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166 2 CAPÍTULO 4 EQUILÍBRIO DE COMPLEXAÇÃO 4.1 INTRODUÇÃO Uma reação de complexação é entendida como a “transformação” de um íon simples em um íon complexo. O íon complexo é obtido pelo compartilhamento de um par ou mais pares de elétrons de uma espécie ou mais espécies (ânions ou moléculas) com uma espécie deficiente em elétrons (um cátion), capaz de aceitar esse par (ou pares) de elétrons, através de ligações covalentes coordenadas. A espécie “doadora” de elétrons é denominada ligante e cátion “receptor” desses elétrons é denominado cátion metálico central. Assim, uma reação de complexação deve ser entendida como uma reação ácido - base, onde o cátion metálico é o ácido e o ligante é a base, já que pela teoria ácido - base de Lewis tem-se que: Teoria ácido - base de Lewis: Base: é toda espécie química capaz de doar um ou mais pares de elétrons. Ácido: é toda espécie química capaz de aceitar um ou mais pares de elétrons. Exemplo: Cu2+ + 4 NH3 [Cu(NH3)4]2+ ácido base íon complexo (cátion central) (ligante) Exemplos de base de Lewis: NH3 , H2O , CN-, S=, F-. Exemplos de ácido de Lewis: Cd2+ , Ag+ , BF3 . Observação 1: metais de transição (orbitais d parcialmente preenchidos), que formam ligações covalentes com o ligante: Co3+, Ni2+, Cd2+, Fe2+, Fe3+ ,Ag+. O Al+3, um metal que possui o p incompleto, também é um exemplo. Observação 2: Os sais metálicos quando estão em solução aquosa, seus respectivos cátions encontram-se hidratados, ou seja, com moléculas de água ligadas firmemente ao seu redor. Exemplo: Cu(H2O)4 2+; Al(H2O) 6 3+; Ag(H2O) +. Generalizando, uma reação de complexação pode ser representada por: 167 Onde: M+n + y L-m [M(L)y ]+n-m ÁCIDO BASE ÍON COMPLEXO M = cátion metálico central (ácido de Lewis) L = ligante (base de Lewis) ML = íon complexo Observação: Um ligante é um íon ou molécula que forma uma ligação covalente com um cátion através da doação de um par de elétrons. O número de ligações covalentes que um cátion tende a formar com os elétrons doadores é o seu número de coordenação ou o número de ligantes, que normalmente são 2, 4 ou 6. Exemplo: [Cu(NH3)4]2+ M = Cu2+ (ácido de Lewis) L = NH3 (base de Lewis) ML = [Cu(NH3)4]2+ No. de coordenação = 4 (4 moléculas de NH3). Um ligante com um único grupo doador de elétrons, tal como, por exemplo, a amônia, é denominada um ligante unidentado. Em titulações, complexométricos utilizam-se normalmente ligantes multidentados, com 4 ou 6 grupos doadores de elétrons na mesma molécula. Esses ligantes multidentados reagem completamente com os cátions metálicos e formam íons complexos bem estáveis com pontos de estequiométricos bem definidos. 4.2 CONSTANTE DE EQUILÍBRIO As equações que representam as reações de complexação e as respectivas constantes de equilíbrio são, normalmente, escritas no sentido de formação do íon complexo e são denominadas de: constante de formação (Kf) ou constante de estabilidade (Kest). Tal como nos cálculos referentes à dissociação de ácidos polipróticos são consideradas as constantes de equilíbrio sucessivas nas reações de formação de íons complexos. Exemplo: Ag+ + NH3 [Ag(NH3)]+ K1 = _[Ag(NH3)]+ [Ag+][NH3] [Ag(NH3)]+ + NH3 [Ag(NH3)2]+ K2 = _[Ag(NH3)2] _ [Ag(NH3)]+[NH3] 168 Onde: K1 e K2 são as constantes de formação ou estabilidade sucessivas para cada etapa da reação de complexação. Somando-se as duas reações acima, tem-se a reação global, com o conseqüente produto entre as duas constantes. Assim: Ag+ + 2NH3 [Ag(NH3)2]+ K1.K2 Onde o produto entre as constantes de formação sucessivas é denominado de constante global de formação desse íon complexo e é denominada por . Neste caso, com duas reações intermediárias, tem-se, especificamente 2. K1 = 1 K1K2 = 2 Generalizando, então, tem-se: (a) Se o metal reage com um ligante, tem-se uma reação do tipo 1:1. M + L ML K = [ML] = 1. [M][L] Onde K = 1. Dado 1 tem-se a seguinte informação: o metal formou complexo com um ligante e a constante de equilíbrio do complexo é 1. (b) Se o metal reage com dois ligantes, tem-se uma reação do tipo 1:2. Neste caso, como nos ácidos polipróticos, a representação do equilíbrio é dada em etapas: M + L ML K1 = [ML] [M][L] ML + L [M(L)2] K2 = [M(L)2] [ML][L] Somando as duas reações acima teremos: M + L ML K1 + ML + L [M(L)2] K2 M + 2 L [M(L)2] K1.K2 = [M(L)2] = 2 [M] x [L] 2 Observação: Nesta reação têm-se duas reações intermediárias compondo a reação final. 2. Significa que duas moléculas ligantes, duas reações intermediárias, (duas constantes intermediárias que se multiplicaram). 2 = K1.K2 (c ) Se o metal reage com três ligantes a reação é do tipo1:3: 169 M + L ML K1 = [ML] [M] x [L] ML + L ML2 K2 = [ML2] [ML] x [L] ML2 + L ML3 K3 = [ML3] [ML2] x [L] Reação global: M + 3 L K1.K2.K3 = [M(L] = 3 [M] x [L] 3 Observação: Nesta reação tem-se: duas reações intermediárias compondo a reação final. 3. Significa que três moléculas ligantes, três reações intermediárias, (três constantes intermediárias que se multiplicaram). 3 = K1.K2.K3 Conclusão: Se a reação for 1:4, 1:5, 1:6, tem-se 4 (4 ligantes) , 5 (5 ligantes) e 6 (6 ligantes), respectivamente. Observação: Uma constante de formação global é designada por n, onde o n significa o número total de ligante adicionado ao cátion central. Assim, para os diferentes íons complexos formados entre Zn2+ e NH3 tem-se uma relação simples entre as constantes de formação sucessivas e as constantes de formação globais. Exemplo: Zn2+ + NH3 [Zn(NH3)]2+ 1 = K1 Zn2+ + 2 NH3 [Zn(NH3)2]2+ 2 = K1.K2 Zn2+ + 3 NH3 [Zn(NH3)3]2+ 3 = K1.K2.K3 Zn2+ + 4 NH3 [Zn(NH3)4]2+ 4 = K1.K2.K3.K4 Exercício 1: Observe os complexos abaixo e determine: o n° de reações intermediárias, o n° de ligantes e o índice do : a) [Ag(NH3)2]+ R: 2, 2 e 2 (2 = K1.K2 ) b) [Cu(NH3)4]+2 R: 4, 4 e 4 (4 = K1.K2.K3.K4) c) [Co(NH3)6]+3 R: 6, 6 e 6 (6 = K1.K2.K3.K4.K5.K6) Observação 1: Considera-se que se K > 103 o equilíbrio se desloca totalmente no sentido da formação do complexo, resultando numa concentração de metal livre próximo de zero. 170 3 2 3 2 3 2 Observação 2. Complexos mais estáveis são aqueles que possuem maior valor na sua constante de formação. Exercício 2: Quantas reações intermediárias e constantes de formação sucessivas existem para os íons complexos abaixo? E constantes globais? Destaque o cátion metálico central