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18 1 RESGATE TEORICO DA DESOBEDIÊNCIA CIVIL 1.1 OS PRIMEIROS GRANDES TEÓRICOS DA DESOBEDIÊNCIA CIVIL 1.1.1 HENRY DAVID THOREAU: “DESOBEDIENCIA CIVIL” Seguindo-se a Thomas Jefferson, teremos a obra de Henry David Thoreau. O autor é um dos três autores considerados como clássicos da desobediência civil, juntamente com Martin Luther King e Gandhi, que serão trabalhados na sequência. Ele será o primeiro grande teorico da desobediência civil como forma de resistência.34 É No contexto de expansão territorial estadunidense e guerra contra o México entre 1846 e 1848, que terminou com a anexação das regiões onde, hoje em dia, se encontram o Texas, Novo México e California, é que Henry David Thoreau (1817- 1862) vai escrever sua obra “A desobediência Civil”.35 Henry David Thoreau, um abolicionista, percebeu que a ampliação territorial imperialista dos Estados Unidos sobre o México aumentaria a cultura escravocrata36, e contrário a esta guerra se propôs a fazer algo por meio do não pagamento de impostos ao estado de Massachusetts, que o usavam para financiar o exército. Por conta disso, foi preso, sendo a experíencia relatada em sua obra “A Desobediencia Civil”.37 O autor era um feroz crítico a democracia estudinidense, discrepando das concepções liberais de Thomas Jefferson. Concorda com a frase “O melhor governo é o que menos governa”38, mas segue dizendo que também acredita que: “O melhor governo é o que absolutamente não governa”39 e que “Na melhor das hipóteses, o governo não é mais que uma conveniência; mas a maioria deles é, em geral (e alguns o são às vezes), 34 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 48. 35OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.57-58. 36 Ibdem, p.57-58. 37 THOREAU, Henry David A Desobediência Civil, Tradução de José Geraldo Couto, 3ª reimpressão, Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2012, p.25-26. 38 Ibdem,p.7. 39 Ibdem,p.7. 19 inconvenientes.”40. Nada mais coerente do que o autor vislumbrar como ideal uma sociedade sem governo, se afastando das idéias tanto de Jefferson e Locke.41 Como parte de suas críticas, o autor analisa as progressões das formas de governo ao longo da história, partindo, primeiramente, de uma monarquia absoluta, depois a uma monarquia limitada, para finalmente um regime democratico de governo. No fim de sua análise, questiona se com o regime democratico tal como ele era conhecido em sua época, teria se chegado ao ápice das formas de governo. 42 Ligado à esse ponto, o autor demonstra a discrença que será exposta na visão de que não necessariamente o governo da maioria é o mais justo. Em verdade, argumenta que a maioria unicamente se impõe não por ser sinonimo de virtude, ou porque isso é melhor para as minorias, mas por conta de sua superioridade física.43 Thoreau, em outro ponto, também estabelecerá que as massas são despreparadas e que o aprimoramento é lento, pois a minoria não seria, em essência, mais sábia ou melhor que a maioria, ou seja, não necessariamente a minoria faria ecoar as vozes da virtude que estremeceria e mexeria as massas e faria com que elas alcançassem a sabedoria.44 Porém, não obstante isso, dirá que, o que mais vale não é muitos homens bons, mas um que seja excepcional.45 Escreve que mais valeria um homem que alcanssasse o ápice de sua virtude, pois isso influenciaria a massa como um todo, do que muitos homens bons, que, somente, seriam contra a escravidão apenas em tese.46 Nas palavras do autor: “Há milhares que se opõem em tese à escravidão e à guerra, mas que nada fazem efetivamente para pôr fim a elas”.47 Thoreau em sua obra tecerá ainda mais críticas a ação das multidões de homens, como se pode vislumbrar quando disserta sobre as eleições, com se verá a seguir. 40 THOREAU, Henry David A Desobediência Civil, Tradução de José Geraldo Couto, 3ª reimpressão, Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2012 ,p.7. 