Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
3.5 3.5.1 atual vem, portanto, afastando tal requisito. Quando da III Jornada foi aprovado o Enunciado n. 188, também aplicável ao tema, com a seguinte redação: “A existência de negócio jurídico válido e eficaz é, em regra, uma justa causa para o enriquecimento”. Pelo enunciado doutrinário, presente um contrato válido e gerando efeitos que trazem o enriquecimento de alguém, em regra, não se pode falar em locupletamento sem razão. Isso desde que o contrato não viole os princípios da função social e da boa-fé objetiva e também não gere onerosidade excessiva, desproporção negocial. Categoricamente, o enriquecimento sem causa não se confunde com o enriquecimento ilícito. Na primeira hipótese, falta uma causa jurídica para o enriquecimento. Na segunda, o enriquecimento está fundado em um ilícito. Assim, todo enriquecimento ilícito é sem causa, mas nem todo enriquecimento sem causa é ilícito. Um contrato desproporcional pode não ser um ilícito e gerar enriquecimento sem causa. Determina o art. 885 do CC que a restituição é cabível não só quando não existir causa para o pagamento, mas também quando esta deixar de existir. Como exemplo pode ser citada uma situação em que a lei revoga a possibilidade de cobrança de uma taxa. A partir do momento desta revogação, o valor não pode mais ser cobrado, pois, caso contrário, haverá conduta visando ao enriquecimento sem causa, tornando possível a restituição. Caso a lei forneça ao lesado outros meios para a satisfação (ressarcimento) do prejuízo, não caberá a restituição por enriquecimento, segundo o art. 886 do CC. O dispositivo realça o caráter subsidiário da ação de enriquecimento sem causa. Ilustrando, sendo possível a ação de reparação de danos, uma vez que alguém recebeu um imóvel indevidamente e que veio a se perder, será esse o caminho a ser seguido. Anote-se que, doutrinariamente, foi aprovado o Enunciado n. 36, na I Jornada de Direito Civil, com o seguinte teor: “O art. 886 do novo CC não exclui o direito à restituição do que foi objeto de enriquecimento sem causa nos casos em que os meios alternativos conferidos ao lesado encontram obstáculos de fato”. Em suma, eventualmente, a ação fundada no enriquecimento sem causa deve ser tida como primeira opção, o que demanda análise casuística. Fica em dúvida o caráter subsidiário da citada demanda. PRINCIPAIS CLASSIFICAÇÕES DAS OBRIGAÇÕES. MODALIDADES PREVISTAS NO CÓDIGO CIVIL DE 2002 Classificação da obrigação quanto ao seu conteúdo ou prestação De acordo com o conteúdo da prestação, a obrigação pode ser positiva ou negativa. Será positiva 3.5.1.1 a) b) quando tiver como conteúdo uma ação (ou comissão) e negativa quando relacionada com uma abstenção (ou omissão). Filiam-se entre as primeiras a obrigação de dar e fazer. A obrigação de não fazer é a única negativa admitida em nosso ordenamento jurídico. Quando o conteúdo obrigacional estiver relacionado com uma coisa, determinada ou determinável, a obrigação é de dar. Quando uma tarefa positiva ou uma abstenção estiver nela presente, haverá uma obrigação de fazer e de não fazer, respectivamente. Todas essas obrigações constam do esquema a seguir: Vejamos, então, o seu estudo pontual. Obrigação positiva de dar A obrigação positiva de dar pode ser conceituada como aquela em que o sujeito passivo compromete-se a entregar alguma coisa, certa ou incerta. Nesse sentido, há na maioria das vezes uma intenção de transmissão da propriedade de uma coisa, móvel ou imóvel. Assim sendo, a obrigação de dar se faz presente, por exemplo, no contrato de compra e venda, em que o comprador tem a obrigação de pagar o preço e o vendedor de entregar a coisa. A obrigação de dar, pelo que consta do atual Código Civil, é subclassificada em duas modalidades: obrigação de dar coisa certa, também denominada obrigação específica; obrigação de dar coisa incerta ou obrigação genérica. Vejamos quais as regras e consequências jurídicas relacionadas