e o ligante. (a) [Fe(CN)6]3- (b) [Fe(CN)6]4- (c) [BF4]- (d) [Zn(OH)4]2- (e) [Cr(Cl)6]3- 4.3 ESTABILIDADE DOS ÍONS COMPLEXOS Para a formação de íon complexo entre Ag+ e NH3, as constante de formação sucessivas são: K1 = 1,9 x 103 e K2 = 7,9 x 103. Escreva as possibilidades de formação dos íons complexos e diga qual deles tem maior estabilidade e porquê. Ag+ + NH3 [Ag(NH3)+] K1 = [Ag(NH3)+] = 1,9 x 103 = 1 [Ag+] x [NH3] [Ag(NH3) +] + NH3 [Ag(NH ) +] K2 = [Ag(NH ) +] = 7,9 x 103 [Ag(NH3)+] x [NH3] Reação global: Ag+ + 2 NH3 [Ag(NH ) +] K1.K2= 2= 1,5 x 107 Comparando 1 e 2: 2/1 103; pode-se observar que o segundo complexo tem constante de formação global aproximadamente 1000 vezes maior é que o primeiro, ou seja, se houver excesso de ligante, o segundo íon complexo será o mais estável. Observação 1: Quando K > 103, a reação é quase 100% deslocada no sentido de formação do íon complexo. Significa dizer que praticamente não se tem íon metálico livre. Observação 2: O índice subscrito em , significa o número de ligantes em torno do íon metálico central. 4.4 CÁLCULOS ENVOLVENDO REAÇÕES DE COMPLEXAÇÃO164 164 4.4.1 Cálculo das concentrações das espécies no equilíbrio após formação do complexo Exemplo 1: Calcule a concentração de cátion metálico, ligante e íon complexo em equilíbrio após a mistura de 1,0 L de KCN 2,4 mol/L e 1,0 litro de Cd(NO3)2 0,1 mol/L. Dado: 4(Cd/CN) = 7,1 x 1018 Cd2+ + 4CN- [Cd(CN)4]2- 4 0,1 2,4 -0,1 - 0,4 X 2,0 0,1 moles [Cd2+] = X moles/2L [CN-] = 2,0 moles/2 litros = 1,0 mol/L [Cd(CN)4]2- = 0,1 moles/2L = 0,05 mol/L 4 = [Cd(CN)4]2- = 7,1 x 1018 = 0,05 [Cd2+][CN-]4 [Cd++] . (1)4 R: [Cd2+] = 7,04 x 10-21 mol/L [CN-] = 1,0 mol/L [Cd(CN)4]2- = 0,05 mol/L Exercício 3: Calcular as concentrações de todas as espécies após misturar 1,0 L de Co(NO3)3 0,05 mol/L e 1,0 litro de NH3 1,3 mol/L. Dado: 6 (Co/NH3) = 1,6 x 1035 4.4.2 Cálculo da dissolução de um precipitado pela formação de complexo 4.4.2.1 Cálculo da solubilidade de um precipitado pela formação de um complexo Exemplo: Calcular a solubilidade do AgBr em 1,0 L de NH3 1,0 mol/L. Introduziria após ter sido atingido o equilíbrio. Dados: 2 (Ag/NH3) = 1,7 x 107 Kps (AgBr) = 5,0 x 10-13 AgBr Ag+ + Br- Kps Ag+ + 2 NH3 [Ag(NH3)2+] 2 AgBr + 2 NH3 [Ag(NH3)2+] + Br - Kps . 2 X s s -s -2s 165 165 3 2 3 2 3 equilíbrio 3 2 3 2 3 2 3 2 1 s s moles A constante de equilíbrio para a reação de dissolução do precipitado é: Kps . 2 = [Ag(NH ) +] x [Br -] [NH3]2 Sabendo-se que: [Ag(NH ) +] = [Br -] = s e que: [NH ] = 1 mol/L Tem-se: 1,7 x 107 x 5 x 10-13 = s2/12 s = 2,9 x 10-3 mol/L Logo: [NH3]adicionado = 1 mol/L + 2 s = 1 mol/L + 2 x ( 2,9 x 10-3) mol/L = 1,0058 mol/L 4.4.2.2 Cálculo da concentração das espécies em equilíbrio após a dissolução de um precipitado Exemplo: Calcular as concentrações do ligante, metal e complexo após a dissolução completa de 0,01 moles de AgCl em 1,0 litro de solução de NH3. Kps (AgCl) = 1,8 x 10-10 2(Ag/NH3) = 1,7 x 107 AgCl Ag+ + Cl- Kps Ag+ + 2 NH3 [Ag(NH ) +] 2 AgCl + 2 NH3 [Ag(NH ) +] + Cl - Kps x 2 X 0,01 0,01 (moles) Observação: Como o número de moles está em 1,0 L, tem-se diretamente a concentração molar de cada íon na solução. Kps . 