41 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.58. 42 THOREAU, Henry David, Op. Cit., p.35. 43 Ibdem,p.8-9. 44Ibdem , p.13. 45 Ibdem,p.13. 46 Ibdem,p.13. 47 Ibdem,p.13. 20 O autor utiliza-se da exposição do processo eleitoral para dizer que este seria apenas um “jogo”.48 O caráter de quem vota não entraria em destaque, por que, embora o indivíduo vote em quem ache certo,no fim das contas, não estaria preocupado com a vitória do que acha correto, ou seja, nada fariam “de concreto para que aquilo chegue a se materializar”.49 O eleitor seria“pouco engajado e preocupado com o interesse público, quando vota, atua passiva e despretensiosamente, disposto a deixar o resultado a cargo da maioria”.50 Entretanto, “Ocorre que esta maioria, assim como ele, é indiferente às causas sociais”.51 Por isso, dirá o autor, que a obrigação de votar seria sempre um ato que não fugiria do que é conveniente, ou seja, nuca iria além do que é esperado e do que ditam as convenções. Arremata dizendo que, votar pelo que acha correto não seria o mesmo que fazer algo por ele, visto que o ato de votar somente serviria pra expressar, de uma forma muito frágil, aos outros, o desejo de que o correto vença.52 Dirá que um“um homem sábio não deixará o que é correto a mercê da sorte, nem desejará que ele prevaleça mediante o poder da maioria”.53 Faltaria, segundo o autor, portanto, virtude na ação das massas.54 Dirá o autor, também, que essa virtude não seria encontrada na lei. Isso porque, a lei nunca fez com que os homens fossem mais justos e que o respeito indevido as leis poderia fazer com que os homens virassem, eles mesmos, agentes da injustiça.55 Um exemplo citado pelo autor seria “a fila de soldados, Coronel, capitão, cabo, recrutas, carregadores de explosivos e tudo o mais, marchando em ordem admiravel pelos caminhos mais tortuosos para a guerra, contra a sua vontade, pior ainda, contra sua sensatez e sua consciência”.56 48 THOREAU, Henry David A Desobediência Civil, Tradução de José Geraldo Couto, 3ª reimpressão, Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2012 ,p.14. 49 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.59. 50 Ibdem, p.59. 51 Ibdem, p.59. 52 THOREAU, Henry David, Op. Cit., p.14. 53 Ibdem, p.14. 54 Ibdem,p.14. 55 Ibdem,p.9. 56 Ibdem,p.9. 21 Não haveria neles (“exército permanente, as milícias, os carcereiros, os policiais, os membros de destacamentos etc”57) o exercício livre de seu senso moral e de seu julgamento, de modo que “a massa dos homens serve ao Estado não na qualidade de homens, mas como maquinas, com seus corpos”.58 Esses homens, portanto, teriam a função de defender o estado e manter o status quo.59 Ademais, as massas sofriam com uma atuação incisiva da imprensa, visto que a igreja havia perdido força.60 Aquela trabalhava arduamente, para controlar a vontade social. O jornal era considerado a bíblia que acompanhava os indivíduos todos os dias em seus afazeres e os editores não tinham pudor ao apelar para o que pior das pessoas e excluir o que tinham de melhor. A impressa teria a função de sustentar o governo, não se importava com os meios utilizados para atingir essa finalidade.61 Soma-se aisso também que os legisladores, políticos, advogados, ministros e funcionarios públicos, raramente tinha como norteador de suas ações, a sua consciência e, quando tinham, eram menos servidores do estado e muito mais inimigos dele, pois resistiriam ao governo a maior parte do tempo. A maioria não faria qualquer distinção moral e, nas palavras de Thoreau, poderiam tanto servir ao diabo ou servir a Deus.62 Critica a ação do governo da maioria, também, quando analisa que os mecanismos que este propicia para contornar as ações ruins “levam muito tempo, e a vida de um homem pode acabar antes de eles vingarem”63. Tal descredito com as instituições governamentais,bem como com as massas da população e a exaltação de indivíduos poucos e exepcionais, que seguiriam sua consciência e fariam o que é certo, deixarão claro que o público em potencial da desobediência não seria a maioria da população. 