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DESCRIÇÃO
A importância da pesquisa de modelos qualitativo e quantitativo para a
produção acadêmica. A pesquisa de campo e a análise de dados nas
abordagens quantitativa e qualitativa.
PROPÓSITO
Compreender as características da pesquisa de abordagens qualitativa e
quantitativa, bem como suas possíveis interfaces. Perceber que a análise
de dados, proveniente da pesquisa de campo, pode tornar-se instrumento
eficaz na pesquisa acadêmica, em ambas as abordagens.
OBJETIVOS
MÓDULO 1
Distinguir pesquisa quantitativa de pesquisa qualitativa a partir da relevância
da pesquisa de campo para a produção acadêmica
MÓDULO 2
Reconhecer a importância da análise de dados para a pesquisa acadêmica
no âmbito das análises quantitativa e qualitativa
INTRODUÇÃO
DEPOIMENTO (PROFESSORA MIRIAN
GOLDENBERG)
Quando inicio um curso presencial de metodologia de pesquisa, noto no
semblante de meus alunos uma profunda desconfiança. Costumo perguntar
sobre suas experiências anteriores com a disciplina e, salvo raríssimas
exceções, eles são unânimes em afirmar que a matéria foi muito
desinteressante em suas experiências anteriores. Com essa recepção, não
é fácil iniciar um curso de dezenas de horas, semanas ou meses. Ao final
do curso, no entanto, sempre encontro alunos entusiasmados, empolgados
com seus projetos, e não raro com manifestações de carinho e gratidão.
Aqui quero compartilhar um pouco dessa experiência prazerosa em sala de
aula e mostrar que a pesquisa científica não é algo de apenas alguns
eleitos, podendo ser exercida em qualquer campo de estudo.
Metodologia científica é muito mais do que algumas regras de como fazer
uma pesquisa; ela auxilia a refletir e propicia um “novo” olhar sobre o
mundo: um olhar científico, curioso, indagador e criativo. Portanto, a
pesquisa não se reduz a certos procedimentos metodológicos. A pesquisa
científica exige criatividade, disciplina, empatia, flexibilidade, humildade,
interesse genuíno, organização e sensibilidade, baseando‐se no confronto
permanente entre o possível e o impossível, entre o conhecimento e o
desconhecimento.
Nenhuma pesquisa é totalmente controlável, com início, meio e fim
previsíveis. A pesquisa é um processo em que é impossível prever todas as
etapas. O pesquisador está sempre em estado de tensão porque sabe que
seu conhecimento é parcial e limitado — o “possível” para ele. Nesse
mesmo sentido, não existe um único modelo de pesquisa. Neste tema
veremos um dos caminhos possíveis: aquele que tenho buscado seguir nas
últimas quatro décadas e com diferentes abordagens de acordo com o tema
escolhido.
Todos os pesquisadores precisam estar abertos para um verdadeiro debate
de ideias. É a discussão dos nossos achados que pode contribuir para o
amadurecimento de nosso trabalho. A pesquisa científica exige um
exercício permanente de crítica e autocrítica. Por isso, aceite o estudo
desse tema como um prazeroso desafio: um exercício para aprender a
pensar cientificamente, com clareza, criatividade, organização e, acima de
tudo, sabor.
MÓDULO 1
 Distinguir pesquisa quantitativa de pesquisa qualitativa a partir da
relevância da pesquisa de campo para a produção acadêmica
CONSTRUINDO O PROBLEMA DA
PESQUISA
Fazer uma pesquisa significa aprender a pôr ordem nas próprias ideias. Não
importa tanto o tema escolhido, mas a experiência de trabalho de pesquisa.
Trabalhando‐se bem, não existe tema que seja tolo ou pouco importante. A
pesquisa deve ser entendida como uma ocasião singular para fazer alguns
exercícios que servirão por toda a vida. O trabalho de pesquisa deve ser
instigante, mesmo que o objeto não pareça ser tão interessante. O que o
verdadeiro pesquisador busca é o jogo criativo de aprender como pensar e
olhar cientificamente.
 COMENTÁRIO
Aqui falamos em objeto da pesquisa e não objetivos. Em Metodologia
Científica, o que chamamos objeto da pesquisa é exatamente aquilo que
será pesquisado. Já os objetivos de uma pesquisa dependerão de muitos
fatores, inclusive do tipo de objeto pesquisado.
 Fonte: fizkes | Shutterstock
QUALQUER TEMA OU ASSUNTO DA ATUALIDADE
PODE SER OBJETO DE UMA PESQUISA
CIENTÍFICA.
É preciso ter estudado muito, possuir uma sólida bagagem teórica e muita
experiência de pesquisa para enxergar o que outros não conseguem ver. O
pesquisador experiente descobre assuntos que podem parecer banais e os
transforma em pesquisas fecundas.
O desejo de reconhecimento não só leva o cientista a comunicar os seus
resultados, mas também o influencia na escolha de temas e métodos que
tornem seu trabalho mais aceitável por seus pares. Quanto maior a
consciência de suas motivações, mais o pesquisador é capaz de evitar os
desvios (ou bias) próprios daqueles que trabalham com a ilusão de serem
orientados apenas por propósitos científicos.
Existe uma hierarquia de legitimidade dentro do campo científico traçada de
acordo com os temas que dão prestígio, recursos para a pesquisa, cargos
universitários, publicações em editoras prestigiadas etc. Assim, falar de
“liberdade de escolha” nesse campo é desconsiderar as pressões
(evidentes ou sutis) às quais o pesquisador permanentemente se submete.
Tendo consciência de tais pressões, muitas dificuldades e contradições
podem ser mais bem compreendidas na escolha de um assunto e na sua
formulação como um projeto de pesquisa.
Nessa “arte” de fazer pesquisa, o jogador precisa ter alguns atributos para
poder entrar no campo científico. Alguns podem ser vistos como internos,
atributos pessoais que devem fazer parte do indivíduo que deseja ser um
pesquisador:
Clareza
Concentração
Criatividade
Curiosidade
Delicadeza
Disciplina
Empatia
Equilíbrio
Flexibilidade
Humildade
Iniciativa
Interesse real
Objetividade
Organização
Paciência
Paixão
Respeito ao entrevistado
Saber escutar
Tranquilidade
Outras qualidades podem ser chamadas de externas, porque dependem da
formação científica do pesquisador. São elas:
BOM DOMÍNIO DA TEORIA
DOMÍNIO DAS TÉCNICAS DE PESQUISA
ESCREVER BEM
EXPERIÊNCIA COM PESQUISA
RELACIONAR OS DADOS EMPÍRICOS COM A TEORIA
As principais etapas da pesquisa científica envolvem a concepção de um
tema de estudo, a coleta de dados, a apresentação de um relatório com os
resultados e, em alguns casos, a aplicação dos resultados. O passo inicial
está ligado à formulação do problema e consequente definição do objeto da
pesquisa.
O primeiro passo é tornar o problema concreto e explícito mediante:
 
autor/shutterstock
Imersão sistemática no assunto
 
autor/shutterstock
Estudo da literatura existente
 
autor/shutterstock
Discussão com pessoas que acumularam experiência prática no campo de
estudo
A boa resposta depende da boa pergunta. O pesquisador deve estar
consciente da importância da pergunta que faz e deve saber colocar as
questões necessárias para o sucesso de sua pesquisa.
O pesquisador, ao escolher seu objeto de estudo, deve pensar em como:
 
PRIMEIRO PASSO
Identificar um tema preciso (recorte do objeto).
 
SEGUNDO PASSO
Escolher e organizar o tempo de trabalho.
 
TERCEIRO PASSO
Realizar a pesquisa bibliográfica (revisão da literatura).
 
QUARTO PASSO
Organizar e analisar o material selecionado.
 
