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Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais APRESENTAÇÃO O mundo dinâmico dos negócios requer agilidade e respostas rápidas. É frequente a necessidade de solução de conflitos comerciais entre empresários, os quais não têm a condição de esperar pela demora da resposta judicial. Os meios alternativos de solução de conflitos apresentam-se como uma opção adequada, sendo a menos dispendiosa para a resolução de conflitos empresariais. Entidades e Câmaras especializadas têm solucionado conflitos entre empresários com a qualidade de mantença do vínculo entre eles. Nesta Unidade de Aprendizagem, você estudará os meios alternativos de resolução de conflitos aplicáveis às relações empresariais, assim como a forma de previsão de uso dessa importante ferramenta para a solução de conflitos. Bons estudos. Ao final desta Unidade de Aprendizagem, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar a aplicabilidade de formas consensuais de resolução de conflitos aos contratos empresariais. • Diferenciar cláusulas compromissórias cheias das cláusulas compromissórias vazias.• Descrever exemplos de cláusula compromissória.• DESAFIO Ao confeccionar um contrato, as partes devem esperar que ele se cumpra sem qualquer dificuldade em sua execução. Entretanto, deve-se sempre ter em mente a possibilidade de alguma das partes cumprir parcialmente o contrato. Acompanhe o caso a seguir: Infelizmente, Marcos só fez as entregas na primeira semana, deixando de executar o fornecimento das tortas na semana seguinte. Levando em conta que João Pedro já havia pagado antecipadamente pelas tortas, o que deve ser feito para executar o contrato? Como advogado, para resolver essa situação: a) O que você faria para convocar Marcos para a mediação? b) O que acontecerá se Marcos não atender à sua convocação? INFOGRÁFICO Na Antiguidade, as partes envolvidas em um conflito resolviam na forma particular, era a época da autotutela, ou seja, prevalecendo a lei do mais forte. Diante da compreensão de que a sociedade deveria garantir a todos o acesso à justiça, em igualdade de condições formal e material, o Estado assumiu a tutela jurisdicional, distribuindo justiça pelo Poder Judiciário. Perante uma justiça lenta e burocrática, necessitou-se do desenvolvimento de meios alternativos ao Judiciário para a resolução dos conflitos. Confira, no Infográfico, os meios existentes atualmente para a composição dos conflitos. CONTEÚDO DO LIVRO A falta de efetividade pelo Poder Judiciário tem levado os Jurisdicionados a desenvolver novas formas de solucionar os conflitos que se apresentam. A chamada desjudicialização é uma necessidade e levou ao desenvolvimento dos chamados Meios Alternativos de Solução de Conflitos. Esses meios são alternativos porque são uma excelente opção à morosidade judicial. No capítulo Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais, da obra Direito Empresarial III, você aprenderá sobre o uso da Arbitragem e Mediação aos contratos empresariais e a forma de sua previsão em contratos empresariais, tornando possível a solução dos conflitos com a mantença de vínculo entre os conflitantes. Boa leitura. DIREITO EMPRESARIAL III Eduardo Zaffari Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: Identificar a aplicabilidade de formas consensuais de resolução de conflitos aos contratos empresariais. Diferenciar cláusulas compromissórias cheias das cláusulas compro- missórias vazias. Descrever exemplos de cláusula compromissória. Introdução Os meios de resolução de conflitos foram introduzidos no ordenamento jurídico pátrio como importantes instrumentos de pacificação social e al- ternativa ao Poder Judiciário pela autocomposição ou heterocomposição. A mediação e a arbitragem consistem em técnicas cujo desenvolvimento utiliza técnicas negociais. Os meios de solução de conflitos podem ser empregados em prati- camente todas as áreas em que se encontra instalado o conflito, tendo sido descobertos pelos empresários como uma forma mais célere, barata e adequada para a resolução de conflitos empresariais. Ao contratar, é necessário que o empresário saiba como prever a possibilidade de solução alternativa por meio da mediação ou arbitragem. Neste capítulo, você vai ler sobre os meios alternativos de solução de conflitos, a forma de previsão contratual dessa possibilidade e alguns exemplos de cláusulas compromissárias. Aplicabilidade das formas consensuais de resolução de conflitos aos contratos empresariais Mauro Cappelletti recorda que o conceito de justiça tem variado ao longo do tempo, ressaltando que, nos Estados liberais burgueses do passado, os