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A NORMA DE DIPRI O método das normas de DIPRI é conhecido como método indireto, analítico ou sintético judicial, pois o seu objetivo é apenas resolver o “conflito de leis no espaço” e não resolver o problema de direito material subjacente, nem as questões processuais. As normas podem ser de dois tipos: diretas e indiretas. As normas diretas preveem um fato (hipótese de incidência) e apontam as suas consequências jurídicas. As normas indiretas apresentam uma matéria jurídica e a indicação do direito aplicável. Por exemplo: Art. 235. Deteriorada a coisa, não sendo o devedor culpado, poderá o credor resolver a obrigação, ou aceitar a coisa, abatido de seu preço o valor que perdeu. Art. 247. Incorre na obrigação de indenizar perdas e danos o devedor que recusar a prestação a ele só imposta, ou só por ele exeqüível. Art. 390. Nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato de que se devia abster. Art. 7o A lei do país em que domiciliada a pessoa determina as regras sobre o começo e o fim da personalidade, o nome, a capacidade e os direitos de família. Art. 8o Para qualificar os bens e regular as relações a eles concernentes, aplicar-se-á a lei do país em que estiverem situados. Art. 9o Para qualificar e reger as obrigações, aplicar-se-á a lei do país em que se constituírem. A norma indireta, a exemplo do art. 9º da LINDB não resolve o problema subjacente entre credor e devedor, mas tão somente o “conflito de leis no espaço”, isto é, determina o direito aplicável. Do que se conclui que a resolução do problema subjacente será encontrada aplicando-se o direito material apontado pelo DIPRI, no caso a lei do país em que se constituiu a obrigação. As normas de DIPRI são de natureza pública (ainda que indiquem, para a solução do problema subjacente, normas de direito material de natureza privada: de direito civil), pois elas se dirigem ao Estado (ao juiz). Elas não se destinam às partes, mas sim ao Estado, quando já instaurada a relação processual, e o juiz se pergunta qual é a lei aplicável, tendo em vista que ele está diante de um caso misto, multinacional. Estrutura da norma de Dipri: As normas de DIPRI apresentam 02 partes fundamentais: matéria e a indicação da lei aplicável. Ademais, entre os elementos acima e justamente para uni-los a norma de DIPRI apresenta um 3º elemento: o ELEMENTO DE CONEXÃO (exs: domicílio, lugar da constituição da obrigação, lugar da situação do bem e etc). O elemento de conexão vincula uma categoria (matéria) jurídica a uma ordem jurídica (país) de onde sairá o direito a ser aplicado. Este elemento está previamente determinado pelo legislador na norma: Hipótese de incidência + elemento de conexão + consequência jurídica. TÉCNICA DE RESOLUÇÃO DE CASOS DE DIPRI 1ª Etapa: qualificação. Qualificar o problema subjacente, que deu origem à controvérsia entre as partes e determinar a sua natureza jurídica (direito pessoal, direito de família, direito das sucessões, direitos reais, direito das obrigações e etc). 2ª Etapa : buscar a lei aplicável à solução do conflito de leis de acordo com a natureza jurídica 3ª Etapa : solução do problema subjacente. Aplicar a lei material do país indicada como aplicável pela Etapa 2ª. TEORIA DAS QUALIFICAÇÕES É o primeiro passo do juiz ou advogado: enquadrar os fatos da vida dentro de um determinado tipo jurídico dado pelo DIPRI. É um caso que está dentro do direito societário ou direito de família? É um caso de bens ou de obrigações? PROCESSO DE QUALIFICAÇÃO Definição: processo técnico-jurídico pelo qual se classifica ordenadamente os fatos da vida relativamente às instituições criadas pela Lei ou pelo Costume. Qualificar = conceituar + classificar. No DIPri: enquadrar o fato com elementos estrangeiros na norma de DIPRI. 