com tais modalidades obrigacionais. a) Obrigação de dar coisa certa (arts. 233 a 242 do CC) Está presente nas situações em que o devedor se obrigar a dar uma coisa individualizada, móvel ou imóvel, cujas características foram acertadas pelas partes, geralmente em um instrumento negocial. Na compra e venda, por exemplo, o devedor da coisa é o vendedor e o credor, o comprador. A determinação do objeto justifica a denominação obrigação específica. Na obrigação de dar coisa certa, o credor não é obrigado a receber outra coisa, ainda que mais valiosa, conforme consta no art. 313 do CC em vigor, velha aplicação da máxima nemo aliud pro alio invito creditore solvere potest. Ilustrando a aplicação do dispositivo, cumpre transcrever julgado do Tribunal de São Paulo: “Rescisão contratual. Loteamento. Pleito fundado na inadimplência contratual da compromissária-vendedora. Superveniente desapropriação que inviabilizou a entrega do lote adquirido pelo autor. Cabimento da rescisão. Autor que não é obrigado a aceitar outro lote, ainda que mais valioso. Inteligência do artigo 313 do Código Civil. Necessária restituição integral e imediata das parcelas pagas. Retorno das partes ao status quo ante. Descabimento, todavia, da aplicação de multa cominatória diante da ocorrência de caso fortuito. Juros moratórios, ademais, que devem ser computados a partir da citação. Recurso provido em parte” (TJSP, Apelação com Revisão 415.544.4/8, Acórdão 4127884, Mogi- Mirim, 6.ª Câmara de Direito Privado, Rel. Des. Sebastião Carlos Garcia, j. 15.10.2009, DJESP 24.11.2009). Na mesma linha, de julgado publicado no Informativo n. 465 do STJ extrai-se exemplo a respeito da entrega de grãos, com conteúdo bem interessante: “Consignatória. Dinheiro. Coisa devida. Trata-se de REsp em que se discute a possibilidade de, em contrato para entrega de coisa certa (no caso, sacas de soja), utilizar-se a via consignatória para depósito de dinheiro com força liberatória de pagamento. A Turma negou provimento ao recurso sob o fundamento de que somente a entrega do que faltou das sacas de soja seria eficaz na hipótese, visto que o depósito em numerário, estimado exclusivamente pelo recorrente do quanto ele entende como devido, não pode compelir o recorrido a recebê- lo em lugar da prestação pactuada. Vale ressaltar que o credor não é obrigado a receber a prestação diversa da que lhe é devida, ainda que mais valiosa. Dessarte, a consignação em pagamento só é cabível pelo depósito da coisa ou quantia devida. Assim, não é possível ao recorrente pretender fazê-lo por objeto diverso daquele a que se obrigou” (STJ, REsp 1.194.264/PR, Rel. Min. Luis Felipe Salomão, j. 1.º.03.2011). De acordo com o art. 233 do CC/2002, a obrigação de dar coisa certa abrange os acessórios, salvo se o contrário resultar do título ou das circunstâncias do caso. Pelo que consta em tal dispositivo, continua em vigor o princípio pelo qual o acessório segue o principal (accessorium sequitur principale) – princípio da gravitação jurídica. Como acessórios, devem ser incluídos os frutos, os produtos, as benfeitorias e as pertenças que tenham natureza essencial, essas últimas nos termos do art. 94 da codificação atual. Pois bem, o que interessa substancialmente em relação às obrigações de dar coisa certa são as regras que apontam as consequências do inadimplemento, o que inclui a obrigação de restituir coisa certa. Assim, oito são as regras que merecem estudo a seguir: 1.ª Regra – Havendo obrigação de dar coisa certa e perdendo-se a coisa sem culpa do devedor, antes da tradição ou pendente condição suspensiva, resolve-se a obrigação para ambas as partes, sem o pagamento das perdas e danos (art. 234, primeira parte, do CC). A expressão resolver significa que as partes voltam à situação primitiva, anterior à celebração da obrigação. Exemplificando, convenciona-se a venda de um cavalo, com pagamento antecipado do preço. No dia anterior à entrega, o cavalo morre atingido por um raio. Nesse caso, o preço pago deverá ser devolvido, sem qualquer indenização suplementar. 