Fonte:Shutterstock
QUINTO PASSO
Fazer com que o leitor compreenda o seu estudo e possa recorrer aos
resultados caso queira dar continuidade à pesquisa.
Para tanto, o objeto de estudo deve responder aos interesses do
pesquisador e ter as fontes de consulta acessíveis e de fácil manuseio.
Quanto mais se recorta o tema, com mais segurança e criatividade se
trabalha. O estudo científico deve ser claro, interessante e objetivo, tanto
para as pessoas familiarizadas com o assunto quanto para as que não são.
Muitos acadêmicos se perdem em parágrafos herméticos que não são
compreendidos nem pelos seus pares. O pesquisador não precisa utilizar
termos obscuros para se mostrar profundo. A profundidade e a seriedade do
estudo podem ser mais bem percebidas se o pesquisadorutilizar uma
linguagem compreensível para o maior número de alunos e leitores.
A PESQUISA APRESENTA DIFERENTES
FASES.
Veremos a seguir:
FASE EXPLORATÓRIA
A fase inicial, que pode ser chamada de exploratória, lembra uma “paquera”
de dois adolescentes. É o momento em que se tenta descobrir algo sobre o
objeto de desejo, quem mais escreveu (ou se interessou) sobre ele, como
poderia haver uma aproximação, qual a melhor abordagem (ou
metodologia) dentre todas as possíveis para conquistar esse objeto.
FASE DE ELABORAÇÃO
Em seguida, vem a fase que equivale ao “namoro”, quando há maior
compromisso e que exige um conhecimento mais profundo, uma dedicação
quase exclusiva ao objeto de paixão. É a fase de elaboração do projeto de
pesquisa, quando o estudioso mergulha profundamente no tema estudado.
FASE DE RESOLUÇÃO DE PROBLEMAS
javascript:void(0)
A terceira fase é o “casamento”, em que a pesquisa exige fidelidade,
dedicação, atenção ao seu cotidiano, que é feito de altos e baixos. O
pesquisador deve resolver os problemas que vão aparecendo, desde os
mais simples (como se vestir para realizar as entrevistas) até os mais
cruciais (como garantir a verba para a execução da pesquisa).
FASE DE DIAGNÓSTICO
Por último, a fase de “separação”, em que o pesquisador precisa se
distanciar do seu objeto para escrever o relatório final da pesquisa. É o
momento em que é necessário olhar o mais criticamente possível para o
objeto estudado, quando é preciso fazer rupturas, sugerir novas pesquisas.
É o momento de ver os defeitos e as qualidades do objeto amado.
METODOLOGIA
Quando se fala de metodologia, trata-se de um caminho possível para
a pesquisa científica. O que determina a técnica escolhida é o problema
que se quer trabalhar: só se escolhe o caminho quando se sabe aonde
quer chegar.
A importância da pesquisa na vida acadêmica
PESQUISA QUANTITATIVA X
PESQUISA QUALITATIVA
Durante muito tempo, as ciências se pautavam por um modelo quantitativo
de pesquisa, em que a veracidade de um estudo era constatada pela
quantidade de pesquisados. Muitos pesquisadores, no entanto,
questionaram a representatividade e o caráter de objetividade com que a
pesquisa quantitativa se revestia.
É PRECISO ACEITAR O FATO DE QUE,
MESMO NAS PESQUISAS QUANTITATIVAS,
A SUBJETIVIDADE DO PESQUISADOR
ESTÁ PRESENTE.
Na escolha do tema, dos entrevistados, no roteiro de perguntas, na
bibliografia consultada e na análise do material coletado, existe um autor,
um sujeito que decide os passos a serem dados.
Na pesquisa qualitativa, a preocupação do pesquisador não é com a
quantidade de indivíduos, mas com o aprofundamento da compreensão de
um grupo social, de uma organização, de uma instituição, de uma trajetória
etc.
 
Fonte:Shutterstock
 Fonte: Arthimedes | Shutterstock
Ao se pensar nas origens da pesquisa qualitativa em ciências sociais, corre‐
se o risco de se perder em um caminho longo demais que, procurando as
origens das origens, não chega jamais ao fim. Poderia chegar a Heródoto
(495 a.C.-425 a.C.) que, descrevendo a guerra entre a Pérsia e a Grécia,
dedicou-se a esboçar os costumes, as vestimentas, as armas, os barcos, os
tabus alimentares e as cerimônias religiosas dos persas e povos
circunvizinhos.
HERÓDOTO
Uma boa reflexão sobre a importância de Heródoto nesse contexto,
bem como um ótimo exemplo de pesquisa podem ser encontrados no
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artigo O selvagem e a História: Heródoto e a questão do Outro, de
Klaas Woortmann. Pesquise-o na plataforma SciELO.
 Fonte: sianstock | Shutterstock
 COMENTÁRIO
Não pretendendo fazer um caminho tão longo, mas, para situar a questão
do uso de técnicas e métodos qualitativos de pesquisa nas ciências sociais
dentro de uma discussão mais ampla, elucidaremos o debate entre a
sociologia positivista e a sociologia compreensiva.
Os pesquisadores que adotam a abordagem qualitativa em pesquisa se
opõem ao pressuposto que defende um modelo único de pesquisa para
todas as ciências, baseado no modelo de estudo das ciências da natureza.
Esses pesquisadores se recusam a legitimar seus conhecimentos por
processos quantificáveis que venham a se transformar em leis e
explicações gerais. Afirmam que as ciências sociais têm sua especificidade,
o que pressupõe uma metodologia própria. Vamos conhecê-los?
COMTE
Os pesquisadores qualitativistas recusam o modelo positivista aplicado ao
estudo da vida social. O fundador do positivismo, Augusto Comte (foto),
defendia a unidade de todas as ciências e a aplicação da abordagem
científica na realidade social humana. Com base em critérios de abstração,
complexidade e relevância prática, Comte estabeleceu uma hierarquia das
ciências, em que a Matemática ocupava o primeiro lugar e a Sociologia ou
“física social”, o último, precedida, em ordem decrescente, por Astronomia,
Física, Química e Biologia. Para Comte, cada ciência dependia do
desenvolvimento da que a precedeu. Portanto, a Sociologia não poderia
existir sem a Biologia, que não existiria sem a Química, e assim por diante.
 
 Augusto Comte. Fonte: wikimedia.org
Segundo a perspectiva de que o objeto das ciências sociais deve ser
estudado como o das ciências físicas, a pesquisa é uma atividade neutra e
objetiva, que busca descobrir regularidades ou leis, em que o pesquisador
javascript:void(0)
não pode fazer julgamentos nem permitir que seus preconceitos e suas
crenças contaminem a pesquisa.
DURKHEIM
 
 Émile Durkheim. Fonte: wikimedia.org
Émile Durkheim (foto), como Comte, preocupado com a ordem na
sociedade e com a primazia da sociedade sobre o indivíduo, também se
posicionou a favor da unidade das ciências. Tomando “os fatos sociais como
coisas”, Durkheim (1985) defendia que o social é real e externo ao
indivíduo, ou seja, o fenômeno social, como o fenômeno físico, é
independente da consciência humana e verificável pela experiência dos
sentidos e da observação.
Durkheim acreditava que os fatos sociais só poderiam ser explicados por
outros fatos sociais, e não por fatos psicológicos ou biológicos, como
pretendiam alguns pensadores de seu tempo. Defendendo a visão da
ciência social como neutra e objetiva, na qual sujeito e objeto do
conhecimento estão radicalmente separados, Durkheim teve uma influência
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decisiva para que as ciências sociais adotassem o método científico das
ciências naturais.
DILTHEY
Na segunda metade do século passado, alguns pensadores, influenciados
pelo idealismo de Kant, reagiram criticamente ao modelo positivista de
conhecimento aplicado às ciências sociais, acreditando que o estudo da
realidade social por meio de métodos de outras ciências poderia destruir a
própria essência dessa realidade, já que esquecia a dimensão de liberdade
e individualidade do ser humano.
 