procedimentos judiciais refl etiam uma fi losofi a essencialmente individualista dos direitos (CAPPELLETTI; GARTH, 1988). Bastava à parte ter garantido pelo Estado a possibilidade de acesso ao Poder Judiciário; fosse para demandar ou defender-se, estaria cumprido o papel jurisdicional. Esse viés dava um cunho formal à justiça, tendo as partes que demandar na forma privada. Nesse sentido, apenas aqueles com condições de custear os dispendiosos processos judiciais — muitas vezes necessitando de força privada para executar a decisão judicial — tinham condições de se socorrer do Poder Judiciário. A tradição privatística do processo decorre do pragmatismo romano, que inspirou todas as legislações daqueles países cuja tradição jurídica serviu de base. À medida que as sociedades evoluíram para a valorização dos direitos humanos e dos relacionamentos, o caráter individualista foi dando espaço para o caráter coletivo, reconhecendo-se os direitos e deveres dos Estados na realização dos direitos de trabalho, saúde, segurança, educação e proteção contra todas as espécies de discriminação. Nesse sentido, o efetivo acesso à justiça passou a ser valorizado e considerado um direito humano e concretizado em muitas constituições como direito fundamental. Alterou-se o paradigma de um acesso à justiça formal para um acesso à justiça material, em que se faz necessária a garantia de um efetivo acesso ao Poder Judiciário. O Estado brasileiro reconhece o acesso à justiça como direito fundamental e cláusula pétrea, como consta na Constituição Federal (BRASIL, 1988, documento on-line), cujo art. 5º, XXXV, afirma que “[...] a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”, o que garante a todo cidadão não apenas o acesso ao Poder Judiciário, mas impõe ao Estado o dever de garantir que os jurisdicionados tenham os seus conflitos pacificados pela máquina estatal. Entretanto, uma crescente demanda de jurisdição e um Estado cada vez mais incapaz de atender aos processos judiciais, em razão da falta de recursos humanos e financeiros, levaram a uma crescente insatisfação. O Poder Judiciário não conseguiu atender à crescente demanda. Compreendendo o legislador que diferentes conflitos podem ser tratados de diferentes formas, adotando um novo paradigma de atendimento ao juris- dicionado e confiando na capacidade de restabelecimento da comunicação, quando valorizada a autonomia de vontade dos conflitantes, há a busca de novos meios para a resolução dos litígios. Nos dizeres de Cappelletti (1988, p. 11-12): Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais2 Os juristas precisam, agora, reconhecer que as técnicas processuais servem a funções sociais; que as cortes não são a única forma de solução de conflitos a ser considerada e que qualquer regulamentação processual, inclusive a criação ou encorajamento de alternativas ao sistema judiciário formal tem um efeito importante sobre a forma como opera a lei substantiva — com que frequência é executada, em benefício de quem e com que impacto social. A Resolução nº. 125, de 29 de novembro de 2010, do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), introduziu no Paísa política judicial em favor dos meios alternativos/adequados para a solução dos conflitos, estabelecendo as seguintes diretrizes (BRASIL, 2010): institui a política pública de resolução adequada dos conflitos (art. 1º); define o CNJ como organizador dessa política junto ao Poder Judiciário (art. 4º); impõe aos tribunais o dever de criar centros de solução de conflitos e cidadania (art. 7º); regulamenta a atuação dos conciliadores e dos mediadores, impondo um Código de Ética (art. 12 e anexo); determina a criação, mantença e publicidade de estatísticas dos resul- tados dos Centros de Conciliação (art. 13); define o currículo mínimo para os cursos de capacitação de mediadores e conciliadores. O art. 3º do Código de Processo Civil de 2015 (BRASIL, 2015a, documento on-line), na parte das normas fundamentais aplicáveis aos processos judiciais, igualmente estimula a necessidade dos meios alternativos em seu § 3º: “A conciliação, a mediação e outros métodos de solução consensual de conflitos deverão ser estimulados por juízes, advogados, defensores públicos e membros do Ministério Público, inclusive no curso do processo judicial”. Entre os meios alternativos de solução de conflitos, dois são fundamentais e utilizados nos contratos comerciais: a mediação e a arbitragem. A medição, cuja expressão norte-americana é alternative dispute resolutions (ADRs), é reconhecida como um dos mais relevantes meios alternativos de resolução de conflitos e tem servido como importante instrumento da política