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O ócio criativo

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Introdução
Com a teoria do valor de Marx, percebemos como o tempo que passamos produzindo não retorna ao trabalhador. Várias das suas horas de trabalho são voltadas para a acumulação, para produzir um excedente do qual ele quase não usufrui, sobrando para estes pouco tempo para si. Quando possui esse tempo, ele é voltado para o consumo. O presente trabalho pretende mostrar a importância do tempo de não-trabalho e de como o ideal seria que se invés de gastar este tempo produzindo mais-valor as pessoas pudessem de fato se desenvolver em outros aspectos.
O ócio criativo
Um assunto que muitas vezes é deixado de lado e é pouco valorizado dentro da nossa lógica de eterna busca pelo desenvolvimento e crescimento econômico é o ócio. O ócio é caracterizado pelo não-trabalho, seria o tempo em que o indivíduo tem livre para exercitar sua consciência, sua crítica e suas habilidades pessoais e sociais.( Freire, 2001) No tempo ocioso o indivíduo não tem uma tarefa a concluir, então haveria um distanciamento da realidade alienada, onde se poderia dedicar a algo diferente de suas funções. Com longas e cansativas jornadas de trabalho, o assalariado não desfruta plenamente desse direito ao tempo livre. Dentro da psicologia muitas vezes veremos o ócio como um fator importante para a expressão e para a individualidade do ser humano, assim como seu crescimento pessoal, mas como em vários outros aspectos da nossa vida ele também acaba sendo explorado como dispositivo de consumo. (Rhoden,2009)
 O ócio como fenômeno tem um caráter psiquicamente dinâmico, como uma via de sentido duplo: por um lado, possui um potencial de introspecção e assimilação do mundo; por outro, resulta em uma singular possibilidade de expressão humana. Portanto, a experiência de ócio é também o intercâmbio do Ser com o mundo. Neste processo, o sujeito muda e muda o seu entorno, realizando naturalmente um exercício de aprendizagem espontânea. (Rhoden, 2009)
Do grego, ócio corresponde a sckolé, opondo-se a asckolé (servidão). Sckolé é derivado de escola, o que possibilitava contemplação e sabedoria. A filosofia e a ciência eram tarefas que necessitavam deste tempo de contemplação. Na atualidade isso ainda ocorre, mas somente para a classe privilegiada da sociedade. Mesmo que o trabalho tenha uma função no desenvolvimento do ser humano e seja visto como algo que dignifica o homem, é crucial ter tempo livre para acessar a cultura, para a construção de saberes diversos, aprimoramento de virtudes e para dar espaço para o descanso. (Camillo,2011) 
Ao longo da história houveram modificações na forma de ver o tempo livre, lembrando que aqui o tempo livre não é considerado sinônimo de ócio, e sim um aspecto necessário para que o ócio ocorra. Na Grécia Antiga, muitos filósofos desvalorizavam o mundo prático e material, então os considerados cidadãos não deveriam se dedicar a atividades de operário. Precisavam do tempo de reflexão e autoconhecimento deixando o trabalho braçal na mão de alguns. No Renascimento, a proposta dos filósofos já é bem diferente, com a noção de homem criador de seu mundo e não mais um sujeito contemplativo. (Maya, 2008) Os filósofos iluministas e os economistas clássicos no século XVIII descobriram no trabalho a fonte das nossas riquezas e fator que possibilitou a diferenciação do homem e dos outros animais, juntamente com a utilização de ferramentas e criação de significados.