Fonte:Shutterstock
 Wilhelm Dilthey. Fonte: wikimedia.org
A sociologia compreensiva, distinguindo “natureza” de “cultura”, mostrou
que era necessário, para estudar os fenômenos sociais, um procedimento
metodológico diferente daquele utilizado nas ciências físicas e matemáticas.
O filósofo alemão Wilhelm Dilthey (foto) foi um dos primeiros a criticar o
uso da metodologia das ciências naturais pelas ciências sociais, em função
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da diferença fundamental entre seus objetos de estudo. Nas primeiras, os
cientistas lidam com objetos externos passíveis de serem conhecidos de
forma objetiva, enquanto nas ciências sociais lidam com emoções, valores,
subjetividades. Essa diferença se traduz em diferenças nos objetivos e nos
métodos de pesquisa.
Para Dilthey, os fatos sociais não são suscetíveis de quantificação, já que
cada um deles tem um sentido próprio, diferente dos demais, e isso torna
necessário que cada caso concreto seja compreendido em sua
singularidade. Portanto, as ciências sociais devem se preocupar com a
compreensão de casos particulares e não com a formulação de leis
generalizantes, como fazem as ciências naturais.
WEBER
 
Fonte:Shutterstock
 MaxWeber. Fonte: wikimedia.org
O maior representante da chamada sociologia compreensiva é Max Weber
(foto). Para ele, o principal interesse da ciência social era o comportamento
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significativo dos indivíduos engajados na ação social, ou seja, o
comportamento ao qual os indivíduos agregam significado considerando o
comportamento de outros indivíduos.
Os cientistas sociais, que pesquisam os significados das ações sociais de
outros indivíduos e deles próprios, são sujeito e objeto de suas pesquisas.
Nessa perspectiva – que se opõe à visão positivista de objetividade e de
separação radical entre sujeito e objeto da pesquisa – é natural que
cientistas sociais se interessem por pesquisar aquilo que valorizam. Esses
cientistas buscam compreender os valores, as crenças, as motivações e os
sentimentos humanos, compreensão que só pode ocorrer se a ação for
colocada dentro de um contexto de significado.
FUNDADOR DO POSITIVISMO
A origem do positivismo é atribuída ao francês Augusto Comte (1798-
1857), autor dos famosos Sistema de Filosofia Positiva (1830-1842) e
Catecismo Positivista (1852), além de outras publicações. A relação
que se estabelece entre a filosofia do francês Comte – chamada de
filosofia positiva ou positivismo – e as várias correntes denominadas de
"positivismo" baseia-se em diversas possibilidades: a primeira, claro, é
a identidade de nome em diversas situações; em seguida, alguns
vínculos históricos (teóricos e políticos) entre eles; por fim, mera
extensão ou ampliação de sentido (LACERDA, 2009).
ÉMILE DURKHEIM
David Émile Durkheim (1858-1917) foi um sociólogo, antropólogo,
cientista político, psicólogo social e filósofo francês. Formalmente,
tornou a Sociologia uma ciência e, com Karl Marx (1818-1883) e Max
Weber (1864-1920), é comumente citado como o principal arquiteto da
ciência social moderna e pai da Sociologia.
WILHELM DILTHEY
Wilhelm Christian Ludwig Dilthey (1833‐1911) foi um filósofo
hermenêutico, psicólogo, historiador, sociólogo e pedagogo alemão.
Dilthey lecionou Filosofia na Universidade de Berlim.
MAX WEBER
Maximilian Karl Emil Weber (1864‐1920) foi um intelectual, jurista e
economista alemão considerado um dos fundadores da Sociologia. Seu
irmão foi o também famoso sociólogo e economista Alfred Weber.
PESQUISA DE CAMPO
A discussão apresentada anteriormente, que diferencia as ciências sociais
das demais ciências físicas, contextualiza o surgimento e o
desenvolvimento das técnicas e dos métodos qualitativos de pesquisa
social.
LE PLAY
Frédéric Le Play (foto), contemporâneo de Comte, foi um dos primeiros a
estudar a realidade social dentro de uma perspectiva científica que
considerava a observação direta, controlável e objetiva da sociedade como
o método mais adequado à pesquisa social. Em La Réforme Sociale en
France (1864), Le Play expõe o método das monografias, que se
caracteriza por ser uma técnica, ordenada e metódica, de observação direta
da sociedade.
 
 Frédéric Le Play. Fonte: wikimedia.org
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Trouxe de sua experiência de mineralogista, na qual estava habituado a
colher amostras de jazidas para serem analisadas, a preocupação de
observar diretamente e analisar sistematicamente as famílias operárias
localizadas nos diferentes países da Europa onde pesquisou. De seus
registros minuciosos e ordenados, resultou um conjunto de monografias
reunidas em Les ouvriers européens (1855).
MORGAN, BOAS E MALINOWSKI
No final do século XIX e início do século XX, os estudos dos antropólogos
nas sociedades chamadas então de “primitivas” foram determinantes para o
desenvolvimento das técnicas de pesquisa que permitem recolher
diretamente observações e informações sobre a cultura nativa. As
sociedades estudadas diretamente por esses antropólogos eram
sociedades sem escrita, longínquas, isoladas, de pequenas dimensões,
com reduzida especialização das atividades sociais, tendo sido classificadas
como “simples” ou “primitivas” em contraste com a organização “complexa”
das sociedades dos pesquisadores.
 
Fonte:Shutterstock
 Lewis Henry Morgan. Fonte: wikimedia.org
O primeiro antropólogo a conviver com os nativos foi o americano Lewis
Henry Morgan (foto), um dos mais expressivos representantes do
pensamento evolucionista. Jurista de formação, em 1851 publicou The
League of Hodénosaunee, or Iroquois, considerado o primeiro tratado
científico de etnografia.
javascript:void(0)
 
Fonte:Shutterstock
 Franz Boas. Fonte: wikimedia.org
 
Fonte:Shutterstock
 Bronislaw Malinowski. Fonte: wikimedia.org
Mas foram os trabalhos de campo de Franz Boas e Bronislaw Malinowski
(respectivamente retratados acima), entre 1883 e 1902, e, particularmente,
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javascript:void(0)
a expedição às ilhas Trobriand, que consagraram a ideia de que os
antropólogos deveriam passar um longo período na sociedade que estão
estudando para encontrar e interpretar seus próprios dados, em vez de
depender dos relatos dos viajantes, como faziam os chamados
“antropólogos de gabinete”.
Nos primeiros trinta anos do século XX, o trabalho de campo passou a
orientar as pesquisas antropológicas. Boas, um geógrafo de formação,
crítico radical dos antropólogos evolucionistas, ensinou que no campo tudo
deveria ser anotado meticulosamente e que um costume só tem significado
se estiver relacionado ao seu contexto particular. Ensinou também o
“relativismo cultural”: o pesquisador deveria estudar as culturas com um
mínimo de preconceitos etnocêntricos.
Para Boas, o que constitui o “gênio próprio” de um povo repousa sobre as
experiências individuais e, portanto, o objetivo do pesquisador é
compreender a vida do indivíduo dentro da própria sociedade em que vive.
A primeira experiência de campo de Malinowski foi em 1914, entre os mailu,
na Melanésia. Impedido de voltar à Inglaterra no início da Primeira Guerra
Mundial, ele começou sua pesquisa nas ilhas Trobriand, de 1915 a 1916,
retornando em 1917 para viver com os nativos por mais um ano. Essa longa
convivência com os nativos teve uma influência decisiva na inovação do
método de pesquisa antropológica.
Malinowski demonstrou que o comportamento nativo não é irracional, mas
se explica por uma lógica própria que precisa ser descoberta pelo
pesquisador. Colocou em prática a observação participante, criando um
modelo do que deve ser o trabalho de campo: o pesquisador, por meio de
uma estada de longa duração, deve mergulhar profundamente na cultura
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nativa, impregnando‐se da mentalidade nativa. Deve viver, falar, pensar e
sentir como os nativos.
Grande parte da renovação das ciências sociais se deve às influências
(diretas ou indiretas) dos métodos de pesquisa de Malinowski. Argonauts of
the Western Pacific provocou uma verdadeira ruptura metodológica na
Antropologia, priorizando a observação direta e a experiência pessoal do
pesquisador no campo.
FRÉDÉRIC LE PLAY
Frédéric Le Play (1806-1882) teve uma grande influência no
desenvolvimento da sociologia aplicada devido às metodologias que
propôs para estudar determinados fenômenos sociais; considerava a
família e o orçamento familiar fundamentais para estudar as condições
sociais da sociedade em que se encontravam.
LEWIS HENRY MORGAN
Lewis Henry Morgan (1818-1881) foi um antropólogo, etnólogo e
escritor norte-americano. Considerado um dos fundadores da
antropologia moderna, fez pesquisa de campo entre os iroqueses, de
onde retirou material para sua reflexão sobre cultura e sociedade.
FRANZ BOAS
Franz Uri Boas (1858-1942) foi um antropólogo teuto-americano e um
dos pioneiros da antropologia moderna que tem sido chamado de "Pai
da Antropologia Americana". Estudando na Alemanha, Boas foi
premiado com um doutorado em Física em 1881, enquanto estudava
Geografia.
BRONISLAW MALINOWSKI
Bronislaw Kasper Malinowski (1884-1942) foi um antropólogo polonês.
É considerado um dos fundadores da Antropologia social. Atuando na
London School of Economics,fundou a Escola Funcionalista. Suas
grandes influências incluíam James Frazer e Ernst Mach.
Malinowski, considerado o pai do funcionalismo, acreditava que cada
cultura tivesse como função a satisfação das necessidades básicas dos
indivíduos que a compõem, criando instituições capazes de responder
a essas necessidades. A análise funcional consiste em verificar todo
fato social do ponto de vista das relações de interdependência que ele
mantém, sincronicamente, com outros fatos sociais no interior de uma
totalidade.
INOVAÇÃO DO MÉTODO DE
PESQUISA ANTROPOLÓGICA
Argonauts of the Western Pacific, publicado em 1922, é um verdadeiro
tratado sobre o trabalho de campo. A convivência íntima com os nativos
passou a ser considerada o melhor instrumento de que o antropólogo
dispõe para compreender “de dentro” o significado das lógicas
particulares características de cada cultura.
 SAIBA MAIS
Boas foi o grande mestre da antropologia americana na primeira metade do
século XX. Formou toda uma geração de antropólogos importantes no
campo, como Ralph Linton, Ruth Benedict e Margaret Mead,
considerados representantes da antropologia cultural americana, que utiliza
métodos e técnicas de pesquisa qualitativa somados a modelos conceituais
próximos da Psicologia e da Psicanálise.
RALPH LINTON
Ralph Linton (1893-1953) foi um respeitado antropólogo americano de
meados do século XX, particularmente lembrado por seus textos O
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Estudo do Homem e A Árvore da Cultura. Uma das principais
contribuições de Linton para a Antropologia foi definir uma distinção
entre status e papel.
RUTH BENEDICT
Ruth Benedict (1887-1948) foi uma antropóloga americana, iniciou sua
graduação na Universidade de Columbia em 1919. Lá, entrou em
contato com Franz Boas e se tornou PhD. Em 1923, tornou-se membro
da mesma universidade. São de autoria de Boas muitos trabalhos
clássicos, inclusive Raça, Linguagem e Cultura – provavelmente o mais
veemente texto antirracista a surgir do mundo acadêmico em sua
época.
MARGARET MEAD
Margaret Mead (1901-1978) foi uma antropóloga cultural norte-
americana. Nasceu na Pensilvânia, criada na localidade de Doylestown
por um pai professor universitário e uma mãe ativista social. Graduou-
se no Barnard College em 1923 e fez doutorado na Universidade de
Columbia em 1929.
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. SOBRE O CONCEITO DE PESQUISA ESTUDADO NESTE
TEMA, É CORRETO AFIRMAR, EXCETO:
A) A pesquisa não é uma ação isolada, mas uma oportunidade de fazer
exercícios que servirão por toda a vida.
B) O autêntico pesquisador compreende a pesquisa como um jogo que lhe
proporciona a criatividade e o desenvolvimento do olhar científico.
C) Ainda que o objeto não seja ou não pareça interessante, é preciso que o
trabalho do pesquisador seja instigante.
D) Não é qualquer tema ou assunto da atualidade que pode ser objeto de
uma pesquisa científica.
E) Mesmo temas do cotidiano e banais, dependendo da experiência do
pesquisador, podem se tornar grandes e profundas pesquisas.
2. PARA ESTE PENSADOR, OS FATOS SOCIAIS SOMENTE
PODEM SER EXPLICADOS POR OUTROS FATOS SOCIAIS
E NÃO POR EXPLICAÇÕES PSICOLÓGICAS OU
BIOLÓGICAS, DIFERENCIANDO-SE DE MUITOS OUTROS
PENSADORES DE SUA ÉPOCA. A ADOÇÃO DO MÉTODO
CIENTÍFICO NAS CIÊNCIAS SOCIAIS TEM, COM CERTEZA,
A SUA INFLUÊNCIA DIRETA E DETERMINANTE. ESSE
PENSADOR É:
A) Durkheim
B) Comte
C) Malinowski
D) Dilthey
E) Weber
GABARITO
1. Sobre o conceito de pesquisa estudado neste tema, é correto
afirmar, exceto:
A alternativa "D " está correta.
 
