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3746-Texto do artigo-14698-1-10-20191120

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Revista Jurídica٠http://revistas.unievangelica.edu.br/RevistaJurídica/ v.19, n.1, jan-jun. 2019•p.33-
46.• DOI: https://doi.org/10.29248/2236-5788.2019v19i1.p33-46 
33 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
 
Self-mutilation Under The View Of Criminal Law: Crime Or Fundamental Law? 
 
 
Fabrício Wantoil Lima
1
 
José Roberto Bonome
2
 
Fernando Lobo Lemes
3
 
Sandra Cristina Rodrigues Lopes
4
 
 
 
Resumo: Este artigo dá destaque à problemática da automutilação entre crianças e 
adolescentes, por se tratar de uma prática recorrente na sociedade contemporânea. Partindo de 
considerações sobre a origem e subcategorias do ato de se automutilar, desenvolvemos uma 
reflexão sobre a proteção dos bens jurídicos tutelados, com especial ênfase ao núcleo 
essencial dos direitos fundamentais – a vida –, o qual deve ser interpretado de forma 
extensiva, uma vez que estes direitos fundamentais buscam garantir o cumprimento do 
preceito constitucional mais importante: a dignidade do homem, fonte primeira de atenção do 
ordenamento jurídico. Como tentativa de fazer dialogar autores da Psicologia e Direito, 
fazemos uma revisão bibliográfica do aporte teórico de cunho jurídico, analisando Costa 
(2010) e Greco (2010-2012) numa intersecção com textos de autores de concepção 
psicológica, como Giusti (2017) e Favazza (1996, 2007, 2009), no intuito de desvelarmos 
importantes aspectos no tocante à proteção do sujeito inimputável, a criança ou adolescente, e 
ressaltar o papel da jurisdição no cumprimento do que estabelece o Estatuto da Criança e do 
Adolescente - Lei 8069/90 acerca da Política de atendimento à criança e ao adolescente de 
maneira a realmente garantir a plena efetivação dos direitos infanto-juvenis. Por fim, 
procuramos chamar a atenção para a complexidade do comportamento automutilador e da 
necessidade de se viabilizar normas protetivas aos sujeitos praticantes deste ato, bem como a 
urgência de se criminalizar aqueles que de alguma forma incentivam a automutilação, no 
sentido de coibir essa prática. 
 
1
 Pós-Doutorando em Democracia e Direitos Humanos – Ius Gentium Conimbrigae/Centro de Direitos Humanos 
(IGC) da Faculdade de Direito da Universidade de Coimbra (FDUC), Coimbra, Portugal; Doutor em Ciências da 
Religião (PUC/GO) Goiânia-Goiás, Brasil; Mestre em Sociedade, Tecnologia e Meio Ambiente – Ciências 
Ambientais (UniEvangélica/GO) Anápolis-Goiás, Brasil; Especialista em Direito Penal, Direito Processual e 
Direito Público (Uniurv) Rio Verde-Goiás, Brasil; Professor Universitário do Curso de Direito da Faculdade de 
Anicuns (FAN) Anicuns-Goiás, Brasil; Professor do Centro Universitário de Anápolis (UniEvangélica) e da 
Faculdade Raízes (FR) Anápolis-GO, Brasil; E-mail: professorfwl@hotmail.com. CV: 
http://lattes.cnpq.br/8773334060667787. 
2
 Doutor em Estudos Comparados das Américas (UnB) Brasília-DF, Brasil; Professor e pesquisador no Centro 
Universitário de Anápolis (UniEvangélica) e Faculdade Raízes (FR) Anápolis-Goiás, Brasil; E-mail: 
bonomee@bol.com.br; CV: http://lattes.cnpq.br/3046622688636130. 
3
 Doutor em História pela Universidade Sorbonne Nouvelle – Paris 3, Paris, França; Professor do Programa de 
Pós-Graduação em Territórios e Expressões Culturais no Cerrado (TECCER) da Universidade Estadual de Goiás 
(UEG), Goiás, Brasil; Professor da Universidade Estadual de Goiás (UEG), Goiás, Brasil; Professor da 
Faculdade de Direito Raízes (FR) Anápolis-Goiás, Brasil; E-mail: fernandolobolemes@gmail.com; CV: 
http://lattes.cnpq.br/8574762759505644. 
4
 Graduanda em Direito pela Faculdade Evangélica Raízes, Mestranda em Educação, Linguagem e Tecnologia 
pela Universidade Estadual de Goiás - UEG. PPG-IELT– Anápolis-GO. Graduada em Letras pela Universidade 
Estadual de Goiás – UEG. Especialista em Docência Universitária pela Pontifícia Universidade Católica de 
Goiás – PUC-GO. Graduada em Psicologia pela Faculdade Anhanguera de Anápolis – FAA. Especialista em 
Terapia Familiar Sistêmica pela AVM – Faculdade Integrada do Rio de Janeiro. Professora da Rede Estadual de 
Educação de Goiás. Psicóloga (CRP 09/010532) de abordagem Sistêmica. Endereço para acessar este CV: 
http://lattes.cnpq.br/1200662254991364 E-mail para contato: onlytwt@gmail.com 
http://lattes.cnpq.br/1200662254991364
mailto:onlytwt@gmail.com
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
F.Wantoil
; 
J.R. Bonome; F. Lobo Lemes; Sandra C. R. Lopes 
 