57 THOREAU, Henry David A Desobediência Civil, Tradução de José Geraldo Couto, 3ª reimpressão, Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2012 ,p.10. 58 Ibdem ,p.10. 59 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.60. 60 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 34. 61 Ibdem, p. 34. 62 THOREAU, Henry David, Op. Cit., p.10. 63 Ibdem,p.18. 22 Isso porque, como já exposto, primeiramente, no sistema de governo liberal, a maioria representava o próprio fundamento da autoridade. Ademais, o governo e a imprensa atuariam sobre essa massa, que, já desprovida de virtude, ficaria sem vontade própria. Além disso, soma-se, por derradeiro, a demora demasiada grande do governo da maioria em fazer mudanças legislativas. Restaria que a minoria,em caráter quase que obrigatório, desobedecesse aos comandos estatais para que suas reinvidicações fossem atendidas, visto que esperar os meios que o estado impõe para a resolução dos conflitos demoraria e muitos poderiam chegar ao fim da vida sem ter suas demandas atendidas.64 Em verdade, para solidificar esse entedimento de que Thoreau via com melhores olhos uma minoria da população dirá o autor que “uma minoria é impotente enquanto se conforma com a maioria; não chega nem a ser minoria, então; mas é irresistível quando intervém com todo seu peso”.65 Cumpre ressaltar, entretanto, que essa minoria deveria ser adjetivada como virtuosa. Seriam indivíduos poucos e exepcionais, que seguiriam sua consciência e fariam o que é certo. Embora haja claramente um marcador de postura ética e moral no pensamento de Thoreau, não foi possível vislumbrar um teoria de ação ética no livro “desobediência Civil”. Para o autor, o governo ideal seria aquele em que a voz da consciência guiasse a ação dos homens e do governo e não a voz da maioria. A obediência às leis seria avaliada pela consciência individual, independentemente da visão majoritaria. Dirá em sua obra que antes de serem súditos, os homens deveriam ser homens.66 Irá estabelecer que todos os homens reconhecem o direito a revolução que seria “o direito de recusar obediência ao governo, e de resistira a ele, quando sua tirania ou sua ineficiência são grandes e intoleráveis.”67 Nelson Nery dirá que Thoreau enxergava “a desobediência como o único comportamento aceitável para os homens, quando se deparassem com legislação e práticas 64 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 36. 65 THOREAU, Henry David A Desobediência Civil, Tradução de José Geraldo Couto, 3ª reimpressão, Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2012, p.20/21. 66 Ibdem, p.9. 67 Ibdem,p.11. 23 governamentais que não procurassem agir pelos critérios da justiça ou contrariassem os princípios morais dos indivíduos.”68 O homem deveria “manter as mãos limpas e, mesmo sem pensar no assunto, recusar apoio prático ao que é errado”.69 Dita que os autoproclamados abolicionistas deveriam retirar seu apoio a escravidão de imediato e não esperar pelo crivo da maioria, nesse âmbito chega a admitir a resistência individual como um ato de desobediência civil e diz que “qualquer homem mais direito que seus vizinhos constitui em si uma maioria de um”.70 Quando se questiona sobre se deve-se desobedecer leis injustas responde que devemos violar a lei sempre que ela obrigue o indivíduo a ser, ele mesmo, o agente da injustiça: “O que devemos fazer, de qualquer maneira, é verificar se não nos estamos prestando ao mal que condenamos.” 71 Dirá o autor que o lugar dos homens justos seria na prisão.72 Portanto, “todos os desobedientes deveriam estar preparados para a mesma sina, lancinante, porém, virtuosa, honrosa e livre.”73 O autor, inclusive, viveu pelas suas palavras e, de fato, foi preso por que passou seis anos sonegando imposto.74 Nesse sentido também, encontra-se a lição de Nelson Nery.75 Este desobediente defendia fervorosamente a via pacifica para solução dos conflitos, mas era um realista e reconhecia que apenas a via pacifica em alguns casos, não possuiria sempre reais chances de êxito e reconhecia suas fragilidades. 