2 = [Ag(NH ) +] x [Cl -] 1,8 x 10-10 x 1,7 x 107 = 0,01 x 0,01 (NH3)2 [X]2 ` [X] = [NH3]eq = 0,18 mol/L [Cl-] = [Ag(NH ) +] = 0,01 mol/L Atenção: Para o cálculo da concentração de cátion metálico livre após ter sido atingido o equilíbrio utiliza-se a reação de formação do íon complexo. Assim: Ag+ + 2 NH3 [Ag(NH3)2]+ ? 0,18 0,01 (moles) 166 166 3 2 3 2 3 2 1,7 x 107 = 0,01 [Ag+] = 1,8 x 10-8 mol/L [Ag+] (0,18)2 Atenção: Também se pode utilizar a reação de dissolução do precipitado para calcular a concentração de cátion metálico livre após ter sido atingido o equilíbrio. Assim: AgCl Ag+ + Cl- ? 0,01 1,8 x 10-10 = [Ag+] x 0,01 [Ag+] = 1,8 x 10-8 mol/L 4.4.2.3 Cálculo da concentração do ligante a ser adicionada para dissolução completa de um precipitado Exemplo: Quantos moles/L de NH3 devem ser adicionados para dissolver completamente 0,02 moles de AgCl? Calcular a concentração de ligante no equilíbrio? Dados: 2(Ag/NH3) = 1,7 x 107 Kps (AgCl)= 1,8 x 10-10 AgCl Ag+ + Cl- Kps Ag+ + 2 NH3 [Ag(NH ) +] 2 AgCl + 2 NH3 [Ag(NH ) +] + Cl - Kps x 2 X - 0,04 + 0,02 + 0,02 [NH3]eq 0,02 0,02 Kps . 2 = [Ag(NH ) +] x [Cl -] (NH3)2 1,8 x 10-10 x 1,7 x 107 = 0,02 x 0,02 = 3,06 x 1017 [NH3]2 [NH3]eq = 0,362 mol/L [NH3]adicionada = 0,362 + 0,04 = 0,402 moles/L 4.5 CURVA DE TITULAÇÃO 167 167 Para muitos íons metálicos e a maioria dos ligantes monodentados, as estabilidades relativas de vários complexos dentro de uma mesma família são tais que diferentes espécies podem coexistir na mesma solução para concentrações específicas de ligante, tornando esses ligantes monodentados inadequados para titulações complexométricas. Ou seja: (1) os complexos formados entre Zn2+ e NH3 – as constantes de formação sucessivas são similares em grandeza, que significa que a adição de amônia produz uma troca na mistura de complexos, tornando nada simples a razão estequiométrica entre amônia e Zn(II); (2) As constantes de formação sucessivas são relativamente pequenas e para garantir que todo o Zn(II) foi complexado à forma mais estável [Zn(NH3)4]2+, requer um grande excesso de NH3 livre, que somente pode ser alcançado após o ponto estequiométrico teórico. Quando a titulação complexométrica é realizada com um ligante multidentado, a dificuldade maior é evitada, pois os complexos formados têm constantes de formação relativamente grandes e os complexos formados são sempre na razão stquiométrica 1 Metal: 1 Ligante, tornando a estequiometria da titulação muito simples. Muitos ligantes multidentados empregados em volumetria de complexação se ligam (coordenam) em diversas ou todas as posições em torno do átomo central causando um impedimento estérico para que a estequiometria seja diferente de 1metal; 1 ligante. Muitos íons metálicos formam complexos estáveis, solúveis em água, com um grande número de aminas terciárias contendo grupos carboxílicos. A formação destes complexos serve como base para a titulação complexométrica. Existe u grande números de compostos desse tipo, sendo o ácido etilenodiaminotetraacético (EDTA), um dos agentes complexantes (ligantes) mais comum e mais empregado. HOOCH2C HOOCH2C N CH2CH2 CH2COOH N CH2COOH Figura 1 – A molécula de