas espaciais (no contexto onde as próprias práticas culturais eram contestadas politicamente). O novo entendimento acerca do termo cultura postula que os significados e as práticas culturais são particulares a determinados grupos da sociedade. Significados dominantes podem ser subvertidos contestados ou derrubados. Este reconhecimento de significados contestados e divergentes, e que o conhecimento em si mesmo também é temporário e contestável é a característica chave que diferencia os novos geógrafos dos sauerianos. 
Modernidade e a ordem simbólica da metrópole
	A história da produção cultural ficou extremamente marcada pelo advento da industrialização e urbanização no mundo Ocidental. As novas paisagens e relações sociais e as novas noções de identidade individual e social nas sociedades industriais forjaram um cenário fértil para as transformações no âmbito cultural. Portanto, o que podemos considerar um assunto primordial da geografia – mudanças demográficas e sociais associadas com a urbanização industrial – também é tido por teóricos culturais como de esmagadora importância na história da mudança cultural no Ocidente.
	A despeito da importante ênfase em paisagens “naturais” ou paisagens pré-industriais por parte dos geógrafos culturais, tanto sauerianos quantos os novos geógrafos paisagistas, os geógrafos culturais tem se voltado cada vez mais sobre a questão urbana e a vida cultural. Em meio a diversas contribuições para este debate, ela destaca a importância da escola francesa, principalmente as obras de De Certeau e Lefebvre. O trabalho desses teóricos é importante pela distinção entre a visão racional e científica do espaço (típica do planejamento urbano) e uma ideia de espaço vivenciado ou imaginado – uma concepção que foi apropriada por nos geografos culturais em seus trabalhos [a exemplo de Rob Shields, pág. 167 e 168]. A autora afirma que um dos aspectos mais úteis na obra desses autores é ênfase que colocam nas relações sociais de poder alojadas nas diferentes ideias de espaço – uma abordagem a que se dedicaram alguns geógrafos culturais [a exemplo de Harvey, Davis e Sharon Zukin, pág. 168]. Após essa série de exemplos, a autora afirma que o que é publicado e lecionado sob a rubrica de “geografia cultural” se altera em função do clima político e econômico da época e das estruturas de poder.
	Ela relata uma diferença de ênfase entre as “novas” geografias culturais do Reino Unido e a dos Estados Unidos. A primeira tomou como foco as relações sociais e o significa simbólico, reveladas em ações em um determinado lugar/localidade, enquanto a segunda enfocava mais especificamente sobre as paisagens. A despeito das diferenças de conteúdo e de inspiração teórica-conceitual, ambas tem origem comum nas mudanças teóricas e políticos da última parte dos anos 60 em diante. A autora então se dedica a examinar os diferentes interesses e responsabilidades intelectuais das novas geografias.
“Novas” geografias culturais. 1: Materialismo cultural
	Segundo a autora, dois teóricos culturais ingleses se destacam por sua influência nessa geografia cultural “do lugar”: Raymond Williams e Stuart Hall. Segundo a autora o trabalho desses intelectuais conduz à colocação de questões geográficas particulares e a exclusão de outras.
	Williams foi o principal defensor de uma abordagem de fenômenos culturais que enfatizam o contexto social, político e histórico específico onde ocorre a produção cultural e onde se cria o significado. A sua noção de cultura é bem resumida no argumento de que a cultura é a “unidade vivida da experiência” que produz determinadas “estruturas de sentimento” – conceitos que demonstram como a cultura está vinculada aos modos de vida local, tornando-se um estímulo para investigações geográficas de culturas com base local. Como Sauer, Williams lamentava a o surgimento da indústria de consumo de massa, evocando o pretenso rompimento das relações sociais de solidariedade e conjuntos compartilhados de significados em áreas operárias de cidades, vilas e povoados. Os estudos inspirados nessa concepção enfatizam a profunda percepção de pertencer à área local originada por uma compartilhada formação de classe, capacidade rápida de recuperação face às adversidades e um conjunto geograficamente limitado de atividades sociais. A autora faz notar como a sua visão tem elementos puritanistas, romantizados e nostálgicos, além de sexistas. 