Revista Jurídica٠http://revistas.unievangelica.edu.br/RevistaJurídica/ v.19, n.1, jan-jun. 2019•p.33-
46.• DOI: https://doi.org/10.29248/2236-5788.2019v19i1.p33-46 
34 
 
Palavras-Chave: Automutilação. Direito penal. Dignidade humana. ECA. Conduta lesiva. 
 
 
Abstract: This article highlights the contemporary problem of self - mutilation, seeking to 
develop a reflection on the protection of protected legal interests, with special emphasis on 
the essential core of fundamental rights - life -, which must be interpreted extensively, since 
these fundamental rights seek to guarantee compliance with the most important constitutional 
precept: the dignity of man, the primary source of attention of the legal order. Considering the 
legal and theoretical contributions of authors from the area of Psychology, important aspects 
are revealed regarding the protection of the unimpeachable subject, the child or adolescent, 
highlighting the role of the jurisdiction in the fulfillment of the Statute of the Child and 
Adolescent - Law 8069/90 on the Policy of assistance to children and adolescents in order to 
truly ensure the full realization of children's rights. Throughout the text we seek to draw 
attention to the complexity of self-mutilating behavior and the need to provide protection 
standards to the subjects practicing this act, as well as the urgency to criminalize those who in 
some way encourage self-mutilation in order to curb this practice. 
Keywords: Self-mutilation. Criminal law. Human dignity. ECA. Harmful conduct. 
 
 
Introdução 
 
O homem moderno experimenta uma sociedade movida pela constante 
necessidade de o sujeito apreender o olhar do outro, na mesma medida em que esse sujeito se 
projeta nesse olhar. Percebemos, nesse sentido, o que Laender (2012), identificou como 
“sociedade espetáculo”, em que o sujeito só existe quando é notado pelo outro, a partir das 
relações mediadas pelos corpos, já que o corpo humano é tido nessa sociedade, como o 
primeiro receptor das relações. 
Nesse contexto, o indivíduo moderno usa o corpo para demarcar o lugar do sentir, 
hipervalorizando-o e o envolvendo em experiências extremas como forma de se projetar para 
a vida e responder às demandas de prazer e de completude. 
Há, portanto, na relação indivíduo e corpo, uma distorção da imagem corporal, 
uma vez que a sociedade privilegia a imagem, dando vasão à “cultura do narcisismo”, de 
modo que a subjetividade é sempre captada pelo olhar do outro, fragmentada e objetificada 
(LAENDER, 2012). 
Vivemos, assim, a busca pelo ideal narcísico da imagem refletida, capaz de ser 
notada, incluída, vista e aceita (BIRMAN, 2003). O problema é quando, por vezes, o sujeito 
se perde na sua própria imagem e passa a vivenciar uma teatralidade, um elemento singular 
recente das relações contemporâneas. 
O presente artigo tem como objetivo central discutir alguns aspectos que 
consideramos relevantes acerca do comportamento da automutilação, principalmente no que 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
F.Wantoil
; 
J.R. Bonome; F. Lobo Lemes; Sandra C. R. Lopes 
 