EDTA. 168 168 O EDTA é um ácido fraco e tem os respectivos pK1 = 2,00; pK2 = 2,66; pK3 = 6,16; pK4 = 10,26. H4Y + H2O H3Y- + H3O+ K1 H3Y- + H2O H2Y= + H3O+ K2 H2Y= + H2O HY3- + H3O+ K3 HY3- + H2O Y4- + H3O+ K4 Em soluções aquosas o EDTA dissocia-se produzindo quatro espécies aniônicas. Representa-se a molécula de EDTA por H4Y, onde o índice 4 refere-se aos quatro íons hidrogênio dissociáveis dos quatro grupos carboxílicos, sendo que a fração () de cada espécie de EDTA e dependente do pH. O EDTA forma complexo estável com a maioria dos cátions metálicos da Tabela Periódica (à exceção dos metais alcalinos). Na Tabela 1 são encontradas algumas constantes de formação para íons complexos entre diferentes cátions e EDTA. Tabela I – Constantes de formação (KMY) para íons complexos de EDTA. Cátion KMY Log KMY Cátion KMY Log KMY Ag+ 2,0 x 107 7,30 Cu2+ 6,3 x 1018 18,80 Mg2+ 4,9 x 108 8,69 Zn2+ 3,2 x 1016 16,50 Ca2+ 5,0 x 1010 10,70 Cd2+ 2,9 x 1016 16,46 Sr2+ 4,3 x 108 8,63 Hg2+ 6,3 x 1021 21,80 Ba2+ 5,8 x 107 7,76 Pb2+ 1,1 x 1018 18,04 Mn2+ 6,2 x 1013 13,79 Al3+ 1,3 x 1016 16,13 Fe2+ 2,1 x 1014 14,33 Fe3+ 1,0 x 1025 25,10 Co2+ 2,0 x 1016 16,31 V3+ 8,0 x 1025 25,90 Ni2+ 4,2 x 1018 18,62 Fe3+ 2,0 x 1023 23,20 Extraído de: G. Schwarzembach, Complexometric Titrations, N.Y., Interscience Publishers, Inc., 1957, p.8 (T = 20oC e força iônica 0,1) - Fonte: BACCAN, 2001. A reação entre um cátion metálico (Mn+) e Y4- com a formação do respectivo íon complexo é dada pela reação: Mn+ + Y4- MY-(4-n) E a constante de formação do íon complexo é: Kf = [MY-(4-n)] (1) [Mn+] x [Y4-] Kf = constante de formação ou de estabilidade. 169 169 Como o EDTA é usado na forma do sal dissódico, Na2H2Y.2H2O, em soluções aquosas de EDTA tem-se H2Y= e a reação com um metal, por exemplo, Ca2+, pode ser descrita pela seguinte reação: Ca2+ + H2Y= CaY2- + 2 H+ É evidente que dependendo do pH, o equilíbrio é deslocado no sentido em um ou outro sentido. Ou seja, se o pH diminui, o equilíbrio se desloca no sentido de impedir a formação do íon complexo, sendo evidente que deverá existir um valor de pH abaixo do qual não poderá ser realizada a titulação de íon cálcio com EDTA. O valor deste pH pode ser calculado e o cálculo envolve o valorda constante de estabilidade (ou de formação), bem como os valores apropriados das constantes de dissociação do EDTA. A expressão que dá a fração de EDTA na forma de Y4- pode ser obtida através da equação que relaciona a concentração total (CT) das espécies de EDTA não complexadas no equilíbrio: CT = [Y4-] + [HY3-] + [H2Y=] + H3Y-] + [H4Y] E substituindo na equação acima a concentração de cada espécie em função de sua constante de dissociação, tem-se: 4 = [Y4-] = K1K2K3K4 CT [H3O+]4 + K1[H3O+]3 + K1K2[H3O+]2 + K1K2K3[H3O+] + K1K2K3K4 Ou [Y4-] = 4 CT onde 4 é a fração de EDTA na forma de Y4-. Substituindo o valor de 4CT na expressão da constante de estabilidade (1), tem-se: Kf = [MY-(4-n)] (2) [Mn+] x 4CT Que rearranjada pode ser escrita assim: K’f = Kf 4 = [MY-(4-n)] (3) [Mn+] x CT Onde K’f é chamada de constante de estabilidade condicional, pois varia com o pH, pois está na dependência de 4 que varia com o pH. A vantagem de