	Segundo a autora, o anseio pela autenticidade perdida tem ressurgido nos anos 1980-90. Na geografia britânica, o sentimento nostálgico por antigas classes trabalhadoras, culturas locais e as políticas “esquerdistas” associadas a ela tem expressão mais vigorosa na obra de Doreen Massey e a “escola localista”dos anos 80. A influência de Williams está na noção de Massey de localidade enquanto área identificável marcada por por seus próprios conjuntos de hábitos sociais espacialmente específicos. A sua ênfase foi predominantemente econômica, ainda que tenha abordado diversas vezes a questão como a divisão do trabalho se reflete nos ambientes do cotidiano. Contudo, a escola localista foi severamente criticada devido ao seu relativo descaso pelos fatores “culturais”, tendo negligenciado os aspectos contraditórios da contemporânea cultura de massa e as possibilidades de hábitos sociais baseados no consumo – abrindo uma agenda para novos trabalhos da geografia cultural contemporânea. 
Consumo de massa, publicidade, cultura popular e contracultura
	Ao mesmo tempo em que Williams lamentava os estragos do consumismo, analistas sociais e culturais em outros locais desenvolviam uma estrutura teórica que mais exaltava que denegria a cultura do consumo. Stuart Hall e seus colegas chamavam a atenção para as maneiras de subverção do consumo e do estilo, unindo os consumidores em “culturas” ou “comunidades oposicionistas”. Nessa concepção, o consumo é fundamental para a elaboração da identidade (grunges, motoqueiros, mods, beatniks etc.) em detrimento da localidade, que não desempenha nenhum papel em sua constituição (mas, claro, envolvem uma espacialidade, sentimentos de lugar, redes e afins). A autora aponta que uma das principais contribuições destes estudiosos foi colocar a investigação da cultura jovem e de outras culturas oposicionistas na agenda acadêmica de estudos culturais, e agora da geografia (anos 90 em diante). Com essa mudança, o locus da investigação geográfica pode se deslocar para a esfera do consumo, desafiando as ênfases anteriores nas relações sociais de produção. Também, houve um novo trabalho em geografia cultural e social sobre os locais de espetáculos e consumo característicos das sociedades pós-modernas. 
	Nesse período de transição entre as geografias culturais, foi resgatada como influência a obra do teórico marxista clássico Antonio Gramsci. Stuart Hall se inspira nesse autor para elaborar sua demonstração de como os fenômenos culturais e a organização da vida cotidiana aumentam o domínio do controle capitalista em sociedades industriais avançadas como a Grã-Bretanha.
“Novas” geografias culturais. 2: A escola do paisagismo
	A identificação da paisagem como conceito central por parte desse grupo dos “novos” geógrafos culturais oferece um elo de ligação com a obra de Sauer. Influentes obras de geógrados nos últimos anos das décadas de 1960-70 sobre percepção ambiental e análises humanísticas sobre a influência de significados e valores sobre o comportamento no lugar é outro precursor geográfico dessa corrente.
	Ao contrário dos geógrafos culturais sauerianos, os novos analistas da paisagem reconheceram que as paisagens materiais não são neutras mas refletem as relações de poder e as dominantes “maneira de ver” o mundo. As paisagens não são apenas construídas, são também percebidas através da representação de versões ideais, na pintura e na poesia, como também no discurso científico e nos escritos acadêmicos. Em consequência, os novos geógrafos da paisagem reteorizaram a paisagem não apenas como o resultado material de interações entre o ambiente e a sociedade (o antigo nexo homem/terra), mas também como a consequência de uma maneira específica de olhar. O geógrafo encontra-se também culturalmente situado, e assim, o modo como ele/ela vê a paisagem cultural e historicamente específico. 
	Um dos mais proeminentes membros dessa escola de paisagismo é Dennis Cosgrove. Em comum com os “novos” geógrafos culturais da corrente do materialismo, estes também tiveram inspiração em Gramsci e Williams, tendo diversas vezes enfatizado a importância da produção cultural baseada em classes sociais. Recentemente, a ênfase da escola de paisagismo desviou-se das análises materialistas para a problematização das maneiras como as paisagens foram representadas (textos escritos, mapas, levantamentos topográficos etc.). Os geógrafos paisagísticos passaram a se dedicar às humanidades, especialmente à teoria literária, semiótica e teoria do discurso, para desenvolver maneiras de ler as paisagens como se fossem textos, utilizando conceitos tais como “intertextualidade” e “recepção por parte do leitor”. Um foco mais recente é o de problematizar os escritos geográficos em si, analisando as maneiras como os geógrafos trataram dos relacionamentos entre o mundo e sua representação.