Revista Jurídica٠http://revistas.unievangelica.edu.br/RevistaJurídica/ v.19, n.1, jan-jun. 2019•p.33-
46.• DOI: https://doi.org/10.29248/2236-5788.2019v19i1.p33-46 
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concerne à relação do sujeito com a sua imagem corpórea e às formas com que este sujeitolida com o corpo buscando transformá-lo em um veículo para comunicar suas angústias, seus 
conflitos e suas dores. Por outro lado, tratamos também, de modo reflexivo, dos aspectos 
jurídicos em torno da criminalização do comportamento automutilador. 
Na modalidade de um artigo de reflexão teórica, propomos estudar este tema a 
partir da análise de textos de cunho psicológico e da área jurídica, realizando uma revisão 
bibliográfica. 
A automutilação autodirigida, de caráter não suicida, ainda hoje se mantém entre 
os tabus e a discrição de quem não se quer ou não se pode mostrar. Conforme Guisti (2013), a 
automutilação “se refere à imposição de danos e/ou dor, de forma deliberada, às partes 
corpóreas sem intenção suicida”. 
A automutilação é considerada, também, como um comportamento disfuncional, 
podendo ser entendida como um mecanismo de autorregulação em face de estados emocionais 
negativos, como forma de comunicar dores e conflitos afetivos ou, ainda, como meio de se 
fazer perceber ao outro. (GUISTI, 2013). 
Vários estudos (SCARAMOZZINO, 2004; GAUTHIER, 2007; JAFFRÉ, 2008) 
alertam para o fato de que, em virtude de se tentar buscar um alívio psíquico para dores, 
conflitos e sintomas psicopatológicos o sujeito realiza cortes superficiais na própria pele, 
arranha-se, morde os lábios, arranca os cabelos, queima-se, debate-se contra a parede ou 
superfícies rígidas, perfura-se com objetos pontiagudos entre outras formas de autoagressão. 
Favazza (2009), esclarece que os atos de automutilação “servem como forma de 
expressão de uma dor ou de uma angústia que o sujeito não consegue nominar”. Todavia, há 
que nos questionarmos como o ato da automutilação é entendido não só pela Psicologia, mas 
pelas ciências jurídicas também, haja vista o bem-estar humano e a integridade física serem 
objetos de estudo dos Direitos Humanos, sendo compreendidos como um bem jurídico 
tutelado e, por isso mesmo, devem ser salvaguardados. 
Na esfera do Direito Penal, o princípio da humanidade costuma ser tratado como 
um limite negativo à imposição de determinados tipos de sanção penal, consideradas cruéis ou 
privativas do mínimo exigido para a dignidade humana (SMANIO, 2002). Porém, segundo 
Teles (2004), o princípio da humanidade significa também impor limites em preceitos penais 
incriminadores de condutas que são reveladoras de uma condição humana indigna. 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
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J.R. Bonome; F. Lobo Lemes; Sandra C. R. Lopes 
 
Revista Jurídica٠http://revistas.unievangelica.edu.br/RevistaJurídica/ v.19, n.1, jan-jun. 2019•p.33-
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Para além disso, Ávila (2003) assevera que a lei aparece como o instituto 
criminalizador de certas condutas, em que não criminaliza o desvalor da ação ou do resultado, 
mas criminaliza a condição de privação de indignidade compreendida por trás desta conduta. 
Em tese, o princípio da dignidade da pessoa humana deve buscar a vida digna e 
plena. Diante disto, entendemos que o mínimo existencial não deve ser um mínimo vital. Há 
que se cumprir o preceito constitucional mais importante, que é a dignidade do homem. 
Entretanto, questionamos o porquê, mesmo diante do avanço da prática da 
automutilação, sobretudo nas escolas e colégios brasileiros, ainda não existe uma lei 
realmente efetiva na prevenção e como forma de coibir tais comportamentos? Isto é, sabemos 
que existe uma lacuna jurídica no que tange à proteção da saúde psicológica e também física 
de nossas crianças e adolescentes, mas o sistema jurídico se mostra apático e letárgico. 
Postas tais premissas, buscamos sistematizar o texto em três momentos: o 
primeiro momento compreende a temática sobre a automutilação e suas subcategorias, para 
que possamos delinear o contorno deste transtorno comportamental. O segundo momento 
dedica-se a considerar as proposições acerca do bem jurídico tutelado – vida –, e seus 
desdobramentos, bem como a posição do Direito Penal brasileiro sobre a automutilação. No 
terceiro e último momento, buscamos tecer uma discussão acerca do aspecto jurídico da 
automutilação no Brasil, trazendo considerações do Estatuto da Criança e do Adolescente 
(ECA) e de um projeto de lei do Senador Ciro Nogueira (PP-PI), destinado a tipificar o crime 
de induzimento, instigação ou auxílio à automutilação de crianças ou adolescentes. 
 