76 68 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 38. 69 THOREAU, Henry David A Desobediência Civil, Tradução de José Geraldo Couto, 3ª reimpressão, Penguin Classics Companhia das Letras, São Paulo, 2012, p.15. 70 Ibdem,p.19. 71 Ibdem,p.18. 72 Ibdem,p.20. 73 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.62. 74 THOREAU, Henry David, Op. Cit., p.24. 75 COSTA, Nelson Nery, Op. Cit., p. 38. 76 Ibdem, p.37. 24 1.1.2 GANDHI E A NÃO VIOLÊNCIA Seguindo-se a Henry David Thoreau, tem-se Gandhi. Mohandas Karamchand Gandhi, nascido em 1869, depois de ter se formado em Direito na Inglaterra, ingressou na Africa do Sul para advogadar a respeito de problemas de imigração. Logo em seus primeiros dias em Natal ficou surpreso com a grande discriminação que sofreu o que o fez prolongar sua estada no pais e iniciar sua luta contra as injustiças sociais naquele país injusto que retirava de seus concidadãos o direito de voto, ir e vir e havia também uma taxação diferenciada nos impostos.77 Gandhi estabeleceu um marco na prática da desobediência, notadamente a desobediência não violenta, que sempre será seu legado.78 Deixou certos escritos, notadamente seu livro “Ethical Religion” e “Todos somos irmãos: reflexões autobiográficas”, o qual teve-se acesso, que traz varias considerações sobre sua vida e filosofia e alguns de seus pensamentos sobre a desobediência civil no capítulo destinado a análise da democracia e do povo. Assim como Karl Marx em seu tempo, Gandhi também esteve a frente de jornais, assumindo a edição do Young Índia e, posteriormente, fundando o jornal semanal Harijan.79 Gandhi encampou inúmeras lutas. Na África do Sul seu movimento de maior repercussão foi contra a Lei de Registro dos Asiáticos que obrigou todos os indianos a serem registrados e terem suas impressões digitais arquivadas. Neste movimento após decidirem em conjunto pela aplicação da Satyagraha (resistência pacífica) em que indianos se oporam a medida e jogaram seus certificados em um caldeirão, em 1908.80 Gandhi é exposto como um pacifista (praticante da Ahimsa) e pregava a resistência não-violenta, e a Satyagraha, foi sua estratégia mais famosa,que consistia na 77 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.69-71. 78 Ibdem, p.75. 79GANDHI, Mahatma Todos Somos Irmãos: Reflexões Autobiográficas, Tradução de Bruno Alexander, 1ª Edição, Editora L&PM, Porto Alegre (RS), 2020, p.291-299. 80 OLIVEIRA, Bruno Pittella, Op. Cit.,p.72-73. 25 resistência pacífica, praticada por meio de protestos não violentos com o objetivo de reivindicar direitos civis e políticos.81 Após sua estada na África do Sul, retornou a seu país natal, a índia, e começou a utilizar sua segunda tática mais famosa a asahayoh, que nada mais é que a não cooperação. Sua aplicação mais célebre foi com a histórica marcha do sal em 1919, que se constituiu primeiro num boicote a compra do sal inglês, que detinha o monopólio. Também ocorreu a campanha do “Khâdi”, que consistiu em uma troca: As vestimentas caseiras feitas artesanalmente substituiram os téxteis da Inglaterra.82 Gandhi, portanto, defendia a filosofia da não-violência (Ahimsa). Esta seria uma forma coletiva83, que deveria possuir adesão e preparo dos participantes, e não- violenta, constituindo-se em um instrumento essencial de cidadania e exercício da moral.84 A resistência passiva, assim, era um método que permitia defender todo o direito que se encontrasse ameaçado.85 Gandhi, influenciado por Thoreau e Tolstoi, foi um dos grandes pensadores e executores da desobediência civil, se tornou um exemplo para todas as gerações que o sucederam e lutaram contra o arbítrio estatal, se diferenciou pelo uso da não violência e por aceitar pacificamente os resultados de suas ações, que iam desde sua reclusão até sofrer violência. O grande diferencial de Gandhi foi introduzir uma pratica consistente da ferramenta e acrescentar-lhe a característica da não violência.86 1.1.3 MATIN LUTHER KING E O MOVIMENTO NEGRO Conterrâneo de Jefferson, tem-se Luther King. Martin Luther King Jr, o mesmo era pastor na cidade de Montgomery no Alabama, onde iniciou suas atividades políticas 81 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.71-72. 