Qualquer tema ou assunto da atualidade pode ser objeto de uma pesquisa
científica. A pesquisa não é uma ação isolada, mas uma oportunidade de
fazer exercícios que servirão por toda a vida. O autêntico pesquisador
compreende a pesquisa como um jogo que lhe proporciona criatividade e o
desenvolvimento do olhar científico. Ainda que o objeto não seja ou não
pareça interessante, é preciso que o trabalho do pesquisador seja
instigante. Mesmo temas do cotidiano e banais, dependendo da experiência
do pesquisador, podem se tornar grandes e profundas pesquisas.
2. Para este pensador, os fatos sociais somente podem ser explicados
por outros fatos sociais e não por explicações psicológicas ou
biológicas, diferenciando-se de muitos outros pensadores de sua
época. A adoção do método científico nas ciências sociais tem, com
certeza, a sua influência direta e determinante. Esse pensador é:
A alternativa "A " está correta.
 
É fato social toda a maneira de fazer, fixada ou não, suscetível de exercer
sobre o indivíduo uma coerção exterior; ou ainda, toda a maneira de fazer
que é geral na extensão de uma sociedade dada e, ao mesmo tempo,
possui uma existência própria, independentemente de suas manifestações
individuais. O fato social é tudo o que se produz na e pela sociedade, ou
ainda, aquilo que interessa e afeta o grupo de alguma forma (DURKHEIM,
1985).
MÓDULO 2
 Reconhecer a importância da análise de dados para a pesquisa
acadêmica no âmbito das análises quantitativa e qualitativa
ANÁLISE DOS DADOS: DA FASE
DA COLETA À INTERPRETAÇÃO
Agora vamos nos aprofundar um pouco mais na pesquisa de campo e como
ela acontece. Isso possibilitará que você encontre a melhor metodologia
para realizá-la quando estiver elaborando seu próprio projeto de pesquisa
ou mesmo já buscando os dados de seu objeto. Para isso, continuaremos
aproveitando a experiência antropológica citada.
Malinowski sugeriu três questões para o trabalho de campo:
 
Por meio do contato íntimo com a vida nativa, exaustivamente registrado no
diário de campo, Malinowski buscou as respostas dessas questões
preocupando‐se em compreender o ponto de vista nativo.
Para Malinowski, a Antropologia era o estudo segundo o qual,
compreendendo o “primitivo”, poderíamos chegar a compreender melhor a
nós mesmos. A rica experiência de campo de Malinowski, assim como suas
propostas metodológicas, influenciaram decisivamente a aplicação de
técnicas e métodos de pesquisa qualitativa em ciências sociais.
 
Fonte:Shutterstock
 Malinowski em pesquisa de campo com nativos das Ilhas Trobriand. |
Fonte: scihi.org
Na década de 1970, surge nos EUA, inspirada na ideia weberiana de que a
observação dos fatos sociais deve levar à compreensão (e não a um
conjunto de leis), a antropologia interpretativa. Um dos principais
representantes da abordagem interpretativa é Clifford Geertz, que propõe
um modelo de análise cultural hermenêutico: o antropólogo deve fazer uma
descrição em profundidade (descrição densa) das culturas como “textos”
vividos, como “teias de significados” que devem ser interpretados.
De acordo com Geertz (1978), os “textos” antropológicos são interpretações
sobre as interpretações nativas, já que os nativos produzem interpretações
de sua própria experiência. Essa perspectiva se traduz em um permanente
questionamento do antropólogo a respeito dos limites de sua capacidade de
conhecer o grupo que estuda, e na necessidade de expor, em seu texto,
suas dúvidas, perplexidades e os caminhos que levaram à sua
interpretação, percebida sempre como parcial e provisória.
CLIFFORD GEERTZ
Clifford James Geertz (1926-2006) foi um antropólogo estadunidense,
professor emérito da Universidade de Princeton, em Nova Jersey, nos
Estados Unidos. Seu trabalho no Institute for Advanced Study de
Princeton se destacou pela análise da prática simbólica no fato
antropológico.
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Geertz inspirou a tendência atual da chamada antropologia reflexiva (ou
pós‐interpretativa), que propõe uma autorreflexão a respeito do trabalho de
campo nos seus aspectos morais e epistemológicos. Essa antropologia
questiona a autoridade do texto antropológico e propõe que o resultado da
pesquisa não seja fruto da observação pura e simples, mas de um diálogo e
de uma negociação de pontos de vista entre pesquisador e pesquisados.
 