1 Delineando A Automutilação E Suas Subcategorias 
 
A automutilação pode ser entendida, dependendo do caso, como uma doença 
psiquiátrica ou de cunho emocional, uma vez que inúmeras pesquisas associam sua prática ao 
fato de o automutilador buscar alívio para problemas emocionais ou como uma forma de 
expressão de dores e conflitos internalizados pelo sujeito, o qual não consegue externalizá-los 
por meio de palavras. De acordo com Favazza (2007), a automutilação “não é uma prática 
recente, já que há muito tempo se inscreve na história”. 
Segundo estudos deste autor, a automutilação sempre acompanhou a evolução 
humana, sendo observada em sociedades tribais, em rituais de passagem em grupos étnicos 
africanos ou na mitologia grega, em que casos de automutilação masculina eram frequentes. 
Por outro lado, nos tempos antigos, algumas religiões pregavam que o sofrimento e a dor 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
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física eram capazes de expurgar o mal e a purificar a alma. Entretanto o primeiro relato 
científico sobre automutilação data de 1901, segundo pesquisa realizada por Favazza (2009). 
A automutilação pode ser descrita, então, como uma conduta em que o sujeito 
executa atos de se machucar ou de fazer mal a si mesmo, sem que haja a intenção de suicídio. 
Comumente, o comportamento automutilador é iniciado na adolescência, tendo como forma 
mais comum da violência autodirigida, conforme Giusti (2013): 
 
[...] os cortes na pele, as ações de bater, pontapear, arranhar e queimar os 
braços e o abdômem, fazer cortes superficiais no corpo, esmurrar-se, 
enforcar-se por alguns instantes, morder as próprias mãos, língua, braços e 
lábios, apertar ou reabrir feridas, queimar-se com cigarro ou produtos 
químicos (geralmente sal e gelo), furar-se com agulhas, pregos, canetas, 
envenenar-se (exagerar na dose de remédios), entre outaras formas 
(GIUSTI,2013, p. 6). 
 