Em Marx o trabalho tem caráter tanto de criador do homem, quanto de alienador, onde o homem perde a exteriorização de si no mundo real, separado daquilo que produz. O trabalho exerce um papel na socialização do homem, mas é marcado pela coisificação humana, resumindo o trabalhador a uma mercadoria. O capitalismo "dá alças para que os trabalhadores sejam transformados em sujeitos abstratos e desumanos: em coisas. Esta situação nega a essência humana, compondo uma desumanidade criada, curiosamente, pelo próprio homem."(Krueger, 2016) O tempo livre na sociedade capitalista é preciso para que se possa consumir mais. "O capitalismo se insere em nossos hábitos, desejos, atitude"( Gawryszewski,2003) Na lógica dessa sociedade o trabalho é visto como enobrecedor e ao tempo livre é atribuído o título de "pai de todos os vícios". A desocupação e o desemprego são associados uma noção de desvio social.(Maya,2008) O ócio só tem sido levado em conta quando apresenta alguma vantagem ao consumo. 
O tempo livre de um trabalhador assalariado é diferente do tempo livre do dono do capital quantitativa e qualitativamente (Maya, 2008) Em "O Manifesto comunista", Marx diz que a condição essencial para existência da supremacia da classe burguesa é acumulação de riqueza em poucas mãos. O fruto do trabalho traz a base para a liberdade individual, mas a única liberdade obtida é a de comprar e vender.(Marx & Engels,1999) Nossa educação é voltada para os interesses da classe dominante, ou seja, invés de aprendermos a entender nossas próprias necessidades e vontades.
Assim como existe uma alienação do trabalho, existe uma alienação do ócio; Os meios de comunicação no Brasil pertencem a grupos hegemônicos, e é disseminada uma ideologia que contribui para esta alienação. É evidenciado uma lógica de consumo, criando um ócio massificado, deixando de lado valores de povos específicos e supervalorizando culturas de povos dominantes, na intenção de criar uma homogeneização cultural, negando a diversidade. (Camillo, 2011) O surgimento da indústria do entretenimento foi o aumento de tempo livre dos trabalhadores. Era necessária uma produção em massa para que houvessem consumidores em massa. (Gawryszewski,2003) 
Frequentemente quem é passivo no trabalho tende a ser passivo no ócio. Os ócios ativos são aqueles onde as pessoas efetivamente fazem algo, nos ócios passivos são apenas receptores. Sendo acesso a cultura reduzido ao acesso ao consumo, as pessoas que se encontram cansadas e imersas numa lógica de sobreviver/acumular desfrutam seu ócio de forma passiva, assim não alcançando uma emancipação. (Camillo, 2011) 
Neste contexto, surge o conceito de ócio criativo de Domenico de Masi, que propõe unir trabalho, tempo livre e estudo. Segundo o autor, a paixão pelo trabalho auxilia na criatividade e com cargas reduzidas da jornada de trabalho, as necessidades emocionais e afetivas teriam mais atenção. Deve-se destacar que ociar não significa não pensar, o ócio criativo envolve trabalho mental. É importante destacar que de Masi ao defender o ócio criativo não se refere a todos os trabalhadores, mas àqueles que trabalham com a mente, com a organização, com a produção de ideias e todo tipo de trabalho imaterial (Correa,2002), isso não é uma libertação completa da classe trabalhadora. O ideal seria que todos tivessem direito a esse tempo e acesso a elementos que os ajudassem a criar e a ter contato com aquilo que criam de fato. Quanto mais se enriquece seus significados, mais se conhece e descobre coisas, mais pode modificar, criar e alterar sua realidade. 
A criatividade por mais que exigida e valorizada pelo mercado de trabalho, não é realmente incentivada. Dentro de perspectivas como a da psicologia cultural inspirada na teoria de Vygotsky, importante nome dentro dos estudos em educação e desenvolvimento, a criatividade é considerada um fruto tanto do meio, quanto do contexto histórico. Surge do domínio sociocultural como produto da interação do sujeito com seu ambiente. É definida em uma cultura e passa a ser elemento formador dessa mesma cultura. (Neves-Pereira, 2007) Sendo assim, pode ser incentivada ou inibida no processo de desenvolvimento e educação. Dentro das nossas escolas e no nosso dia-a-dia não somos acostumados a criar e pensar soluções e uma camada considerável da população acaba se distanciando daquilo que produzem, alimentando o processo de alienação e as desigualdades. 