se trabalhar com K’f em vez de 170 170 Kf, está no fato de K’f mostra a tendência real para ocorrer a formação do quelato metálico em um determinado valor de pH. Os valores de K’f são facilmente obtidos de Kf e 4. Tabela II - Valores de 4 para o EDTA. pH 4 Log 4 2,0 3,7 x 10-14 13,44 2,5 1,4 x 10-12 11,86 3,0 2,5 x 10-11 10,60 4,0 3,3 x 10-9 8,48 5,0 3,5 x 10-7 6,45 6,0 2,2 x 10-5 4,66 7,0 4,8 x 10-4 3,33 8,0 5,1 x 10-3 2,29 9,9 5,1 x 10-2 1,29 10,0 0,35 0,46 11,0 0,85 0,07 12,0 0,98 0,00 FONTE: BACCAN, 2001. Nota-se que à medida que o pH diminui o 4, e conseqüentemente o valor de K’f diminui. Como 4 é a fração de EDTA na forma Y4-, em pH acima de 12, onde o EDTA está completamente dissociado, o valor de 4 se aproxima de 1,0. E daí K’f se aproxima de Kf. 4.5.1 Construção da curva de titulação Dada a titulação de 50,00 mL de uma solução de Ca2+ 0,01 mol/L com EDTA 0,01 mol/L. A solução de Ca2+ é inicialmente mantida em pH >11,0 pela adição de KOH 5 %(m/v). Pede-se calcular os valores de pCa nos vários estágios da titulação e traçar a curva de titulação teórica pCa versus volume de EDTA. Levando-se em conta que em pH > 11,0, O EDTA estará quase que totalmente na forma Y4-, pode-se simplificar a reação, utilizando a constante de formação condicional. a) Cálculo da constante de estabilidade condicional: K’f CaY = Kf CaY x 4 = 5,0 x 1010 x 0,85 = 4,25 x 1010 Observação: isto quer dizer que [Y4-] CT. Assim, a reação pode ser escrita assim: Ca2+ + Y4- CaY2- 171 171 E a constante de formação condicional pode ser escrita assim: K’f = [CaY2-] (4) [Ca2+] x [Y4-] b) Início da titulação: [Ca2+] = 0,01 mol/L pCa = 2,00 c) Antes do ponto estequiométrico (0< Volume de EDTA < 50,00 mL): Antes do ponto estequiométrico, a [Ca2+] é igual à [Ca2+] que não reagiu com o ligante. Exemplo: 20,00 mL de EDTA 0,01 mol/L. Ca2+ + Y4- CaY2- 0,5 0,2 -0,2 -0,2 +0,2 0,3 0 0,2 [Ca2+] = 0,3 mmol/70 mL = 4,29 x 10-3 mol/L pCa = 2,37 Observação: Através de cálculos análogos, pode-se obter os valores de pCa para qualquer ponto da curva antes do ponto estequiométrico. d) No ponto estequiométrico (V = 50,0 mL EDTA): Neste ponto, e além dele, pCa é determinado a partir da dissociação do quelato no pH determinado previamente, utilizando o valor da constante de estabilidade condicional em um pH pré-determinado. Ca2+ + Y4- CaY2- 0,5 0,5 -0,5 -0,5 +0,5 0 0 0,5 Neste ponto a [Ca2+] livre surgirá da dissociação do íon complexo. Neste ponto tem-se: 172 172 [CaY2-] = 0,5 mmol/(50+50) mL = 0,005 mol/L. [Ca2+] = [Y4-] Então, utilizando a equação (3) ou (4), tem-se: K’f = [CaY2-] [Ca2+] x CT Ou K’f = [CaY2-] [Ca2+] x [Y4-] 4,25 x 1010 = 0,005 [Ca2+]2 [Ca2+] = 3,43 x 10-7 mol/L pCa = 6,47 e) Após o ponto estequiométrico (V > 50,00 mL). Exemplo: 60,00 mL de EDTA 0,01 mol/L. Tem-se excesso de EDTA, e calcula-se [Ca2+] e pCa em função da dissociação do íon complexo. Assim: Ca2+ + Y4- CaY2- 0,5 0,6 -0,5 -0,5 +0,5 0 0,1 0,5 [CaY2-] = 0,5 mmol/(50+60) mL = 0,00455 mol/L. [Y4-] = 0,1 mmol/(50+60) mL = 0,000909 mol/L. Então: 4,25 x 1010 = 0,00455 [Ca2+] x 0,000909 [Ca2+] = 1,18 x 10-10 mol/L pCa = 9,93 173 173 Exercício: Calcular o pH para as diferentes adições de EDTA 