2.ª Regra – Na obrigação de dar coisacerta, ocorrendo a perda da coisa com culpa do devedor, poderá o credor exigir o equivalente à coisa e mais perdas e danos (art. 234, segunda parte, do CC). Em suma, haverá resolução da obrigação com perdas e danos. A culpa, nesse e nos casos a seguir, é concebida em sentido amplo ( lato sensu), englobando o dolo (intenção de descumprimento) e a culpa em sentido estrito ou stricto sensu (descumprimento por imprudência, negligência ou imperícia). No mesmo exemplo anterior, se o cavalo morrer por um golpe do devedor, que se encontrava em estado de embriaguez, além de devolver o preço recebido deverá indenizar o comprador por lucros cessantes e outros prejuízos suportados. 3.ª Regra – Na obrigação de dar coisa certa, se a coisa se deteriorar sem culpa do devedor, o credor terá duas opções: resolver a obrigação, sem o direito a perdas e danos, já que não houve culpa genérica da outra parte; ficar com a coisa, abatido do preço o valor correspondente ao perecimento parcial (art. 235 do CC). Se na ilustração anterior o cavalo ficar cego porque foi atingido no seu olho por um inseto, o comprador poderá ficar com o cavalo, abatido no preço o valor da desvalorização; ou exigir a devolução do preço integral, sem perdas e danos. 4.ª Regra – Nos termos do art. 236 do CC, na obrigação de dar coisa certa, havendo deterioração da coisa, com culpa do devedor, poderá o credor exigir o valor equivalente à coisa ou ficar com ela no estado em que se encontrar, nos dois casos com perdas e danos. Se no exemplo anterior o vendedor cegar o cavalo de forma intencional, o comprador poderá ficar com o animal deteriorado ou exigir o seu equivalente, nos dois casos com direito à indenização suplementar pelos prejuízos suportados. 5.ª Regra – Na obrigação de restituir coisa certa, ocorrendo a perda da coisa sem culpa do devedor e antes da tradição, aplica-se a máxima pela qual a coisa perece para o dono (res perit domino), suportando o credor o prejuízo, conforme determina o art. 238 do CC. Pelo mesmo dispositivo, o credor, proprietário da coisa que se perdeu, poderá pleitear os direitos que já existiam até o dia da referida perda. A regra é das mais importantes, devendo ser ilustrada. Como primeiro exemplo, imagine-se o caso de uma locação, em que há o dever de devolver o imóvel ao final do contrato. No caso de um incêndio causado por caso fortuito ou força maior e que destrói o apartamento, o locador (credor da coisa) não poderá pleitear um novo imóvel do locatário (devedor da coisa) que estava na posse do bem, ou o seu valor correspondente; mas terá direito aos aluguéis vencidos e não pagos até o evento danoso. Outro exemplo pode ser visualizado diante da vigência de um comodato, cujo veículo é roubado à mão armada, estando na posse do comodatário (devedor da coisa). A coisa perece para o seu dono (comodante), não respondendo o comodatário sequer pelo valor do automóvel. 6.ª Regra – Determina o art. 239 do CC/2002 que, na obrigação de restituir, se a coisa se perder por culpa do devedor, responderá este pelo equivalente, mais perdas e danos. Assim, no caso por último descrito, caso o locatário seja responsável pelo incêndio que causou a perda total do apartamento, digase provado o seu dolo ou a sua culpa, o locador poderá pleitear o valor correspondente ao bem, sem prejuízo de perdas e danos. 7.ª Regra – Havendo deterioração sem culpa do devedor na obrigação de restituir, o credor somente pode exigir a coisa no estado em que se encontrar, sem direito a qualquer indenização (art. 240, primeira parte, do CC). Isso porque se a coisa perece para o dono totalmente, por igual perece parcialmente. Ilustrando, se na locação o imóvel for destruído parcialmente por uma enchente, o credor (locador) somente poderá pleitear a coisa, no estado em que se encontrar. 8.