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Problema 8 1- Definir os critérios de sepse os critérios diagnósticos 2- Diferenciar sepse, SIRS e choque séptico 3- Discutir fisiopatologia da sepse e SIRS 4- Discutir a abordagem terapêutica inicial e metas de controle da resposta ao tratamento da sepse 5- Explicar a interpretação da gasometria Problema 9 1- Definir choque séptico, sepse e os critérios diagnósticos 2- Discutir o manejo e tratamento do choque séptico 3- Discutir a fisiopatologia do choque séptico (nível celular, NO, endotélio) 4- Discutir as medidas de monitorização do choque séptico 5- Discutir a SARA como complicação (comprometimento pulmonar ou hiper- hidratação), sinais clínicos 6- Explicar a farmacologia das drogas vasoativas (noradrenalina, vasopressina, epinefrina, dopamina) 7- Discutir a importância dos protocolos institucionais no manejo da sepse Referências: - ILAS. IMPLEMENTAÇÃO DE PROTOCOLO GERENCIADO DE SEPSE PROTOCOLO CLÍNICO. Atendimento ao paciente adulto com sepse / choque séptico. Revisado em: agosto de 2018 - Sepse: atualidades e perspectivas. Rev Bras Ter Intensiva. 2011; 23(2):207-216 - ILAS. Sepse: um problema de saúde pública. Brasília: CFM, 2015. - Drogas vasoativas - Uso racional. Rev SOCERJ Vol XIV NO 2 Abr / Mai / Jun 2001 - Condutas no paciente grave. Knobel Sepse e choque séptico De acordo com as novas definições do Sepsis 3, são usados os termos: infecção, sepse e choque séptico. A síndrome de resposta inflamatória sistêmica (SRIS), embora não utilizada para a definição de sepse, continua sendo importante para a triagem de pacientes com suspeita de sepse. Da mesma forma que a SSC (Surviving Sepsis Campaign), o ILAS não mudou os critérios usados para definir disfunção orgânica, mantendo a hiperlactatemia como um deles. O critério para definição de choque séptico também não foi alterado. Definições ● Síndrome da resposta inflamatória sistêmica (SIRS): Caracterizada por ser uma resposta inespecífica do organismo a uma variedade de situações que geram inflamação - infecção, queimaduras, pancreatite aguda, trauma, e outras. É definida pela presença de no mínimo dois dos sinais abaixo: ○ Temperatura central >38,3º C ou <36º C OU equivalente em termos de temperatura axilar; ○ Frequência cardíaca >90 bpm; ○ Frequência respiratória > 20 irpm, ou PaCO2 < 32mmHg; ○ Leucócitos totais > 12.00/mm³, ou <4.000/mm³ ou presença de > 10% de formas jovens (desvio à esquerda). ● Infecção sem disfunção: paciente com infecção sem disfunção aquele que, tendo ou não os critérios de SRIS, possui foco infeccioso suspeito ou confirmado (bacteriano, viral, fúngico, etc.) sem apresentar disfunção orgânica. ● Sepse: presença de disfunção ameaçadora à vida em decorrência da presença de resposta desregulada à infecção. Entretanto, não adotamos os critérios clínicos para definição de disfunção orgânica do Sepse 3, variação do escore SOFA, por entender que os mesmos não são aplicáveis em iniciativas de melhoria de qualidade. Manteve-se os critérios utilizados anteriormente, inclusive a hiperlactatemia, por entendermos que a mortalidade em países em desenvolvimento ainda é muito elevada e a identificação precoce destes pacientes é parte fundamental do objetivo deste protocolo. As principais disfunções orgânicas são: ○ Hipotensão (PAS< 90 mmHg ou PAM< 65 mmHg ou queda de PA > 40mmHg); ○ Oligúria (≤ 0,5ml/Kg/h) ou elevação da creatinina (>2 mm/dL); ○ Relação PaO2/ FiO2 < 300 ou necessidade de O2 para manter SpO2> 90%; ○ Contagem de plaquetas < 100.000/mm³ ou redução de 50% no nº de plaquetas em relação ao maior valor registrado nos últimos 3 dias; ○ Lactato acima do valor de referência; ○ Rebaixamento do nível de consciência, agitação, delirium; ○ Aumento significativo de bilirrubinas (> 2X o valor de referência). ● Choque séptico: Segundo a SSC, choque séptico é definido pela presença de hipotensão não responsiva à utilização de fluídos, independente dos valores de lactato. A SSC não adotou o novo conceito de choque, que exige a presença concomitante de lactato acima do valor de referência mesmo após reposição volêmica inicial. Fisiopatologia A partir de uma fonte de infecção, a bactéria invade a corrente sanguínea, levando ao extravasamento vascular, disfunção de múltiplos órgãos e morte. Infecções comuns entre adultos que podem levar a sepse: • Pulmonar – 35% • Trato urinário – 25% • Intestinal – 11% • Pele – 11% O desencadeamento de resposta do hospedeiro à presença de um agente agressor infeccioso constitui um mecanismo básico de defesa. Dentro do contexto dessa resposta, ocorrem fenômenos inflamatórios, que incluem ativação de citocinas, produção de óxido nítrico, radicais livres de oxigênio e expressão de moléculas de adesão no endotélio. Há também alterações importantes dos processos de coagulação e fibrinólise. Deve-se entender que todas essas ações têm o intuito fisiológico de combater a agressão infecciosa e restringir o agente ao local onde ele se encontra. Ao mesmo tempo, o organismo contra regula essa resposta com desencadeamento de resposta anti-inflamatória. O equilíbrio entre essas duas respostas é fundamental para que o paciente se recupere. O desequilíbrio entre essas duas forças, inflamatória e anti-inflamatória, é o responsável pela geração de fenômenos que culminam em disfunções orgânicas. Basicamente, temos alterações celulares e circulatórias, tanto na circulação sistêmica como na microcirculação. Entre as alterações circulatórias, os pontos mais marcantes são a vasodilatação e o aumento de permeabilidade capilar, ambos contribuindo para a hipovolêmica relativa e hipotensão. Do ponto de vista da microcirculação, temos heterogeneidade de fluxo com redução de densidade capilar, trombose na microcirculação e alterações reológicas das células sanguíneas. Todos esses fenômenos contribuem para a redução da oferta tecidual de oxigênio e, por consequência, para o desequilíbrio entre oferta e consumo de oxigênio, com aumento de metabolismo anaeróbio e hiperlactatemia. Além disso, fazem parte dos mecanismos geradores de disfunção os fenômenos celulares de apoptose e hipoxemia citopática, quando há dificuldade na utilização de oxigênio pelas mitocôndrias. → Aspectos fisiopatológicos: imunidade, inflamação e coagulação A patogênese da sepse envolve um complexo processo de ativação celular que resulta na liberação de mediadores pró inflamatórios, como as citocinas; o recrutamento de neutrófilos e de monócitos; o envolvimento de reflexos neuroendócrinos; e a ativação dos sistemas complemento, de coagulação e fibrinolítico. Interação patógeno/ hospedeiro: a resposta imune inata: A iniciação da resposta começa com a ativação do sistema imunológico inato através dos receptores de reconhecimento de padrões (p.ex., receptores Toll-like [TLRs]) que interagem com moléculas específicas presentes nos microorganismos. Após esta fase de reconhecimento, sucedem-se vários eventos de ativação celular e produção de citocinas, cujo resultado é a SIRS. Inflamação e mediação imunológica: A ligação dos TLRs a epitopos em micro-organismosestimula a transcrição e a liberação de vários mediadores proinflamatórios ( (IL-1), 2 (IL-2), 6 (IL-6), 8 (IL-8), 12 (IL-12), TNF-a (fator de necrose tumoral alfa) e TNF-b (fator de necrose tumoral beta), evento considerado crucial no desenvolvimento de sepse) e anti-inflamatórios (4 (IL-4), 5 (IL-5), 10 (IL-10), 11 (IL-11) e 13 (IL-13), são igualmente produzidas). Dois desses mediadores, o TNF-a e a interleucina-1, estão envolvidos na adesão de leucócitos, inflamação local, ativação de neutrófilos, supressão da eritropoese, geração de febre, taquicardia, acidose lática, anormalidades de ventilação-perfusão e em outros sinais de sepse. Embora neutrófilos ativados matem micro-organismos, eles também agridem o endotélio