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E-book de DIREITO PROCESSUAL CIVIL Organizado por CP Iuris ISBN 978-85-5805-023-4 DIREITO PROCESSUAL CIVIL 1° Edição Brasília CP Iuris Sumário Sumário ......................................................................................................................................................... 3 TEORIA GERAL DO PROCESSO ...................................................................................................................... 6 1. Fontes e princípios .................................................................................................................................... 6 2. Jurisdição ................................................................................................................................................. 23 3. Competência e estrutura do Poder Judiciário ....................................................................................... 31 4. Ação ......................................................................................................................................................... 46 5. Processo .................................................................................................................................................. 50 6. Tutela jurisdicional.................................................................................................................................. 55 7. Sujeitos do processo ............................................................................................................................... 67 8. Litisconsórcio........................................................................................................................................... 81 9. Intervenção de terceiros ......................................................................................................................... 87 10. Atos e negócios processuais ............................................................................................................... 105 11. Vícios dos atos processuais ................................................................................................................ 113 PROCESSO DE CONHECIMENTO ............................................................................................................... 117 1. Processo de conhecimento e o procedimento comum ....................................................................... 117 2. Petição inicial ........................................................................................................................................ 118 3. Comunicação dos atos processuais ...................................................................................................... 127 4. Audiência de conciliação e mediação .................................................................................................. 136 5. Reconhecimento do pedido ou inércia ................................................................................................ 137 6. Apresentação de resposta .................................................................................................................... 140 7. Providências preliminares .................................................................................................................... 144 8. Provas .................................................................................................................................................... 146 9. Audiência de instrução e julgamento .................................................................................................. 164 10. Sentença .............................................................................................................................................. 166 PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE JURISDIÇÃO CONTENCIOSA ................................................................. 195 1. Consignação em pagamento ................................................................................................................ 195 2. Ação de exigir contas ............................................................................................................................ 198 3. Ações possessórias ................................................................................................................................ 199 4. Ação de divisão e de demarcação de terras particulares .................................................................... 203 5. Dissolução parcial de sociedade ........................................................................................................... 203 6. Inventário e partilha ............................................................................................................................. 204 7. Embargos de terceiro ............................................................................................................................ 207 8. Oposição ................................................................................................................................................ 208 9. Ações de família .................................................................................................................................... 209 10. Ação monitória.................................................................................................................................... 210 11. Restauração de autos ......................................................................................................................... 212 PROCEDIMENTOS ESPECIAIS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA ................................................................... 212 1. Introdução ao procedimento de jurisdição voluntária ........................................................................ 212 2. Notificação e interpelação .................................................................................................................... 213 3. Alienação judicial .................................................................................................................................. 213 4. Divórcio e separação consensuais ........................................................................................................ 214 5. Testamento e codicilo ........................................................................................................................... 214 6. Herança jacente .................................................................................................................................... 215 7. Interdição .............................................................................................................................................. 216 EXECUÇÃO CIVIL ........................................................................................................................................ 216 1. Teoria geral da execução ...................................................................................................................... 217 2. Competência na execução .................................................................................................................... 220 3. Partes na execução e responsabilidade patrimonial ........................................................................... 222 4. Título executivo .................................................................................................................................... 230 5. Procedimento comum para obrigação de pagar ................................................................................. 236 6. Suspensão e extinção da execução ...................................................................................................... 256 7. Procedimentos especiais para obrigação de pagar .............................................................................257 8. Execução fiscal ...................................................................................................................................... 262 9. Execução por quantia certa em face do devedor insolvente: insolvência civil .................................. 264 10. Execução de obrigação de prestar alimentos .................................................................................... 267 11. Procedimento para obrigação de fazer, não fazer ou de entregar coisa reconhecida em título executivo judicial ...................................................................................................................................... 271 12. Procedimento para obrigação de fazer, não fazer ou de entregar coisa reconhecida em título executivo extrajudicial .............................................................................................................................. 273 PROCESSOS NOS TRIBUNAIS E MEIOS DE IMPUGNAÇÃO DAS DECISÕES JUDICIAIS .............................. 273 1. Teoria geral dos precedentes judiciais e a ordem dos processos nos tribunais ................................. 273 2. Teoria geral dos recursos ...................................................................................................................... 276 3. Recursos em espécie ............................................................................................................................. 294 4. Ações autônomas de impugnação nos Tribunais ................................................................................ 310 5. Incidentes nos tribunais ....................................................................................................................... 