ª Regra – Por fim, na obrigação de restituir coisa certa, havendo deterioração da coisa com culpa do devedor, o credor passa a ter o direito de exigir o valor equivalente à coisa, mais as perdas e danos que o caso determinar (conforme o art. 240, segunda parte, que manda aplicar o art. 239 do CC). Na verdade, como o caso é de deterioração, o comando deveria mandar aplicar o art. 236, que traz regra equivalente. Diante desse equívoco do legislador, complementando a norma, prevê o Enunciado n. 15 do Conselho da Justiça Federal, aprovado na I Jornada de Direito Civil, que “as disposições do art. 236 do novo Código Civil também são aplicáveis à hipótese do art. 240, in fine”. Em suma, se o credor quiser, poderá ficar com a coisa no estado em que se encontrar ou exigir o seu equivalente, mais perdas e danos, como consta do art. 236 do CC. Além das regras relativas ao inadimplemento da obrigação específica, outras devem ser estudadas. De início, de acordo com o art. 237 do Código Civil em vigor, até a tradição pertence ao devedor a coisa, com os seus melhoramentos e acrescidos, pelos quais poderá exigir aumento no preço; se o credor não anuir, poderá o devedor resolver a obrigação. Tais melhoramentos são também denominados cômodos obrigacionais.20 Como melhoramentos devem ser incluídos os frutos, bens acessórios que são retirados do principal sem lhe diminuir a quantidade. Quanto a esses bens acessórios, há regra específica no parágrafo único do art. 237 do CC, segundo a qual os frutos percebidos – já colhidos – pertencem ao devedor, enquanto os pendentes (ainda não colhidos), ao credor. Tendo em vista a vedação ao enriquecimento sem causa, o art. 241 do CC enuncia que se sobrevier melhoramento ou acréscimo à coisa, sem despesa ou trabalho do devedor, o credor as lucrará, ficando desobrigado ao pagamento de indenização. Como exposto, a coisa perece para o dono e, pelos mesmos fundamentos, lidos em sentido contrário, havendo melhoramentos, essas vantagens também serão acrescidas ao patrimônio do proprietário da coisa, no caso o credor da obrigação. Entretanto, se para o melhoramento ou aumento, empregou o devedor trabalho ou dispêndio, o caso se regulará pelas normas do Código Privado atinentes às benfeitorias realizadas pelo possuidor de boa ou de má-fé (art. 242 do CC). Também essa regra está sincronizada com a vedação do enriquecimento sem causa e com a eticidade, prevendo a atual codificação que o devedor deverá ser indenizado pelas benfeitorias úteis e necessárias, conforme dispõem os arts. 1.219 a 1.222 da atual legislação privada. O parágrafo único do art. 242 consagra regras em relação aos frutos. No que se refere aos frutos percebidos – aqueles que já foram colhidos pelo proprietário –, no caso de terem sido colhidos pelo devedor, deverão ser observadas as regras que constam dos arts. 1.214 a 1.216 do mesmo Código Civil. Desse modo, sendo o devedor possuidor de boa-fé – regra geral, pela presunção do justo título –, terá direito aos frutos referidos no dispositivo em análise. Porém, se o possuidor tiver agido de má-fé, não haverá qualquer direito, além de responder por todos os frutos colhidos e percebidos, bem como por aqueles que, por culpa sua, deixou de perceber (art. 1.216 do CC). Ainda o que tange às obrigações de dar coisa certa, insta apontar que a Lei 10.444/2002 trouxe inovações ao então Código de Processo Civil, entre as quais a possibilidade de o credor pleitear a fixação de um preceito cominatório, via tutela específica, para fazer cumprir a obrigação de dar (multa ou astreintes). O Novo Código de Processo Civil reafirmou essa medida de tutela específica nas obrigações de dar coisa certa, prevendo o seu art. 498, caput, que, “Na ação que tenha por objeto a entrega de coisa, o juiz, ao conceder a tutela específica, fixará o prazo para o cumprimento da obrigação”. Em todos os casos apresentados, portanto, isto é possível, antes da conversão da obrigação de dar em perdas e danos. Ilustrando, A prometeu a entrega de um cavalo a B, tendo o último pago o preço. Negando-se o primeiro a entregar a coisa, caberá ação de execução de obrigação de dar, sendo possível a B requerer ao magistrado a fixação de uma multa diária (astreintes) a cada dia que acoisa não for entregue, sem prejuízo dos danos decorrentes do atraso da entrega do animal. Em complemento, determinava o § 2.