A criação das tecnologias que deveriam nos auxiliar surgem segundo nossas necessidades dentro do nosso contexto e exigem da nossa criatividade. A tecnologia deveria ser um meio da nossaemancipação, mas se tornou um meio de dominação e manutenção de status. (Correa, 200) A educação precisa ser o meio de criar novas atitudes diante da passividade no tempo de ócio. Precisaria que o modelo fosse reconstruído não com vista apenas no trabalho, mas que o homem fosse visto numa totalidade, não apenas como um futuro operário.(Camillo,2011) O ócio precisa ser realizado voluntariamente e precisa envolver descanso, diversão e desenvolvimento. Exige também o tempo livre, e para isso o homem precisaria ser liberado de amarras que possam impedir seu tempo ocioso.(Camillo, 2011)
Conclusão
Dentro da lógica capitalista de produção não é visto um benefício no ócio além do consumo. O lazer e o tempo livre das pessoas são direcionados todo o tempo por interesses além dos delas e o trabalhador assalariado acaba sendo visto como também mercadoria vendendo suas horas de trabalho. A criatividade, que é outro conceito que deveria ser mais notado também na sociologia, traz uma perspectiva de mudança, mas sendo que a criatividade depende da nossa bagagem cultural e da nossa condição sócio-histórica, a educação deveria ser voltada para um ócio criativo, onde o trabalhador teria reais chances de emancipação. Criando o homem fica mais perto daquilo que produz. Infelizmente isto não é permitido ou bem visto na sociedade em que vivemos pelo ócio ser considerado "o pai dos vícios", sendo assim é um grande desafio a conquista de mais tempo livre para se expressar e mais condições para criar. 
Referências: 
Camillo, Eliane Juraski. "O ÓCIO COMO UM DIREITO PERPASSADO PELA EDUCAÇÃO." Reflexão e Ação 19, no. 1: 29-59., 2011
CORRÊA, Darcioni. Apologia do Ócio como Crítica da Sociedade do Trabalho. Dissertação (Mestrado em Sociologia Política) - Centro de Filosofia e Ciências Humanas, Universidade Federal de Santa Catarina, Florianópolis, 2002
FREIRE, J. C.. Proust e o uso do ócio: o avesso da pseudocultura.. Educação em Debate (UFC), Fortaleza-CE, v. 2, n.42, p. 69-76, 2001.
Gawryszewski, B. . A luta capitalista contra o ócio: a necessidade à um lazer consumista. Revista Digital 66. http://www.efdeportes.com/efd66/ocio.htm (Acessado em junho de 2017), 2003
Krüger, Carlos Eduardo, and Gilmar Antonio Bedin. "OS TRABALHADORES E O PAPEL DO DESCANSO, DO LAZER E DO ÓCIO EM SUAS VIDAS." Salão do Conhecimento 2, no. 2 ,2016.
MAYA, PVR. Trabalho e tempo livre: uma abordagem crítica. In JACQUES, MGC., et al. org. Relações sociais e ética [online]. Rio de Janeiro: Centro Edelstein de Pesquisas Sociais, 2008. p. 31- 47. . Available from SciELO Books < http://books.scielo.org
MARX, K.; ENGELS, F. Manifesto do Partido Comunista. 9. ed. Petrópolis, RJ: Vozes, 1999.
Neves-Pereira, M. S. 2007. Uma leitura histórico-cultural dos processos criativos: as contribuições de Vygotsky e da psicologia soviética. In A. M. R. Virgolim (Org.), Talento criativo. Expressão em múltiplos contextos (pp. 65-85). Brasília: Editora da Universidade de Brasília., 2007
RHODEN, Ieda. O ócio como experiência subjetiva: contribuições da psicologia do ócio.Rev. Mal-Estar Subj., Fortaleza , v. 9, n. 4, p. 1233-1250, dez. 2009 . Disponível em <http://pepsic.bvsalud.org/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S1518-61482009000400008&lng=pt&nrm=iso>. acessos em 01 jul. 2017.

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