De acordo com o Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais 
(DSM-5) e também conforme a Classificação Estatística Internacional de Doenças e 
Problemas Relacionados à Saúde (CID-10), a automutilação circunscreve-se na categoria de 
transtornos dos hábitos e dos impulsos. 
A pesquisa mais extensiva sobre quem são os automutiladores e a prática 
recorrente da automutilação foi realizada por Amando Favazza, um professor de psiquiatria da 
Universidade de Missouri, em Columbia. (STRONG, 1998). 
Favazza (1996), em seu livro Bodies under Siege, classificou a automutilação em 
três categorias: “grave, estereotipada e a superficial/moderada”. A automutilação grave 
compreende os atos mais danosos como a amputação de membros, a castração ou a remoção 
dos próprios olhos. 
A automutilação estereotipada inclui atos como bater a cabeça repetitivamente, 
morder-se e se arranhar. Já a automutilação superficial/moderada foi classificada, segundo 
Favazza (1996), em três subtipos: compulsivo; episódico e repetitivo. Os atos de se cortar, 
queimar-se e quebrar os próprios ossos tanto se enquadram como episódicos como repetitivos. 
O que os difere e a frequência e também a importância que esses atos assumem na vida do 
sujeito. 
No tocante à automutilação compulsiva, esta se refere aos comportamentosautomáticos que surgem em resposta a uma angústia e/ou desejo de se machucar com o intuito 
de promover um alívio das dores ou conflitos psíquicos. Nesta subcategoria, há recorrentes 
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estudos sobre a tricotilomania (ato repetitivo e deliberado de arrancar os próprios cabelos da 
cabeça, sobrancelhas ou partes genitais). 
Buscarmos compreender as razões de um sujeito realizar atos lesivos contra o 
próprio corpo é muito importante, na medida que, compreendendo esses eventos, poderemos 
ajudar de algum modo. Entretanto, há que nos questionarmos sobre a simbologia presente no 
comportamento automutilante. Seria uma conduta suicida, um pedido de socorro ou um crime 
praticado contra a própria integridade física? 
Ademais, ao procurarmos compreender a simbologia por trás do comportamento 
automutilador, desvela-se outro fator de extrema relevância, que é entender como se dá o 
aspecto jurídico de proteção à dignidade do ser humano, uma vez que a automutilação tem 
consequências graves para a vida pessoal e também social do sujeito automutilado. 
Destarte, as pesquisas realizadas com crianças e adolescentes trazem relatos 
recorrentes de sujeitos fragilizados, os quais evitam o convívio social, temendo exposições 
das marcas deixadas pela automutilação. Além disso, é comum que esses sujeitos evitem 
eventos esportivos ou de lazer; são introspectivos e têm imensa dificuldade de falar do 
problema, isolando-se e, em sua maioria, desenvolvendo quadros de depressão severa, em 
virtude dos constantes episódios automutilantes (GIUSTI, 2013, p. 20). 
Há um consenso, entre os profissionais de saúde, de que o transtorno 
automutilante carece de mais atenção e estudos, além de um olhar mais acurado sobre o lugar 
da dor do outro. 
 
2 O Direito Penal Brasileiro E A Automutilação - Bens Jurídicos Tutelados 
 
A essência do Direito Penal é a proteção aos bens jurídicos tutelados, que são os 
bens jurídicos fundamentais. Conforme Teles (2004, p. 46) são bens jurídicos “avida, a 
liberdade, o casamento, a família, a honra, a saúde, enfim, todos os valores importantes para a 
sociedade” e ainda “bens jurídicos são valores éticos sociais que o Direito seleciona, com o 
objetivo de assegurar a paz social, e coloca sua proteção para que não sejam expostos a perigo 
de ataque ou a lesões efetivas” (TELES, 2004, p. 48). 
É importante ressaltarmos que não é efetivamente o legislador que cria esses bens, 
pois eles já preexistem e o legislador somente lhes confere tutela jurídica, ao transformar 
esses bens em bens jurídicos. 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
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Revista Jurídica٠http://revistas.unievangelica.edu.br/RevistaJurídica/ v.19, n.1, jan-jun. 2019•p.33-
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Nesse sentido, quando os comportamentos que os violam ou os fizerem perigar, 
tais comportamentos devem ser objeto de uma reação penal, por agredirem o bem jurídico 
protegido penalmente. Assim, o bem jurídico é, portanto, a pedra angular do Direito de ultima 
ratio já que manifesta a valoração pessoal ou comunitária que é relevante para o direito. 
(COSTA, 2010, p. 169). 
Posto isto, dá-se a entender que o direito de ultima ratio visa, primordialmente, 
garantir o desenvolvimento das relações e da convivência social, mediante à proteção de bens 
jurídicos fundamentais que, uma vez lhes sendo reconhecida a dignidade penal, passaram a 
ser bens jurídico-penais. 
Nesse sentido, normalmente, só os bens jurídicos carregados de interesses 
individuais concretos como a vida e a integridade física podem ser tutelados pelo direito 
penal. Nessa perspectiva, Costa (2010, p. 36) sustenta que o indivíduo é o “ epicentro de todo 
o ordenamento jurídico e, assim, o Estado se apresenta sempre a serviço do cidadão”. Isto é, 
na relação antropológica de cuidado e proteção aos perigos surgem os bens individuais e 
também o zelo com o plural, com as relações sociais 
Assim, de acordo com Greco (2012), o legislador irá criminalizar, ou seja, 
considerar uma conduta típica, ilícita e culposa à luz dos valores da sociedade, dentro dos 
preceitos axiológicos constitucionais e, a partir disso, poder circunscrever se determinada 
conduta praticada pelo sujeito/agente constitui um crime. Semelhantemente, ocorrerá quando 
legislador deixar de considerar uma conduta típica, ilícita e culposa; isto é, descriminalizar 
determinada conduta segundo os critérios coletivos de determinada época ou momento 
histórico. 
Logo, o que questionamos é se o Direito Penal contemporâneo abarcará a 
pretendida justiça aclamada pela sociedade atual, no que tange ao bem jurídico vida e/ou 
integridade física da pessoa. 
O ordenamento jurídico brasileiro, embasado no Art. 13, do Código Civil, veda 
automutilações que acarretem diminuição permanente da integridade física ou contrariem os 
bons costumes, mas não há atenção para as lesões menores e frequentes. Entretanto, o 
principio penal da lesividade não pode deixar de ser relacionado, ao nosso ver, com o da 
dignidade da pessoa humana pois, em certa medida e conforme os postulados de Ferrajoli 
(2002, p. 46), “o princípio da lesividade desemboca na dignidade humana”. 
Contudo, Mello (2004) assevera que, 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
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a partir do momento em que é assegurado, a cada ser humano, o direito à 
liberdade, como princípio básico do Estado Democrático de Direito, não se 
pode incriminar condutas que representem mera expressão dessa liberdade, 
que não interfiram em qualquer bem jurídico alheio, por mais escandalosas 
ou desviadas que sejam (MELLO, 2004, p. 178). 
 