1ª pergunta → que tipo de relação é essa? Contrato, responsabilidade civil, bens, direito de família, sucessões etc. 2ª pergunta → enquadrar a relação dentro de um elemento de conexão . Ex: se for uma relação de direito de família, aplica-se a lei do domicílio. Se for bens, é a lei da situação do bem. Se for contratos, a regra geral é a lei do local da celebração do ato. CONFLITO DE QUALIFICAÇÕES Definição: hipótese em que a qualificação dada aos fatos não coincide nos diferentes sistemas jurídicos aplicáveis. Ex: jurisdição 1 qualifica a questão como relativa à capacidade, e a jurisdição 2 a qualifica como atinente à validade de um contrato. Que qualificação deve ser obedecida pelo juiz – qualificação dada pelo sistema do foro ou a qualificação dada pelo ordenamento estrangeiro indicado pela regra de conexão como aplicável? Sistema do foro – lex fori . Sistema da lei estrangeira aplicável – lex causae . EXEMPLOS CLÁSSICOS DA JURISPRUDÊNCIA FRANCESA Ex. 1: o Caso Bartholo, ou a sucessão do maltês. Fatos: o casal Bartholo, originário da ilha de Malta, casou-se sem pacto antenupcial e seu primeiro domicílio conjugal foi Malta. Posteriormente emigraram para a Argélia, onde o marido veio a falecer. Eles não tiveram filhos, mas o marido deixou bens imóveis e outros herdeiros. Na Argélia vigia o direito francês e, por este direito, uma viúva não herdava nada. Em Malta, o cônjuge sobrevivente tinha o direito a receber ¼ do patrimônio deixado pelo falecido. A questão foi submetida ao Tribunal da Argel, capital da Argélia. A viúva só receberia ¼ dos bens do falecido se o caso fosse enquadrado como de regime matrimonial, pois neste caso incide a lei do primeiro domicílio conjugal (Malta). Mas se o caso fosse enquadrado como pretensão sucessória, o caso deveria ser regulado pela lei da situação dos bens, a lei argelina, que nada atribui à viúva. O caso deve ser qualificado como sendo de matéria sucessória ou de regime de bens? Ex. 2: o testamento ológrafo do holandês. Fatos: vedação da lei holandesa de fazer testamento ológrafo (particular). Um holandês assina um testamento ológrafo na França. Questão jurídica à corte francesa: pode a corte francesa reconhecer a validade deste testamento?Opção 1: qualificação da matéria como estatuto pessoal (capacidade), o testamento será nulo, pois a norma da Holanda que proíbe assinar um testamento particular acompanha o holandês aonde ele for. Esta é a posição do direito holandês. Opção 2: qualificação da matéria como forma dos atos jurídicos, o testamento será válido, pois em matéria de forma tudo depende da lei do local da realização do ato jurídico, e a lei francesa admite o testamento particular. Esta é a posição do direito francês. As diferentes qualificações encaminham o problema a regras de conexão diferentes e, por consequência, à aplicação de outro sistema jurídico. Ex. 3: o casamento do grego ortodoxo . Fatos: um grego ortodoxo casa-se no civil com francesa na França, desconsiderando a lei grega que exige a celebração religiosa do casamento. Este casamento é válido ou não? Se considerar-se que a celebração religiosa é uma questão de validade do casamento, estes fatos devem ser submetidos à lei da nacionalidade (lei grega), e o casamento não teria validade (direito grego). Mas se considerarem-se os fatos como uma questão de forma, deve ser aplicada a lei do local da celebração do ato, lei francesa, e o casamento será considerado válido (direito francês). DETERMINAÇÃO DA LEI QUALIFICADORA Questão: qual a lei competente para qualificar, na hipótese de as qualificações da matéria variarem? Não devemos confundir lei qualificadora com lei aplicável para resolver o problema jurídico. A → qualificação pela lex fori – a qualificação é dada pelo próprio sistema do foro, o ordenamento do juiz da causa. B → qualificação pela lex causae – a qualificação é dada pelo direito estrangeiro eventualmente aplicável. Existem críticas à escolha da lei estrangeira para qualificar os fatos jurídicos, pois, antes de saber se ela será ou não aplicável, é necessário qualificar os fatos. QUALIFICAÇÃO NO DIPRI BRASILEIRO Regra geral: qualificação pela lex fori . Exceção: qualificação pela lex causae. Artigos 8º e 9º LINDB. Fundamento: lei do local da situação dos bens e vontade tácita das partes de submeter o contrato à lei do local em que se constituiu. Na prática, o juiz brasileiro acaba qualificando sempre pela lei brasileira, sem levar em conta as exceções.
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