321 DISPOSIÇÕES FINAIS E TRANSITÓRIAS DO CPC ........................................................................................ 327 1. Disposições finais e transitórias do CPC ............................................................................................... 327 JUIZADOS ESPECIAIS ................................................................................................................................. 335 Microssistema dos juizados especiais ...................................................................................................... 335 PROCESSO COLETIVO ................................................................................................................................ 345 1. Introdução ............................................................................................................................................. 345 2. Processo coletivo .................................................................................................................................. 346 6 TEORIA GERAL DO PROCESSO 1. Fontes e princípios O direito processual tem uma finalidade que é disciplinar a forma pela qual o Estado presta a atividade jurisdicional. O Estado presta a atividade jurisdicional através de um processo, o qual nasce a partir de uma provocação do exercício do direito de ação. I. Fontes normativas do direito processual civil São fontes primárias do direito processual civil: • Constituição Federal: Existem regras processuais na própria Constituição, como quando a CF estabelece as competências dos Tribunais Superiores. Portanto, a Constituição é fonte do direito processual civil. • Leis Federais: Regra geral, as competências serão disciplinada pela lei federal, sejam leis complementares ou leis ordinárias, relativas a matéria processual, é de competência privativa da União, conforme art. 22, I, da CF. Perceba que a CF veda expressamente a criação de normas de direito processual por meio de medida provisória. • Lei de Organização Judiciária dos Estados: Como as normas de direito processual abrangem também as normas de organização judiciária, é necessário reconhecer que os Estados têm competência para tratar dessa matéria, conforme art. 125, §1º, da CF, o qual diz que a competência dos tribunais será definida na Constituição do Estado, sendo a lei de organização judiciária de iniciativa do Tribunal de Justiça. Neste caso, estas leis estaduais trazem regras de competência. Veja, o STF considerou plenamente válida que a lei de organização judiciária estadual estabelecesse que a primeira fase do procedimento do júri ocorresse na vara do juizado de violência doméstica contra a mulher, caso tenha havido um crime dessa natureza. Isso não afrontaria a soberania do júri, eis que a segunda fase continuaria sendo julgada pelo conselho de sentença. Com isso, é possível perceber que há uma norma estadual tratando de matéria processual. Mas a regra é da competência privativa da União. • Tratados e convenções internacionais já internalizados no Brasil Esse tratados têm, como regra, natureza de lei ordinária. Sendo de direitos humanos, podem ter status de emenda constitucional (art. 5º, §3º, CF) ou de norma supralegal. 7 Existem também as fontes secundárias, sendo elas observadas quando as fontes primárias não se mostram suficientes: • Analogia • Costumes • Princípios gerais do direito II. Princípios Os princípios passaram a ser considerados normas jurídicas, apesar de maior abstração, quando comparados às regras. Tratam-se de mandados de otimização (Alexy), visto que ordenam que algo deva ser realizado na maior medida possível, considerando as possibilidades fáticas e as possibilidades jurídicas existentes. Por conta disso, num conflito entre princípios deve ser feita a ponderação. Via de regra, apesar de entendimento contrário, no conflito entre regras não há ponderação, e sim subsunção. III. Princípios constitucionais Existem princípios constitucionais que norteiam o processo civil brasileiro. a) Princípio do devido processo legal O princípio do devido processo legal é uma garantia. Esta garantia deve ser compreendida como uma garantia das partes de que terão um instrumento, ou seja, um processo composto por atos sequenciados, os quais permitirão a obtenção da tutela jurisdicional. O princípio do devido processo legal garante que para ser condenado a pagar uma indenização será necessário ouvir o réu, podendo produzir provas e realizar defesa. Esta é a garantia do devido processo legal, limitando o poder exercido pelo Estado. Ou seja, o princípio do devido processo legal deve observar os princípios constitucionais também. Só há processo legal devido quando está assegurada ampla defesa, contraditório, fundamentação das decisões, entre outros princípios constitucionais. Portanto, o devido processo legal é como um postulado que orienta outros princípios. Só haverá devido processo legal se aquele processo observa tais princípios. O devido processo legal, em verdade, não se limita à esfera pública (relação vertical entre estado e parte), sendo percebido também nas relações entre particulares (eficácia horizontal). Vale ressaltar que isto é no aspecto processual. 8 Cabe ressaltar que no aspecto material, o devido processo legal seria a vertente do princípio da proporcionalidade, o qual exige: necessidade, adequação e proporcionalidade em sentido estrito. • Adequação: é verificação de que o ato praticado é idôneo para alcançar a finalidade; • Necessidade: é verificação de que o ato praticado é o menos gravoso dentre os atos possíveis para se alcançar aquela finalidade. • Proporcionalidade em sentido estrito: é verificação de que o ato praticado, apesar de provocar prejuízos, trará benefícios superiores aos prejuízos. Preenchido estes requisitos, haverá a observância do princípio da proporcionalidade, que é a vertente material do princípio do devido processo legal. b) Princípio que garante livre acesso à justiça Segundo o art. 5º, XXXV, CF, a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito. Trata-se do princípioda inafastabilidade do Poder Judiciário. Percebe-se que a CF resultou numa maior procura do poder judiciário. Para Barroso, a judicialização dos interesses da sociedade não é culpa do poder judiciário. As causas que justificam este alargamento da atuação do Poder Judiciário são: • Próprio alargamento da assistência da atuação do Poder Judiciário: quem não tem condições de contratar advogado pode buscar a defensoria pública. • Constituição é analítica, reconhecendo um extenso rol de direitos sociais • Criação de instrumento aptos a prestação jurisdicional mais eficiente: hoje já há Juizado Especial, não precisando sequer de advogado. Esta crescente procura pelo Poder Judiciário pode ser sintetizada pelas causas denominadas de “ondas de acesso à justiça”. Quais seriam as ondas de acesso à justiça? De acordo com a doutrina são 3 as ondas de acesso à justiça: 1. Fim dos entraves financeiros do processo: ou seja, começam a cair por terra os entraves financeiros, por conta da defensoria pública. 2. Surgimento de novos direitos: isso porque, se não há direitos, o sujeito não busca à justiça. 3. Satisfação daquele que se utiliza dos serviços judiciário: isto significa dizer que o sujeito irá ingressar no judiciário e irá ganha o seu direito. O poder judiciário quer a tutela efetiva. Ou seja, o fato de um indivíduo buscar o judiciário possibilita que efetivamente concretize o seu direito. 9 O princípio que garante o livre acesso à justiça tem previsão constitucional, mas o próprio CPC, em seu art. 3º, o classifica como norma fundamental. MITIGAÇÕES/FLEXIBILIZAÇÕES DESTE PRINCÍPIO: a) Lides desportivas (art. 217, §1º da CF): para que se ajuíze uma ação envolvendo lide desportiva, é necessário o esgotamento da seara administrativa. b) Habeas data (art. 8º, parágrafo único da Lei n° 9.507/97): a petição inicial deverá ser instruída com prova: I - da recusa ao acesso às informações ou do decurso de mais de dez dias sem qualquer decisão sobre tal pedido; II - da recusa em fazer a retificação ou transcurso de mais de quinze dias, sem decisão; ou III - da recusa em fazer a anotação a que se refere o §2º do art. 4º ou do decurso de mais de quinze dias sem decisão. Neste caso, n ão se exige o esgotamento da via administrativa, mas tão somente a demonstração de tais requisitos na petição. c) Ações previdenciárias: é necessário prévio requerimento junto ao INSS, contudo, não se exige o esgotamento da via administrativa, em todo caso, havendo negativa da administração ou uma demora excessiva, dá ensejo a uma pretensão resistida (lide) e, consequentemente, há interesse de agir (STF: RE 631.240- MG1). 1 Ementa: RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. PRÉVIO REQUERIMENTO ADMINISTRATIVO E INTERESSE EM AGIR. 1. A instituição de condições para o regular exercício do direito de ação é compatível com o art. 5º, XXXV, da Constituição. Para se caracterizar a presença de interesse em agir, é preciso haver necessidade de ir a juízo. 2. A concessão de benefícios previdenciários depende de requerimento do interessado, não se caracterizando ameaça ou lesão a direito antes de sua apreciação e indeferimento pelo INSS, ou se excedido o prazo legal para sua análise. É bem de ver, no entanto, que a exigência de prévio requerimento não se confunde com o exaurimento das vias administrativas. 3. A exigência de prévio requerimento administrativo não deve prevalecer quando o entendimento da Administração for notória e reiteradamente contrário à postulação do segurado. 