através da liberação de mediadores que aumentam a permeabilidade vascular. Além disso, as células endoteliais ativadas liberam óxido nítrico, um potente vasodilatador que atua como um mediador crucial do choque séptico. A regulação deste equilíbrio pró/ antiinflamatório é complexa, cabendo destaque à atuação dos monócitos/macrófagos como ativadores da resposta imune adaptativa; ao fagocitarem células necróticas ou bactérias, os macrófagos induzem os linfócitos a assumir um fenótipo Th1, o que leva à liberação de substâncias pró-inflamatórias, como interferon alfa (INF-a), interferon delta (INF-δ) e IL-2; se fagocitam células apoptóticas, ativam o fenótipo linfocitário Th2, que leva à produção de IL-4 e IL-10, as quais reduzem a resposta pró-inflamatória. Ademais, tem sido demonstrado que disfunções na atuação dos neutrófilos – especialmente a migração destas células, relacionada à redução da expressão de moléculas de adesão e do receptor de quimiocinas CXCR2 por estas células, consequente à intensa liberação de mediadores pró-inflamatórios – é um dos fatores responsáveis pela instalação de quadros de maior gravidade. Com base nestas considerações, propõe-se que o balanço entre mediadores pró/antiinflamatórios – podendo-se chegar a uma situação de intensa “dissonância imunológica”, denominada MARS, na qual ocorrem SIRS e CARS (síndrome da resposta antinflamatória compensatória) no mesmo paciente – é a chave explicativa para a evolução dos quadros de sepse. Nesta complexa teia fisiopatogênica, o TNF-a tem um papel relevante, ao estimular os leucócitos e as células endoteliais a liberarem outras citocinas (bem como mais TNF-a), a expressar moléculas de adesão na superfície celular e a aumentar o turnover de ácido aracdônico. Além disso, a interação entre TNF-a e IL-1 - por estimulação recíproca -, propicia o desenvolvimento de um estado pró-coagulante através da inibição da trombomodulina, além de promover uma série de alterações hemodinâmicas encontradas na sepse, tais como aumento da permeabilidade vascular, diminuição da resistência vascular periférica e inotropismo negativo. Distúrbios vasculares podem ser também produzidos diretamente pelas endotoxinas - através da ativação da cascata do complemento, usualmente pela via alternativa -, resultando na liberação de C3a e C5a , os quais induzem vasodilatação, aumento da permeabilidade vascular, potencialização da agregação plaquetária e ativação/agregação de neutrófilos, eventos que concorrem para a instalação das alterações microvasculares do choque séptico. As endotoxinas também levam à liberação de calicreína, cininogênio e bradicinina (pela ativação do fator XII - fator de Hageman), sendo esta última um potente agente vasodilatador e hipotensor. Vale ressaltar que a ativação do fator XII pode acionar a via intrínseca da coagulação, resultando em coagulação intravascular disseminada (CID). Pode ser destacado, igualmente, o papel do óxido nítrico - no âmbito das alterações vasculares -, identificando-se maior síntese desta substância nos enfermos com sepse, com consequente vasodilatação, a qual pode ser antagonizada pelo uso de inibidores da enzima óxido nítrico sintetase. Sistema de coagulação: Um outro importante aspecto da sepse é uma alteração do equilíbrio entre procoagulação e anticoagulação, com um aumento nos fatores procoagulantes e uma diminuição nos fatores anticoagulantes. O lipopolissacarídeo na superfície de microorganismos estimula as células endoteliais que revestem vasos sanguíneos a aumentar sua produção de fator tecidual, ativando assim a coagulação. O fibrinogênio é, em seguida, convertido em fibrina, levando à formação de trombos microvasculares que amplificam mais ainda a injúria tecidual. Além disso, a sepse abaixa os níveis de proteína C, proteína S, antitrombina III e inibidor da via do fator tecidual, substâncias que modulam e inibem a coagulação. O lipopolissacarídeo e o TNF-a também diminuem a síntese de trombomodulina e do receptor endotelial de proteína C, prejudicando a ativação da proteína e, e aumentam a síntese do inibidor 1 do ativador do plasminogênio, prejudicando a fibrinólise. Tal cenário pode culminar na instalação da CID - caracterizada por (1) ativação intravascular da coagulação, (2) formação e deposição de fibrina na microvasculatura, (3) consumo de plaquetas e (4) alterações na fibrinólise - é classicamente encontrada nessas situações, sendo importante preditora do êxito letal. A conseqüência é a obstrução do fluxo vascular para órgãos e tecidos, com contribuição para a instalação de má perfusão tissular (já esperada pela hipotensão arterial crítica) e falência de órgãos e sistemas. Além disso, o consumo de fibrina e de plaquetas (devido à ativação intravascular da coagulação) pode desencadear hemorragias graves, complicando ainda mais este panorama. → Deslances fisiopatológicos A progressão da sepse pode levar a disfunções em muitos órgãos e sistemas. O mecanismo provável resulta da lesão endotelial disseminada, com extravasamento de fluidos e, em consequência, edema intersticial e hipovolemia, além dos já descritos distúrbios da coagulação (com formação de microtrombos, que diminuem o aporte de oxigênio e nutrientes para os tecidos atingidos). Ademais, há na sepse um incremento na liberação de hormônios contra-insulínicos (glucagon, corticosteróides, catecolaminas e hormônio do crescimento), resultando em hipermetabolismo, com aumento da glicogenólise e da gliconeogênese hepática, aumento da lipólise e do catabolismo protéico muscular, intestinal e do tecido conjuntivo. Todos esses mecanismos, em conjunto, levam à hipóxia tissular, acidose láctica - a hiperlactatemia associa-se com gravidade da doença - e a morte celular. Quadro Clínico No caso de sepse, a esse quadro somam-se os sinais de disfunção orgânica, com manifestações clínicas decorrentes dos órgãos em disfunção (Quadro 3). O choque séptico é o de mais pronto diagnóstico, pois a hipotensão é facilmente perceptível. Entretanto, o diagnóstico nessa fase pode ser considerado tardio. Todos os esforços devem ser feitos no sentido de diagnosticar a sepse em seus estágios iniciais, quando a intervenção tem maiores possibilidades de evitar o óbito. • Febre, calafrios; • Dor ou desconforto abdominal intensos; • Pele friae sudorese • Confusão ou desorientação • Dispnéia- taquipneia advém do aumento da produção de CO2, do estímulo direto do centro respiratório por citocinas ou, quando há insuficiência respiratória, surge em consequência da hipoxemia. • Taquicardia- é geralmente reflexa à redução da resistência vascular, objetivando garantir o débito cardíaco. **Se for gram negativo o paciente pode ter leucopenia. O qSOFA score (Quick Sequential Organ Failure Assessment Score) é uma ferramenta para se usar à beira do leito para identificar pacientes com suspeita/documentação de infecção que estão sob maior risco de desfechos adversos. Os critérios utilizados são: **qSOFA pode ser usados para diagnóstico! Mas não só ele. • PA sistólica < 100mmHg - 1 ponto • Frequência Respiratória > 22iRPM - 1 ponto • Alteração do estado mental (GLASGOW < 15) – 1 ponto Um escore maior ou igual a 2 indica um maior risco de mortalidade ou permanência prolongada em UTI. Disfunção de órgãos A redução da oferta de oxigênio e as alterações celulares levam à disfunção orgânica. As principais disfunções são cardiovascular, respiratória, neurológica, renal, hematológica, intestinal e endócrina. ● Disfunção cardiovascular ○ É a manifestação mais grave do quadro séptico. A hipotensão é secundária a vasodilatação (redução da resistência vascular sistêmica) e diminuição nas pressões de enchimento das câmaras cardíacas. Esse estado de hipovolemia pode ser agravado pelas perdas secundárias ao extravasamento capilar característico dos quadros