	Uma das mais marcantes características da contemporânea geografia cultural, e das ciências sociais e humanidades em geral, tem sido a maneira como noções predominantes de verdade foram desafiadas e rompidas: existe uma percepção de que o conhecimento é múltiplo e situacional, existindo assim várias maneiras de ver e ler a paisagem. Essa percepção tem dado margem a uma série de estudos no que passou a ser conhecido como o assunto pós-colonial, dando abertura para que os despossuídos, anteriormente silenciosos, dêem a sua interpretação acerca de suas visões de paisagem e sentidos de lugar. Tanto quanto as relações de classes e domínio colonial, as maneiras como a representação simbólica de paisagens reflete relaçoes de poder entre os gêneros também estão se tornando objeto de exame.
Culturas globais/um sentido de lugar: culturas itinerantes?
	As novas questões acerca de significado, representação, a política de localização e a elaboração de sentido próprio baseado em lugar nas sociedades multiculturais são atualmente um foco unificador em geografia cultural. Descolonização, migração internacional, a globalização do capital, do comércio e das formas de produção cultural resultaram em sociedades em que as tendências internacionais, os bens e os serviços estão modificando nosso sentido de identidade vinculado ao território. 
	O atual desafio que une os geógrafos culturais é a investigação de como as interconexões entre forças globais e particularidade local alteram os relacionamentos entre identidade, significado e lugar. Daí podemos formular uma série de perguntas de como bens e serviços produzidos e anunciados globalmente, incluindo a paisagem, são percebidos e usados de maneiras diferentes por pessoas em distintas partes do globo. Uma segunda série de perguntas gira em torno das maneiras como um sentimento de identidade, comunidade e nacionalidade permanece enraízado ao lugar no assim chamado mundo pós-moderno. Esses novos questionamentos tem levado um número cada vez maior de geógrafos a buscarem novos métodos de pesquisa, particularmente, abordagens qualitativas detalhadas e em pequena escala, incluindo depoimentos orais.
	
· Imagens, mitos e geografias alternativas do Terceiro Mundo
Morag Bell
Com seu interesse por estudos de desenvolvimento, Morag Bell apega-se à maneira pela qual a geografia e as outras ciências tenderam a conceber e a teorizar o terceiro mundo através da perspectiva do eurocentrismo, onde o terceiro mundo foi impregnado por uma homogeneidade equivocada, apreendida em dualismos espaciais como norte-sul, núcleo-periferia e desenvolvido-em desenvolvimento. O que uma crítica pós-colonialista de tais sociedades deve ter, sustenta Bell, é uma sensibilidade para diferenciar, evitando tratar o terceiro mundo em termos estereotipados de raça, cultura economia ou política. Se estamos dispostos a contribuir para a compreensão dos difundidos problemas de pobreza e catástrofe ambiental, então, como geógrafos, precisamos ser suscetíveis ao fato de que as pessoas e os lugares em que vivem divergem em seus costumes culturais, economicos e políticos, produzem suas próprias geografias localizadas e se valem frequentemente de estratégias radicalmente diferentes para melhorar suas condições materiais. Como este capitulo também aponta, as políticas de capacitação do terceiro mundo, refletidas no surgimento de uma multiplicidade de novos movimentos sociais, notadamente o ambientalismo e o feminismo, convidam os geógrafos a abraçar programasde pesquisa social que ampliam e refundem nossos conceitos sobre os outros. 