82Ibdem, p.74. 83 Ibdem, p.72. 84 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p.41-42. 85 Ibdem, p. 41. 86 Ibdem, p. 42. 26 contra o racismo institucionalizado vigente nos Estados Unidos.87 Sua maior luta foi na busca dos direitos civis da população negra, tais como o direito de votar e o fim das discriminações raciais em todos os níveis.88 Uma de suas importantes participações com apoiador da luta anti-segregacionista envolveu o caso emblematico de Rosa Louise Mccauley, mais conhecida como Rosa Parks, e o boicoite ao sistema de transporte público de Montgomery.89 Os protestos foram desencadeados quando Rosa, mulher negra, não cedou seu lugar no ônibus para um homem branco, como era constume na época e contou com a mobilização do Conselho político Feminino90, bem como de outras várias lideranças negras91 e durou pouco mais de um ano trazendo graves prejuízos para a empresa de ônibus e chamou a atenção de todo o país.92 Segundo o professor Ricardo Alexino, professor da Escola de Comunicação e artes da USP, a atitude de Rosa Parks possibilitou maior organização dos movimentos sociais de combate ao segregacionismo e pelos direitos civis dos negros nos Estados Unidos e o despontamento de lideranças, como Martin Luther King.93 Martin Luther King apoiou integralmente, portanto, o protesto silencioso de Rosa Parks contra as leis segragacionistas de seu Estado. Segundo Nelson Nery Costa havia na comunidade negra estadunidense do século XX duas propostas de ação social. Uma delas conivente com a situação de discriminação, cuja proposto era uma obediência passiva. A outra, pregava a violência como saída para o impasse social e era formada pela militância revolucionária. O movimento de desobediência civil de Martin Luther King surgiu como uma opção não-violenta para a comunidade negra dos Estados Unidos para lutar contra a discriminação que lhe aflingia. Tal movimento estipulava que a legislação ainda seria seguida, mas as partes injustas seriam negadas.94 87 OLIVEIRA, Bruno Pittella Direito de Resistência, Desobediência Civil e a Construção da Democracia no Brasil Trabalho de conclusão de curso apresentado ao Departamento de Direito da Pontifícia Universidade Católica do Rio de Janeiro (PUC-Rio), Rio de Janeiro, 2013, p.76-77. 88 Ibdem,p.78. 89 FERREIRA, Ricardo Alexino. Rosa parks declarou luta pelos direitos civis dos negros nos EUA. Jornal da USP, São Paulo, 08/05/2018. Disponível em: < https://jornal.usp.br/atualidades/rosa-parks-deflagrou-luta-pelos- direitos-civis-dos-negros-nos-eua/>. Acesso em: 06 de Dezembro de 2020. 90 KLEFF, Michael. 1955: Rosa Parks se recusa a ceder lugar a um homem branco nos EUA. Deutsche Welle (DW), 01/12/2019. Disponível em: < https://www.dw.com/pt-br/1955-rosa-parks-se-recusa-a-ceder-lugar- a-um-branco-nos-eua/a-340929>. Acessado em: 06 de Dezembro de 2020. 91 FERREIRA, Ricardo Alexino. Op. Cit. 92 OLIVEIRA, Bruno Pittella, Op. Cit.,p.77. 93 FERREIRA, Ricardo Alexino. Op. Cit. 94 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p. 43. http://www.dw.com/pt-br/1955-rosa-parks-se-recusa-a-ceder-lugar- 27 As grandes características da desobediência civil seriam: uma ação de massas, não violenta e aberta, chamando a atenção da população passiva. Das táticas utilizadas vale citar os boicotes, os sit-in e a marcha, todas levadas a cabo sem a utilização de violência. Entende Luther King que se os desobedientes forem para a prisão, o significado daquele ato ficaria cristalino95, podendo dizer que há certa semelhança com Thoreau, para quem o único lugar para um homem justo seria a prisão. Além disso, esta deveria ser o último recurso para os desobedientes e exigiria uma grande preparação antes de ser posta em prática.96 Dirá em “Letter from Birmingham city jail” que os requisitos para a deflagração da desobediência deveriam ser a coleta de informações para averiguar se a injustiça ainda estaria pendente, a tentativa de negociação, o preparo dos envolvidos na desobediência e, por último, a “ação direta”. 