sépticos. Contribuem para a hipovolemia o aumento das perdas insensíveis em decorrência da febre ou taquipneia e a redução da ingestão de líquidos. O débito cardíaco pode estar aumentado na sepse, em valores absolutos, principalmente após reposição volêmica. Entretanto, apesar de normal, esse débito pode não estar adequado ao aumento da demanda metabólica induzida pela sepse. Além disso, pode ocorrer redução de débito mesmo em termos absolutos, quadro conhecido como depressão miocárdia. Ela é induzida por mediadores inflamatórios e se caracteriza por redução da contratilidade e diminuição da fração de ejeção. Pode ocorrer elevação discreta de troponina e alterações eletrocardiográficas que simulam doença coronariana isquêmica, além de arritmias. ○ Em decorrência de todos esses fatores, há comprometimento da perfusão tecidual e redução da oferta tecidual de oxigênio. A redução do enchimento capilar, cianose de extremidades e livedo são marcadores de hipoperfusão. Os tecidos passam a produzir energia de forma anaeróbica e os níveis de lactato se elevam. Hiperlactatemia é um claro sinal de gravidade na sepse e é utilizada como um dos critérios de disfunção orgânica. Além disso, níveis acima de duas vezes o valor normal constituem sinal de alerta e requerem imediata atenção no sentido de otimização hemodinâmica como será posteriormente abordado na sessão de tratamento. ● Disfunção respiratória ○ Taquipneia, dispneia e comprometimento das trocas gasosas com hipoxemia caracterizam a lesão pulmonar na sepse. Ocorre redução na complacência pulmonar, pela presença de colapso alveolar secundário ao aumento da permeabilidade vascular e diminuição de surfactante. Consequentemente, estes pacientes apresentam oxigenação inadequada, com redução na relação PaO2 /FiO2 . Podemos definir disfunção pulmonar de causa inflamatória quando esta relação encontra-se abaixo que 300, na ausência de comprometimento primariamente cardíaco. Os novos conceitos denominam síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) leve quando essa relação está entre 200 e 300, moderada quando entre 100 e 200 e grave quando abaixo de 100. Tais alterações acompanham-se à radiografia de tórax, de opacificações compatíveis com infiltrado intersticial bilateral. ● Disfunção neurológica ○ A sepse pode cursar com graus variáveis de alteração do nível de consciência, da confusão ao estupor ou coma. Delirium é bastante frequente, principalmente em pacientes idosos. A polineuropatia e as miopatias são frequentes, embora não surjam nas fases mais agudas, exigem atenção. A resposta inflamatória parece ser o principal fator responsável pela degeneração axonal difusa motora e sensitiva característica da sepse. Ela se expressa por hiporeflexia, fraqueza e atrofia muscular, dificultando o desmame, prolongando o tempo de ventilação mecânica e aumentando o risco de pneumonia e de novos episódios sépticos. Além disso, como já mencionado, o comprometimento cognitivo persiste mesmo após meses do evento séptico. O mesmo pode ocorrer com o comprometimento neuromuscular, fazendo com que a reabilitação física dos pacientes seja demorada. ● Disfunção renal ○ A fisiopatogenia da disfunção renal na sepse é multifatorial, tanto pré renal por hipovolemia e hipotensão, como por lesão direta. Pode ocorrer necrose tubular aguda e lesão por apoptose celular. Caracteriza-se pela diminuição do débito urinário e pelo aumento dos níveis séricos de ureia e creatinina. ● Disfunção hematológica ○ Durante a tempestade inflamatória gerada por agressão, o endotélio se torna pró-coagulante, contribuindo para a geração de trombose na microcirculação, hipoperfusão e, consequentemente, disfunção orgânica. Esse quadro denomina-se coagulação intravascular disseminada (CIVD). Na sepse, ao contrário de outras doenças, as principais manifestações clínicas da CIVD são as disfunções orgânicas e não o sangramento. O coagulograma se mostra alterado, com alargamento do tempo de tromboplastina parcial e redução da atividade de protrombina. É frequente queda abrupta da contagem de plaquetas, com manutenção dos níveis ainda normais ou franca plaquetopenia, com clara correlação prognóstica. Esse comprometimento é secundário tanto ao consumo exacerbado como à redução da produção de plaquetas secundária a disfunção da medula e diminuição da produção de trombopoetina. ○ Outra disfunção frequente no sistema hematológico é a anemia, secundária a múltiplos fatores. Ocorre perda sanguínea por sangramentos evidentes, incluindo a “anemia iatrogênica” decorrente da coleta seriada de amostras para exames, procedimentos invasivos, hemólise ou mesmo perda oculta de sangue. Deficiências nutricionais prévias podem desempenhar um papel. Além disso, existem fatores mais específicos como alterações no metabolismo do ferro, redução na produção de eritropoietina, depressão medular pelas citocinas levando à diminuição na eritropoiese e aumento do sequestro esplênico. ● Disfunção gastrointestinal ○ A disfunção gastrointestinal na sepse é bastante frequente e, muitas vezes, negligenciada. Entre suas manifestações, destaca se a colestase trans-infecciosa, secundária ao comprometimento da excreção canalicular de bilirrubina, expressando-se por elevação das enzimas canaliculares, fosfatase alcalina e gamaglutamiltransferase. O hepatócito geralmente consegue preservar suas demais funções, de sorte que a insuficiência hepática franca é rara, exceto em pacientes com comprometimento prévio da função hepática. A elevação de transaminases é, portanto, discreta.○ Gastroparesia e íleo adinâmico são frequentes, dificultando a manutenção do suporte nutricional. A mucosa também pode sofrer lesões secundárias a isquemia, manifestando-se como lesão aguda da mucosa ou hemorragia. As alterações no sistema digestivo podem levar à intolerância à dieta, refluxo importante e diarreia. ○ Embora não claramente demonstrada, a translocação de bactérias da luz intestinal para o sistema linfático ou para o sangue através dessa mucosa lesada pode contribuir para o agravamento do quadro séptico. ● Disfunção endócrina ○ O sistema endócrino também faz parte do quadro de disfunção generalizada associada à sepse. Pode ocorrer disfunção tireoidiana, alterações de suprarrenal e distúrbios glicêmicos. ○ A disfunção adrenal pode contribuir para o quadro de vasodilatação e hipotensão já característicos da sepse. Distúrbios eletrolíticos como hiponatremia e hipercalemia são mais dificilmente identificados, visto serem mascarados pelos líquidos infundidos no paciente no decorrer do tratamento. A reposição com doses baixas de hidrocortisona pode ser necessária em pacientes com choque séptico refratário. ○ A hiperglicemia faz parte da resposta inflamatória, seja ela associada ou não à sepse. Contribuem sobremaneira para hiperglicemia, a resistência periférica à insulina e o aumento da produção de glicose pelo fígado. Triagem e rotina para atendimento O protocolo de sepse deve ser aberto para pacientes com SUSPEITA de sepse e choque séptico. Recentemente, foi descrito o escore qSOFA , com 3 componentes: rebaixamento de nível de consciência, frequência respiratoria ≥ 22 ipm e pressão arterial sistólica abaixo de 100 mmHg. No seu processo de validação retrospectiva, o escore mostrou boa acurácia na predição de óbito, às custas, entretanto, de baixa sensibilidade. Assim, o mesmo não deve ser utilizado para triagem de pacientes com suspeita de sepse, mas sim para, após a triagem adequada desses pacientes com base em critérios mais sensíveis, identificar aqueles com maior risco de óbito. Após identificação do paciente com SUSPEITA de sepse, usualmente pela enfermagem, a equipe médica decide se deve ou não haver o seguimento do protocolo, com base nas informações disponíveis para tomada de decisão em relação à probabilidade de se tratar de sepse. Nessa decisão, alguns fatores devem ser levados em consideração: 1. Em pacientes com qualquer das disfunções clínica utilizadas na triagem (hipotensão, rebaixamento de consciência, dispneia ou dessaturação e, eventualmente, oligúria), deve-se dar seguimento imediato ao protocolo, com as medidas do pacote de 1 hora, e proceder a reavaliação do paciente ao longo das 6 primeiras horas. 