judiciária 3Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesses no âmbito do Poder Judiciário. Introduzida pela Resolução nº. 125/2010 do CNJ (BRASIL, 2010), a mediação ganhou regulamentação especial na Lei nº. 13.140, de 26 de junho de 2015 (BRASIL, 2015b), chamada de Marco Legal da Mediação, e na Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015 (BRASIL, 2015a). No Brasil, o primeiro disciplinamento de arbitragem aparece nas Or- denações Filipinas de 1603, em que as partes poderiam recorrer ao Poder Judiciário mesmo diante de compromisso arbitral com cláusula sem recurso. A decisão arbitral, àquela época, não estava sujeita à homologação judicial. A Constituição Federal de 1824, art. 18, assegurava as sentenças sem recurso: “Nas cíveis e nas penais intentadas poderão às partes nomear juízes árbitros. Suas sentenças serão executadas sem recurso, se assim o convencionarem as mesmas partes” (BRASIL, 1988, documento on-line). O Código Comercial do tempo do Império — Lei nº. 556, de 25 de julho de 1850, no art. 294 — recomendava o juízo arbitral para a resolução de disputas entre os sócios durante a vigência da sociedade, liquidação e partilha de bens. Pela Lei nº. 1.350, de 14 de setembro de 1866, a obrigatoriedade de resolução por árbitros foi revogada e apenas recomendada a solução arbitral, que viria a ser regulamentada nos arts. 1.037 a 1.048 do Código Civil de 1916. Com o advento da Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996, pelo art. 44, foram revogadas as disposições do antigo Código Civil de 1916. Por sua vez, o termo mediação vem do latim mediare, que significa mediar, intervir e dividir ao meio. A palavra mediação evoca a ideia de centro, de meio, de equilíbrio, em que há alguém entre os conflitantes, não sobre eles (SPENGLER, 2017). Na mediação, o mediador exerce um papel diferenciado, pois servirá como meio de comunicação entre os interessados, auxiliando- -os a compreender as questões e os interesses em conflito, de modo que eles possam identificar, por si mesmos, as soluções consensuais que gerem benefícios mútuos. Nessa forma de solução de conflitos, o mediador não propõe soluções aos interessados, permitindo que eles mesmos construam a melhor forma de solucionar o conflito. É uma técnica mais indicada para os casos em que exista uma relação anterior e permanente entre os interessados, como nos casos de conflitos societários e familiares (DIDIER JÚNIOR, 2015). Para definir esse método, vale a explicação de Cabral (201, p. 54), para quem a arbitragem: Pode ser definida como uma instituição através da qual as pessoas naturais ou jurídicas submetem, mediante uma declaração de vontade, questões liti- giosas atuais ou futuras que surjam em uma matéria de livre disposição à Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais4 decisão de um ou vários árbitros, vinculando-se a dita resolução, ou, ainda, com a submissão de fato ou de direito, ou de ambos, a um tribunal arbitral, compostos por uma ou mais pessoas, ao qual as partes atribuem o poder de emitir uma decisão vinculante. Para Fredie Didier, “É a técnica de solução de conflitos mediante a qual os conflitantes buscam em uma terceira pessoa, de sua confiança, a solução amigável e ‘imparcial’ (porque não feita pelas partes diretamente) do litígio. É portanto, heterocomposição” (DIDIER, 2015: 169). Por meio desse sistema, as partes têm uma decisão por meio de um terceiro, chamado de árbitro, excluindo a possibilidade de conhecimento do conflito pelos tribunais. É interessante observar que as formas alternativas de solução de conflitos deram-se fora dos tribunais, conforme Tartuce (TARTUCE, 2018). Diante da insatisfação dos jurisdicionados, as lides comerciais passaram a ser ne- gociadas diretamente entre os envolvidos, propagando-se para outras áreas de impasse, como nos conflitos sindicais (convenções coletivas, acordos sindicais). A partir de 1970, os norte-americanos institucionalizaram diferentes formas para a resolução dos conflitos. Em conferência realizada em 1976, o professor emérito da Harvard School, Frank Sanders, sugeriu que os tribunais americanos tivessem várias portas, o que levou essa forma alternativa de resolução de conflitos a ser chamada também de justiça multiportas. Diante da sua celeridade, especialização e valorização da autonomia de vontade daqueles que participam, com uma maior eficiência e protagonismo dos confli- tantes, responsabilizando-os pelo conflito, pela solução e pelo outro, os meios alternativos de solução de conflitos têm sido cada vez mais utilizados na solução de impasses empresariais e nas disputas contratuais, com previsão expressa nos contratos