0,01 mol/L para a titulação de 50,00 mL Ca2+ 0,01 mol/L, completando a Tabela III. Tabela III – Variação de pCa durante a titulação de 50,0 mL de Ca2+ 0,01 mol/L com EDTA 0,01 mol/L. VEDTA (mL) pCa VEDTA (mL) pCa 0,00 2,00 50,00 6,47 5,00 2,09 50,10 10,00 2,17 51,00 20,00 2,37 55,00 25,00 60,00 9,93 30,00 70,00 40,00 80,00 45,00 90,00 49,90 100,00 Com os dados da Tabela III pode ser construído um gráfico, pode-se construir a curva de titulação. Fazer volume (mL) EDTA versus pCa. A partir da curva de titulação de Ca2+ em pH>11, como seria a curva de titulação em pH menor? R: Iria ser observar uma inflexão menor em valores de pH menor, pois a constante de formação condicional é menor em soluções com alta concentração de H+. 4.6 Indicadores Metalocrômicos 174 174 Os indicadores metalocrômicos são compostos orgânicos coloridos que formam quelatos com os íons metálicos. O quelato tem uma cor diferente daquela do indicador livre. Para se conseguir uma boa detecção do ponto final da titulação deve-se evitar a adição de grandes quantidades do indicador. No processo, o indicador libera o íon metálico, que será complexado pelo EDTA em um pM (- Log Metal) mais próximo possível do ponto estequiométrico. O comportamento de tais indicadores é um tanto complicado pelo fato de que a sua cor depende do pH da solução. Eles podem reagir com íons H+, assim como o fazem com um cátion, apresentando um comportamento análogo ao de um indicador ácido- base. Em titulações diretas de Ca2+ com EDTA pode se utilizar a murexida, que em meio alcalino (pH>11) é violeta. Como a murexida se combina com Ca2+ para formar um íon complexo estável, 1:1, de cor vermelho cereja, ela é utilizada como indicador. Antes do ponto estequiométrico, a solução contendo Ca2+ então fica vermelho-cereja devido ao complexo cálcio-murexida. De repente, após a adição da primeira gota em excesso de EDTA, a cor da solução torna-se violeta, devido à formação do complexo cálcio-EDTA, liberando o indicador na forma livre. Observação: Na titulação direta envolvendo EDTA e indicadores metolocrômicos a única restrição é que o complexo formado entre Metal-EDTA tem que ser mais estável que o complexo formado entre Metal-Indicador, para que no ponto final da titulação o indicador seja liberado na sua forma livre, assinalando o ponto final da titulação. Que tal verificar se o ponto final experimental de Ca2+ com EDTA em pH>11 coincide com o ponto estequiométrico teórico? 175 175 Erro do Indicador Para a formação do complexo cálcio-murexida pode-se escrever a reação: Ca2+ + H2Ind3- CaH2Ind- Kf = 1 x 107 E sabendo-se constante de dissociação da murexida: H3Ind2- + H2O H2Ind3- + H3O+ Ka = 1,26 x 10-11 A combinação (soma) do equilíbrio de complexação com a expressão da constante de dissociação da murexida dá a reação: Ca2+ + H3Ind2- + H2O CaH2Ind- + H3O+ Kf x Ka = 1,26 x 10-4 Que tem a seguinte constante de equilíbrio: [CaInd-] x [H3O+] = 1,26 x 10-4 [Ca2+] x [H3Ind2-] Para a titulação de Ca2+ com EDTA o pH da solução foi maior que 11. Considerando pH 11, [H3O+] = 10-11 mol/L. Substituindo a [H3O+] na equação acima tem-se a [Ca2+]: [Ca2+] = [CaInd-] x 10-11 = 7,9 x 10-8 [CaInd-] 