Fonte:Shutterstock
 Clifford Geertz. Fonte: wikimedia.orgPartindo do princípio de que o ato de compreender está ligado ao universo
existencial humano, as abordagens qualitativas não se preocupam em fixar
leis para se produzir generalizações. Os dados da pesquisa qualitativa
objetivam uma compreensão profunda de certos fenômenos sociais
apoiados no pressuposto da maior relevância do aspecto subjetivo da ação
social. Contrapõem‐se, assim, à incapacidade da estatística de dar conta
dos fenômenos complexos e da singularidade dos fenômenos que não
podem ser identificados por meio de questionários padronizados.
 ATENÇÃO
Enquanto os métodos quantitativos supõem uma população de objetos
comparáveis, os métodos qualitativos enfatizam as particularidades de um
fenômeno em termos de seu significado para o grupo pesquisado. É como
um mergulho em profundidade dentro de um grupo “bom para pensar”
questões relevantes para o tema estudado.
 Fonet: GrAl | Shutterstock
O reconhecimento da especificidade das ciências sociais conduz à
elaboração de um método que permita o tratamento da subjetividade e da
singularidade dos fenômenos sociais. Com esses pressupostos básicos, a
representatividade dos dados na pesquisa qualitativa em ciências sociais
está relacionada à sua capacidade de possibilitar a compreensão do
significado e a “descrição densa” dos fenômenos estudados em seus
contextos e não à sua expressividade numérica.
A quantidade é, então, substituída pela intensidade, pela imersão profunda
— através da observação participante por um longo período, das entrevistas
em profundidade, da análise de diferentes fontes que possam ser cruzadas
— que atinge níveis de compreensão que não podem ser alcançados por
meio de uma pesquisa quantitativa.
O pesquisador qualitativo buscará casos exemplares que possam ser
reveladores da cultura em que estão inseridos. O número de pessoas é
menos importante do que a insistência em enxergar a questão sob várias
perspectivas. Observar aspectos diferentes, sob enfoques diversos, pode
não só contribuir para reduzir o bias da pesquisa, como também propiciar
uma compreensão mais profunda do problema estudado.
 Fonte: IR Stone | Shutterstock
Grande parte dos problemas metodológicos da pesquisa qualitativa é
decorrente da tentativa de se ter como referência o modelo positivista das
ciências naturais, não se levando em conta a especificidade dos objetos de
estudo das ciências sociais. Os dados qualitativos consistem em descrições
detalhadas de situações, com o objetivo de compreender os indivíduos em
seus próprios termos. Esses dados não são padronizáveis como os dados
quantitativos, obrigando o pesquisador a ter flexibilidade e criatividade no
momento de coletá‐los e analisá‐los.
Duas pesquisadoras destacam-se nesse cenário:
RUTH CARDOSO
 
Fonte:Shutterstock
 Ruth Cardoso. Fonte: wikimedia.org
Ruth Cardoso (1986) apontou para a falta de uma crítica teórico‐
metodológica consistente no campo das ciências sociais e para algumas
das armadilhas e limitações das pesquisas qualitativas. A autora descreve
um “indisfarçado pragmatismo”, que dominou as ciências sociais
contemporâneas e desqualificou o debate sobre os compromissos teóricos
que cada método exige.
EUNICE DURHAM
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Fonte:Shutterstock
 Eunice Durham. Fonte: wikimedia.org
Eunice Durham (1986) concorda com essa crítica e mostra a preocupação
dos pesquisadores em descobrirem uma aplicação imediata e direta dos
resultados de sua pesquisa que beneficie a população estudada. Sem
deixar de ver como necessária a identificação do pesquisador com seu
objeto, porque sem ela é impossível a compreensão “de dentro”, Durham
adverte para o risco de se explicar a sociedade por meio das categorias
“nativas”, sem uma análise científica sobre elas e sem uma reflexão teórica
e metodológica sobre a postura do cientista social.
RUTH CARDOSO
Na área da Antropologia, Ruth Cardoso (1930-2008) recebeu alguns
títulos acadêmicos pela Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências
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Humanas da Universidade de São Paulo (USP). Em 1952, formou-se
em bacharelado e licenciatura em Ciências Sociais, continuando, em
1959, o mestrado em Sociologia e, em 1972, concluindo o doutorado
em Ciências Sociais. Em 1988, obteve pós-doutorado pela Columbia
University e New York University, em Nova York, nos Estados Unidos.
EUNICE DURHAM
Graduou-se em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo
(1954), instituição onde também cursou o mestrado em Ciência Social
(Antropologia Social) em 1964 e o doutorado em Ciência Social
(Antropologia Social) em 1967.
Aaron Cicourel e Mariza Peirano apresentam dois importantes alertas:
AARON CICOUREL
Aaron Victor Cicourel, professor emérito de Sociologia da Universidade
da Califórnia, San Diego, é especializado em Sociolinguística,
comunicação médica, tomada de decisão e socialização infantil. No
início de sua carreira, ele foi intelectualmente influenciado por Alfred
Schütz (1899-1959), Erving Goffman (1922-1982) e Harold Garfinkel
(1917-2011).
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javascript:void(0)
MARIZA PEIRANO
Formou-se em Ciências Sociais na Universidade Federal do Rio de
Janeiro em 1970. Em 1975, concluiu o mestrado em Antropologia
Social na Universidade de Brasília, realizando um estudo em uma
comunidade na costa do Ceará. Em 1980, Mariza Peirano concluiu o
doutorado em Antropologia na Universidade de Harvard. Sua tese de
doutorado, The anthropology of Anthropology: the brazilian case, foi
orientada por David Maybury-Lewis (1929-2007).
 
Fonte: sociology.ucsd.edu
Cicourel (1980) já havia advertido para o perigo de o pesquisador ficar tão
envolvido com o grupo estudado que poderia se tornar um “nativo”, sem
compreender as consequências desta “conversão” para os objetivos da
pesquisa, como, por exemplo, “tornar‐se cego para muitas questões
importantes cientificamente”. Cicourel aponta para as faltas de regras
processuais claras que definam o papel do pesquisador no campo desde o
momento de sua inserção.
 
Fonte: wikimedia.org
Mariza Peirano (1995), em A favor da etnografia, afirma que não se pode
ensinar a fazer pesquisa de campo como se ensinam os métodos
estatísticos, as técnicas de surveys (tipo de investigação quantitativa,
baseada principalmente na coleta de dados), a aplicação de questionário. A
pesquisa qualitativa depende da biografia do pesquisador, das opções
teóricas, do contexto mais amplo e das imprevisíveis situações que ocorrem
no dia a dia da pesquisa.
LEIA MAIS
Um dos principais problemas a ser enfrentado na pesquisa qualitativa
diz respeito à possível contaminação dos seus resultados em função da
personalidade do pesquisador e de seus valores. O pesquisador
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interfere nas respostas do grupo ou do indivíduo que pesquisa. A
melhor maneira de controlar essa interferência é ter a consciência de
como sua presença afeta o grupo e até que ponto esse fato pode ser
minimizado ou, inclusive, analisado como dado da pesquisa.
Maria Isaura Pereira de Queiroz (1983) enfatiza que a omissão de fatos,
de ocorrências, de detalhes pode ser tão significativa quanto a sua inclusão
nos depoimentos. Para a autora, o importante não é verificar se o
entrevistado conhece ou não o fato, mas sim buscar saber por que razão
ele o havia esquecido, ou o havia ocultado, ou simplesmente dele não
tivera registro.
 
Fonte:Shutterstock
 Maria Isaura Pereira de Queiroz
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MARIA ISAURA PEREIRA DE
QUEIROZ
Maria Isaura Pereira de Queiroz (1918-2018) foi uma socióloga
brasileira e escritora premiada com o Prêmio Jabuti de 1967.
Reconhecida nacional e internacionalmente por seus trabalhos com
Ciências Sociais, foi professora da Universidade de São Paulo.
 RESUMINDO
O pesquisador deve estabelecer um difícil equilíbrio para não ir além do que
pode perguntar, mas, também, não ficar aquém do possível. Além disso, a
memória é seletiva, a lembrança diz respeito ao passado, mas se atualiza
sempre a partir de um ponto do presente.As lembranças não são falsas ou verdadeiras, simplesmente contam o
passado através dos olhos de quem o vivenciou. Um trabalho de
negociação e compromisso, como afirma Michael Pollak (1896), que
consiste em interpretar, ordenar ou rechaçar (temporária ou definitivamente)
toda experiência vivida de maneira a torná‐la coerente com uma identidade
construída.
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Fonte:Shutterstock
 Michael Pollak. Fonte: wikimedia.org
MICHAEL POLLAK
Michael Pollak (1948-1992) estudou Sociologia na Universidade de Linz
e escreveu uma tese sob a orientação de Pierre Bourdieu (1930-2002).
Em 1982, trabalhou nas condições de vida em campos de
concentração e conduziu entrevistas com sobreviventes. Ele também
estudava o estilo de vida dos homossexuais. Em 1985, lançou a
primeira pesquisa sobre AIDS na França. No final da década de 1980,
desenvolveu estudos sobre a história das tecnologias de pesquisa em
colaboração com Alain Desrosières (1940-2013), com foco nas
pesquisas realizadas por Max Weber na Prússia Oriental.
 