4. Na hipótese de pretensão de revisão, restabelecimento ou manutenção de benefício anteriormente concedido, considerando que o INSS tem o dever legal de conceder a prestação mais vantajosa possível, o pedido poderá ser formulado diretamente em juízo – salvo se depender da análise de matéria de fato ainda não levada ao conhecimento da Administração –, uma vez que, nesses casos, a conduta do INSS já configura o não acolhimento ao menos tácito da pretensão. 5. Tendo em vista a prolongada oscilação jurisprudencial na matéria, inclusive no Supremo Tribunal Federal, deve-se estabelecer uma fórmula de transição para lidar com as ações em curso, nos termos a seguir expostos. 6. Quanto às ações ajuizadas até a conclusão do presente julgamento (03.09.2014), sem que tenha havido prévio requerimento administrativo nas hipóteses em que exigível, será observado o seguinte: (i) caso a ação tenha sido ajuizada no âmbito de Juizado Itinerante, a ausência de anterior pedido administrativo não deverá implicar a extinção do feito; (ii) caso o INSS já tenha apresentado contestação de mérito, está caracterizado o interesse em agir pela resistência à pretensão; (iii) as demais ações que não se enquadrem nos itens (i) e (ii) ficarão sobrestadas, observando-se a sistemática a seguir. 7. Nas ações sobrestadas, o autor será intimado a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção do processo. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado a se manifestar acerca do pedido em até 90 dias, prazo dentro do qual a Autarquia deverá colher todas as provas eventualmente necessárias e proferir decisão. Se o pedido for acolhido administrativamente ou não puder ter o seu mérito analisado devido a razões imputáveis ao próprio requerente, extingue-se a ação. Do contrário, estará caracterizado o interesse em agir e o feito deverá prosseguir. 8. Em todos os casos acima – itens (i), (ii) e (iii) –, tanto a análise administrativa quanto a judicial deverão levar em conta a data do início da ação como data de entrada do requerimento, para todos os efeitos legais. 9. Recurso extraordinário a que se dá parcial provimento, reformando-se o acórdão recorrido para determinar a baixa dos autos ao juiz de primeiro grau, 10 ACESSO À JUSTIÇA E ONDAS RENOVATÓRIAS (MAURO CAPPELLETTI) O princípio do acesso à justiça, no curso do tempo, está sendo reconstruído, ganhando cada vez mais conteúdo. No Brasil o acesso à justiça se renova nas seguintes situações: 1ª onda renovatória: gratuidade da justiça às pessoas hipossuficientes (Lei n° 1.060/50), e instituição das Defensorias Públicas. Ora, exigir que todos tenham que pagar/ recolher as custas processuais viola o acesso à justiça, pois cria-se barreiras econômicas para os hipossuficientes. 2ª onda renovatória: trata-se do acesso coletivo à justiça, das ações/processos coletivos: Lei da Ação Popular (lei 4.717/65); Lei de Ação Civil Pública (Lei 7.347/85); Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429/92); Código de Defesa do Consumidor; Estatuto do Idoso, etc. Era perceptível que havia barreiras quanto ao acesso à justiça para as demandas em massa, apesar de que muitas vezes o interesse na ação era transindividual, ou seja, transcendia o mero interesse individual. Assim, para evitar tais barreiras, deve-se admitir as ações de massa, por meio de seus representantes, que são os legitimados para essas demandas de acesso à justiça da coletividade. 3ª onda renovatória: desburocratização do processo/ sincretismo processual/ criatividade judicial: processo é um só, dividido em fases (junção, em um único processo, das fases de conhecimento e de cumprimento de sentença). No processo de execução extrajudicial, há um único processo de execução. Criatividade judicial: possibilidade de o juiz extrair do texto da lei a verdadeira norma jurídica, ou seja, a norma jurídica mais justa para o caso concreto. c) Princípio do juiz natural O princípio do juiz natural, ou do juízo natural, estabelece, no art. 5º, LIII e XXXVII, que o particular somente poderá ter o seu processo conduzido por uma autoridade ou perante uma autoridade competente. Esta autoridade competente é aquela que tiver sido previamente definida, por critérios impessoais. Portanto, juízo natural é aquele previamente definido. Além disso, para observância do juízo natural, é necessário observar as regras que estabeleçam a competência,ou seja, a área de atuação de cada órgão jurisdicional. O objetivo aqui é vedar o juízo de exceção. o qual deverá intimar a autora – que alega ser trabalhadora rural informal – a dar entrada no pedido administrativo em 30 dias, sob pena de extinção. Comprovada a postulação administrativa, o INSS será intimado para que, em 90 dias, colha as provas necessárias e profira decisão administrativa, considerando como data de entrada do requerimento a data do início da ação, para todos os efeitos legais. O resultado será comunicado ao juiz, que apreciará a subsistência ou não do interesse em agir. 11 d) Princípio da motivação das decisões judiciais O princípio da motivação das decisões judiciais está previsto no art. 93, IX, da CF, estabelecendo que todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade, podendo a lei limitar a presença, em determinados atos, às próprias partes e a seus advogados, ou somente a estes, em casos nos quais a preservação do direito à intimidade do interessado no sigilo não prejudique o interesse público à informação. Veja, o magistrado deve fundamentar suas decisões. Despacho não necessita motivação, visto que não contém carga decisória. Caso tenha, não será despacho, razão pela qual será decisões interlocutória. É a motivação das decisões que permite ao interessado indicar quais razões foram do seu inconformismo. Também confere legitimação à atuação do magistrado. De acordo com o NCPC, existe um rol exaustivo de dever de fundamentação. Este dispositivo afirma que o juiz deve fundamentar, criando uma norma que indica as hipóteses em que a decisão não será considerada fundamentada. A depender da situação, não será considerada fundamentada a decisão do juiz. A doutrina sustenta que este dispositivo teria tornado o processo ainda mais burocrático. Segundo o art. 489, §1º, estabelece que não será considerada decisão judicial fundamentada quando: • Decisão que se limitar à indicação, à reprodução ou à paráfrase de ato normativo, sem explicar sua relação com a causa ou a questão decidida; • Decisão que empregar conceitos jurídicos indeterminados, sem explicar o motivo concreto de sua incidência no caso; • Decisão que invocar motivos que se prestariam a justificar qualquer outra decisão; • Decisão que não enfrentar todos os argumentos deduzidos no processo capazes de, em tese, infirmar a conclusão adotada pelo julgador; • Decisão que se limitar a invocar precedente ou enunciado de súmula, sem identificar seus fundamentos determinantes nem demonstrar que o caso sob julgamento se ajusta àqueles fundamentos; • Decisão que deixar de seguir enunciado de súmula, jurisprudência ou precedente invocado pela parte, sem demonstrar a existência de distinção no caso em julgamento ou a superação do entendimento. Há uma enorme preocupação do legislador com as fundamentações das decisões. 12 Ocorre que isto vai de encontro à brevidade. Este dispositivo não pode ser interpretado literalmente, senão anulará muitas decisões. Não basta a parte alegar as teses genericamente, sendo indispensável a sua fundamentação. Isto é, se a parte não observou o seu dever de cooperação, conforme art. 6º, o juiz não estaria obrigado a esmiuçar uma tese que ela sequer fundamentou. O art. 489, §1º, receberá temperamentos da jurisprudência. e) Princípio da isonomia Segundo o princípio da isonomia, os iguais devem ser tratados iguais e os desiguais desigualmente, na medida de sua desigualdade. Ex.: possibilidade da parte idosa ter prioridade na tramitação do processo em todas as instâncias. O princípio da isonomia, além de ter sede constitucional, tem sede no NCPC, como norma fundamental (art. 6º). f) Princípio do contraditório e da ampla defesa O art. 5º, LV, da CF trata do princípio do contraditório e da ampla defesa. Também é considerado norma fundamental do NCPC, conforme art. 9º. Basicamente assegura contraditório e ampla defesa aos litigantes, com os recursos e os meios inerentes. A ampla defesa é garantida a quem está se defendendo, ou seja, em tese será destinada ao demandado, o qual deve se defender dos fatos alegados pelo demandado. Em relação ao contraditório, ele se refere à: • possibilidade de uma parte ser intimada a respeito de um documento juntado • possibilidade de se manifestar a respeito dessa afirmação e • possibilidade de exercer influência na decisão judicial. O contraditório é importantíssimo. O contraditório possui, além da face processual, uma dimensão substancial. Isto quer dizer que as partes devem ter a possibilidade efetiva de influenciar a decisão do juiz. Portanto, a paridade de armas é o que se assegura efetivamente o contraditório. 