97 Luther King afirmava em sua obra “Why we can´t wait” que a desobediência pacífica seria uma forma poderosa e justa sendo a uma arma que corta sem machucar e enobrece aquele que a usa.98 O autor entendia que a inexistência de violência nos atos desobedientes colocava o governo em xeque, pois, se proibisse manifestações pacificas, seria injusto, mas, se deixasse que ocorressem ficaria público a insatisfação do povo contra o governo. Ela colocaria em contradição o Estado.99 Martin Luther King não admitia que suas ações fossem clandestinas e ressaltava que a violência não poderia ir contra pessoas, apenas contra coisas. Ademais, o ato de desobedecer seria contra a parte perceptiva da lei injusta, mas o indivíduo deveria se sujeitar às sanções previstas, justamente pelo ato de desobediência não ir contra o ordenamento jurídico como um todo.100 O autor afirmará em “Letter from Birmingham city jail” que aquele que viola a lei injusta e, em caráter voluntário,aceita a pena imposta a ele como forma de 95 COSTA, Nelson Nery. Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p.44.96 Ibdem, p. 44 e 48. 97 KING, Martin Luther. Letter From Birminghan City Jail. In: BEDAU, Hugo Adam Civil Disobedience in Focus, London ; New York : Routledge, 2002, p.69. 98 KING, Martin Luther, Why we Can´t Wait, New York, The American Library, 1966, p.26. 99 COSTA, Nelson Nery. Op. Cit., p.45. 100 Ibdem, p. 45. 28 conscientização dos demais indivíduos da população, estaria demonstrando o mais elevado respeito pela lei.101 Nelson Nery, dissertando sobre a doutrina de Luther King expõe que tais táticas visavam mostrar que as reinvidicações da população negra eram justas e, pela ação não- violenta, tinha como um dos seus objetivos consolidar uma publicidade a seu favor. A atuação violenta do estado contra a passividade dos ativistas tinham o objetivo de sensibilizar o resto da população por meio da veiculação na imprensa.102 A minoria seria o segmento utilizador desta ferramenta de cidadania, pois havia um elemento de união na opressão que sofriam; tal unidade permitia que eles agissem como um grupo compacto e organizado e, corrolário a esses dois fatores, os indivíduos conseguiriam criar laços fortes que os forjava em uma identidade própria sempre procurando afirmar suas posições perante a maioria.103 Haveria dois tipos de leis para Luther King: As justas e as injustas. A primeira todos deviam obediência e a segunda deveriam desobedecer, visto que ela estaria em descompasso com a lei moral.104 Por derradeiro, Nelson Nery Costa, analisando o legado do autor, estabelece que Luther King e seus escritos foram importantes pois reafirmavam as minorias como setores chave para a desobediência civil, por meio de sua ação em massa105 (fato semelhante a Gandhi e Thoreau, embora este dizia que uma única pessoa também poderia ser um desobediente). A não-violência e a sujeição à lei no que diz respeito as punições teve impacto positivo para se obter uma publicidade favorável e foi reafirmada a justificativa com conteúdo moral106 (tal como seus antecessores). 101 KING, Martin Luther. Letter From Birminghan City Jail, Op. Cit., p.74. 102 COSTA, Nelson Nery Teoria e Realidade da Desobediência Civil, 2ª Edição (Revista e ampliada), Editora Forense, Rio de Janeiro, 2000, p.46. 103 Ibdem, p.46. 104 Ibdem ,p.47. 105 Ibdem,p.47. 106 Ibdem,p.47. 1 RESGATE TEORICO DA DESOBEDIÊNCIA CIVIL 1.1.1 HENRY DAVID THOREAU: “DESOBEDIENCIA CIVIL” 1.1.2 GANDHI E A NÃO VIOLÊNCIA 1.1.3 MATIN LUTHER KING E O MOVIMENTO NEGRO
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