2. Em pacientes com disfunção clínica aparente, mas com quadro clínico sugestivo de outros processos infecciosos atípicos (no contexto da sepse), como dengue, malária e leptospirose, a equipe médica poderá optar por seguir fluxo específico de atendimento que leve em consideração peculiaridades do atendimento a esses pacientes. 3. Em pacientes sem disfunção clínica aparente, deve-se levar em conta o quadro clínico, não sendo adequado o seguimento do protocolo em pacientes com quadros típicos de infecções de via aérea alta ou amigdalites, por exemplo, que podem gerar SRIS mas tem baixa probabilidade de se tratar de casos de sepse. São também exemplos de pacientes de baixo risco aqueles jovens e sem comorbidades. Em pacientes sem disfunção clínica aparente e com baixo risco de se tratar de sepse, o médico pode decidir por outro fluxo de atendimento. Nesses casos, pode-se optar por investigação diagnóstica simplificada e observação clínica antes da administração de antimicrobianos da primeira hora. Novamente, pacientes com quadros sugestivos de processos infecciosos atípicos, como dengue e malária, devem seguir fluxo específico de atendimento. 4. Em pacientes para os quais já exista definição de cuidados de fim de vida, o protocolo deve ser descontinuado, e o paciente deve receber tratamento pertinente a sua situação clínica, incluindo eventualmente alguns dos componentes do pacote de tratamento. Em hospitais que gerenciam o protocolo de sepse, esses pacientes não devem ser incluídos no cálculo dos denominadores. Deve-se lembrar que escores de gravidade podem auxiliar na identificação de pacientes com maior risco de óbito. Assim, pacientes com escore qSOFA positivo, ou seja, com dois ou mais componentes presentes, devem receber atenção especial, da mesma forma que pacientes com múltiplas disfunções orgânicas. Após identificação do paciente com suspeita de sepse os seguintes passos devem ser cumpridos: 1. registre o diagnóstico no prontuário ou na folha específica de triagem do protocolo institucional. Todas as medidas devem ser tomadas a partir do momento da formulação da hipótese de sepse. 2. todos os pacientes com protocolos de sepse abertos devem ter seu atendimento priorizado com o objetivo de otimizar a coleta de exames, o início de antibioticoterapia e a ressuscitação hemodinâmica; 3. realize anamnese e exame físico dirigidos, com atenção especial aos sinais clínicos de disfunção orgânica; 4. pacientes com disfunção orgânica grave e ou choque devem ser alocados em leitos de terapia intensiva assim que possível, a fim de garantir o suporte clínico necessário. Caso não seja possível a alocação em leito de terapia intensiva, deve-se garantir o atendimento do paciente de maneira integral, independente do setor em que o mesmo se encontre; 5. a ficha do protocolo de sepse deve acompanhar o paciente durante todo o atendimento de tratamento das 6 primeiras horas, a fim de facilitar a comunicação nos pontos de transição entre as equipes de diferentes turnos ou setores e resolver pendências existentes para o atendimento. Tratamento Pacote de 1 hora Para todos os pacientes em que a equipe médica optou por dar seguimento ao protocolo, o pacote de 1 hora deve ser executado. O mesmo é composto dos seguintes itens: 1. Coleta de exames laboratoriais para a pesquisa de disfunções orgânicas: gasometria e lactato arterial, hemograma completo, creatinina, bilirrubina e coagulograma.* Lactato acima de 4 inicialmente, mal proagnóstico→ dr. Diogo!!! 2. Coleta de lactato arterial o mais rapidamente possível mas dentro da primeira hora, que deve ser imediatamente encaminhado ao laboratório, a fim de se evitar resultado falsos positivos. O objetivo é ter resultado deste exame em 30 minutos. 3. Coleta de duas hemoculturas de sítios distintos em até uma hora, conforme rotina específica do hospital, e culturas de todos os outros sítios pertinentes (aspirado traqueal, líquor, urocultura) antes da administração do antimicrobiano. Caso não seja possível a coleta destes exames antes da primeira dose, a administração de antimicrobianos não deverá ser postergada; 4. Prescrição e administração de antimicrobianos de amplo espectro para a situação clínica, por via endovenosa, visando o foco suspeito, dentro da primeira hora da identificação da sepse. A utilização deantimicrobianos deve seguir a orientação do serviço de controle de infecção hospitalar da instituição, que deverá definir com o corpo clínico local as recomendações para o tratamento empírico conforme o foco de infecção identificado e a característica da infecção, comunitária ou associada a assistência a saúde. 5. Princípios de farmacocinética e farmacodinâmica devem ser seguidos por todas as instituições. Todas as recomendações visando otimização da terapia antimicrobiana devem ser feitas com auxílio do farmacêutico e da enfermagem e estarem amplamente disponíveis para todos os profissionais. As principais recomendações estão listadas abaixo. ○ Utilizar dose máxima para o foco suspeito ou confirmado, com dose de ataque nos casos pertinentes, sem ajustes para a função renal ou hepática. As doses devem ser plenas visando otimização da redução da carga bacteriana ou fúngica. Embora seja discutível, pode-se manter doses sem ajuste para função renal pelas primeiras 24 horas. Isso é de suma importância para os antimicrobianos hidrofílicos dado ao aumento do volume de distribuição dos mesmos em decorrência da ressuscitação volêmica. ○ Atentar para a diluição adequada de forma a evitar incompatibilidade e concentração excessiva. Utilizar a infusão estendida de antibióticos betalactâmicos como piperacilina-tazobactam e meropenem, com exceção da primeira dose, que deve ser administrada, em bolus, o mais rápido possível. ○ Utilizar terapia combinada, com duas ou três drogas, quando existir suspeita de infecção por agentes multidrogas resistentes. Considerar o uso de diferentes classes de antibióticos, para um mesmo agente, em pacientes com choque séptico. ○ Restringir o espectro antimicrobiano quando o patógeno for identificado e a sensibilidade conhecida; terapia combinada pode ser de-escalonada conforme evidência de resposta clínica ou resolução da infecção. 6. Para pacientes hipotensos (PAS< 90mmHg, PAM <65mmHg ou, eventualmente, redução da PAS em 40mmHg da pressão habitual) ou com sinais de hipoperfusão, entre eles níveis de lactato acima de duas vezes o valor de referência institucional (hiperlactatemia inicial), deve ser iniciada ressuscitação volêmica com infusão imediata de 30 mL/kg de cristalóides dentro da 1ª hora do diagnóstico da detecção dos sinais de hipoperfusão. Embora classicamente não sejam considerados com parte do pacote de ressuscitação, sinais de hipoperfusão podem incluir oligúria, presença de livedo, tempo de enchimento capilar lentificado e alteração do nível de consciência. Coloides proteicos, albumina ou soro albuminado, podem fazer parte dessa reposição inicial. O uso de amidos está contraindicado, pois está associado a aumento da incidência de disfunção renal. Esse volume deve ser infundido o mais rápido possível, considerando-se as condições clínicas de cada paciente. Pacientes cardiopatas podem necessitar redução na velocidade de infusão, conforme a presença ou não de disfunção diastólica ou sistólica. Nos casos em que foi optado por não realizar reposição volêmica, parcial ou integralmente, após avaliação de fluido responsividade, esta decisão deve estar adequadamente registrada no prontuário. Nesses pacientes, o uso de vasopressores para garantir pressão de perfusão adequada necessita ser avaliado. 