º do art. 461-A do CPC/1973 que “não cumprida a obrigação no prazo estabelecido, expedir-se-á em favor do credor mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel”. Essa previsão não consta do atual art. 498 do CPC/2015, restando a dúvida se as citadas medidas ainda são possíveis, o que deve ser respondido pela doutrina especializada e pela jurisprudência nos próximos anos. A resposta do presente autor é positiva, pois tais medidas são inerentes à obrigação de dar coisa certa. Em caso de ter sido proferida a sentença, não restam dúvidas de suas viabilidades, pois o art. 538 do Novo Codex preconiza que, não cumprida a obrigação de entregar coisa no prazo estabelecido na sentença, será expedido mandado de busca e apreensão ou de imissão na posse em favor do credor, conforme se tratar de coisa móvel ou imóvel. O mesmo vale para a hipótese de execução para entrega de coisa certa, pois o art. 806 do CPC/2015 estabelece que o devedor de obrigação de entrega de coisa certa, constante de título executivo extrajudicial, será citado para, em 15 (quinze) dias, satisfazer a obrigação. Em complemento, estatui-se que, ao despachar a inicial, o juiz poderá fixar multa por dia de atraso no cumprimento da obrigação, ficando o respectivo valor sujeito a alteração, caso se revele insuficiente ou excessivo (§ 1.º). Por fim, quanto a essa ação, está previsto no Novo CPC que do mandado de citação constará ordem para imissão na posse ou busca e apreensão, conforme se tratar de bem imóvel ou móvel, cujo cumprimento se dará de imediato, se o executado não satisfizer a obrigação no prazo que lhe foi designado (§ 2.º). A encerrar o estudo do tema, colaciona-se quadro elaborado pelo leitor Daniel de Carvalho, servidor público do Tribunal de Justiça de São Paulo, que resume muito bem as exposições que foram feitas a respeito da obrigação de dar coisa certa, contribuindo sobremaneira para o aperfeiçoamento desta obra: Obrigação Fato com bem Sem culpa Com culpa Dar Perda Resolve-se a obrigação para ambas as partes Pode o credor: Exigir o valor equivalente + Perdas e danos Dar Deterioração Pode o credor: Resolver a obrigação ou Aceitar a coisa com abatimento do preço Pode o credor: Exigir o equivalente ou Aceitar a coisa com abatimento do preço + Perdas e danos (nos dois casos) Restituir Perda Resolve-se a obrigação para ambas as partes Pode o credor: Exigir o valor equivalente + Perdas e danos Restituir Deterioração O credor recebe a coisa no estado em que se encontra Pode o credor: Exigir o equivalente ou Aceitar a coisa com abatimento do preço + Perdas e danos (nos dois casos) b) Obrigação de dar coisa incerta (arts. 243 a 246 do CC) Denominada obrigação genérica, a expressão obrigação de dar coisa incerta indica que a obrigação tem por objeto uma coisa indeterminada, pelo menos inicialmente, sendo ela somente indicada pelo gênero e pela quantidade, restando uma indicação posterior quanto à sua qualidade que, em regra, cabe ao devedor. Na verdade, o objeto obrigacional deve ser reputado determinável, nos moldes do art. 104, inc. II, do CC. A título de exemplo, pode ser citada a hipótese em que duas partes obrigacionais pactuam a entrega de um animal que faz parte do rebanho do vendedor (devedor da coisa). Nesse caso, haverá a necessidade de determinação futura do objeto, por meio de uma escolha. Assim, coisa incerta não quer dizer qualquer coisa, mas coisa indeterminada, porém suscetível de determinação futura. A determinação se faz pela escolha, denominada concentração, que constitui um ato jurídico unilateral. Assim, enuncia o art. 243 do atual Código Civil que a coisa incerta será