Fonte:Shutterstock
 Paul Thompson. Fonte: wikimedia.org
Existem algumas qualidades essenciais que o pesquisador deve possuir
para ter sucesso em suas entrevistas: interesse real e respeito pelos seus
pesquisados, flexibilidade e criatividade para explorar novos problemas em
sua pesquisa, capacidade de demonstrar compreensão e simpatia por eles,
sensibilidade para saber o momento de encerrar uma entrevista ou “sair de
cena” e, como lembra Paul Thompson (1992), principalmente, disposição
para ficar calado e ouvir.
PAUL THOMPSON
Paul Thompson é professor aposentado de Sociologia da Universidade
de Essex; é um dos pioneiros da história oral na Grã-Bretanha e
atualmente uma das autoridades mundiais na reflexão e na utilização
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desse método para o registro histórico. Dirige a National Life Story
Collection, da Biblioteca Nacional de Londres.
 ATENÇÃO
Thompson, ao analisar a situação de entrevista, afirma que quem não
consegue parar de falar nem resistir à tentação de discordar do informante e
de impor suas próprias ideias, obterá informações inúteis ou enganosas.
Howard Becker admite que, no lugar de procedimentos uniformes, prefere
um modelo artesanal de ciência, no qual cada pesquisador produz as
teorias e técnicas necessárias para o trabalho que está sendo feito.
HOWARD BECKER
Howard Saul Becker é um sociólogo norte-americano que fez grandes
contribuições à sociologia do desvio, sociologia da arte e sociologia da
música. Becker também escreveu extensivamente sobre estilos e
metodologias de escrita sociológica. O livro de Becker, Outsiders, de
1963, forneceu as bases para a teoria da rotulagem.
Becker (1997) alerta que a escolha das teorias que orientam a pesquisa
também está contaminada pelas preferências e dificuldades do pesquisador,
já que uma organização ou um grupo pode ser visto de muitas maneiras
diferentes, nenhuma delas certa ou errada, visto que são alternativas
possíveis e talvez complementares. Não é possível formular regras precisas
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sobre as técnicas de pesquisa qualitativa porque cada entrevista ou
observação é única: depende do tema, do pesquisador e de seus
pesquisados.
 
 Howard Becker. Fonte: wikimedia.org
A delimitação do objeto de estudo deve ser claramente explicitada pelo
pesquisador para que outros pesquisadores analisem as conclusões
obtidas. A escolha do objeto está relacionada a um problema central deste
tipo de abordagem: a questão da representatividade do caso escolhido.
Ao contrário das pesquisas quantitativas, em que a representatividade se
estabelece através de procedimentos claros, não existem regras precisas
para a escolha de um caso a ser estudado de maneira aprofundada pelo
cientista social. A exemplaridade de um indivíduo ou grupo e a possibilidade
de explorar um problema em profundidade em uma instituição ou família
são alguns dos motivos que levam à escolha do objeto de estudo. Essa
escolha depende, fortemente, da sensibilidade e experiência do
pesquisador e não apenas de características objetivas do grupo estudado.
O pesquisador deve:
 
Apresentar claramente as características do indivíduo, da organização ou
do grupo que foram determinantes para sua escolha, de tal forma que o
leitor possa tirar suas próprias conclusões sobre os resultados e a sua
possível aplicação em outros grupos ou indivíduos em situações similares.
 
Explicitar as dificuldades e os limites da pesquisa, as pessoas que o
ajudaram em sua entrada no campo (que são determinantes para a
construção da identidade do pesquisador pelo grupo estudado), as pessoas
que se recusaram a dar entrevistas, as perguntas que não foram
respondidas pelos pesquisados, as contradições apresentadas, a
(in)consistência das respostas, possibilitando uma visão ampla do estudo e
não apenas dos aspectos que “deram certo”.
O fato de ter uma convivência profunda com o grupo estudado pode
contribuir para que o pesquisador “naturalize” certas práticas e alguns
comportamentos que deveria “estranhar” para compreender. Malinowski
chama a atenção para a “explosão de significados” no momento de entrada
no campo, em que cada fato observado na cultura nativa é significativo para
o pesquisador. O olhar que “estranha”, em um primeiro momento, passa a
“naturalizar” em seguida e torna‐se “cego” para dados valiosos.
É comum que pesquisadores se vejam em situações delicadas com o
indivíduo ou grupo pesquisado que extrapolam os limites da pesquisa, como
pedido de dinheiro ou de favores, convites inapropriados, telefonemas após
o término da pesquisa etc. Todos esses problemas, decorrentes do
envolvimento intenso com o objeto de estudo, precisam ser administrados
pelo pesquisador para que sua pesquisa não fique comprometida.
QUANTO MAIS INTENSA A RELAÇÃO, MAIOR A
NECESSIDADE DE UM “DISTANCIAMENTO” DO
PESQUISADOR, QUE TORNE POSSÍVEL A SUA
REFLEXÃO SOBRE CADA DIFICULDADE QUE,
COM CERTEZA, TERÁ DE ENFRENTAR.
 Fonte: Lucky Business | Shutterstock
 RESUMINDO
A questão do relacionamento entre pesquisador e objeto, da possível
dependência ou disputa de poder, é um dos maiores problemas que devem
ser enfrentados. O pesquisador necessita ter bom senso e criatividade para
encaminhar as soluções para cada situação. A experiência e a maturidade
do pesquisador são fatores determinantes para que a pesquisa seja bem‐
sucedida.
INTEGRAÇÃO DOS DADOS DA
ANÁLISE QUANTITATIVA E
QUALITATIVA
Muitos pesquisadores que utilizam métodos de pesquisa qualitativos
consideram que os surveys apenas servem para dar legitimidade ao senso
comum, visto que não contribuem para a compreensão dos fenômenos
sociais. Para esses cientistas sociais, os métodos quantitativos simplificam
a vida social limitando‐a aos fenômenos que podem ser enumerados.
Afirmam que as abordagens quantitativas sacrificam a compreensão do
significado em troca do rigor matemático.
 
Fonte:Shutterstock
 Fonte: Kanjana Kawfang | Shutterstock
Max Weber acreditava que se podia tirar proveito da quantificação na
Sociologia, desde que esse método se mostrasse fértil para a compreensão
de determinado problema e não obscurecesse a singularidade dos
fenômenos que não poderia ser captada por meio da generalização. Como
nenhum pesquisador tem condições para produzir um conhecimento
completo da realidade, diferentes abordagens de pesquisa podem projetar
luz sobre distintas questões. É o conjunto de diversos pontos de vista e de
maneiras de coletar e analisar os dados (qualitativa e quantitativamente)
que permite uma ideia mais ampla e inteligível da complexidade de um
problema.
A integração da pesquisa quantitativa e qualitativa permite que o
pesquisador faça um cruzamento de suas conclusões de modo a ter maior
confiança de que seus dados não são produto de um procedimento
específico ou de alguma situação particular. Ele não se limita ao que pode
ser coletado em uma entrevista: pode entrevistar repetidamente, pode
aplicarquestionários, pode investigar diversas questões em diferentes
ocasiões, pode utilizar fontes documentais e dados estatísticos.
A MAIOR PARTE DOS PESQUISADORES EM
CIÊNCIAS SOCIAIS ADMITE QUE NÃO HÁ UMA
ÚNICA TÉCNICA, UM ÚNICO MEIO VÁLIDO DE
COLETAR OS DADOS EM TODAS AS PESQUISAS.
Há uma interdependência entre os aspectos quantificáveis e a vivência da
realidade objetiva no cotidiano. A escolha de trabalhar com dados
estatísticos ou com um único grupo ou indivíduo, ou com ambos, depende
das questões levantadas e dos problemas que se quer resolver.
É o processo da pesquisa que determina as técnicas e os procedimentos
necessários para as respostas que se quer alcançar. Cada pesquisador
deve estabelecer os procedimentos de coleta de dados que sejam mais
adequados para o seu objeto particular. O importante é ser criativo e flexível
para explorar todos os possíveis caminhos e não reificar a ideia positivista
de que os dados qualitativos comprometem a objetividade, a neutralidade e
o rigor científico.
 