7. Uso de vasopressores para pacientes que permaneçam com pressão arterial média (PAM) abaixo de 65 (após a infusão de volume inicial), sendo a noradrenalina a droga de primeira escolha. Não se deve tolerar pressões abaixo de 65 mmHg por períodos superiores a 30-40 minutos. Por isso, o vasopressor deve ser iniciado dentro da primeira hora nos pacientes em que ele está indicado. Em casos de hipotensão ameaçadora a vida, pode-se iniciar o vasopressor mesmo antes ou durante a reposição volêmica. É fundamental garantir pressão de perfusão enquanto se continua a reposição volêmica. Assim, o vasopressor pode ser iniciado em veia periférica, enquanto se providencia o acesso venoso central. O uso de outros vasopressores pode ser necessário. Dentre os disponíveis, a recomendação é o uso de vasopressina, com intuito de desmame de noradrenalina ou como estratégia poupadora de catecolaminas, ou a adrenalina, preferível em pacientes que se apresentem com débito cardíaco reduzido. A dobutamina pode ser utilizada quando exista evidência de baixo cardíaco ou sinais clínicos de hipoperfusão tecidual, como livedo, oligúria, tempo de enchimento capilar lentificado, baixa saturação venosa central ou lactato aumentado. 8. Nos pacientes com lactato alterado acima de duas vezes o valor de referência, a meta terapêutica é o clareamento do mesmo. Assim, como um complemento ao pacote de 1 hora, dentro de 2 a 4 horas após o início da ressuscitação volêmica, novas dosagens devem ser solicitadas. Nem sempre se obtem a normalização do lactato, haja vista existirem outras causas para a hiperlactatemia que não a hipoperfusão tecidual. A busca pela normalização deve ser feita cuidadosamente, sob risco de intervenções terapêuticas desnecessárias, e potencialmente deletérias. A hiperlactatemia residual isolada, sem outros sinais clínicos de hipoperfusão ou má evolução, não necessariamente precisa ser tratada. Reavaliação das 6 horas A reavaliação das 6 horas deve ser feita em pacientes que se apresentem com choque séptico, hiperlactatemia ou sinais clínicos de hipoperfusão tecidual. A continuidade do cuidado é importante, por isso entende-se que durante as seis primeiras horas o paciente deve ser reavaliado periodicamente. Para isso é importante o registro da reavaliação do status volêmico e da perfusão tecidual. 1. Reavaliação da continuidade da ressuscitação volêmica, por meio de marcadores do estado volêmico ou de parâmetros perfusionais. As seguintes formas de reavaliação poderão ser consideradas: • Mensuração de pressão venosa central • Variação de pressão de pulso • Variação de distensibilidade de veia cava • Elevação passiva de membros inferiores • Qualquer outra forma de avaliação de responsividade a fluídos (melhora da pressão arterial após infusão de fluidos, por exemplo) • Mensuração de saturação venosa central • Tempo de enchimento capilar • Presença de livedo • Sinais indiretos (por exemplo, melhora do nível de consciência ou presença de diurese) 2. Pacientes com sinais de hipoperfusão e com níveis de hemoglobina abaixo de 7 mg/dL devem receber transfusão o mais rapidamente possível. 3. Idealmente, os pacientes com choque séptico devem ser monitorados com pressão arterial invasiva, enquanto estiverem em uso de vasopressor. A aferição por manguito não é fidedigna nessa situação, mas pode ser utilizada nos locais onde a monitorização invasiva não está disponível. 4. Pacientes sépticos podem se apresentar hipertensos, principalmente se já portadores de hipertensão arterial sistêmica. Nesses casos, a redução da pós-carga pode ser necessária para o restabelecimento da adequada oferta de oxigênio. Não se deve usar medicações de efeito prolongado, pois esses pacientes podem rapidamente evoluir com hipotensão. Assim, vasodilatadoresendovenosos, como nitroglicerina ou nitroprussiatos são as drogas de escolha. Outras recomendações Uso de corticóides- A utilização de corticóides é recomendada para pacientes com choque séptico refratário, ou seja, naqueles em que não se consegue manter a pressão arterial alvo, a despeito da ressuscitação volêmica adequada e do uso de vasopressores. A droga recomendada é a hidrocortisona na dose de 50 mg a cada 6 horas. Ventilação mecânica- A intubação orotraqueal não deve ser postergada, em pacientes sépticos, com insuficiência respiratória aguda e evidências de hipoperfusão tecidual. Os pacientes que necessitarem de ventilação mecânica devem ser mantidos em estratégia de ventilação mecânica protetora, devido ao risco de desenvolvimento de síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA). A estratégia protetora inclui a utilização de baixos volumes correntes (6 mL/kg de peso ideal) e a limitação da pressão de platô abaixo de 30 cmH2O. A fração inspirada de oxigênio deve ser suficiente para manter uma PaO2 entre 70 - 90 mmHg. Também deve-se objetivar uma pressão de distensão (driving pressure, pressão de platô - peep) menor que 15 cmH2O, sempre que possível. Para pacientes com diagnóstico de SDRA há menos de 48 horas, com relação PaO2/ FiO2 menor que 150 e FiO2 de 60% ou mais, a utilização de posição de prona é recomendada, para unidades que tenham equipe com treinamento na técnica. Manobras de recrutamento estão associadas a maior mortalidade e devem ser evitadas. Bicarbonato- Não está indicado o uso de bicarbonato nos casos de acidose lática em pacientes com pH >7,15, pois o tratamento dessa acidose é o restabelecimento da adequada perfusão. Nos pacientes com pH abaixo desse valor esta terapia pode ser avaliada como medida de salvamento. Controle glicêmico- Os pacientes na fase aguda de sepse cursam frequentemente com hiperglicemia, secundária a resposta endocrino-metabólica ao trauma. O controle adequado da glicemia é recomendado por meio da utilização de protocolos específico, visando uma meta abaixo de 180 mg/dL, evitando-se episódios de hipoglicemia e variações abruptas da mesma. Terapia renal substituta- Não existe recomendação para o início precoce de terapia renal substituta, devendo-se individualizar cada caso, conforme discussão com equipe especialista. Da mesma maneira, não existe recomendação para hemodiálise intermitente ou modalidades contínuas, devendo-se reservar estes métodos para pacientes com instabilidade hemodinâmica grave, nos locais onde este recurso é disponível. Seguimento do paciente: linha de cuidado do paciente séptico O atendimento ao paciente séptico nas primeiras 24 horas é de suma importância para o desfecho favorável. Entretanto, outras ações são necessárias para o sucesso pleno em termos de sobrevida hospitalar e reabilitação após a alta, com estabelecimento de uma linha de cuidado adequada, desde o momento da internação hospitalar ou do diagnóstico de sepse até o momento da alta. O paciente deve ser seguido e atendido de forma adequada durante toda a internação hospitalar. O atendimento multidisciplinar contribui para os desfechos favoráveis tanto dentro do hospital como após a alta. A enfermagem tem fundamental importância para a recuperação funcional, desde o momento do reconhecimento precoce até a alta hospitalar. Nutrição adequada, fisioterapia respiratória e motora, focada em mobilização precoce, e atendimento fonoaudiológico para recuperação de deglutição e fonação contribuem para a reabilitação do paciente. O suporte psicológico precoce pode minimizar os riscos de desenvolvimento de estresse pós traumático. A odontologia tem seu papel na identificação e controle do foco, bem como na prevenção de infecções respiratórias. O acompanhamento diário pela farmácia clínica possibilita a adequação da prescrição médica. O serviço