Assim sendo, entendemos que se houver a necessidade de restabelecimento da 
ordem jurídica violada, basta-se conclamar medidas civis ou administrativas e não as medidas 
penais, uma vez que, por seu teor extremo, a intervenção penal deve ser aplicada quando 
irrestritamente indispensável. Isto é, só recorremos às sanções penais quando as medidas 
extrapenais forem insuficientes para solucionar o conflito. 
Retomando o conteúdo consoante ao disposto no Art. 13, do Código Civil 
Brasileiro, o qual proíbe o sujeito de dispor do próprio corpo, quando isto lhe resultar em 
diminuição permanente da integridade física e mutilações, é importante ressaltarmos que os 
dispositivos fixados pelo referido Código, podem não ser aptos, sozinhos, a proteger a 
personalidade de acordo com a sua dimensão valorativa. 
Outrosim, segundo Teles (2004), a eficácia da tutela jurídica da pessoa, nos 
termos de que trata o Código Civil, dependerá de uma atividade hermenêutica capaz de 
garantir subsídios à garantia dos imperativos constitucionais da dignidade humana. 
No mais, depreendemos acerca deste tema, que por ser a saúde e/ou integridade 
física um bem jurídico tutelado, caberá ao Estado, por meio de políticas públicas, encarregar-
se do tratamento necessário e também na tarefa de viabilizar campanhas de conscientização 
acerca do comportamento automutilador, já que estes comportamentos ferem os princípios da 
dignidade da pessoa humana. 
Por outro lado, a Constituição Brasileira tem como princípio basilar a dignidade 
humana e a pluralidade (CF, Artigo 1º, III e V), que afastam a criminalização de qualquer 
comportamento que não coloqueem risco bens jurídicos de terceiro, mesmo que afete a saúde 
a integridade ou a própria vida do agente. 
Assim, no ordenamento jurídico brasileiro, tanto a automutilação (exceto na 
hipótese do Art. 171, § 2º. V do CP) quanto o suicídio, estes não são apenados, haja vista não 
serem considerados condutas tipificadas no Código Penal. Isto é, ambos não configuram 
ilícito penal. Acerca disso, Rogério Greco (2010) sustenta que: 
Se o indivíduo tentou contra a própria vida por não mais suportar alguns 
momentos tormentosos, quando ainda estava em liberdade, quem dirá 
quando for colocado em cárcere [...] tal comportamento não atinge bens de 
terceiros, senão os do próprio agente, da mesma forma que não pode o 
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
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Estado punir, também por intermédio do Direito Penal, as automutilações 
(GRECO, 2010, p. 188). 
 