1,26 x 10-4 x [HInd2-] [HInd2-] Como em titulação ácido-base, para ser observado o ponto final da titulação, a concentração do indicador na forma livre, violeta, tem que ser dez(10)vezes maior que a concentração da cor do indicador complexado com cálcio, vermelho cereja. Quando tal ponto é alcançado, o observador reconhecerá que a cor mudou de vermelho-cereja para violeta. Assim, o ponto final da titulação será observado quando a razão de concentração CaInd-/HInd2- for 1/10. Substituindo esta razão tem-se: [Ca2+] = 7,9 x 10-8/10 = 7,9 x 10-9 mol/L pCa = 7,10 Este valor de pCa está de acordo como ponto estequiométrico teórico (pCa = 6,47)? Responder. Nesta titulação, a murexida muda de cor depois do PEQ. Assim: Ca2+ + Y4- CaY2- 176 176 0,5 0,01V - 0,5 -0,5 +0,5 0 0,5 – 0,01V 0,5 Então: [Ca2+] = 7,9 x 10-8 = 0,5/[(0,5 – 0,01V)4,25 x 1010] V = 50,0 mL % erro = (50 – 50) X100/50 = 0 % ERRO. Exercício: (a) Calcular o erro provocado na titulação de 50,00 mL de Mg2+ 0,01 mol/L com EDTA 0,01 mol/L quando se utiliza o erioT como indicador e tampão de amônia/cloreto de amônio de pH 10,0, que corresponde a [H+] = 1,0 x 10-10 mol/L. (b) Destacar o pMg do ponto estequiométrico e comparar com pMg quando o ponto final experimental é observado. Dados: KMgY2-= 4,9E8 KMg-ErioT = 1,0E7 EDTA: K1 = 1,0E-2; K2 = 2,2E-3; K3 = 6,9E-7; K4 = 5,5E-11 ErioT: KHInd- = 2,51E-12 177 177 EXERCÍCIO - Complexos 1) Calcular a concentração de todas os íons presentes após a mistura de 1,0 L de NH3 2,0M com 1,0L de AgNO3 0,01M. DADO: 2 (Ag/NH3) = 1,7 E7. 2) Em um recipiente de 2,5 L foram adicionados 4,69 g de Cu(NO3)2, 5,5 moles de tartarato de sódio (Na2Tar) e água para completar o volume do recipiente. Calcular a concentração das espécies presentes. DADO:2 (Ag/Tar) = 1,3 E5. 3) Calcular o número de moles por litro de um ligante L que deve ser adicionado a uma solução de cátion metálico Me(II) 0,02 M para se obter uma solução no equilíbrio [L] = 0,001 M. Calcular também a concentração de cada espécie presente. DADO: 4 (Me2+/L) = 1,2 E15. 4) Que massa de EDTA deve ser adicionada para dissolver, por L, 0,05 moles de CaC2O4? DADO: K1= 1 (Ca2+/Y4-) = 5,0 E10 Kps (CaC2O4) = 1,3 E-9 M.M. (g/mol) EDTA = 292 5) Quantos moles de NH3 devem ser adicionados em um recipiente de 1,0 L para dissolver 0,01 moles de AgBr? DADO: 2 (Ag+/ NH3) = 1,7 E7. Kps (AgBr) = 5,0 E-13 6) Calcular a solubilidade de AgBr em uma solução 1,0 M de NH3 e a concentração de todas as espécies presentes. 2 (Ag+/ NH3) = 1,7 E7. Kps (AgBr) = 15,0 E-13 7) Calcular a solubilidade do Al(OH)3 em uma solução que contém KF 13,5 M. Calcular as concentrações de todas as espécies presentes. 6 = 6,9E19 Kps (Al(OH)3) = 1,0E-32 RESPOSTA: 1) [Ag+] = 3,0E-10 M; [NH3] = 0,99M; [Ag(NH3)2+] = 0,005M; [NO3-] = 0,005 M 2) [Cu2+] = 1,62E-8 M; [Tar=] = 2,18M; [Cu(Tar)2=] = 0,01M; [Na+] = 4,4 M; [NO3-] = 0,005 M 3) [Me2+] = 1,66E-5 M; [L]ad = 0,081M; [MeL42+] = 0,02M 4) 14,6 g 5) 3,45 moles 6) s = 2,9E-3 M; [NH3] = 1,0M; [Ag(NH3)2+] = 2,9E-3M; [Ag+] = 1,7E-10 M; [Br] =2,9E-3 M 7) s = [AlF63-] = 0,0198M; [HO-] = 0,0594M; [F-] = 13,5 M; [Al3+] = 4,7E-29
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