social é importante para a reinserção do paciente na sociedade e o seguimento do mesmo no sistema de saúde. Em suma, todos os profissionais envolvidos no atendimento têm um papel importante a desempenhar. As orientações no momento da alta, visando a continuidade do cuidado ambulatorial e o seguimento por todas as equipes responsáveis pela reabilitação funcional do paciente são também fundamentais para a continuidade do tratamento. Monitorização (PVC 8- 12, SAT VENOSA> 70%, PAM > 65 < 90 pq se não encharca o pulmão, DIURESE 0,5ml/kg/h)* ● Avaliação da PA ● Avaliação da PVC ● Métodos que avaliam o contorno do pulso arterial ● Utilização do CAP (cateter da artéria pulmonar) ● ECG ● Doppler esofágico ● Diurese Lactato acima de 4 inicialmente, mal proagnóstico Olhar o gradiente venoso (gasometria venosa) - >6 infundir Drogas vasoativas (noradrenalina, vasopressina, epinefrina, dopamina) A utilização de drogas vasoativas no suporte farmacológico de pacientes críticos, baseia-se na otimização do débito cardíaco e do tônus vascular da circulação sistêmica e pulmonar, com o objetivo principal de restabelecimento do fluxo sangüíneo regional para órgãos vitais durante o choque circulatório. → As catecolaminas, ou agonistas adrenérgicos, melhoram o desempenho mecânico do coração, devido ao efeito inotrópico positivo. Algumas reduzem a resistência vascular sistêmica e pulmonar, e as pressões de enchimento ventricular, conforme interação com receptores adrenérgicos específicos. → Os inibidores da fosfodiesterase apresentam mecanismo de ação diferenciado, mas os efeitos hemodinâmicos são semelhantes às catecolaminas. → E os vasodilatadores promovem a vasodilatação arterial e/ou venosa, determinando a redução da pré e/ou pós-carga, e aumento do débito cardíaco, além de reduzir as pressões de enchimento ventricular. ● Agonistas adrenérgicos Os agonistas adrenérgicos são substâncias análogas às catecolaminas, as quais são sintetizadas naturalmente em nosso organismo. Existem três tipos de catecolaminas endógenas, ou seja, noradrenalina, adrenalina, e dopamina, que interagem com receptores de membrana específicos (a, b, e dopa), determinando uma série de fenômenos bioquímicos, que resultam em aumento do cálcio intracelular. Desta forma, as catecolaminas promovem os seus efeitos simpaticomiméticos sobre o organismo, tais como: estimulação da freqüência e contratilidade cardíaca, estimulação do músculo liso vascular, inibição do músculo liso brônquico e intestinal, lipólise, glicogenólise e outros efeitos no sistema nervoso central. ○ Dopamina: A dopamina é um importante neurotransmissor do sistema nervoso central e periférico. A ativação dos receptores dopaminérgicos resulta em vasodilatação de artérias renais, mesentéricas, coronárias e cerebrais. A Dopamina na dose de 0,2 a 3,0 mg/kg/ min é freqüentemente utilizada para aumento do fluxo sanguíneo renal e aumento do volume urinário, podendo ser utilizada em períodos de “stress” renal. Na dose de 3,0 a 10,0 mg/kg/min predomina os efeitos beta-adrenérgicos ocorrendo taquicardia, aumento do retorno venoso e queda da resistência vascular sistêmica. Parte da respostainotrópica da dopamina depende da liberação endógena de noradrenalina o que limita sua eficiência em estados de depleção de catecolaminas, como ocorre na insuficiência cardíaca crônica. Doses superiores a 10,0 mg/kg/min poduzem efeitos predominantes alfa-adrenérgicos com vasoconstricção sistêmica, aumento da pressão arterial e abolição dos efeitos vasodilatadores renais e mesentéricos. * A dopamina pode ser utilizada em baixas doses, associada ao uso de dobutamina e/ou noradrenalina no tratamento do choque cardiogênico e do choque séptico, com o objetivo de aumentar o fluxo hepático, esplâncnico e renal. Também pode ser utilizada em pacientes oligúricos não hipovolêmicos, com o propósito de incremento do fluxo sanguíneo renal e aumento do volume urinário. ○ Dobutamina: é uma catecolamina sintética, formulada como uma mistura racêmica com isômeros (-) alfaagonistas e (+) beta-agonistas, que exerce efeito predominante em receptores beta-adrenérgicos, promovendo aumento do débito cardíaco e redução nas pressões de enchimento ventricular, no modelo dose-dependente. Até a dose de 15 mg/kg/min promove aumento da contratilidade miocárdica sem elevação significativa da freqüência cardíaca. Também ocorre diminuição das pressões venosa central e capilar pulmonar devido à melhor performance do coração, sem haver, contudo, alteração da resistência vascular pulmonar. Em doses superiores a 30 mg/kg/ min, pode provocar o aparecimento de arritmias ventriculares e aumento da pressão arterial. Importante ressaltar que a dobutamina pode promover diminuição da resistência vascular sistêmica devido à sua interação com receptores beta-adrenérgicos vasculares. * A dobutamina está indicada para pacientes, nos quais o tratamento baseia-se no aumento da contratilidade miocárdica sem interferir na resistência vascular sistêmica. Pode ser utilizada no tratamento da insuficiência ventricular esquerda aguda ou crônica e pode ser utilizada isoladamente ou em associação à dopamina e/ou noradrenalina, no tratamento do choque cardiogênico de qualquer etiologia, ou no choque séptico. Também está indicado seu uso no pós-operatório de cirurgia cardíaca de maneira geral, assim como, na fase pré-operatória do transplante cardíaco. ○ Noradrenalina: precursor endógeno da adrenalina, interage predominantemente com receptores alfa-adrenérgicos, exercendo de maneira significativa um efeito vasopressor. Também apresenta efeito inotrópico positivo, em decorrência da estimulação beta-adrenérgica, contudo, apresenta taquicardia menos pronunciada. Em baixas doses, promove aumento da pressão arterial, do índice de trabalho do ventrículo esquerdo, do débito urinário e do índice cardíaco. Em doses superiores a 2 mg/min, ocorre incremento da vasoconstricção periférica com aumento da resistência vascular sistêmica e diminuição da perfusão renal, esplâncnica, pulmonar e musculatura esquelética. * É utilizada como droga vasopressora no tratamento do choque séptico, na síndrome da resposta inflamatória sistêmica, e na síndrome inflamatória pós circulação extra-corporea em pós-operatório de cirurgia cardíaca. Também pode ser utilizada no choque cardiogênico, principalmente como decorrência do infarto agudo do miocárdio assim como no tratamento inicial do choque hipovolêmico grave, até que ocorra o restabelecimento da volemia, com a terapia de reposição de fluidos. ○ Adrenalina: Catecolamina que interage com receptores α, β2 , e β1 , no modelo dose-dependente, com características vasopressoras, e estimulando a liberação de noradrenalina. Induz aumento da freqüência cardíaca e do volume sistólico mediado por efeito beta-adrenérgico, e aumenta de forma significativa a resistência vascular periférica por estimulação alfa-adrenérgica, quando administrada em dose superior a 0,1 mg/kg/min. É uma droga de fundamental importância na parada cardio-respiratória e é freqüentemente utilizada em cirurgia cardíaca, na saída de circulação extracorpórea, com o objetivo de melhorar o desempenho do miocárdio reperfundido , ou após o reparo de comunicação interventricular. * Também pode ser utilizada no choque séptico refratário, mas o seu uso rotineiro não é recomendado devido à intensa redução do fluxo sangüíneo esplâncnico. Constitui ainda uma indicação absoluta no tratamento do choque anafilático. ● Inibidores da fosfodiesterase A inibição da enzima fosfodiesterase diminui a metabolização do AMPc, com conseqüente aumento da contratilidade miocárdica. Os inibidores da fosfodiesterase também aumentam a sensibilidade de proteínas contráteis ao cálcio, aumentam o influxo de cálcio através do mecanismo de troca Na/Ca, e antagonizam a adenosina. Os