13 O NCPC recomenda que o juiz não decida com fundamento ao qual não se tenha dado às partes a oportunidade de se manifestar, mesmo quando se tratar de matéria de ordem pública (art. 10). O art. 10 diz que o juiz não pode decidir, em grau algum de jurisdição, com base em fundamento a respeito do qual não se tenha dado às partes oportunidade de se manifestar, ainda que se trate de matéria sobre a qual deva decidir de ofício. Ex.: caso o juiz venha a conhecer uma prescrição, a qual é norma de ordem pública, deverá abrir vista às duas partes para que elas se manifestem e em seguida decida. O problema é que o contraditório não pode ferir o princípio da celeridade processual, assim como o princípio da isonomia não pode ferir da celeridade. Isso porque a justiça quando tarda é injustiça. Portanto, é preciso então fazer esta ponderação entre valores constitucionais. g) Princípio da razoável duração do processo Criado pela EC 45, a todos são assegurados a razoável duração do processo, e os meios que garantam esta celeridade na tramitação. É o princípio da razoável duração do processo. O NCPC apresenta uma ligeira adaptação desse princípio constitucional. Isso porque, segundo o art. 4º, as partes têm o direito não apenas ao razoável duração do processo, mas também o tempo razoável para a solução integral do mérito, incluída a atividade satisfativa. É a consagração do princípio da primazia da solução integral de mérito. Isto é, se for possível encerrar o processo resolvendo o mérito, esta opção será a mais indicada. No entanto, o CPC não quer conspirar, nem para o rápido e nem para a solução do mérito, não tendo como objetivo a celeridade do processo. Exemplo disso é a contagem dos prazos em dias úteis. Isto torna muito menos célere o processo. Além disso, há a possibilidade de suspender os prazos processuais entre 20 de dezembro e 20 de janeiro de cada ano. Ainda, todos os recursos, com exceção dos embargos de declaração, têm o prazo de 15 dias para interposição. Para Samer, como o NCPC trouxe tais regras, resta claro que estaria havendo uma violação no que tange ao princípio da razoável duração do processo. h) Princípio da boa-fé processual (art. 5° do CPC) 14 A boa-fé processual é uma norma de conduta, impondo a todo o sujeito que participa do diálogo processual um comportamento leal, ético, probo. Por ser uma norma de conduta, trata-se, em verdade, de uma boa-fé objetiva. O art. 5º dispõe no seguinte sentido: “Aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé”. FUNÇÕES DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ PROCESSUAL: 1ª) função interpretativa (art. 322, §2°, art. 489, §3° ambos do CPC): em linhas gerais, quer dizer que as manifestações das partes, bem como as decisões judiciais devem ser interpretadas de acordo com a boa-fé. Art. 322, § 2º. A interpretação do pedido considerará o conjunto da postulação e observará o princípio da boa-fé. Art. 489 §3º. A decisão judicial deve ser interpretada a partir da conjugação de todos os seus elementos e em conformidade com o princípio da boa-fé. 2ª) função integrativa(art. 5º do CPC): aquele que de qualquer forma participa do processo deve comportar-se de acordo com a boa-fé. 3ª) função limitadora (ou de controle): veda o abuso do direito. Ex.: art. 311, I do CPC: Art. 311. A tutela da evidência será concedida, independentemente da demonstração de perigo de dano ou de risco ao resultado útil do processo, quando: I - ficar caracterizado o abuso do direito de defesa ou o manifesto propósito protelatório da parte. FUNDAMENTOS CONSTITUCIONAIS DA BOA-FÉ PROCESSUAL: I- art. 1º, inciso III da CF: dignidade da pessoa humana; II- art. 5º, inciso LIV da CF: princípio do devido processo legal; III- art. 3º, inciso I da CF: “constitui objetivo da República Federativa do Brasil construir uma sociedade livre, justa e solidária”. A solidariedade é um dos fundamentos do princípio da boa-fé, logo a Constituição Federal exige uma sociedade solidária; no âmbito processual, a boa-fé acaba decorrendo da solidariedade que deve haver entre as pessoas que fazem parte da relação processual. CONCRETIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA BOA-FÉ: a) Vedação de litigância de má-fé: previsão nos seguintes artigos: Art. 79. Responde por perdas e danos aquele que litigar de má-fé como autor, réu ou interveniente. 15 Art. 80. Considera-se litigante de má-fé aquele que: I - deduzir pretensão ou defesa contra texto expresso de lei ou fato incontroverso; II - alterar a verdade dos fatos; III - usar do processo para conseguir objetivo ilegal; IV - opuser resistência injustificada ao andamento do processo; V - proceder de modo temerário em qualquer incidente ou ato do processo; VI - provocar incidente manifestamente infundado; VII - interpuser recurso com intuito manifestamente protelatório. Art. 81. De ofício ou a requerimento, o juiz condenará o litigante de má-fé a pagar multa, que deverá ser superior a um por cento e inferior a dez por cento do valor corrigido da causa, a indenizar a parte contrária pelos prejuízos que esta sofreu e a arcar com os honorários advocatícios e com todas as despesas que efetuou. b) Proibição de proteção dolosa de posições jurídicas: não é permitido criar uma situação jurídica ou posição jurídica para prejudicar a parte contrária. Ex.: art. 258, CPC: ajuízo uma ação dizendo que a parte ré está em local incerto e não sabido e peço a citação por edital, mesmo sabendo onde a parte tem domicílio. c) Responsabilidade pessoal e regressiva do juiz: ver art. 143, art. 181, art. 184, art. 187 todos do CPC. Ocorrerá quando o juiz agir com dolo e fraude. Tal responsabilidade também será aplicada ao membro do Ministério Público, ao Advogado Público e ao Defensor Público. d) Proibição do abuso de direito: trata-se da função limitadora ou de controle da boa-fé processual. Ex1: art. 311, I do CPC – é possível a concessão de tutela provisória de evidência, quando ocorrer o abuso do direito de defesa. Convém mencionar ainda, que se tratando de tutela de evidência, não se exige urgência, mas sim, a probabilidade do direito. Ex2: art. 1.026, §2º do CPC: “Quando manifestamente protelatórios os embargos de declaração, o juiz ou o tribunal, em decisão fundamentada, condenará o embargante a pagar ao embargado multa não excedente a dois por cento sobre o valor atualizado da causa”. e) vedação de comportamento contraditório (venire contra factum proprium): significa dizer, que uma das partes não pode criar uma expectativa na parte contrária, em razão de um comportamento que ela 16 própria apresentou, e, posteriormente, surpreendê-la negativamente com outro comportamento contraditório. Exemplos: Art. 276. Quando a lei prescrever determinada forma sob pena de nulidade, a decretação desta não pode ser requerida pela parte que lhe deu causa. Art. 1.000. A parte que aceitar expressa ou tacitamente a decisão não poderá recorrer. Pergunta: O que se entende por nulidade de algibeira? R: É também chamada de nulidade de bolso, ou seja, a parte guarda para si uma nulidade, para arguí-la posteriormente, em momento mais oportuno para ela. Importante destacar, que essa modalidade de nulidade viola o princípio da boa-fé processual, que é uma norma de conduta. Enunciado 377 do FPPC: A boa-fé objetiva impede que o julgador profira, sem motivar a alteração, decisões diferentes sobre uma mesma questão de direito aplicável às situações de fato análogas, ainda que em processos distintos. Enunciado 375 do FPPC: O órgão jurisdicional também deve comportar-se de acordo com a boa- fé objetiva. Enunciado 376 do FPPC: A vedação do comportamento contraditório aplica-se ao órgão jurisdicional. i) Princípio da adequação do procedimento Também conhecido como princípio da adaptabilidade do procedimento/ princípio da flexibilização do procedimento/ do processo. Art. 139. O juiz dirigirá o processo conforme as disposições deste Código, incumbindo-lhe: VI - dilatar os prazos processuais e alterar a ordem de produção dos meios de prova, adequando-os às necessidades do conflito de modo a conferir maior efetividade à tutela do direito. 17 Podemos exteriorizar, a partir desse dispositivo, que o juiz, na prática, pode adequar/ adaptar o procedimento processual de acordo com as peculiaridades do caso concreto. No entanto, não poderá o juiz dilatar o prazo processual depois do seu transcurso integral, conforme demonstra o art. 139, parágrafo único, do CPC: “A dilação de prazos prevista no inciso VI somente pode ser determinada antes de encerrado o prazo regular”. Pergunta: O princípio da adequação do procedimento se dirige tão somente ao juiz? R: Não, vez que processo devido é o processo adequado às particularidades da causa. Temos como destinatários do princípio da adequação: a) Legislador: cabe ao legislador criar leis que versem sobre processos, mas criando procedimentos adequados, de acordo com a necessidade de determinadas causas. Ex.: Lei n° 9.099/95 (juizados especiais); b) Juiz: previsto no art. 139, inciso VI do CPC, conforme já citado acima; c) Partes: art. 373, §3º e art. 190 ambos do CPC: as partes podem, por meio de um negócio jurídico processual, dispor de forma diversa acerca do ônus da prova, podendo, inclusive, modificar o procedimento, aumentar o prazo, determinar a irrecorribilidade de alguma decisão. Art. 373, § 3º. A distribuição diversa do ônus da prova também pode ocorrer por convenção das partes, salvo quando: I - recair sobre direito indisponível da parte; II - tornar excessivamente difícil a uma parte o exercício do direito. Art. 190. Versando o processo sobre direitos que admitam autocomposição, é lícito às partes plenamente capazes estipular mudanças no procedimento para ajustá-lo às especificidades da causa e convencionar sobre os seus ônus, poderes, faculdades e deveres processuais, antes ou durante o processo. IV. Princípios gerais de direito Princípios gerais são formas de integração. Serão estudados ao longo do curso, tal como: • Princípio da congruência: juiz não pode decidir além ou aquém do que foi pedido. • Princípio da competência sobre competência: não há quem seja tão incompetente de não ter competência para reconhecer a sua incompetência. • Princípio da instrumentalidade das formas • Princípio do prejuízo: se foi alcançada a finalidade, ou se não houve prejuízo, o ato é válido. • Princípio da causalidade: quem deu causa é o responsável. • Princípio da identidade física do juiz: o juiz que concluiu a audiência de instrução deve sentenciar. 