Buscar

alegações finais SAJU III

Prévia do material em texto

EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA 1ª VARA CRIMINAL DA COMARCA SALVADOR - BA
Autos nº: 
Autor: Justiça Pública
Acusado: Mário Henrique 
 
já qualificado nos autos em epígrafe, representado neste ato por seu Advogado que abaixo subscreve, vem, com a devida vênia, perante Vossa Excelência, com fulcro no Art. 403, § 3º do CPP, apresentar 
ALEGAÇÕES FINAIS, EM FORMA DE MEMORIAIS
na forma que passa a expor, para ao final pedir:
SÍNTESE DA ACUSAÇÃO
Conforme consta na peça inaugural, está sendo imputada ao Denunciado a conduta tipificada no art. 155, caput do Código Penal.
Consta da denúncia que o acusado, munido de animus furandi, teria subtraído, para si, um carro de propriedade da Família Almeida. Referido carro estaria estacionada na Garagem dos patrões de sua genitora, pois queria fazer um passeio com sua namorada, e assim, realizou este ato.
Após esta suposta ação, quando o Acusado já retornava em direção a Residência para devolver o veículo, foi surpreendidos por agentes de polícia, momento em em ingressar na residência, perguntaram sobre a propriedade do bem.
NO MÉRITO
Da Atipicidade Formal – Furto de Uso
 Caso o Nobre Julgador não entenda pela atipicidade material do fato, por outro lado estampa-se evidente a sua atipicidade formal, pois não se adéqua ao modelo abstrato previsto no art. 155 do Código Penal.
A subtração para uso, como prefere denominar o ilustre Rogério Greco, é considerada um indiferente penal pelo fato de o art. 155 do diploma repressivo exigir, ao seu reconhecimento, que a finalidade do agente seja a de subtrair a coisa alheia móvel para si ou para outrem. Portanto, deve agir com o chamado animus furandi ou, ainda, o animus rem sibi habendi, vale dizer, o dolo de ter a coisa para si ou para outrem, a vontade de se assenhorar da coisa subtraída.
A jurisprudência orienta-se neste mesmo liame:
Furto de uso – Não é incriminado perante o Código Penal Brasileiro quem se serve arbitrariamente de automóvel alheio para um passeio, ou sem animus rem sibi habendi, não pratica o furto do veículo, mas, sim, da consumida porção de carburante e óleo, de que deixa de reabastecê-lo. (STF – HC 31892)
Furto do uso de automóvel – 1. O STF, reiteradamente, tem considerado não haver crime no uso furtivo do automóvel para passeio, seguindo-se abandono do veículo, sem apropriação ou venda, ainda que seja punível o furto da gasolina consumida. 2. O ínfimo valor do combustível, sobretudo quando o agente é menor e primário, à luz do art. 42 do CP, recomenda, na pior hipótese, a aplicação do art. 155, § 2º, do mesmo diploma, especialmente a cláusula final. (STF – HC 46177)
Neste mesmo sentido discorre o Digno Promotor de Justiça Fernando Capez, que para configuração do furto “é indispensável que a subtração seja efetuada com ânimo definitivo, sendo necessária a intenção de não devolver o bem. É que o tipo do furto exige a elementar de natureza subjetiva “para si ou para outrem”, que significa “finalidade de assenhoramento permanente”.
Não se pode olvidar de aludir que in casu, narrou o Acusado e foi esta afirmativa apoiada pelo agente policial, que o mesmo estava de posse da bicicleta, próximo da borracharia, na qual teria ido solicitar emprego, e no seu retorno, ainda nas proximidades, foi abordado pelos policiais, os quais já o apreenderam, não permitindo que este devolvesse a bicicleta no local em que encontrou.
Esclareceu o Defendente que em nenhum momento teve a intenção de subtrair para si ou para outrem a bicicleta, apenas almejou em sua ação utilizá-la de forma transitória, posteriormente devolvendo-a para o local em que a encontrou, e em seu mesmo estado.
Sobre este mote Fernando Capez assevera que “na hipótese em que o agente retira o bem da esfera de disponibilidade da vítima apenas para o seu uso transitório, passageiro, e depois o devolve no mesmo estado e local em que se encontrava, não há que se falar em realização da conduta tipificada no art. 155 do CP.” Segundo este autor, este tipo de ação na verdade consiste em “mero furto de uso, fato atípico, dada a ausência do elemento subjetivo do tipo exigido (ficar definitivamente com o bem ou entregá-lo a terceiro).”.