inibidores da fosfodiesterase constituem uma alternativa às catecolaminas em pacientes com diminuição de receptores beta-adrenérgicos (downregulation), como ocorre na insuficiência cardíaca crônica. ○ Existem duas drogas, amrinona e milrinona, que apresentam estas características, e são utilizadas na prática clínica. A amrinona é ao menos, tão efetiva quanto a dobutamina, no manuseio da insuficiência cardíaca congestiva, a curto prazo, devido à miocardiopatia dilatada. Existem relatos que a associação de amrinona e dobutamina, em pacientes com insuficiência cardíaca grave, promove um volume sistólico maior do que o uso isolado de ambas drogas. A milrinona apresenta atividade inotrópica e vasodilatadora semelhante à amrinona, sendo 15 vezes mais potente, e com incidência de plaquetopenia 6 vezes menor. Esta promove aumento do índice cardíaco e da oferta de oxigênio (DO2), do tipo dose-dependente, em pacientes com insuficiência cardíaca e outras situações críticas. Ambas podem ser utilizadas no tratamento do choque circulatório, em pacientes refratários aos agonistas adrenérgicos. ● Vasodilatadores Os vasodilatadores aumentam o diâmetro dos vasos sangüíneos, ou seja, induzem a vasodilatação arterial e/ou venosa, com conseqüente aumento do débito cardíaco e redução das pressões de enchimento. Estes apresentam mecanismos de ação diversos: (a) relaxamento do músculo liso vascular por ação direta; (b) inibição do sistema renina-angiotensina; (c) bloqueio da estimulação simpática; e (d) inibição do influxo de cálcio na célula do músculo liso vascular. Entretanto, os efeitos destes agentes dependem de numerosos parâmetros clínicos, incluindo o status volêmico do paciente, que em decorrência da diminuição da pré e/ou pós-carga, apresentam como efeito marcante, a hipotensão arterial, o que limita seu uso na terapia do choque circulatório. Cabe ressaltar a importância do nitroprussiato de sódio e da nitroglicerina, que são vasodilatadores potentes de ação direta com início de ação imediato e meia vida curta. O mecanismo de ação em nível celular consiste na decomposição de sua molécula em um metabólico ativo, óxido nítrico (NO), que estimula a guanilato-ciclase presente no músculo liso vascular, aumentando os níveis de GMP cíclico, que exerce ação vasodilatadora. ○ O nitroprussiato de sódio, que apresenta ação balanceada, promove umadiminuição da pré e pós-cargas e aumento do débito cardíaco na insuficiência cardíaca severa, e também provoca queda do consumo miocárdico de oxigênio no infarto agudo do miocárdio. Portanto, o nitroprussiato de sódio pode ser útil no tratamento do choque cardiogênico, pois determina redução das pressões de enchimento ventricular, e aumento do débito cardíaco, desde que associado a agente inotrópico positivo, tendo como fator limitante, a hipotensão arterial. ○ A nitroglicerina é um vasodilatador de ação venosa predominante, que determina uma redução das pressões de enchimento (pressão venosa central e pressão de oclusão de artéria pulmonar), e não reduz de modo significativo a pressão arterial e o débito cardíaco. Seus efeitos são particularmente úteis no tratamento da isquemia miocárdica e no infarto agudo do miocárdio, estando relacionada à diminuição da extensão da área infartada e melhora da função ventricular. Pode ser utilizada para controle da hipertensão arterial, e também é utilizada freqüentemente em per e pós-operatório de cirurgia cardíaca devido à melhora do fluxo sangüíneo através da mamária interna esquerda. No tratamento do choque cardiogênico, seja decorrente do infarto agudo do miocárdio ou na descompensação da insuficiência cardíaca, a dobutamina deve ser utilizada como agente inotrópico, podendo ser associada ao uso de nitroprussiato de sódio ou nitroglicerina na ausência de hipotensão arterial, ou à dopamina em baixas doses, quando existe oligúria associada, entretanto é importante ressaltar a necessidade da monitoração hemodinâmica para avaliação do status volêmico deste paciente. Em situações de hipotensão arterial importante, apesar do uso de dobutamina em dose plena, podemos associar a noradrenalina como terapêutica vasopressora, além de outras medidas adequadas ao suporte circulatório. Cabe ressaltar a importância dos inibidores da fosfodiesterase, anrinona e milrinona, no tratamento da insuficiência cardíaca refratária ao tratamento com catecolaminas, assim como a importância do isoproterenol no choque cardiogênico associado a bradiarritmia, ou hipertensão pulmonar. No choque séptico ou na síndrome de resposta inflamatória sistêmica, a noradrenalina pode ser empregada como droga vasopressora de eleição. Quando existe disfunção ventricular associada, com pressões de enchimento elevadas, a dobutamina pode ser associada ao tratamento. A dopamina também pode ser associada, desde que em doses baixas, com o objetivo de aumentar a perfusão renal e esplâncnica. E apenas em casos refratários, justifica-se o uso de adrenalina como tratamento vasopressor adjuvante Em condições de hipovolemia e principalmente, no choque hipovolêmico, a terapia de reposição de fluidos e/ou hemoderivados, constitui a melhor abordagem terapêutica. Entretanto, na fase inicial do tratamento, a utilização de noradrenalina assume importância como terapia vasopressora, até que ocorra estabilização hemodinâmica após a reposição volêmica. vasopressora ____ Epinefrina: Especificamente, a epinefrina interage-se com os receptores α e β, assim como com alguns de seus subtipos. Esses receptores localizam-se nas terminações nervosas pré-sinápticas e em algumas pós-sinápticas. Essas terminações podem ser observadas perifericamente, no tecido vascular e adiposo, assim como no coração, pulmões, plaquetas, leucócitos, rins, entre outros. Existem dois subtipos de receptores α-adrenérgicos (α1 e α2, sendo esses subdividos em outros três subtipos) e três subtipos de receptores β-adrenérgicos (β1, β2 e β3). Ao serem ativados, observam-se os seguintes principais eventos: • α1 – adrenérgico: vasoconstrição, relaxamento da musculatura do trato gastrintestinal, secreção salivar e glicogenólise hepática. • α2 – adrenérgico: inibição da liberação de determinados transmissores (como a norepinefrina e a acetilcolina pelo sistema nervoso autônomo), agregação plaquetária, contração da musculatura lisa vascular, inibição da liberação de insulina. • β1 – adrenérgico: aumento da contração da musculatura miocárdica e da frequência cardíaca. • β2 – adrenérgico: dilatação brônquica, relaxamento da musculatura lisa visceral, glicogenólise hepática e tremor. • β3 – adrenérgico: lipólise. → O tempo de meia-vida da epinefrina é extremamente curto (cerca de 1 minuto). Vasopressina: A pressão baixa nos átrios e a nível dos presso-receptores promove a liberação do hormônio antidiurético (ADH) ou vasopressina e do hormônio adrenocorticotrófico (ACTH) pelo lobo posterior da hipófise. A vasopressina é um dos mais potentes vasoconstritores liberados no organismo e atua controlando excreção renal de água. Em pressões sangüíneas inferiores a 50 mmHg aumenta 20 a 50 vezes. O ACTH estimula a secreção de corticosteróides (aldosterona e hidrocortisona). A aldosterona auxilia a estabilizar o volume plasmático aumentando a reabsorção de sódio pelos rins. Os glicocorticóides potencializam o efeito das catecolaminas e estimulam a gliconeogênese. SARA como complicação (comprometimento pulmonar ou hiper- hidratação), sinais clínicos A Síndrome da Angústia Respiratória Aguda (SARA) ou Síndrome do Desconforto Respiratório Agudo (SDRA) é definida, de acordo com a Conferência de Consenso Européia-Americana,(1) como uma síndrome de insuficiência respiratória de instalação aguda, caracterizada por infiltrado pulmonar bilateral à radiografia de tórax, compatível com edema pulmonar; hipoxemia grave, definida