modernos. Cláusulas compromissárias cheias e vazias Antes da Lei nº. 9.307/1996, a arbitragem como forma de solução de confl itos não era considerada porque a decisão arbitral necessitava de homologação pelo Poder Judiciário, assim como a cláusula compromissária não detinha 5Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais obrigatoriedade e executividade que hoje apresenta. O ordenamento jurídico anterior não assegurava às partes que a prévia convenção dos meios alter- nativos permitiria obrigar à submissão a esse método, tornando-o um mero compromisso a ser espontaneamente optado. A cláusula compromissária era considerada apenas uma obrigação de fazer, que não possibilitava a instituição coercitiva da arbitragem, tampouco tinha autonomia em relação ao contrato em que estava inscrita. Considerada pela doutrina e jurisprudência um mero pré-contrato, poderia dar ensejo a perdas e danos, mas, se surgido o conflito, deveriam as partes buscar o Poder Judiciário caso algum dos conflitantes não concordasse em buscar a arbitragem. Com o surgimento da Lei de Arbitragem — Lei nº. 9.307/1996 (BRASIL, 1996) —, a convenção de arbitragem passou a retirar a competência do Poder Judiciário e prescrever a competência da arbitragem quando convencionado pelos conflitantes. Isso significa que a cláusula de arbitragem ganhou força coercitiva, permitindo às partes abdicar do Poder Judiciário e obrigar os contratantes a se submeter a esse meio de resolução de conflito. Ganha relevo a redação da convenção, cuja falta de elementos poderá necessitar, eventual- mente, da intervenção do Judiciário. Em geral, inserta no contrato, a cláusula compromissária é uma convenção de arbitragem queconsta expressamente prevista, indicando que o litígio será resolvido pela arbitragem. A cláusula, que poderá estar em documento apartado, prescreve a solução para litígios futuros. Bacellar (2017, p. 130) afirma que: [...] a cláusula compromissória é definida como a convenção preliminar ou preparatória, mediante as qual as partes se obrigam, no próprio contrato ou em ajuste ulterior, a submeter todas ou algumas das controvérsias que se originam da execução contratual, gerando os seguintes efeitos: o desprezo pela jurisdição ordinária em prol da jurisdição convencional; uma obrigação de submissão ao juízo arbitral. Didier Júnior (2015, p. 170) afirma que: Cláusula Compromissária: é a convenção em que as partes decidem, prévia e abstratamente, que as divergências oriundas de certos negócios jurídicos serão resolvidas pela arbitragem; as partes, antes do litígio surgir, determinam que, uma vez ele ocorrendo, a sua solução, qualquer que seja o conflito, desde que decorra de certo negócio jurídico, dar-se-á pela arbitragem. Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais6 O art. 2º da Lei de Arbitragem prescreve que esse meio de resolução de conflitos poderá usar o direito escolhido pelas partes ou, até mesmo, somente a equidade, que é a decisão fundamentada apenas no senso de justiça. Prescreve a lei que “A arbitragem poderá ser de direito ou de equidade, a critério das partes” e que “poderão as partes escolher, livremente, as regras de direito que serão aplicadas na arbitragem, desde que não haja violação aos bons costumes e à ordem pública” (BRASIL, 1996, documento on-line). O art. 11 da Lei de Arbitragem prescreve os requisitos do compromisso ar- bitral, que são os mesmos que devem constar em uma cláusula compromissária: Art. 11 [...] I — local, ou locais, onde se desenvolverá a arbitragem; II — a autorização para que o árbitro ou os árbitros julguem por equidade, se assim for convencionado pelas partes; III — o prazo para apresentação da sentença arbitral; IV — a indicação da lei nacional ou das regras corporativas aplicáveis à arbitragem, quando assim convencionarem as partes; V — a declaração da responsabilidade pelo pagamento dos honorários e das despesas com a arbitragem; VI — a fixação dos honorários do árbitro, ou dos árbitros (BRASIL, 1996, documento on-line). Entretanto, embora o Poder Judiciário perca a competência para dirimir conflitos quando estipulado um meio alternativo de solução de conflitos, há a previsão legal, no art. 7º da Lei de Arbitragem, de intervenção do Judiciário para preencher certas lacunas existentes quando não completa a cláusula compromissária (BRASIL, 1996). Assim, há a possibilidade de duas formas de se estabelecer a cláusula compromissária: cláusula compromissária cheia; cláusula compromissária vazia. A cláusula compromissária cheia é “[...] aquela em que se apresentam todos os elementos necessários para que possa ser cumprida, instaurando-se por sua própria força a