· Visando o âmago da região
Nigel Thrift
O argumento desenvolvido neste capítulo assinala que a geografia regional é central ao hábito de fazer geografia humana, não apenas porque propõe questões acerca do mundo de uma maneira que nos permite, como geógrafos, sermos suscetíveis aos contextos diferenciados em que as pessoas passam suas vidas e interagem com o ambiente. Nigel Thrift estrutura seu capítulo em torno das ideias de três importantes pensadores sociais, começando por Vidal de La Blache e Karl Marx, que tiveram forte impacto no pensamento geográfico das regiões. Valendo-se também das ideias de Frederic Jameson e seu comprometimento com o pós-modernismo, este capítulo destaca as ligações entre uma determinada linha do pensamento atual sobre o espaço e localidade e situa essas ideias em relação à Vidal e Marx. Isso permite a Thrift estudar como fazer uma geografia regional dos nossos tempos, uma tarefa que, ele afirma, deve ser sensível ao mundo onde as regiões estão em mudança contínua através de processos diferentes dos da França ou da Inglaterra do séc. XIX. Nossas geografias regionais do “presente”, sustenta, devem ser particularmente sensíveis às maneiras pelas quais lugares são associados com o deslocamento de espaços demarcados como consequência da globalização, de como a imaginação de comunidade e senso de lugar estão sendo reestruturados, onde a mídia tem um papel essencial de mediação, e ao problema da compreensão dos significados que se encontram por trás de “comunidades”.
· Geografia urbana num mundo em mutação
Susan J. Smith
Em seu capítulo sobre “o urbano”, Susan J. Smith defende um lugar para os estudos urbanos, mas um lugar que precisa reconhecer que como a maioria das sociedades agora são sociedades urbanizadas, a cidade é uma parte inter-relacionada de uma teia complexa, cujos limites conceituais e espaciais não são facilmente discerníveis. Todavia, como campo para o questionamento intelectual, o urbanismo permanece como objeto de diferentes concepções e interpretações a respeito do que é a cidade e do que deveria ser. Isto, ela considera em relação a duas abordagens normativas distintas para compreender a cidade. Primeiro, considerando a cidade sob a perspectiva neomarxista, ela argumenta que precisamos ir além das simples abordagens “orientadas para produção” e “baseadas no consumo”, reconhecendo também que a vida urbana, além disso, apresenta também aspectos de gênero e de raça em formas que não podem ser simplesmente lidas, seja pela diferenciação espacial da acumulação de capital, seja pelo enfoque de políticas urbanas de consumo baseadas em classes. Segundo, ao examinar o impacto da Nova Direita, ela observa que, por causa da posição vantajosa dessa ideologia, há uma tendência muito maior de retratar os problemas urbanos como distintamente urbanos e controláveis como, por exemplo, descrevê-los como um sintoma de intervenção estatal ou como uma consequência apenas dos padrões de vida em declínio. Para a Nova Direita, corrigir problemas urbanos acarreta políticas de liberalização do mercado ao mesmo tempo em que enfatiza a centralidade do policiamento como meio de controle social. Todavia, essas polêmicas em estudos urbanos foram mais recentemente usurpadas de considerações sobre o impacto do pós-modernismo e a maneira através da qual ele encontrou expressão nas formas construídas, de como o consumo é organizado e a vida social conduzida, e no modo pelo qual nossas identidades pessoais estão sendo renegociadas. 
· História, geografia, e o “mistério ainda maior” da geografia histórica
Chris Philo
Como Chris Philo argumenta em seu capítulo final, a geografia histórica, ou o que ele preferia chamar de “história geográfica”, sofreu uma agradável transformação. Ao invés de apenas focar a materialidade dos “fatos geográficos”, ou sobre os objetos do “panorama visível”, a geografia histórica avançou cada vez mais em direção ao que diz respeito à imaterialidade dos fenômenos históricos, como, por exemplo, no interesse por movimentos de protesto urbano e rural, pelo funcionamento dos estados central e local e pela difusão espacial das inovações. Por conseguinte, o projeto central da geografia histórica deveria ser o de trazer aos estudos de acontecimentos históricos uma suscetibilidade ao lugar, espaço, distância, localidade e região. Ao centrar sua atenção em um exemplo importante, a geografia do “negócio dos loucos” – as instituições do séc. XIX que abrigavam os que eram chamados de “loucos” e a profissão de “médicos de loucos” responsável pelo seu tratamento –, Philo exemplifica a complexidade das geografias na localização e desenho de “casa de loucos” e na formação e organização dessa profissão. Essa abordagem particular na “história geográfica” levanta questões acerca da natureza do conhecimento e do poder que este capítulo dá continuidade ao investigar a preocupação de Michael Foucault de destacar a “espacialização da história” ou história geográfica.

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