Para verificar a estrutura material do tipo de furto, deve estar presente o coeficiente psíquico do animus furandi, que se traduz na intenção de ter a coisa como própria. Destarte, não basta o animus habendi, isto é, a intenção de ter a coisa junto de si: é mister o animus domini. Tanto isso é exato que o legislador não construiu a figura o furto de uso – e por isso nem a doutrina, nem a jurisprudência podem compô-la – ou seja, aquele em que o agente furta não com a intenção de instaurar sobre a coisa uma relação de domínio, mas com a simples intenção de gozar momentaneamente da coisa. (TACrimSP – Ac. 279.033 – Rel. Silva Franco)
Alicerçando este entendimento, o professor Rogério Greco, afiança que para caracterização da subtração de uso são necessários dois requisitos, que o objeto seja infungível, que seja devolvida ou que essa seja a intenção do autor e que o uso por curto prazo.
No que tange a qualidade do objeto, é fácil observar que se trata de notório bem infungível, uma bicicleta. No que se refere ao requisito subjetivo, o animus do agente, este restou comprovado em seu interrogatório e tendo em vista que realmente estava voltando da borracharia quando foi abordado, ou seja, iria devolver o bem no estado e no local em que encontrou.
No que diz respeito ao período que utilizou o objeto fico claro que foi e iria ser por alguns momentos, tanto que já, no momento da apreensão, retornava ao ponto inicial, apenas não concluindo seu objeto visto que foi surpreendido pelos agentes policiais que foram acionados por um popular que viu, de longe, a ação do Defendente, todavia, não conhecia o seu verdadeiro animus.
Assim, verifica-se que a ação despendida pelo acusado encaixa-se perfeitamente ao furto de uso, visto que este se caracteriza, segundo Álvaro Mayrink da Costa, “pelo uso momentâneo da coisa subtraída e sua imediata devolução intacta ao local de onde fora retirada, operando o autor sem o ânimo de apropriar-se de coisa alheia”.
Resta clarividente que o furto de uso ou subtração de uso, caracteriza-se pela ausência de vontade do agente em se apropriar da coisa, de subtrair o bem para si ou para outrem. Se o agente, como no caso em análise, subtraiu a coisa, mas com o intuito de devolvê-la a seu legítimo proprietário ou possuidor, ausente está a vontade de se apropriar exigida pela lei penal.
O Magistrado deve analisar o contexto e a intenção do Acusado, e diante das provas contidas nos autos e sua convicção, apresentar o seu decreto, conforme elucida a jurisprudência:
Apelação criminal – Irresignação do Ministério Público com a absolvição nos moldes do art. 386, III, do Código de Processo Penal – Princípio da livre persuasão racional – Caracterizado o furto de uso – Sentença fundamentada – Recurso improvido. No ordenamento jurídico atual vige o princípio da livre persuasão racional quanto à valoração das provas, onde o juiz livremente as aprecia e, ante tal apreciação, formula seu convencimento, indicando os motivos através dos quais o formulou. O uso prolongado ou a não reposição da coisa não excluirá o furto de uso, se inexistia ânimo de apossamento definitivo, em razão do elemento subjetivo do tipo do crime de furto – que é a vontade livre e consciente de subtrair e apossar-se da coisa subtraída para si próprio ou para terceira pessoa, definitivamente. (TJES – AP. 24940021645 – Rel. Des. Ewerly Grandik Ribeiro)
Desta feita, deve o Acusado ser absolvido, uma vez que conforme noção cedida, a ausência de elemento essencial do tipo elimina do próprio crime, logo, a conduta perpetrada pelo acusado é atípica.
Cumpre observar que se o Nobre Julgador não entender pela atipicidade formal do delito, requer sejam reconhecidos os direitos infra-abalizados.
Da Atenuante da Confissão Espontânea –
 Preliminarmente, faz mister elucidar que o Acusado, de forma espontânea, confessou a pratica do delito, fazendo jus,desta feita, em caso de condenação, à atenuante da confissão espontânea. Com supedâneo na doutrina do saudoso professor Guilherme de Souza Nucci, temos que:
"Confessar, no âmbito do processo penal, é admitir contra si por quem seja suspeito ou acusado de um crime, tendo pleno discernimento, voluntária, expressa e pessoalmente, diante da autoridade competente, em ato solene e público, reduzido a termo, a prática de algum fato criminoso" (cf. Guilherme de Souza Nucci, O valor da confissão como meio de prova no processo penal, p. 76).
Importante observar que o Acusado não está obrigado a responder as perguntas feitas pelo magistrado, tendo este o direito de permanecer em silêncio. Conclui-se, pois, estar a confissão espontânea compreendida como ato íntimo do penalmente processado, refletindo assim característica do seu comportamento, e, por conseguinte, atributo próprio de sua personalidade, devendo ser devidamente valorada.