arbitragem, sem qualquer providência ou compromisso” (BACELLAR, 7Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais 2017, p. 138). A cláusula cheia é aquela prevista em contrato, ou documento avulso anexo a este, em que todos os elementos necessários e suficientes estejam expressamente previstos para que a arbitragem ou mediação ocorra. Deverão constar na cláusula, para que seja cheia, a indicação dos árbitros, o procedimento, a sua forma, os critérios de julgamento e os seus prazos. Entretanto, a cláusula compromissária cheia ocorre quando há a estipulação dos árbitros e o uso de um regulamento de uma determinada entidade de arbitragem e mediação. Nessa hipótese, o procedimento, a forma, os critérios de julgamento e os prazos serão aqueles previstos no regulamento da entidade escolhida pelos compromis- sários. De qualquer forma, a estipulação da forma de escolha dos árbitros deverá vir prevista na cláusula, para que ela seja equiparada à cláusula cheia. Para Bacellar (2017, p. 18) “[...] a cláusula compromissária vazia ao ser esta- belecida no contrato, embora registre a opção de arbitragem e produza aquele efeito negativo (renúncia ao Poder Judiciário), não adquire firmeza e precisa ser confirmada em seus contornos para que seja possível instaurar e efetivar a arbitragem”. Trata-se da estipulação pelos conflitantes da opção de arbitragem em uma cláusula contratual sem que os contratantes tenham prescrito: forma de escolha do árbitro; procedimento; sua forma; critérios de julgamento; seus prazos. A cláusula compromissória vazia tem uma conformação fraca, genérica, sem definitividade e integralidade, mas sem perder a sua coercitividade para a instauração desse meio alternativo. A instauração de cláusula vazia, igual- mente chamada de branca, deve ser evitada porque poderá surgir tensão no momento de estipulação dos elementos a serem usados na solução do conflito. A Convenção de Arbitragem se divide em cláusula compromissária e compromisso arbitral, conforme art. 3º da Lei de Arbitragem, em que “As partes interessadas podem submeter a solução de seus litígios ao juízo arbitral mediante convenção de arbitragem, assim entendida a cláusula compromissória e o compromisso arbitral” (BRASIL, 1996, documento on-line). Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais8 Estipulada a cláusula compromissária vazia, não poderá ser instituída de imediato. Assim, a parte que tem interesse em dar início à arbitragem ou mediação necessita intimar a parte adversa para o estabelecimento de um compromisso arbitral, em que as partes pactuarão os elementos da solução de conflito. O compromisso arbitral é aquele firmado entre as partes para fixar as condições de sua realização. O art. 6º da Lei de Arbitragem prescreve que “Não havendo acordo prévio sobre a forma de instituir a arbitragem, a parte interessada manifestará à outra parte sua intenção de dar início à arbitragem, por via postal ou por outro meio qualquer de comunicação, mediante comprovação de recebimento, convocando- -a para, em dia, hora e local certos, firmar o compromisso arbitral” (BRASIL, 1996, documento on-line). Caso a parte adversa não compareça para a confecção de compromisso arbitral, ou seja, para o estabelecimento dos elementos para a arbitragem ou mediação, a parte interessada poderá requerer ao juízo competente, conforme a organização judiciária, o estabelecimento do necessário para a solução alternativa. O art. 7º da Lei de Arbitragem traz a possibilidade de execução específica da cláusula arbitral, prescrevendo a possibilidade de interferência do Poder Judiciário para que sejam estabelecidos os árbitros (BRASIL, 1996). Se o autor não comparecer, será extinto o processo; se o réu não comparecer, sofrerá uma pena em que se estabelecerá apenas um árbitro, podendo o juiz estabelecer três, caso a complexidade assim o determine. Exemplos de cláusulas compromissárias O Centro de Arbitragem e Mediação, da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (CCBC), considerada uma das entidades mais tradicionais e sérias do País em arbitragem, tem assessorado pessoas físicas e jurídicas na solução de controvérsias. Considerando que tem crescido consideravelmente a procura pela arbitragem e mediação por parte de empresas, as quais buscam soluções mais céleres e adequadas, a CCBC recomenda o uso da seguinte cláusula compromissária: Qualquer litígio originário do presente contrato, inclusive quanto à sua in- terpretação ou execução, será definitivamente resolvido por arbitragem, administrada pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comér- cio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”), de acordo com o seu Regulamento, 9Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais constituindo-se o tribunal arbitral de [um/três] árbitros, indicados na forma do citado Regulamento. II. Cláusula Detalhada: 1 — Qualquer controvérsia oriunda deste contrato ou com ele relacionada será definitivamente resolvida por arbitragem.1.1 — A arbitragem será administrada pelo Centro de Arbitragem e Media- ção da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”) e obedecerá às normas estabelecidas no seu Regulamento, cujas disposições integram o presente contrato. 