18 • Princípio da unirrecorribilidade: cada decisão possibilita a interposição de apenas um recurso. • Princípio da fungibilidade: permite-se usar um ou outro recurso. Tais princípios serão contextualizados ao longo do estudo. V. Normas fundamentais do NCPC O NCPC inaugurou no Livro I, o capítulo denominado das Normas Fundamentais do Processo Civil. Esta nomenclatura serefere na maioria a princípios. Este capítulo aborda aquilo que o NCPC reputa como norma fundamental: • Princípio dispositivo • Princípio que garante livre acesso ao judiciário • Princípio que garante o tempo razoável para duração do processo e para decisão de mérito • Princípio da boa-fé ou cooperação processual • Princípio da isonomia • Princípio do contraditório • Princípio da publicidade dos atos processuais Atente-se que não há hierarquia entre estes dispositivos, os quais estão no capítulo das normas fundamentais, e os demais espalhados pela legislação. É preciso perceber que estas normas fundamentais ajudarão o intérprete no momento da aplicação das normas do NCPC. O CPC recomenda que o magistrado se atenha aos fins sociais no momento da aplicação do direito. O art. 8º recomenda que o juiz faça uma interpretação teleológica (finalística). Segundo este dispositivo, ao aplicar o ordenamento jurídico, o juiz atenderá aos fins sociais e às exigências do bem comum, resguardando e promovendo a dignidade da pessoa humana e observando a proporcionalidade, a razoabilidade, a legalidade, a publicidade e a eficiência. Veja, a função é a social. Isto é, quando for interpretar uma norma, deve o juiz se ater à função social. Além dessas normas ditas fundamentais, existe a do art. 12, que traz um caráter específico, estabelecendo que os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. É possível que não seja observada esta exigência. VI. Lei processual no tempo e no espaço 19 a) Lei processual no tempo Quanto à lei processual no tempo, a lei deverá ser aplicada imediatamente tão logo esteja em vigor. Mas deverá respeitar os atos processuais já praticados. Por conta disso, a lei processual no tempo será orientada pelo princípio do tempus regit actum. Existem 3 sistemas possíveis: • Sistema da unidade processual: O processo inteiro deve ser regido pela lei processual que vigorava no momento da sua instauração. Ex.: nova lei processual só orientará os processos ajuizados após a sua entrada em vigor. Os que já haviam sido ajuizado continuarão pela lei antiga. • Sistema das fases processuais: Há o desmembramento do processo em várias etapas: postulatória, saneadora, instrutória, decisória, recursal, executória. Apesar de, eventualmente, estas fases se confundirem, é possível, como regra, observar as fases no processo. Com base neste sistema, com o advento de uma nova lei processual, a antiga continua sendo aplicada até que aquela fase seja ultimada. Ex.: Havia a Lei A, mas entrou em vigor a Lei B. No momento em que entrou a Lei B, o processo já estava na fase decisória. Naquele momento, haveria continuidade de aplicação da Lei A. Encerrada a fase decisória, será aplicada a Lei B na fase recursal. Muito embora o NCPC priorize do isolamento dos atos processuais, é possível verificar expressamente numa ou noutra circunstância a aplicação do sistema das fases processuais. O NCPC extinguiu diversos procedimentos, como sumário, ação de usucapião, ação de depósito, etc. No entanto, o art. 1.046, §1º, do CPC prevê que enquanto não for proferida a sentença na etapa de conhecimento, ou seja, enquanto perdurar esta fase, o processo continuará observando estes ritos extintos, caso tenham sido deflagrados pelo CPC/73. Ou seja, perdurarão até a sentença. Após a sentença o processo deverá observar o NCPC. Como se vê, o NCPC adotou neste caso o sistema das fases processuais. • Sistema do isolamento dos atos processuais: Em regra, o NCPC adota o sistema do isolamento dos atos processuais. Isto é, cada ato deve ser analisado individualmente, à luz da lei em vigor no momento em que o ato foi praticado. Isto traz alguns questionamentos práticos, conforme Rodolfo Hartmann. Supondo que a lei preveja o prazo de 10 dias para um recurso. Na fluência desse prazo, vem o NCPC, trazendo o prazo para este recurso de 15 dias. É o que ocorreu com o agravo de instrumento. Neste caso, a parte já foi intimada para ciência da decisão, ainda quando o modelo anterior vigorava, ou seja, havia uma situação consolidada, em que a mesma dispunha de 10 dias 20 para recorrer, razão pela qual continuará a ter os 10 dias para recorrer. Caso diverso é o fato de a parte ter sido intimada quando já estava em vigor o NCPC, situação na qual teria 15 dias. b) Lei processual no espaço Quanto ao aspecto espacial, a lei processual será aplicada no Brasil. O que se tem não é uma exclusão de normas trazidas por tratados que estabeleçam regras específicas, principalmente no que diz respeito à cooperação jurídica internacional. Este é inclusive um tema que o CPC guarda certa importância. Exemplo de tratado internacional importante é o Protocolo de Ouro Preto. Este protocolo sobre medidas cautelares permite que cartas rogatórias sejam cumpridas em zonas de fronteira entre os países signatários desse protocolo: Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai. Isso independentemente do exequatur dado pelo STJ. Em regra, carta rogatória necessita do exequatur, porém neste caso o Protocolo de Ouro Preto estabelece que não é necessário este exequatur. Portanto, aplica-se, como regra, as normas produzidas internamente, sem prejuízo da aplicação de tratados e normas de direito internacional incorporados ao ordenamento brasileiro. ORDEM CRONOLÓGICA (art. 12 do CPC) De acordo com o art. 12 do CPC, os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. Verifica-se, portanto, que as decisões interlocutórias e os despachos não se sujeitam à ordem cronológica. Perguntas: 1- Qual o princípio orientador e justificador desta regra? R: O princípio da isonomia fundamenta a regra do art. 12 do CPC, visto que, ao observar a ordem cronológica, deve-se conceder tratamento isonômico. 2- É admitido negócio jurídico processual para afastar esta regra? R: O negócio jurídico processual está previsto no art. 190 do CPC e oportuniza às partes negociarem sobre deveres, prerrogativas, ônus, poderes processuais e etc. Todavia, segundo a doutrina majoritária, o negócio jurídico processual não pode ser aplicado para dispor sobre a ordem cronológica de conclusão de sentença ou acordão, vez que se trata de uma norma de interesse público e, se 21 modificada a ordem por mero interesse das partes de um processo, com certeza, prejudicará terceiros que estão aguardando a resolução de seus próprios processos. MITIGAÇÕES À REGRA DA ORDEM CRONOLÓGICA: Art. 12. Os juízes e os tribunais atenderão, preferencialmente, à ordem cronológica de conclusão para proferir sentença ou acórdão. §2° estão excluídos da regra do caput: I - as sentenças proferidas em audiência, homologatórias de acordo ou de improcedência liminar do pedido; II - o julgamento de processos em bloco para aplicação de tese jurídica firmada em julgamento de casos repetitivos; III - o julgamento de recursos repetitivos ou de incidente de resolução de demandas repetitivas; IV - as decisões proferidas com base nos arts. 485 e 932; V - o julgamento de embargos de declaração; VI - o julgamento de agravo interno; VII - as preferências legais e as metas estabelecidas pelo Conselho Nacional de Justiça; VIII - os processos criminais, nos órgãos jurisdicionais que tenham competência penal; IX - a causa que exija urgência no julgamento, assim reconhecida por decisão fundamentada. * Importante destacar, que este rol é exemplificativo. Consequências do descumprimento da ordem cronológica pelo juiz: Segundo Fredie Didier, não há nulidade da decisão que desrespeita a ordem cronológica, diante da ausência de prejuízo às partes envolvidas (pas de nulitté sans grief). O terceiro que foi preterido, apesar de prejudicado, nada ganha com a anulaçãoda sentença. O desrespeito, todavia, pode ser apurado no plano disciplinar/correcional. O desrespeito à cronologia, segundo Didier, pode significar indício de suspeição do juiz; caso a suspeição fique demonstrada, aí sim se pode falar em invalidação da decisão. A invalidação dar-se-á pela suspeição, e não em razão do desrespeito à cronologia. EVOLUÇÃO METODOLÓGICA DO PROCESSO 22 Quando falamos em direito processual civil, a primeira indagação que devemos ter em mente é: como o processo evoluiu no tempo? Como se deu a evolução metodológica do processo? A evolução metodológica do processo se desenvolve basicamente em 04 (quatro) grandes fases, sendo elas: fase do praxismo; fase do processualismo; fase do instrumentalismo e fase do neoprocessualismo. Fase do Praxismo (também chamado de sincretismo): não havia qualquer distinção entre o direito material e o direito processual. O direito processual era visto apenas dentro do seu aspecto prático do dia a dia forense, bem como, não era compreendido como uma ciência autônoma. Não havia, portanto, qualquer autonomia entre esses ramos do direito, isso porque, o direito processual, basicamente, pertencia ao direito material. Em linhas gerais, o direito processual seria o próprio direito material. Fase do Processualismo: Oscar Von Bulow, no ano de 1.868 escreveu uma obra prima denominada “Teoria dos Pressupostos Processuais e Exceções Dilatórias”, demonstrando que a relação jurídica de direito processual não se confunde com a relação jurídica do direito material. Diante disso, direito processual é uma ciência que tem elementos e temas específicos totalmente diversos e autônomos do direito material. Essa é a fase divisor de águas do Processo Civil. Fase do Instrumentalismo: para essa teoria, o direito processual civil não se confunde com o direito material, contudo não podemos fechar os olhos para uma relação existente entre ambos. Assim, de que forma o direito