Fonte:Shutterstock
 Fonte: shutter_o | Shutterstock
A combinação de metodologias diversas no estudo do mesmo fenômeno
tem por objetivo abranger a máxima amplitude na descrição, explicação e
compreensão do objeto de estudo. Parte de princípios que sustentam que é
impossível conceber a existência isolada de um fenômeno social. Enquanto
os métodos quantitativos pressupõem uma população de objetos de estudo
comparáveis, que fornecerá dados que podem ser generalizáveis, os
métodos qualitativos poderão observar, diretamente, como cada indivíduo,
grupo ou instituição experimenta, concretamente, a realidade pesquisada.
A pesquisa qualitativa é útil para identificar os conceitos e as variáveis
relevantes de situações que podem ser estudadas quantitativamente. É
inegável a riqueza que pode ser explorada nos casos desviantes da “média”
que ficam obscurecidos nos relatórios estatísticos. Também é evidente o
valor da pesquisa qualitativa para estudar questões difíceis de quantificar,
como os sentimentos, as motivações, as crenças e as atitudes individuais.
 COMENTÁRIO
A premissa básica da integração repousa na ideia de que os limites de um
método poderão ser contrabalançados pelo alcance de outro. Os métodos
qualitativos e quantitativos, nessa perspectiva, deixam de ser percebidos
como opostos para serem vistos como complementares.
Um exemplo de integração de observação participante e survey é o estudo
de Neuma Aguiar no Cariri, uma região no sul do Ceará, sobre os modos
de organização social da produção e na transformação de três tipos de
matéria‐prima.
NEUMA AGUIAR
Neuma Figueiredo de Aguiar possui graduação em História pela PUC-
Rio (1960), mestrado em Sociologia e Antropologia pela Boston
University (1962), doutorado em Sociologia pela Washington University
(1969) e doutorado em Ciências pela University of Wisconsin-Madison
(2003). Tem experiência na área de Sociologia, com ênfase em gênero
e sociedade, atuando principalmente nos seguintes temas: gênero e
patriarcado, movimentos de mulheres, estratificação e mobilidade
social, sociologia internacional comparada e sociologia dos usos do
tempo.
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Fonte:Shutterstock
 Fonte: Lesya Pogosskaya | Shutterstock
A pesquisadora procurou observar as atividades envolvidas na produção do
milho, do barro e da mandioca, assim como as representações elaboradas
pelos próprios trabalhadores. Aguiar (1978) afirma que os dados da
observação participante são profundos na medida em que atingem níveis
de compreensão dos fatos sociais não alcançados pelos surveys. Por
outro lado, os dados dos surveys atingem um nível de mensuração que a
observação participante não pode atingir. A autora propõe que um modo de
superar a dificuldade de generalização dos dados qualitativos e a
dificuldade de interpretação das correlações alcançadas pelos surveys seja
tentar integrar os dois métodos.
Para aumentar a variabilidade dos dados a fim de situar o fenômeno
estudado em um contexto mais abrangente, Aguiar propõe que as
categorias relevantes, selecionadas por meio do processo de observação
participante, sejam empregadas de modo amplo e sistemático com a
utilização do questionário. Durante seis meses, a autora estudou, através da
observação participante, duas indústrias de produtos cerâmicos e duas
indústrias de farinha de milho. Também recolheu, por intermédio de
entrevistas e documentos, dados sobre uma fábrica de fécula de mandioca
que havia fechado. Foram aplicados, depois disso, 250 questionários.
 ATENÇÃO
A autora afirma que a generalização não é o único objetivo de sua pesquisa,
e que a observação participante foi de fundamental importância para
explorar o tema e levantar as hipóteses, para questionar as categorias de
seu vocabulário (que não foram compreendidas pelos trabalhadores), para
especificar os conceitos e as perguntas de seus questionários. Aguiar
demonstra que a combinação do survey com a observação participante
possibilitou ir além das generalizações sobre o processo de industrialização
na região, e permitiu a compreensão das representações dos trabalhadores
sobre suas atividades.
DEPOIMENTO
Outro exemplo de integração de dados qualitativos e quantitativos é a minha
pesquisa sobre amantes de homens casados (GOLDENBERG, 1990). Fiz
entrevistas em profundidade com oito mulheres, em um primeiro estudo. Em
seguida, entrevistei nove homens casados que refletiram sobre as suas
experiências extraconjugais. Por fim, realizei um estudo de caso, em que
entrevistei o homem casado, sua amante e toda a sua família (pai, mãe,
duas irmãs e um irmão). Além desses dados qualitativos, foram
fundamentais para as minhas conclusões as análises demográficas feitas
por Elza Berquó, a partir dos dados do censo de 1980.
ELZA BERQUÓ
Elza é uma das fundadoras da Associação Brasileira de Estudos
Populacionais (ABEP), da qual foi presidente e na qual tem ativa
participação. Também é membro da International Union for the
Scientific Study of Population, da Population Association of America e
da Associación Latinoamericana de Población.
 
Berquó (1989) percebeu que, entre a população com mais de 65 anos,
somente 32% das mulheres estavam casadas enquanto 76% dos homens
estavam casados. A maior mortalidade dos homens — e o fato de o homem
brasileiro se casar com mulheres mais jovens que ele — gera esse
desequilíbrio. As mulheres teriam, assim, chances iguais aos homens
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somente até os 30 anos, no máximo. Berquó levanta a hipótese de que no
Brasil exista uma poligamia disfarçada, já que as mulheres sem
possibilidades de casamento acabam se unindo a homens casados.
Nesse caso, apenas para ilustrar, os dados quantitativos revelam uma
realidade demográfica e as entrevistas em profundidade retratam como
cada mulher vivencia essa situação. É interessante como minhas
entrevistadas se queixam que “falta homem no mercado”, constatação que
pode ser facilmente verificada pelos dados do censo.
 
Fonte:Shutterstock
 Fonte: Arthimedes | Shutterstock
Os dados do IBGE sobre idade, sexo e estado civil foram usados para
pensar situações complexas, não quantificáveis, como a situação de ser
amante de um homem casado. Esses dados ajudaram a interpretar o
discurso e a compreender a situação de uma forma mais ampla.
Interpretados à luz da minha questão, concluo que as mulheres têm menos
chances de casar e essa pode ser uma possível explicação para a situação
da amante. Sem os dados do IBGE, poderia me restringir às explicações
dos pesquisados: a ideia de que o fato de ser amante deve corresponder a
um tipo determinado de personalidade de mulher “que não se valoriza” ou
que “não quer compromisso”. A integração dos dados quantitativos e
qualitativos permite verificar a tensão existente entre a “escolha individual” e
o “campo de possibilidades” das mulheres que são amantes de homens
casados.
 RESUMINDO
Mediante essa análise concreta, é possível demonstrar quea análise e a
interpretação dos dados quantitativos e qualitativos podem proporcionar
uma melhor compreensão do problema estudado. O conflito entre a
pesquisa qualitativa e a quantitativa é artificial. Cada vez mais os
pesquisadores estão descobrindo que devem utilizar todos os recursos e as
técnicas existentes que possam contribuir para o entendimento do problema
estudado.
Pesquisa quantitativa x Pesquisa qualitativa
VERIFICANDO O APRENDIZADO
1. ESTE PENSADOR MARCOU A HISTÓRIA E A
CONCEITUAÇÃO DA PESQUISA AO APRESENTAR SUA
TEORIA DE QUE É NO TRABALHO DE CAMPO, NO
CONTATO ÍNTIMO COM O COTIDIANO DOS NATIVOS, NA
VIVÊNCIA DIÁRIA E COM OS REGISTROS DE TODAS AS
ATIVIDADES QUE SERÁ POSSÍVEL OBTER AS
RESPOSTAS PARA AS PRINCIPAIS QUESTÕES QUE
ENVOLVEM AS INTERROGAÇÕES ACERCA DA VIDA DOS
NATIVOS. ESSE PENSADOR É:
A) Durkheim
B) Comte
C) Malinowski
D) Dilthey
E) Weber
2. ESTE PENSADOR NÃO ACEITAVA A GENERALIZAÇÃO
NA COMPREENSÃO DOS FENÔMENOS. POR ISSO, ELE
AFIRMAVA QUE O MÉTODO QUANTITATIVO DEFENDIDO
PELO POSITIVISMO SOMENTE PODERIA SER
PROVEITOSO SE NÃO OBSCURECESSE A
COMPREENSÃO. AFIRMA ELE EM SEU LIVRO
METODOLOGIA DAS CIÊNCIAS SOCIAIS (2001): “NÃO HÁ
UM ‘AGIR RACIONAL’ SEM A EXPERIMENTAÇÃO DE
REGRAS REFERENTES AO DECURSO HISTÓRICO QUE
APENAS PODEM SER PERCEBIDAS E ELABORADAS
MEDIANTE UMA ‘PERCEPÇÃO E OBSERVAÇÃO
OBJETIVANTES’. ESSE PENSADOR É:
A) Malinowski
B) Durkheim
C) Comte
D) Weber
E) Dilthey
GABARITO
1. Este pensador marcou a história e a conceituação da pesquisa ao
apresentar sua teoria de que é no trabalho de campo, no contato
íntimo com o cotidiano dos nativos, na vivência diária e com os
registros de todas as atividades que será possível obter as respostas
para as principais questões que envolvem as interrogações acerca da
vida dos nativos. Esse pensador é:
A alternativa "C " está correta.
 