como relação PaO2 /FIO2 b 200; pressão de oclusão da artéria pulmonar b 18 mmHg ou ausência de sinais clínicos ou ecocardiográficos de hipertensão atrial esquerda; presença de um fator de risco para lesão pulmonar. A síndrome do desconforto respiratório agudo (SDRA) consiste em uma insuficiência respiratória aguda e grave, produzida por um edema pulmonar inflamatório, com um grande aumento da permeabilidade da membrana alvéolo-capilar pulmonar, o que leva ao encharcamento e desenvolvimento de shunt intrapulmonar. . Aparece dentro de uma semana de exposição a um fator de risco. ● As principais características da SDRA são infiltrados bilaterais na radiografia de tórax, complacência diminuída e hipoxemia refratária a altas FiO2 , sendo shunt intrapulmonar (alvéolos perfundidos, mas não ventilados) sua principal causa. ● Os fatores de risco mais comuns para a SDRA são: pneumonia, sepse, choque, aspiração de conteúdo gástrico e trauma. ● A mortalidade é alta, entre 15% e 60%; a causa mais frequente é a disfunção ou falência de múltiplos órgãos. Apenas 15% dos pacientes morrem de hipoxemia refratária. Os sobreviventes, frequentemente, passam um tempo prolongado em unidade de terapia intensiva (UTI), com sequelas importantes em longo prazo. ● A SDRA é uma doença pulmonar heterogênea, podendo ser mais bem visualizada na tomografia computadorizada de tórax onde se observa massa de atelectasia compressiva nas regiões dorsais dos pulmões ou regiões dependentes da gravidade com o restante do parênquima pulmonar mais preservado. Suas principais características clínicas são:hipoxemia, caracteristicamente refratária à alta fração inspirada de oxigênio (FiO2 ), infiltrado pulmonar bilateral no raio X de tórax (Figura 72.1), e diminuição de complacência pulmonar. Os achados frequentemente encontrados em biópsias pulmonares e necropsias de pacientes com SDRA são: dano alveolar difuso, expresso por membranas hialinas, edema e necrose alveolar e de células endoteliais; e, em estados avançados, fibrose organizada e proliferação importante das células de tipo II. Etiologia Fatores de risco 1. Pulmonar (ou direto): pneumonia (de todas as causas), aspiração de conteúdo gástrico, trauma torácico, lesão inalatória e quase afogamento; também a pressão alta, lesão de alto volume eventualmente produzido pela ventilação mecânica. 2. Extrapulmonar (ou indireto): mais frequentes são choque, sepse extrapulmonar, trauma grave, lesão cerebral aguda (traumatismo craniano, hemorragia subaracnoide, insulto isquêmico cerebral), transfusões (TRALI: lesão pulmonar aguda relacionada transfusão), pancreatite aguda, e outros. 3. Outras doenças: alcoolismo crônico Fisiopatologia A lesão pulmonar endotelial aparece rapidamente, após alguns minutos ou horas da indução de SDRA, provocando um alargamento nos espaços intercelulares do endotélio pulmonar, com consequente aumento da permeabilidade e, em seguida, intersticial e edema alveolar. O dano também afeta a função e a integridade da barreira epitelial, facilitando o trânsito de líquido rico em proteínas e também de outras macromoléculas para o espaço alveolar, onde precipitam e inativam o agente tensioativo (surfactante), formando as membranas hialinas típicas visíveis ao microscópio óptico. O mecanismo inicial ativa o fator nuclear ubíquo ΚB (NF-ΚB), responsáveis pela transcrição de mais de 100 genes que codificam os mediadores inflamatórios fator de necrose tumoral alfa (TNF-α), interleucina-1-β (IL-1β) e interleucina-6 (IL-6), e outros. Citocinas e quimiocinas ativam os neutrófilos circulantes, que são capturados pelo endotélio pela adesão a selectinas e integrinas; depois disso, eles transmigram para o interstício e, finalmente, para os espaços alveolares, onde eles secretam enzimas proteolíticas e radicais livres, aumentando a resposta inicial da inflamação. A infiltração pulmonar por citocinas é controlada por uma rede complexa de quimiocinas alveolares segregadas (IL-8, peptídeos relacionados à regulação do crescimento de oncogene e proteína epitelial de ativação de neutrófilos), por citocinas secretadas por células imunológicas estimuladas pelos danos coexistentes sistêmicos (lipopolissacarídeos [LPS]; TNF, IL-1, IL-6; fator ativador de plaquetas [PAF], eicosanoides, em sepse ou traumas não pulmonares) e por seções do epitélio do pulmão que desenvolvem a apoptose no começo da doença. Estes compostos aparecem no fluido de lavado broncoalveolar (LBA) de pacientes com SDRA, junto com os autoanticorpos que estimulam a produção (p. ex.: anti-interleucinas com funções anti-inflamatórias). O epitélio pulmonar é constituído por 90% das células simples do Tipo 1, que são muito vulneráveis a lesões, e o resto são células do tipo II cuboides, mais resistentes à lesão, e exibindo muitas funções, como diferenciar as células do tipo I, produzir surfactante e intervir no transporte de íons. A quebra de integridade da barreira alvéolo-capilar altera o íon e o transporte de fluidos, perpetuando o edema; o surfactante não é mais sintetizado e os seus restos são inativados por proteínas do plasma, potenciando a tendência para o colapso alveolar e facilitando a translocação bacteriana, o que pode produzir o choque séptico em pacientes com pneumonia. Finalmente, se o dano foi suficientemente grave, a reparação é lenta ou interrompida, o que pode levar à ativação de mecanismos pró-fibróticos agudos. Depois de quatro a sete dias de duração da fase exsudativa, os mecanismos de resolução são ativados. O edema resolve por meio de transporte de sódio ativo e saída de água por canais transcelulares. As proteínas solúveis são removidas por difusão, e as insolúveis, que constituem as membranas hialinas, são eliminadas por meio de endocitose e transcitose por células alveolares, com posterior fagocitose por macrófagos. Esse é um processo especialmente relevante, dado que os restos de proteína podem constituir uma armação para o crescimento do tecido fibrótico. Além disso, os fatores antiapoptóticos foram detectados no lavado broncoalveolar. Esses processos geralmente coexistem com outros mecanismos de lesão, também mediados pelas citocinas, que podem ser adicionados para o prejuízo inicial: ● Lesão associada à VM (lesão pulmonar induzida pelo ventilador ‒ VILI) em virtude da hiperdistensão produzida pelos altos volumes correntes ou pressões no final da inspiração, o que pode afetar o epitélio e endotélio pulmonares. Nesta última situação, refere-se como a tensão de ruptura capilar, com o subsequente aumento da permeabilidade. Outra possibilidade de produzir VILI ocorre no final da expiração, quando o colapso cíclico poderia ocorrer quando há PEEP insuficiente ou na falta de PEEP. Outro nome desse mecanismo é de-recrutamento cíclico ou atelectrauma. A via comum final desses mecanismos de lesão parece ser a secreção de citocinas em resposta ao dano celular; esse processo é conhecido como biotrauma. Esses mediadores poderiam deixar o pulmão e provocar a falência orgânica distante. ● Lesão associada a novas infecções que podem gerar danos adicionais, pela secreção de citocinas que perpetuam aquela induzida pela lesão inicial e/ou VILI. Pneumonia associada à ventilação mecânica é a mais comum, mas existem outras infecções remotas, como infecções relacionadas ao cateter ou trato urinário. Esse estágio temporal da SDRA, quando os mecanismos de reparação coexistem com novas lesões, conhecido como SDRA tardia. O saldo final entre dano e reparação indica o prognóstico de uma evolução relativamente livre de eventos a uma fibrose pulmonar aguda ou subaguda em 10% dos pacientes, com a morte causada por hipoxemia refratária. Diagnóstico A atual definição de SDRA foi proposta em 2012 ( definição de Berlim) conforme a tabela a seguir:
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