processual se relaciona com o direito material? O direito processual deve ser compreendido como instrumento de realização do direito material e o direito material se realiza por meio do processo, somente o processo possui força para fazer/permitir a realização de um direito material quando este não é observado pelas partes. No entanto, a relação de direito processual e direito material deve ser compreendida como uma relação circular, vez que ao mesmo tempo em que o direito processual serve de instrumento para o direito material, o direito processual é servido pelo direito material. O professor Fredie Didier, diz “que não existe processo oco”, ele assiste razão, pois não é possível ajuizar uma ação “para nada”, para não querer nada, sem objetivo. Somente haverá processo se houver o direito material que necessite ser realizado, ainda que seja uma ação meramente declaratória, para reconhecimento e certificação da existência ou inexistência de uma relação jurídica ou de um direito qualquer. A fase do instrumentalismo perdurou por muitos anos, inclusive à luz do CPC/73. Posteriormente, o movimento denominado “neoconstitucionalismo” e seus marcos: histórico (pós segunda guerra mundial), marco teórico (pós-positivismo, com a ideia de que texto não se confunde com norma jurídica) e marco filosófico e teórico (força normativa da Constituição, teoria dos princípios, atividade criativa do juiz, sincretismo processual), influenciou para o que chamamos de “neoprocessualismo”. 23 Fase do Neoprocessualismo (formalismo valorativo ou positivismo reconstruído): as normas de direito processual devem ser aplicadas à luz da pauta dos direitos fundamentais previstos na Constituição Federal. Exemplificando, não é crível que uma pessoa que é demandada em um processo tenha somente o prazo de 15 (quinze) dias para contestar, quando apenas os documentos juntados com a petição inicial, formam um processo com mais de cinco mil páginas, não seria razoável e não haveria a observância do princípio da isonomia. Em resumo: o neoprocessualismo traz a ideia de que o processo deve ser lido e compreendido sempre à luz da Constituição Federal. As normas de processo civil devem ser aplicadas buscando assegurar os direitos fundamentais. 2. Jurisdição I. Introdução A palavra jurisdição quer dizer: “dizer o direito”. Atualmente, deverá ser compreendida não apenas como dizer o direito, mas também como “efetivar o direito”, de aplicar este direito. A jurisdição é desempenhada por uma pessoa que tem poder para exercer a jurisdição. Este desempenho se dá através da investidura, via de regra por concurso público de provas e títulos. No entanto, é possível também pelo quinto constitucional e pela nomeação do presidente da república. Os objetivos da jurisdição são: • Pacificação social • Afirmação do poder estatal • Dizer e realizar o direito no caso concreto DICA: PAD (cuida-se para não confundir com o direito administrativo disciplinar). II. Jurisdição anômala do Poder Legislativo O Poder Legislativo, em caráter excepcional, exerce jurisdição, sendo denominado de jurisdição anômala. Esta jurisdição será exercida para o processamento e julgamento nos crimes de responsabilidade. III. Características da jurisdição As características da jurisdição se revelam muito importantes na identificação da atividade 24 jurisdicional. São elas: a) SUBSTITUTIVIDADE: o estado substitui a vontade das partes e diz o direito no caso concreto. Atentem-se, as ações constitutivas necessárias → são ações que somente por meio da chancela estatal, é possível criar, modificar ou extinguir uma situação jurídica. É possível encontra-las nas ações de divórcio, envolvendo filho incapaz - que necessariamente dependerá de uma sentença por parte do Poder Judiciário -, bem como nas ações de interdição. No que tange as ações constitutivas necessárias, a doutrina vai dizer que não há que se falar em substitutividade, pois o estado não pode substituir algo que as próprias partes não podem resolver sozinhas. Desse modo, fala-se em substitutividade se o Estado substituir, efetivamente, algo que as partes podem resolver. Por exemplo: ação de resolução contratual - as partes podem resolver o contrato sem a intervenção do judiciário -; nas ações de cobrança, de indenização - as partes podem transacionar sem intervenção estatal. b) INÉRCIA: dessa característica, decorre o princípio da demanda e princípio da congruência. No que diz respeito ao princípio da demanda – disposto no art. 2º do CPC, se revela na inércia da jurisdição, uma vez que o juiz não pode iniciar o processo de ofício, pois depende da manifestação/provocação das partes. Quanto ao princípio da congruência, significa dizer que o judiciário deve se atentar aos limites criados pela parte autora (petição inicial) e o réu (defesa), haja vista que a decisão não poderá ser: ultra petita, extra petita e infra petita. O princípio da congruência decorre do princípio da demanda que, por sua vez, emana da característica da inércia da jurisdição. c) LIDE: segundo professor Francesco Carnelutti, lide é o conflito de interesses qualificado por uma pretensão resistida ou insatisfeita. Para que se busque a tutela jurisdicional, é necessária a ocorrência de um litígio/conflito de interesses, ou porque a pretensão de alguém foi resistida ou insatisfeita por outrem, concretizando-se, assim, interesse de agir. Interesse de agir se traduz no binômio: necessidade (não foi possível obter por outros meios) + utilidade (o pedido da parte deve proporcionar um benefício para seu patrimônio jurídico). Interesse de agir = Necessidade + Utilidade Parte da doutrina sustenta que lide não é característica exclusiva da jurisdição, pois pode haver jurisdição sem lide, como por exemplo, no procedimento especial de jurisdição voluntária. Todavia, quem 25 defende essa posição, entende quea jurisdição voluntária é jurisdição. Isso porque, há uma segunda corrente doutrinária que sustenta que o procedimento de jurisdição voluntária não possui jurisdição. d) MANIFESTAÇÃO DE PODER: por meio da jurisdição, o estado exerce seu poder. Decorrem dessa característica a jurisdição imperativa e jurisdição inevitável. É imperativa, porque o Poder Judiciário faz cumprir as suas decisões; decorre do poder geral de efetivação, previstos nos artigos 139, inciso IV e art. 537 ambos do CPC. Em outras palavras, o juiz reconhece e produz uma norma jurídica individualizada; diz o direito e realiza o processo por meio da execução. Quanto à inevitabilidade, significa que a parte não pode simplesmente não concordar ou não querer cumprir uma decisão judicial. e) ATIVIDADE CRIATIVA: o juiz, extrai do texto legal a norma jurídica mais justa para o caso, ou seja, recria-se a norma jurídica no caso concreto. Acerca dessa temática, o jurista Hans Kelsen já dizia, “texto legal não se confunde com norma jurídica”. A norma jurídica se revela por meio de uma atividade hermenêutica, portanto, o juiz por meio dessa interpretação, extrai do texto legal a norma jurídica mais justa, efetiva e harmônica ao próprio texto constitucional. Um exemplo muito marcante acerca da atividade criativa, foi o julgamento da ADI nº 4277 onde se discutiu a possibilidade de união homoafetiva. O STF, nesta oportunidade, interpretou o artigo 1.723 do Código Civil à luz da Constituição Federal e extraiu do texto sua verdadeira norma jurídica, ou seja, a previsão de união estável entre homem e mulher não afasta a possibilidade de união entre pessoas do mesmo sexo. Nessa linha, foi reputada inconstitucional pelo Supremo qualquer interpretação feita ao artigo 1.723 do CC, que proíba a união estável de pessoas do mesmo sexo. f) DEFINITIVIDADE: a jurisdição tem aptidão para a coisa julgada, e é por meio daquela, que a norma jurídica individualizada se torna imutável após o trânsito em julgado. g) TERCEIRO IMPARCIAL: a jurisdição é exercida por um terceiro imparcial. O juiz, portanto, é investido de função jurisdicional. Importante ponderar, que o terceiro imparcial não é uma característica exclusiva da jurisdição. Podemos nos deparar com a imparcialidade na arbitragem, na mediação e na conciliação. Ou seja, a título de exemplo, é perfeitamente cabível que haja conciliação/mediação no âmbito de uma comunidade ou de uma associação. 26 DICA: Para memorizar as características da jurisdição, lembre-se do nome “SILMADETE”. S (substitutividade), I (inércia), L (lide), M (manifestação de poder), A (atividade criativa), D (definitividade), T (terceiro imparcial). III. Princípio da congruência ou da correlação ou da adstrição Basicamente, o juiz não pode entregar uma prestação jurisdicional além do que foi pedido. Neste caso, haveria uma sentença ultra petita. O juiz também não pode entregar uma prestação distinta do que foi pleiteado. Neste caso, a sentença também é nula, em razão de ser sentença extra petita. Ainda, o juiz não pode deixar de analisar fundamento alegado pelas partes, isto é, não pode decidir aquém do que foi pedido. Haveria aqui uma sentença citra petita. IV. Jurisdição contenciosa ou voluntária A jurisdição contenciosa é aquela que nos mostra de forma evidente os sinais de uma jurisdição. É aplicada a um processo judicial em que: • Partes: deduzida uma pretensão • Litígio: partes contrapostas (em litígio) • Substitutividade: decisão judicial que substitui a vontade das partes • Coisa julgada: acobertada com força de coisa julgada Na jurisdição voluntária, existem duas correntes. Uma que entende ser jurisdição, outra entende que não é. Prevalece a corrente que sustenta que a jurisdição voluntária não é jurisdição. Seria o exercício de uma atividade administrativa feita pelo magistrado. Seria, portanto, uma administração pública de interesses privados, eis que o legislador entendeu que alguns atos seria necessária a chancela do poder judiciário. Haveria aqui um procedimento conduzido por um magistrado, em que haveria apenas o requerimento de interessados. Portanto, neste procedimento, segundo esta corrente, não haveria partes, mas somente interessados. Não haveria litígio. Ou seja, a decisão proferida pelo magistrado não se revestiria da imutabilidade da decisão, tampouco fazer coisa julgada material. Ex.: separação consensual, antes da EC 2010, a qual foi feita perante o poder judiciário e homologada pelo juiz. Esta separação não impede que as mesmas pessoas venham a contrair novas núpcias. 