indicada, ao menos, pelo gênero e pela quantidade. O art. 244 do mesmo diploma civil expressa que nas coisas determinadas pelo gênero e pela quantidade a escolha ou concentração cabe ao devedor, se o contrário não resultar do título da obrigação. De qualquer forma, cabendo-lhe a escolha o devedor não poderá dar a pior. Ademais, não será obrigado a prestar a melhor. A segunda parte do dispositivo legal apresenta o princípio da equivalência das prestações, pelo qual a escolha do devedor não pode recair sobre a coisa que seja menos valiosa. Em complemento, o devedor não pode ser compelido a entregar a coisa mais valiosa, devendo o objeto obrigacional recair sempre dentro do gênero intermediário. Aplicando-se a proporcionalidade ao art. 244 do CC, se a escolha couber ao credor, este não poderá fazer a opção pela coisa mais valiosa nem ser compelido a receber a coisa menos valiosa. Mais uma vez aplica-se o princípio da equivalência das prestações, fixando-se o conteúdo da obrigação no gênero médio ou intermediário. Em todo o conteúdo do art. 244 do CC consagra-se a vedação do enriquecimento sem causa (arts. 884 a 886 do CC), sintonizada com a função social obrigacional e com a boa-fé objetiva. Entende este autor que se trata de norma de ordem pública, que não pode ser afastada por vontade dos contratantes ou negociantes. Após a escolha feita pelo devedor, e tendo sido cientificado o credor, a obrigação genérica é convertida em obrigação específica (art. 245 do CC). Com essa conversão, aplicam-se as regras previstas para a obrigação de dar coisa certa (arts. 233 a 242 do CC), outrora estudadas. Antes dessa concentração, não há que se falar em inadimplemento da obrigação genérica, em regra. O art. 246 do CC continua consagrando a regra de direito pela qual o gênero nunca perece (genus nunquam perit), ao prever que antes da escolha não poderá o devedor alegar perda ou deterioração da coisa, ainda que em decorrência de caso fortuito (evento imprevisível) ou força maior (evento previsível, mas inevitável). Isso porque ainda não há individualização da coisa, devendo o art. 246 ser lido em sintonia com a primeira parte do artigo antecedente. Pontue-se que, como consequência natural dessa máxima, não cabem medidas de tutela específica para cumprimento das obrigações genéricas ou de dar coisa incerta, antes de a escolha ser efetivada. Isso constava do art. 461-A, §1.º, do CPC/1973, tendo sido reafirmado pelo art. 498, parágrafo único, do CPC/2015, in verbis: “Tratando-se de entrega de coisa determinada pelo gênero e pela quantidade, o autor individualizá-la-á na petição inicial, se lhe couber a escolha, ou, se a escolha couber ao réu, este a entregará individualizada, no prazo fixado pelo juiz”. 3.5.1.2 Obrigação positiva de fazer A obrigação de fazer (obligatio ad faciendum) pode ser conceituada como uma obrigação positiva cuja prestação consiste no cumprimento de uma tarefa ou atribuição por parte do devedor. Exemplos típicos ocorrem na prestação de serviço e no contrato de empreitada de certa obra. Em inúmeras situações a obrigação de fazer confunde-se com a obrigação de dar, sendo certo que os seus conteúdos são completamente diferentes. Exemplifica-se com uma obrigação cuja prestação é um quadro (obra de arte). Se o quadro já estiver pronto, haverá obrigação de dar. Caso o quadro seja encomendado, devendo ainda ser pintado pelo devedor, a obrigação é de fazer. Com tom didático, pode-se afirmar: o dar não é um fazer, pois, caso contrário, não haveria nunca a obrigação de dar. A obrigação de fazer pode ser classificada da seguinte forma, já constando os efeitos do seu inadimplemento com culpa do devedor: a) Obrigação de fazer fungível, que é aquela que ainda pode ser cumprida por outra pessoa, à custa do devedor originário, por sua natureza ou previsão no instrumento. Havendo inadimplemento com culpa do devedor, o credor poderá exigir: 1.