Não obstante o caráter íntimo, indiscutivelmente presente no ato da confissão, observando que nossa lex pátria não se preocupa com supramencionada situação, restringindo sua aplicação ao caráter prático-objetivo. É o que se depreende do art. 65, III, alínea d, do Código Penal, o qual preceitua que a confissão espontânea sempre atenuará a pena, possuindo caráter meramente objetivo, posto que a lei, não limitou sua aplicação com a imposição de critérios subjetivos ou fáticos.
Nesta senda, tem sido o posicionamento dos Tribunais superiores:
REINCIDÊNCIA. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. COMPENSAÇÃO. A Seção, por maioria, entendeu que devem ser compensadas a atenuante da confissão espontânea e a agravante da reincidência por serem igualmente preponderantes. Segundo se afirmou, a confissão revela traço da personalidade do agente, indicando o seu arrependimento e o desejo de emenda. Assim, nos termos do art. 67 do CP, o peso entre a confissão – que diz respeito à personalidade do agente – e a reincidência – expressamente prevista no referido artigo como circunstância preponderante – deve ser o mesmo, daí a possibilidade de compensação. (STJ - EREsp 1.154.752-RS, Rel. Min. Sebastião Reis Júnior, julgados em 23/5/2012. Informativo nº 0498 - Período: 21 de maio a 1º de junho de 2012)
RECURSO ESPECIAL. PENAL. ROUBO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA PARCIAL DO CRIME. DISSÍDIO JURISPRUDENCIAL NÃO DEMONSTRADO. CIRCUNSTÂNCIA ATENUANTE. RECONHECIMENTO OBRIGATÓRIO. 1. Cotejo analítico não demonstrado nos moldes legais e regimentais. 2. A atenuante do art. 65, inc. III, alínea d, do Código Penal tem caráter objetivo, configurando-se, tão-somente, pelo reconhecimento espontâneo do acusado, perante a autoridade, da autoria do delito, não se sujeitando a critérios subjetivos ou fáticos. 3. In casu, o Paciente confessou o crime de roubo, logo, ainda que tenha negado o emprego de violência contra a vítima, impõem-se a aplicação da atenuante. 4. Recurso parcialmente conhecido e, nessa parte, desprovido. (REsp 711026 / RS - RECURSO ESPECIAL 2004/0178328-6 – STJ – Relatora: Ministra LAURITA VAZ – data de julgamento 09/08/2005)
"HABEAS CORPUS. SISTEMA TRIFÁSICO DE APLICAÇÃO DA PENA. ALEGAÇÃO DE BIS IN IDEM IMPROCEDENTE. CONFISSÃO PARCIAL E PRIMARIEDADE DO PACIENTE. LEI Nº 9.455/97. CRIME HEDIONDO. REGIME DE CUMPRIMENTO DA PENA INTEGRALMENTE FECHADO. (...) A confissão espontânea, ainda que parcial, é circunstância que sempre atenua a pena, ex vi do artigo 65, III, d, do Código Penal, o qual não faz qualquer ressalva no tocante à maneira como o agente a pronunciou. Nesta parte, merece reforma a decisão condenatória. Precedentes. (...) Precedente. Pedido parcialmente deferido, a fim de que seja reconhecida, pelo juízo condenatório, a atenuante referente à confissão espontânea.” (HC 82337/RJ, 1ª Turma, Rel. Min. ELLEN GRACIE, DJ de 04/04/2003)
Portanto, quando da prolação da sentença penal condenatória ao Acusado, o Magistrado deverá considerar a confissão, posto que, não há como negar a aplicação de tal atenuante. Conforme entendimento jurisprudencial:
AGRAVO REGIMENTAL EM HABEAS CORPUS. FURTO QUALIFICADO. CONFISSÃO ESPONTÂNEA. RECONHECIMENTO E APLICAÇÃO. CONFISSÃO UTILIZADA NA SENTENÇA COMO ELEMENTO DE CONVICÇÃO DO MAGISTRADO. AGRAVO IMPROVIDO. 1 - Utilizada pelo Magistrado na sentença condenatória a confissão realizada pela acusada como prova da ocorrência do delito e como elemento de formação da sua convicção, é de rigor, no cálculo da fixação da pena, o reconhecimento e a aplicação da atenuante prevista no artigo 65, inciso III, alínea d, do Código Penal, pouco importando se a confissão foi parcial ou integral, ou se houve a sua retratação em juízo. Precedentes. 2 - Agravo regimental a que se nega provimento. (AgRg no HC 146240 / RS - AGRAVO REGIMENTAL NO HABEAS CORPUS 2009/0171220-0 – STJ – Relator: Ministro HAROLDO RODRIGUES – data de julgamento 03/12/2009)
DOS PEDIDOS
Diante do exporto, a defesa pugna:
a) ABSOLVIÇÃO do acusado, nos termos do art. 386, III, do CPP, não constituir o fato infração penal, uma vez que não possui tipicidade formal – furto de uso;
b) Caso ainda não seja esse o entendimento requer, subsidiariamente, o reconhecimento da confissão espontânea, e em caso de verificado não ser o réu primário, que seja compensada a atenuante da confissão espontânea com a agravante genérica da reincidência, tendo em vista o entendimento postulado no Informativo nº 498 do STJ e melhores entendimentos doutrinários;
Termos em que.
Pede deferimento.

Continue navegando