27 Portanto, neste caso, não haveria coisa julgada material. V. Equivalentes jurisdicionais Está na moda. Os equivalentes jurisdicionais são mecanismos que são empregados para solucionar litígios. Normalmente agrupam a autotutela, autocomposição, conciliação e mediação e a arbitragem. a) Autotutela, autocomposição, conciliação e mediação i. Autotutela Autotutela é a imposição da vontade de uma das partes em detrimento da outra. Atualmente, o Código Penal considera a autotutela como exercício arbitrário das próprias razões (art. 334, CP). No entanto, é possível, eventualmente, a utilização da autotutela. Ex.: desforço imediato, também conhecida como legítima defesa da posse. A autotutela é a imposição da vontade individual em detrimento da vontade do outro. Via de regra, não é cabível. ii. Autocomposição Na autocomposição, os próprios litigantes conseguem se compor amigavelmente, independentemente da atuação de um órgão, seja público ou privado. iii. Conciliação e mediação Diferentemente da autocomposição, tanto a conciliação quanto a mediação, demandam da participação de um terceiro, que é o conciliador ou mediador. Qual é a diferença entre o conciliador e o mediador? • Conciliador: conduz a conciliação. Se o terceiro interfere no diálogo entre os que contendem haverá conciliação. Isso porque o sujeito interfere para mostrar o lado positivo ou negativo do acordo. • Mediador: irá apartear os envolvidos, devendo eles mesmos chegar a uma solução. O CPC, em suas normas fundamentais, impõe que no curso do processo judicial o Estado promova, ou busque promover, a solução consensual do litígio, inclusive com uma audiência de conciliação e mediação, que em regra é obrigatória. 28 Perceba que o NCPC é totalmente voltado da importância à conciliação ou mediação, podendo ser judiciais ou extrajudiciais. b) Arbitragem Arbitragem é regulada pela Lei 9.307/96 (Lei Marco Maciel). A ideia era desafogar o poder judicial. Rodolfo Hartmann sustenta que o efeito da lei foi contrário ao que foi proposto. A sentença arbitral é considerada um título executivo judicial. Não se sujeita a uma homologação do poder judiciário e nem pode ter o seu conteúdo modificado pelo poder judiciário. O poder judiciário poderá somente anular uma sentença arbitral, mas não reformar. O que não pode é bater às portas de Poder Judiciário e dizer que o árbitro condenou João a pagar 10 e o juiz determinou que ele pagasse 15. Atividade desempenhada pelo árbitro não é a mesma de um magistrado. Isso porque não contém alguns atributos da jurisdição: • Impossibilidade de o árbitro se valer de medidas coercitivas e medidas de autossatisfação. Rodolfo Hartmann diz que se as partes quiserem, o árbitro poderá buscar o Poder Judiciário e pedir que se aplique medidas coercitivas e medidas de auto efetivação. Esta é uma crítica que o professor Rodolfo faz, afirmando que esta medida não desafoga o poder judiciário. • Qualquer pessoa capaz pode participar de uma arbitragem, seja pessoa física ou pessoa jurídica, até mesmo integrantes da administração indireta, como empresas públicas e sociedades de economia mista. • A arbitragem somente pode versar sobre direito patrimonial disponível. Isto já restringe e muito a atuação da arbitragem.i. Convenção de arbitragem, cláusula compromissória e compromisso arbitral Convenção de arbitragem é gênero, dos quais são espécies: • Cláusula compromissória: é uma cláusula prevista em contrato. As partes comprometem-se a se submeter à arbitragem os litígios que eventualmente surjam em relação àquele contrato. A cláusula é prevista antes da ocorrência de um ato ilícito. • Compromisso arbitral: é formulado após a ocorrência do litígio. Trata-se de uma convenção na qual as partes submetem um litígio à arbitragem. Perceba que não existe arbitragem sem compromisso arbitral, visto que é ele que estabelece as regras da arbitragem. Deverá constar do compromisso arbitral o nome, domicílio, estado civil das partes, a matéria que será objeto de 29 arbitragem, o lugar em que será proferida a sentença arbitral, se a arbitragem será por equidade ou de acordo com a lei. Como se vê, há aqui a regulação da forma como se dará a arbitragem. E portanto, toda a arbitragem possui necessariamente de um compromisso arbitral. Pode existir arbitragem sem cláusula compromissória? SIM, mas toda a arbitragem deve ter compromisso arbitral. Pode acontecer de que, no contrato firmado entre as partes, exista a menção à cláusula compromissória e que, ocorrendo o dano, a parte venha propor uma demanda judicial. Neste caso, a parte ajuizou a ação, apesar de estar previsto cláusula compromissória. Como não havia compromisso arbitral, a parte ajuizou a ação. A outra parte, em questão preliminar, suscita a existência de convenção de arbitragem, matéria que não pode ser conhecida de ofício pelo juiz. Mas se a outra parte, em preliminar, suscita a convenção de arbitragem, deverá o juiz proferir sentença no processo judicial para extinguir o processo sem resolução do mérito (art. 485, VII). Situação diferente é aquela que ocorre quando as partes celebram cláusula compromissória, e posteriormente ao fato que houve um dano, uma das partes se recusa a elaborar o compromisso arbitral. Então há uma cláusula compromissória, mas é necessariamente preciso que haja o compromisso arbitral. Caso uma das partes não quer elaborar o compromisso arbitral, o interessado deverá notificar a outra parte para que venha a realizar em dia e horário próprio o compromisso arbitral, situação na qual, caso o interessado fique inerte, o interessado irá propor uma demanda perante o poder judiciário. Veja, o sujeito deverá propor uma demanda no poder judiciário com o objetivo de que o outro venha a juízo para poder lavrar o compromisso arbitral. Caso o sujeito não venha ao processo, a sentença irá valer como compromisso arbitral. Rodolfo Hartmann critica muito esta questão, pois não há qualquer desafogamento dos processos. ii. Árbitro Segundo o art. 13 da Lei de Arbitragem, o árbitro pode ser qualquer pessoa capaz e que tenha a confiança das partes. A sua nomeação deverá ser sempre em número ímpar. O árbitro se submeterá às mesmas regras de impedimento e de suspeição dos magistrados. iii. O procedimento arbitral 30 O procedimento arbitral considera-se instituído quando o árbitro aceita a instituição de seu nome para decidir o litígio. Com isso, seguirá aquilo que consta do compromisso arbitral. As partes podem ou não estar assistidas por advogados. A Lei 9.307/96 foi alterada em 2015, passando a prever que as partes podem, antes da instituição da arbitragem, recorrer ao poder judiciário para concessão de medidas de urgência e medidas cautelares. Rodolfo Hartmann afirma que o art. 22-B é de inconstitucionalidade desvairada ou enlouquecida (Min. Carlos Ayres Brito e Eros Grau). Segundo o art. 22-B, o árbitro pode revogar ou modificar as decisões concedidas em medidas de urgência ou medidas cautelares concedidas pelo Poder Judiciário. Veja, o juiz concedeu as medidas, e o árbitro poderá revogá-las. Samer sustenta inconstitucionalidade. O árbitro também poderá deferir tutelas de urgência. No entanto, não terá poder de efetivação desta tutela de urgência, vista que é própria de juízes togados. Diante disso, o árbitro deverá requerer a efetivação dessas medidas perante o Poder Judiciário, por meio da expedição de carta arbitral. Carta arbitral é o meio pelo qual o árbitro requer ao poder judiciário que seja cumprida a sua medida de urgência. Após, correrá a instrução e depois de encerrada haverá a sentença arbitral. A sentença arbitral deverá ter relatório, fundamentação e dispositivo, aproximando-se de uma sentença judicial. Esta sentença arbitral pode ter vícios, que não observaram a lei. Neste caso, o interessado pode vir a alegar esta questão sobre o vício da sentença arbitral por meio de duas vias possíveis, sendo denominada de teoria da dupla porta: • Processo judicial será ajuizado no prazo de 90 dias, após a notificação da sentença arbitral. • Aguardar a execução da sentença arbitral e, em sede de cumprimento da sentença arbitral, alegar este vício da sentença arbitral. Este vício inquina a sentença arbitral ou o próprio procedimento arbitral. Quais as razões que levaram ao insucesso da arbitragem no Brasil? A principal delas é de que um único processo arbitral poderá gerar diversas demandas judiciais, além da possibilidade de se anular um procedimento arbitral. 