A situação jurídica no que tange à automutilação é, dessa forma, muito bem 
posta pelo legislador. Não há o que se fazer, em virtude de a própria legislação refutar a 
criminalização do ato de se automutilar. Porém, é evidente a urgência no aperfeiçoamento 
do nosso Código Penal, haja vista os constantes casos registrados de crianças e adolescentes 
que se automutilam. Porque, embora a automutilação não constitua um ilícito penal, ela é 
considerada um fato antijurídico, já que a vida e a integridade física são bens públicos 
indispensáveis. 
Portanto, conquanto o Código Penal não incriminar a ação de dispor do próprio 
corpo, consequentemente, da vida, toda e qualquer conduta que vise à destruição da vida 
alheia é considerada crime. 
 
3 Propondo A Tutela Jurídica Da Integridade Corpórea Da Criança E Do Adolescente 
 
A Declaração Universal dos Direitos Humanos foi instituída pela Organização das 
Nações Unidas (ONU), em 1948, objetivando combater as barbáries do pós-Guerra. Através 
de suas ações, urgiu a necessidade de os Estados repensarem as suas políticas sociais. 
Nesse contexto, houve um particular interesse em socorrer as crianças vítimas da 
Guerra, dando início à UNICEF, uma agência da ONU voltada para a proteção dos interesses 
das crianças e também dos adolescentes, sobretudo as vítimas da fome, da miséria e das 
doenças. 
Atuando no Brasil desde a década de 1950, a UNICEF tem implementado, junto 
aos governos e sociedade civil, metas concernentes a diversos setores, principalmente no que 
tange à saúde. Para isso, a sua meta mais importante é colocar as crianças e os adolescentes 
como prioridade das políticas públicas. 
Somando-se a esses pressupostos, temos também as garantias fundamentais 
asseveradas na Constituição Federal de 1988, no Título VIII, em que a proteção à criança e ao 
adolescente foi normatizada como status constitucional, impondo à família e ao Estado o 
dever de assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito à vida e à 
saúde. (Art. 227, caput, CRFB). 
http://www.jusbrasil.com.br/legislacao/1033702/c%C3%B3digo-penal-decreto-lei-2848-40
A Automutilação Sob A Ótica Do Direito Penal: Crime Ou Um Direito Fundamental? 
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Objetivando a normatização integral da tutela das crianças e adolescentes, foi 
promulgada em 1990 a lei 8.069, denominada de Estatuto da Criança e do Adolescente 
(ECA). Este estatuto, com base nas diretrizes constitucionais, incorporou uma série de 
normativas internacionais como a Declaração dos Direitos da Criança. 
Segundo o ECA, adolescente é a pessoa com idade entre 12 e 18 anos. Já 
conforme o seu art. 2º, consideram-se crianças a pessoa até 12 anos de idade incompletos. 
Assim, se tanto a criança quanto o adolescente, como pessoas que são, gozam de todos os 
direitos fundamentais garantidos pela Constituição Federal e também pela legislação especial 
(ECA e demais convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário), fica notório a 
necessidade de leis especificas destinadas à criminalização do induzimento, instigação ou 
auxílio a automutilação, como já acontece no tocante ao suicídio, segundo o artigo 122 do 
código penal: 
Induzimento, instigação ou auxílio a suicídio 
Art. 122 - Induzir ou instigar alguém a suicidar-se ou prestar-lhe auxílio para 
que o faça: 
Pena - reclusão, de dois a seis anos, se o suicídio se consuma; ou reclusão, 
de um a três anos, se da tentativa de suicídio resulta lesão corporal de 
natureza grave. 
Parágrafo único - A pena é duplicada: 
Aumento de pena 
I - se o crime é praticado por motivo egoístico; 
II - se a vítima é menor ou tem diminuída, por qualquer causa, a capacidade 
de resistência. 
 