1.2 — O tribunal arbitral será constituído por [um/três] árbitros, indicados na forma prevista no Regulamento do CAM-CCBC. 1.3 — A arbitragem terá sede em [Cidade, Estado]. 1.4 — O procedimento arbitral será conduzido em [idioma]. 1.5 — [lei aplicável] III. Cláusula Padrão Escalona Med-Arb.: Qualquer controvérsia originária do presente contrato, inclusive quanto à sua interpretação ou execução, será submetida obrigatoriamente à Mediação, administrada pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”), de acordo com o seu Roteiro e Regimento de Mediação, a ser coordenada por Mediador participante da Lista de Mediadores do CAM-CCBC, indicado na forma das citadas normas. A controvérsia não resolvida pela mediação, conforme a cláusula de mediação acima, será definitivamente resolvida por arbitragem, administrada pelo mesmo CAM-CCBC, de acordo com o seu Regulamento, constituindo-se o tribunal arbitral de três árbitros, indicados na forma do citado Regulamento. IV. Cláusula Detalhada Escalonada Med-Arb.: 1 — Qualquer controvérsia originária do presente contrato, inclusive quanto à sua interpretação ou execução, será submetida obrigatoriamente à Mediação, administrada pelo Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CAM-CCBC”), de acordo com o seu Roteiro e Regimento de Mediação, a ser coordenada por Mediador participante da Lista de Mediadores do CAM-CCBC, indicado na forma das citadas normas. 1.1 — A controvérsia não resolvida pela mediação, conforme a cláusula de mediação acima, será definitivamente resolvida por arbitragem, administrada pelo mesmo CAM-CCBC, de acordo com o seu Regulamento. 2.1 — A arbitragem será administrada pelo CAM-CCBC e obedecerá às normas estabelecidas no seu Regulamento, cujas disposições integram o presente contrato. 2.2 — O tribunal arbitral será constituído por [um/três] árbitros, indicados na forma prevista no Regulamento do CAM-CCBC. 2.3 — A arbitragem terá sede em [Cidade, Estado]. 2.4 — O procedimento arbitral será conduzido em [idioma]. 2.5 — [lei aplicável] (CAM-CCBD, [2019], documento on-line). Em contratos mais complexos, muitas vezes, é necessário um maior de- talhamento. Vejamos como a descrição de uma cláusula de arbitragem pode ser detalhada: Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais10 CLÁUSULA DE ARBITRAGEM 1. Todas as disputas decorrentes do presente Contrato ou a ele relacionadas serão definitivamente resolvidas de acordo com o Regulamento do Centro de Arbitragem e Mediação da Câmara de Comércio Brasil-Canadá (“CCBC”) (“Regulamento CCBC”), por três árbitros. Cada uma das Partes deverá nomear um árbitro, na forma do Regulamento CCBC. Os árbitros nomeados pelas Partes deverão nomear, em conjunto e por acordo mútuo, o terceiro árbitro, que deverá presidir o Tribunal Arbitral. 2. A arbitragem será regida pelas Leis da República Federativa do Brasil e será uma arbitragem de direito, sendo vedado aos árbitros decidir por equidade. 3. O local da arbitragem será a Cidade do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Janeiro, onde será proferida a sentença arbitral. O idioma da arbitragem será o Português. 4. Até a instauração da arbitragem, nos termos do art. 19 da Lei 9.307/96 — Lei de Arbitragem, as Partes poderão invocar o Poder Judiciário para a propositura de medida de urgência, sempre que houver fundado receio de lesão grave e de difícil reparação, e que dependam, para sua eficácia e efetividade, de ato coercitivo da autoridade judiciária, sem que tais fatos constituam renúncia das Partes de submeterem seus conflitos à arbitragem. Para tais fins, as Partes elegem o foro da comarca da Cidade do Rio de Janeiro, Estado do Rio de Ja- neiro, renunciando expressamente a qualquer outro, por mais privilegiado que seja. Após a instauração da arbitragem, o Tribunal Arbitral deverá deliberar sobre a concessão de qualquer medida dessa natureza, podendo, inclusive, rever decisões tomadas anteriormente pelo Poder Judiciário. 