31 iv. Homologação de sentença arbitral estrangeira A homologação de sentença arbitral estrangeira também deverá ser homologada, conforme art. 960, §3º, NCPC. A competência dessa homologação é do STJ, apesar de não haver uma menção explícita nesse sentido. v. Nulidade da cláusula compromissória Recentemente, o STJ entendeu que o Poder Judiciário não pode decretar a nulidade de cláusula arbitral (compromissória) sem que essa questão tenha sido apreciada anteriormente pelo próprio árbitro. Isso porque, segundo o art. 8º, parágrafo único, da Lei de Arbitragem (Lei nº 9.307/96), antes de judicializar a questão, a parte que deseja arguir a nulidade da cláusula arbitral deve formular esse pedido ao próprio árbitro (Info 591). Segundo a Ministra Nancy Andrighi, a kompetenz-kompetenz (competência-competência) é um dos princípios basilares da arbitragem, que confere ao árbitro o poder de decidir sobre a sua própria competência, sendo condenável qualquer tentativa, das partes ou do juiz estatal, no sentido de alterar essa realidade. Em outras palavras, no embate com as autoridades judiciais, deterá o árbitro preferência na análise da questão, sendo dele o benefício da dúvida. Vale ressaltar que essa questão da nulidade poderá ser apreciada pelo Poder Judiciário em momento posterior. Isso porque, para fazer cumprir a sentença arbitral, o credor terá que ajuizar uma execução judicial. Nesse momento, o devedor poderá se defender por meio de embargos à execução alegando a nulidade da cláusula arbitral e, consequentemente, da sentença arbitral. Excepcionalmente, é possível que o Poder Judiciário, nos casos em que prima facie é identificado um compromisso arbitral "patológico", isto é, claramente ilegal, declare a nulidade dessa cláusula, independentemente do estado em que se encontre o procedimento arbitral. 3. Competência e estrutura do Poder Judiciário I. Conceito e natureza jurídica O termo competência é conceituado como o limite da jurisdição. Isso porque dentro da competência o juiz exerce a sua jurisdição . Majoritariamente, a competência tem natureza jurídica de pressuposto processual para o desenvolvimento válido de um processo. Rodolfo Hartmann discorda, apesar de ser minoritário, sustenta que, sendo adotada uma interpretação literal, a competência não deveria ser reputada como pressuposto processual. Isso porque 32 eventual declaração de incompetência somente irá atingir os atos processuais, se o magistrado que estiver lotado em um novo juízo entender por bem revogá-los (art. 64, §4º). Não teria aqui então um pressuposto processual. Para ele, melhorseria reputar a competência como um requisito para que o mérito possa ser regularmente apreciado. II. Princípios reitores a) Princípio da perpetuatio jurisdictionis A competência de um juízo não mais se modifica por alterações de fato ou de direito relativas as partes, que venha a ocorrer após a determinação e a fixação da competência jurisdicional. São diversas as hipóteses em que este princípio é relativizado: • União intervém no feito, passando para a Justiça Federal • Conexão ou continência de processo b) Princípio da competência sobre a competência (kompetenz-kompetenz) Trata-se de um princípio que não está previsto na Constituição ou na legislação, mas todo o órgão jurisdicional o tem. Mesmo o absolutamente incompetente tem o mínimo de competência para reconhecer que é incompetente para o deslinde do feito. É conhecido como kompetenz-kompetenz. III. Critérios para identificar o órgão jurisdicional competente Como saberemos qual o órgão jurisdicional competente? Para atingir este desiderato, é necessário que haja critérios, separando-os em dois grandes grupos: • Critério da competência material • Critério da competência funcional a) Critério material Competência material é a fixada por um dos critérios: • Competência em razão da pessoa: leva em conta a pessoa. Ex.: União é na Justiça Federal. • Competência em razão da matéria: leva em conta a matéria. Ex.: família é na Vara de Família. • Competência em razão da território: leva em conta o território. Ex.: comarca que é. 33 • Competência em razão do conteúdo econômico da obrigação: leva em conta o conteúdo econômico da obrigação. Ex.: até 40 salários mínimos, será do Juizado Especial Cível, e sendo até 60 salários mínimos será do Juizado Especial Federal. Às vezes, é possível utilizar mais de um critério para fixar a competência. Ex.: competência em razão da pessoa é da Justiça Federal, mas em razão do conteúdo econômico da obrigação é do juizado especial federal. b) Critério funcional No critério funcional, será analisado a relação jurídica com base no direito processual, valendo-se de uma relação horizontal ou de uma relação vertical: • Competência com base na relação horizontal: aqui há dois órgãos de mesma hierarquia atuando e praticando determinados atos processuais em relação ao mesmo feito. Ex.: Juiz da vara cível da comarca de Goiânia expede uma carta precatória para que seja cumprida na comarca de Itumbiara. Os juízes possuem a mesma hierarquia, praticando atos processuais em relação ao mesmo feito. Ademais, terá o juiz de Itumbiara competência funcional para o cumprimento daquela carta precatória. E portanto, há uma relação jurídica, que traz uma competência funcional horizontal. • Competência com base na relação vertical: aqui há dois órgãos de instâncias diversas, atuando num mesmo processo. É o que ocorre quando um magistrado profere uma sentença e a parte interpõe recurso. Este recurso será encaminhado ao Tribunal perante o qual está vinculado aquele magistrado. Isso porque aquele Tribunal tem competência funcional vertical. IV. Jurisdição interna e jurisdição internacional Para identificar o órgão jurisdicional competente, é saber se a solução do litígio vai se dar por meio da jurisdição brasileira ou não. Existem situações em que a jurisdição brasileira é a única que pode atuar, quando por exemplo o litígio envolver bens imóveis situados no Brasil, ou para proceder inventário ou partilha de bens situados no Brasil. Outras normas vão admitir que sejam propostas demandas simultâneas, tanto na justiça brasileira quanto na justiça estrangeira. No entanto, isto não implicará litispendência. Ex.: sentença estrangeira que já tenha transitado em julgado não impede que seja ajuizado um feito sobre o assunto no Brasil. 34 Todavia, esta sentença estrangeira transitada em julgada no estrangeiro poderá ser homologada no Brasil, por meio do STJ. Ainda que haja uma ação em curso no Brasil, isto não impede que haja a homologação de sentença estrangeira pelo STJ. Quando transitar em julgado a decisão que homologou a sentença estrangeira, passará ela a produzir efeitos no Brasil, devendo o feito que estaria correndo no Brasil ser extinto, mas não por litispendência, e sim por coisa julgada. É somente neste momento que o processo que tramitava no Brasil deverá ser extinto sem resolução do mérito. O inverso também é verdadeiro. Isto é, se durante o trâmite do processo de homologação no STJ, a sentença, no Brasil, transitar em julgado, não haverá mais como fazer a homologação. São hipóteses em que se destaca o ajuizamento de ação no Brasil e no estrangeiro: • Quando o demandado for domiciliado no Brasil (agência, filial ou sucursal), a demanda poderá ser proposta no Brasil, ainda que o fato tenha ocorrido no estrangeiro. • Quando a obrigação tiver de ser cumprida no Brasil, demanda poderá ser proposta no Brasil. • Quando o fato ou ato litigioso tiver ocorrido no Brasil, demanda poderá ser proposta no Brasil. • Quando envolver o pagamento de alimentos, quando o credor tiver domicílio ou residência no Brasil, a demanda poderá ser proposta no Brasil. V. Jurisdição interna e a homologação de decisão estrangeira Com a EC 45, a competência que era do STF passou a ser do STJ para homologar sentença estrangeira. Cabe ressaltar que o STJ não analisa o mérito da sentença estrangeira. A atuação do STJ se limita a verificar a forma, competência, autenticidade, se há ofensa ou não à ordem pública, ou seja, há apenas um juízo de delibação. Nos casos de competência exclusiva, a sentença estrangeira não pode ser homologada, pelo que não produz efeito no Brasil. Pela interpretação a contrário senso, o juízo brasileiro deveria reconhecer que não poderá conhecer de mesmas demandas quanto aos imóveis situados no estrangeiro ou a inventário e partilhas situados no estrangeiro, casos que também escapariam dos limites da jurisdição nacional. Após a homologação da sentença estrangeira, o título executivo passa a ser a decisão brasileira que homologou a sentença. Esta decisão é título executivo judicial. Mas apesar disso, haverá a criação de uma nova relação jurídica processual, a qual se processa e será executada perante a Justiça Federal de 1º grau. 35 O regime anterior (CPC 1973) adotava a alcunha de homologação de sentença estrangeira. No entanto, o CPC/2015 chama de homologação de decisão estrangeira, abrangendo também acórdãos, decisões monocráticas e interlocutórias estrangeiras. Existem exceções em que não se admite a homologação de sentença estrangeira, tal como a ofensa que contraria manifestamente a ordem pública. As decisões estrangeiras decididas em processo de jurisdição voluntária também precisam ser homologadas, inclusive aquelas que tratem de estado de pessoas. Atente-se que a única ressalva do CPC é a sentença estrangeira de divórcio consensual, a qual não necessita de homologação e produz desde logo efeitos regulares no Brasil (art. 961, §5º). VI. Procedimento de homologação da decisão estrangeira O procedimento de homologação da sentença estrangeira é do Presidente do STJ, salvo se houver uma contestação ao procedimento, razão pela qual passará a ser da Corte Especial. A petição inicial deverá conter: • Certidão, ou cópia autenticada, do texto integral da decisão estrangeira que se quer homologar. • Ato proferido por autoridade competente • Partes tenham sido citadas, ou tenha ocorrido à revelia • Prova do trânsito em julgado da sentença estrangeira Havendo necessidade, poderá ser concedida alguma tutela provisória de urgência neste processo. O CPC prevê que o exame de urgência deverá ser realizado pela autoridade estrangeira, como diz o art. 962, §3º. No entanto, Rodolfo Hartmann e Samer afirmam que a autoridade estrangeira poderá verificar a urgência da medida liminar, mas isto não impediria que
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