º) O cumprimento forçado da obrigação, por meio de tutela específica, com a possibilidade de fixação de multa ou “astreintes” (art. 497 do CPC/2015, art. 461 do CPC/1973 e art. 84 do CDC, o último em havendo relação de consumo). 2.º) O cumprimento da obrigação por terceiro, à custa do devedor originário,nos termos do que dispõem os arts. 816 e 817 do CPC/2015, equivalentes aos arts. 633 e 634 do CPC/1973 (art. 249, caput, do CC). Na I Jornada de Direito Processual Civil, evento promovido pelo Conselho da Justiça Federal em agosto de 2017, aprovou-se enunciado que traz interessante diálogo entre o Código Civil e o Novo CPC. Conforme o seu teor, pode o exequente – em execução de obrigação de fazer fungível, decorrente do inadimplemento relativo, voluntário e inescusável do executado – requerer a satisfação da obrigação por terceiro, cumulável ou não com perdas e danos, considerando-se que o caput do art. 816, caput, do CPC/2015 não derrogou o art. 249, caput, do Código Civil de 2002 (Enunciado n. 103). Vale lembrar que o mencionado dispositivo processual estabelece que, se o executado não satisfizer a obrigação no prazo designado, é lícito ao exequente, nos próprios autos do processo, requerer a satisfação da obrigação à custa do executado ou perdas e danos, hipótese em que se converterá em indenização. De fato, não se pode falar em revogação, mas da necessária compatibilização entre os dois comandos, sendo plenamente possível, antes da resolução por perdas e danos, exigir o cumprimento por terceiro, eventualmente cumulável com a indenização cabível. 3.5.1.3 3.º) Não interessando mais a obrigação de fazer, o credor poderá requerer a sua conversão em perdas e danos (art. 248 do CC). Observação – As medidas acima existem no plano judicial. No plano extrajudicial, o art. 249, parágrafo único, do CC, passou a possibilitar a autotutela civil, para cumprimento das obrigações de fazer fungível, nos seguintes termos: “Em caso de urgência, pode o credor, independentemente de autorização judicial, executar ou mandar executar o fato, sendo depois ressarcido”. Para ilustrar, imagine-se o caso de contratação de uma empreitada. Sendo pago o preço antecipadamente e negando-se o empreiteiro a desempenhar sua tarefa, o tomador que tem urgência poderá contratar o serviço de outrem, pleiteando depois a indenização cabível do empreiteiro original. b) Obrigação de fazer infungível, que é aquela que tem natureza personalíssima ou intuitu personae, em decorrência de regra constante do instrumento obrigacional ou pela própria natureza da prestação. Em casos de inadimplemento com culpa do devedor, o credor terá as seguintes opções: 1.º) Exigir o cumprimento forçado da obrigação, por meio de tutela específica, com a possibilidade de multa ou “astreintes” (mais uma vez com base no art. 497 do CPC/2015, no art. 461 do CPC/1973 e no art. 84 do CDC, o último se a relação for de consumo). 2.º) Não interessando mais a obrigação de fazer, exigir perdas e danos (art. 247 do CC). Por derradeiro, segundo o art. 248 do CC/2002, caso a obrigação de fazer, nas duas modalidades, torne-se impossível sem culpa do devedor, resolve-se a obrigação sem a necessidade de pagamento de perdas e danos. A título de exemplo, imagine-se a hipótese de falecimento de um pintor contratado, que tinha arte única. Obrigação negativa de não fazer A obrigação de não fazer (obligatio ad non faciendum) é a única obrigação negativa admitida no Direito Privado Brasileiro, tendo como objeto a abstenção de uma conduta. Por tal razão, havendo inadimplemento, a regra do art. 390 da codificação material merece aplicação, in verbis, “nas obrigações negativas o devedor é havido por inadimplente desde o dia em que executou o ato de que se devia abster”. O que se percebe é que o descumprimento da obrigação negativa se dá quando o ato é praticado. A obrigação de não fazer é quase sempre infungível, personalíssima (intuitu personae), sendo também predominantemente indivisível pela sua natureza, nos termos do art. 258 do Código Civil.
Compartilhar