O Senador Ciro Nogueira, consternado com os frequentes relatos de casos de 
automutilação veiculados na mídia nacional, apresentou à comissão de Direitos Humanos e 
Legislação Participava (CDH) o Projeto de Lei do Senado (PLS) nº 664, de 2015, propondo o 
acréscimo do art. 244-C à Lei nº 8069, de 13 de julho de 1990 – Estatuto da Criança e do 
Adolescente, para tipificar o crime de induzimento, instigação ou auxílio à automutilação de 
criança ou adolescente. 
A proposição do Senador se deu mediante a justificativa de que houve um 
crescente número de grupos nas redes sociais voltados a estimular a prática do 
comportamento automutilador. De acordo com o autor do Projeto de Lei, com a 
criminalização do induzimento, instigação ou auxilio a automutilação os grupos que 
incentivam os jovens a lesionar o próprio corpo serão desestimulados, acarretando uma 
diminuição desta prática (Senado Federal, 2016). 
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É latente a legitimidade do PLS Nº 664, de 2015, uma vez que as crianças e os 
adolescentes, por serem mais vulneráveis e influenciáveis ante as demandas sociais de apelo à 
aceitação grupal, são passivos de praticarem o comportamento automutilador, principalmente 
se houver quem os induzam. 
Assim, verificamos o quanto se faz necessária a adequação das leis às condutas 
comportamentais deflagradoras de desajustes físicos ou psíquicos, reclamando a atuação do 
legislativo no sentido de suprir essas lacunas. 
 
Considerações Finais 
A reflexão sobre a eficácia da lei penal, no sentido de proteção dos bens jurídico 
tutelados, sobretudo no que tange à proteção da vida de crianças e adolescentes se faz 
necessária e urgente, dadas as condições de enfrentamento dos comportamentos 
automutilantes nos dias presentes. 
O que vemos, hoje, é uma sociedade demarcada pela indiferença. O que é mais 
degradante, ainda, por uma indiferença assintomática reprodutora da barbárie. Esta, por sua 
vez, é manifestada em suas múltiplas formas de expressão, capturando e aprisionando o 
sujeito, fazendo-o refém de si mesmo, pois há neste sujeito um medo descomunal de se 
relacionar e de se revelar ao outro. 
Entretanto, neste artigo além de buscamos analisar o fenômeno da automutilação 
sob a ótica de uma psicopatologia ou doença, nós nos esforçamos também para explicitá-lo 
como um acometimento fenomênico relacional sugestivo. Destarte, constatamos que a 
automutilação surge e se manifesta enquanto um transtorno semiológico catalogado no DSM-
5, bem como na CID-10. Porém, o que nos interessa não pode ser reduzido à simples 
estatística,mas perpassa o campo psiquiátrico e desemboca nos mais variados campos, uma 
vez que a automutilação, qual um espectro que ronda a adolescência, acontece também na 
escola, preocupando pais, professores, coordenadores pedagógicos e demais profissionais da 
educação. Os casos relatados demonstram a preocupação dos profissionais da educação no 
tocante à escalada da automutilação na idade escolar. 
A constitucionalização do direito no Brasil, a partir da Constituição Federal de 
1988, deu início a um novo paradigma jurídico, agora mais centrado na dignidade da pessoa 
humana. De modo semelhante, o Código Civil de 2002 pretendeu encerrar o máximo respeito 
da dignidade humana e, para tanto, além de reformular-se em suas disposições normativas, 
dedicou-se a uma revisão na sua interpretação. 
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Diante dos contornos delineados no decorrer deste, verificamos que a prática de 
automutilação não é recente, mas recorrente na história da humanidade. Entretanto, se na 
antiguidade, os indivíduos se feriam no cumprimento de atos ritualísticos, hoje os ferimentos 
automutilantes não exigem, necessariamente, um ritual. Inscrevem-se, por seu turno, enquanto 
resposta ao sofrimento psíquico instalado nas tessituras da pós-modernidade, provocando uma 
falha no processo de significação. 
Nesse contexto, porém, as tensões concretas entre as lógicas modernas e pós-
modernas evidenciam práticas sociais que desafiam tanto a tipificação expressa dos direitos 
da personalidade quanto o tratamento via cláusula geral de tutela. A cada momento novos 
riscos à personalidade humana aparecem e demandam novos direitos da personalidade para 
seu tratamento. 
Empreender forças para se barrar os atos de autoagressão cometidos por nossos 
jovens e crianças nada mais é que zelar pela saúde pública, uma vez que tais atos se 
amolduram nas relações sociais vigentes, carregadas de um profundo sentimento de 
indiferença pela dor do outro. Assim, propor leis que buscam tipificar o crime de 
induzimento, instigação ou auxílio à automutilação de criança ou adolescente é, além de um 
dever da sociedade, uma obrigação do Estado. 
 
 
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