5. A sentença arbitral deverá determinar em que medida a parte perdedora deverá suportar as despesas decorrentes da arbitragem, tais como os honorários dos árbitros e dos peritos, custas devidas à câmara de arbitragem, estenotipia, aluguel de salas para audiências, entre outros. 6. Cada Parte suportará individualmente os honorários dos advogados, parece- ristas e assistentes técnicos que contratar e fica expressamente acordado que a sentença arbitral não poderá condenar as Partes ao pagamento de honorários de sucumbência ou de honorários advocatícios de qualquer espécie. 7. As Partes concordam em tratar o procedimento arbitral, informações e documentos correlatos como confidenciais (CAM-CCBD, [2019], documento on-line). Nessa segunda cláusula, estão: a prescrição de arbitragem como forma de solução do conflito; a câmara que arbitrará; a lei a ser utilizada e a vedação ao uso de equidade; a cidade da arbitragem e o idioma a ser utilizado; a possibilidade de intervenção pelo Poder Judiciário apenas em caso de liminares; a atribuição de despesas do procedimento, honorários e demais custos. 11Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais Da mesma forma, a cláusula prescreve a confidencialidade do procedimento e a forma de escolha dos árbitros. BACELLAR, R. P. Mediação e arbitragem: atualizado com o novo CPC, Lei nº. 13.105/2015 e a Lei de Mediação nº. 13.140/2015. São Paulo: Editora Saraiva, 2017. BRASIL. Conselho nacional de Justiça. Resolução no. 125, de 29 de novembro de 2010. Dispõe sobre a Política Judiciária Nacional de tratamento adequado dos conflitos de interesse no âmbito do Poder Judiciário e dá outras providencias. Diário de Justiça eletrô- nico, 1 dez. 2010. Disponível em: https://www.cnj.jus.br/wp-content/uploads/2011/02/ Resolucao_n_125-GP.pdf. Acesso em: 3 dez. 2019. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil de 1988. Diário Oficial da União, 5 out. 1988. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/constituicao/consti- tuicao.htm. Acesso em: 3 dez. 2019. BRASIL. Lei nº. 9.307, de 23 de setembro de 1996. Dispõe sobre a arbitragem. Diário Oficial da União, 24 set. 1996. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/ l9307.htm. Acesso em: 3 dez. 2019. BRASIL. Lei nº. 13.105, de 16 de março de 2015a. Código de Processo Civil. Diário Oficial da União, 17 mar. 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015- 2018/2015/lei/l13105.htm. Acesso em: 3 dez. 2019. BRASIL. Lei nº. 13.140, de 26 de junho de 2015b. Dispõe sobre a mediação entre parti- culares como meio de solução de controvérsias e sobre a autocomposição de conflitos no âmbito da administração pública. Diário Oficial da União, 29 jun. 2015. Disponível em: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2015-2018/2015/lei/l13140.htm. Acesso em: 3 dez. 2019. CABRAL, M. M. Os meios alternativos de resolução de conflitos: instrumentos de ampliação do acesso à justiça. Porto Alegre: Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, Departamento de Artes Gráficas, 2013. CAPPELLETTI, M; GARTH, B. Acesso à justiça. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris, 1988. CCAM-CCBD. Modelos de cláusulas. [2019]. Disponível em: http://www.ccbc.org.br/ Materia/1070/modelo-de-clausula. Acesso em: 3 dez. 2019. DIDIER JÚNIOR, F. Curso de Direito Processual Civil: introdução ao direito processual civil, parte geral e processo de conhecimento. 17. ed. Salvador: Editora JusPODIVM, 2015. v. 1. SPENGLER, F. M. Mediação de conflitos: da teoria à prática. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2017. TARTUCE, F. Mediação nos conflitos civis. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2018. Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais12 Os links para sites daWeb fornecidos neste capítulo foram todos testados, e seu fun- cionamento foi comprovado no momento da publicação do material. No entanto, a rede é extremamente dinâmica; suas páginas estão constantemente mudando de local e conteúdo. Assim, os editores declaram não ter qualquer responsabilidade sobre qualidade, precisão ou integralidade das informações referidas em tais links. 13Solução de conflitos aplicáveis aos contratos empresariais DICA DO PROFESSOR A Escola de Negócios de Harvard, nos Estados Unidos, desenvolveu técnicas específicas para o processo de negociação. Inicialmente, quando essas técnicas foram usadas para a negociação entre empresários, descobriu-se a importância delas nos Meios Alternativos de Solução de Conflitos. Confira, na Dica do Professor, as técnicas utilizadas no processo de mediação. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! EXERCÍCIOS 1) A solução de conflitos por meios alternativos é uma realidade moderna. Pode-se afirmar que: A) Trata-se de uma inovação de complicada implementação. B) Trata-se de uma inovação de simples implementação. C) Trata-se de uma inovação dispendiosa demais no momento. D) Trata-se de uma inovação burocrática demais no momento. E) Trata-se uma inovação que não foi aceita socialmente. 2) É possível utilizar os meios alternativos de conflito como uma possibilidade para solucionar todos os conflitos, inclusive os que ocorrem nos meios empresarias. Marque a alternativa correta: A) A arbitragem tem a intervenção de um terceiro que decidirá pelas partes, na mediação não há a intervenção de um terceiro. B) Na arbitragem não há a intervenção de um terceiro, enquanto que na mediação um terceiro irá intervir. C) Na mediação e na arbitragem há a intervençao de um terceiro, embora ele tenha funções distintas. D) Não há necessidade de intervenção de um terceiro, seja na mediação ou na arbitragem. E) Na mediação haverá a intervenção de um terceiro que decidirá pelas partes; na arbitragem, o terceiro não decidirá. 3) A resolução de conflito pode ser previamente pactuada entre os contratantes. Quanto às cláusulas contratuais compromissárias, pode-se afirmar que: A) são cláusulas que prescrevem o ajuizamento de ação judicial. B) não podem vir previstas em contrato. C) não são coercitivas. D) deverão ser ratificadas pelo Poder Judiário. E) prescrevem o uso de meios alternativos de soluções de conflitos. 4) Autocomposição e heterocomposição são opções para a resolução alternativa de conflitos. Marque a alternativa correta: A) A mediação é a mais indicada para conflitos empresariais, porque mantém o vínculo entre os conflitantes. B) A arbitragem não é recomendada para conflitos empresariais, porque os árbitros não têm prática empresarial. C) Os conflitos empresariais não podem ser solucionados pelos meios alternativos, porque são de alta complexidade. D) Os meios alternativos de solução de conflitos não preservam o vínculo entre os conflitantes em razão da litigiosidade envolvida. E) Os meios alternativos são usados nos conflitos empresariais, quando o Poder Judiciário não consegue resolver o conflito. 5) A cláusula compromissária pode vir em documento avulso, anexo ao contrato. Marque a alternativa correta: A) A cláusula cheia tem todos os requisitos necessários para a instituição de arbitragem ou mediação. B) A cláusula vazia deverá ter todos os requisitos para a instituição de arbitragem e mediação. C) A cláusula cheia poderá deixar de ter alguns requisitos para a arbitragem e mediação, desde que indique o regulamento a ser observado e árbitros. D) A cláusula vazia não poderá ser preenchida pelo Poder Judiciário, mesmo que as partes se neguem a preenchê-la. E) A cláusula vazia não terá coercitividade, pois lhe falta requisitos fundamentais para a instituição de mediação e arbitragem. NA PRÁTICA Os procedimentos de arbitragem e mediação têm a grande vantagem de serem sigilosos, protegendo informações comerciais e industriais que ficariam expostas se estivessem em um processo judicial. Ou seja, é essa razão, aliada ao rápido tempo de sua tramitação, que tem levado os empresários a optar por essa forma de resolução de conflitos. Confira, no Na Prática, como o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) tem monitorado o crescimento da mediação empresarial, constando, em números, a elevada aceitação dessa moderna forma de solução de controvérsias. SAIBA MAIS Para ampliar o seu conhecimento a respeito desse assunto, veja abaixo as sugestões do professor: Registro de Domínios Veja no link a seguir como resolver conflitos de domínio de internet. A utilização indevida de registro de internet de empresas, principalmente quando essas são reconhecidas pelo seu trabalho pela rede mundial de computadores, é um problema frequente e moderno. Assim, o Comitê de Controvérsias Sobre o Registro de Domínio da Câmara de Comércio Brasil-Canadá desenvolveu um comitê específico para tratar sobre essa espécie de disputa. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Mediação Simulada Assista, no link a seguir, a sessão de mediação simulada, realizada pelo Tribunal de Justiça do Estado do Rio Grande do Sul, que apresenta as técnicas que podem ser empregadas em toda a espécie de mediação. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino! Código de Ética Na matéria, no link a seguir, veja os princípios éticos que os árbitros e os mediadores devem observar, sob pena de falta funcional no desempenho de suas funções, pois devem trabalhar com zelo e competência para que o sistema de resolução alternativa de conflitos goze da necessária confiança. Conteúdo interativo disponível na plataforma de ensino!
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