Para Malinowski, o trabalho de campo possibilita a compreensão do estado
mais primitivo do objeto de estudo. Malinowski influenciou decisivamente a
pesquisa ao apresentar sua proposta investigativa de campo com a
aplicação de técnicas específicas de pesquisa, principalmente no diário de
campo, que deve conter o relato das observações. Ele é um dos
representantes da pesquisa qualitativa em ciências sociais.
2. Este pensador não aceitava a generalização na compreensão dos
fenômenos. Por isso, ele afirmava que o método quantitativo
defendido pelo positivismo somente poderia ser proveitoso se não
obscurecesse a compreensão. Afirma ele em seu livro Metodologia das
Ciências Sociais (2001): “Não há um ‘agir racional’ sem a
experimentação de regras referentes ao decurso histórico que apenas
podem ser percebidas e elaboradas mediante uma ‘percepção e
observação objetivantes’. Esse pensador é:
A alternativa "D " está correta.
 
Max Weber defendia a pesquisa qualitativa e, por isso, questionou a
validade do método positivista das metodologias das ciências sociais como
uma física social capaz de compreender os fenômenos sem generalizá-los.
CONCLUSÃO
CONSIDERAÇÕES FINAIS
Antes de finalizarmos, gostaria de trazer uma informação que talvez lhe
ajude a compreender a importância de tudo que aqui estudamos. Minha
primeira experiência com pesquisa científica foi em 1978, aos 21 anos,
quando ingressei no Mestrado de Educação da Pontifícia Universidade
Católica do Rio de Janeiro. Após dois anos e meio defendi minha
dissertação O deficiente auditivo no mundo do trabalho: um estudo sobre a
satisfação profissional. Com a pressão da minha orientadora, que cobrava
relatórios semanais, fui a primeira da turma a defender a dissertação.
É preciso registrar a importância dos nossos primeiros orientadores, que
nos ensinam a pensar, ter disciplina e escrever corretamente.
A minha verdadeira formação como pesquisadora, no entanto, iniciou-se
dez anos depois, em 1988, com o meu doutoramento. Em um ambiente de
intensas e calorosas discussões, de professores e alunos brilhantes,
encontrei solo fértil para começar a fazer pesquisa na área das chamadas
Ciências Humanas ou Ciências Sociais. Desde então, contagiada pelo vírus
do “olhar científico”, não consegui parar de pesquisar.
E é exatamente assim que você deve estar se sentindo! Ao trazer toda a
reflexão feita em nosso tema para a sua prática de estudante (e futuro
pesquisador), você já deve identificar a seriedade de uma pesquisa
acadêmica e a importância da utilização de modelos qualitativos e
quantitativos – ou a integração deles – de acordo com objeto pesquisado e
seus objetivos. E, quem sabe, já esteja contagiado pelo brilho nos olhos,
mantendo sempre acesa a chama do olhar científico.
AVALIAÇÃO DO TEMA:
REFERÊNCIAS
AGUIAR, N. Observação participante e “survey”: uma experiência de
conjugação. In: A aventura sociológica. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
BECKER, H. Métodos de pesquisa em ciências sociais. São Paulo:
Hucitec, 1997.
BERQUÓ, E. A família no século XXI. In: Ciência Hoje. v. 10, n. 58,
outubro 1989.
CARDOSO, R. Aventuras de antropólogos em campo ou como escapar
das armadilhas do método. In: A aventura antropológica. Rio de Janeiro.
Paz e Terra, 1986.
CICOUREL, A. Teoria e método em pesquisa de campo. In:
Desvendando máscaras sociais. Rio de Janeiro: Francisco Alves, 1980.
DURHAM, E. A pesquisa antropológica com populações urbanas. In: A
aventura antropológica. Rio de Janeiro, Paz e Terra, 1986.
DURKHEIM, E. As regras do método sociológico. São Paulo: Nacional,
1985.
GEERTZ, E. A interpretação das culturas. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
GOLDENBERG, M. A Out,/. Rio de Janeiro: Record, 1990.
LACERDA, G. B. Augusto Comte e o "positivismo" redescobertos. In:
Revista de Sociologia e Política, Curitiba, v. 1, n. 34, p. 319-343, out. 2009.
MALINOWSKI, B. Argonautas do Pacífico Ocidental. São Paulo: Abril
Cultural, 1978.
PEIRANO, M. A favor da etnografia. Rio de Janeiro: Relume Dumará,
1995.
POLLAK, M. Le Témoignage In: Actes de la recherche en sciences
sociales. L’illusion biographique. v. 62-63, jun. 1986.
QUEIROZ, M. I. P. Variações sobre a técnica de gravador no registro da
informação viva. (Col. Textos, 4). São Paulo: CERU e FFLCH/USP, 1983.
THOMPSON, P. A voz do passado: história oral. Rio de Janeiro: Paz e
Terra, 1992.
EXPLORE+
A obra A arte de pesquisar: como fazer pesquisa qualitativa em
ciências sociais (1997) apresenta elementos importantes para o
aprofundamento do conteúdo aqui apresentado. Vale conferir.
Leia sobre Émile Durkheim, considerado o pai da Sociologia, no artigo
que analisa seu legado, 100 anos sem Durkheim. 100 anos com
Durkheim, de R. Weiss e R. Benthien.
Leia sobre Wilhelm Dilthey no artigo que destaca o centenário de sua
morte, Wilhelm Dilthey em novas traduções, de L. Waizbort.
Conheça um pouco mais e a atualidade de Max Weber no artigo
Apresentação: Max Weber, hoje, de L. Waizbort.
Leia o artigo A família na obra de Frédéric Le Play, de T. Botelho, e
saiba um pouco mais sobre o sociólogo Frédéric Le Play e seu método
de pesquisa.
No artigo O parentesco como consciência humana, de P. Gow, conheça
um dos principais conceitos do antropólogo Lewis H. Morgan.
Conheça uma pesquisa realizada a partir da fundamentação teórica de
Franz Boas e Bronislaw Malinowski no artigo A questão alimentar na
trajetória do pensamento antropológico clássico, de L. Santos.
Para saber mais sobre a importância de Ralph Linton, Ruth Benedict e
Margaret Mead, leia o texto Cultura e Personalidade, de R. Oliven.
Leia sobre a perspectiva de Clifford Geertz no texto Pode realmente
haver uma ciência natural da ação humana?, de S. Oliveira.
Conheça a importância de Ruth Cardoso e Eunice Durham no artigo
Ruth Corrêa Leite Cardoso, de Gilberto Velho, publicado em 2008 na
Revista DADOS (IESP-UERJ).
No artigo Pesquisa Etnográfica com crianças: participação, voz e ética,
de R. Marchi, é possível perceber a contribuição de Aaron Cicourel e
Mariza Peirano.
Conheça um pouco mais do trabalho de Maria Isaura Pereira de
Queiroz, no artigo Amizade e memória:Maria Isaura Pereira de Queiroz
e Roger Bastide, de G. Villas Boas.
Leia o artigo Memória, esquecimento, silêncio, de Michael Pollak,
sociólogo e historiador austríaco, e conheça um pouco mais sobre um
importante conceito: memória.
Em seu artigo História Oral e contemporaneidade, o sociólogo britânico
Paul Thompson desenvolve esse importante conceito em sua produção
acadêmica.
A resenha do livro Truques da escrita: para começar e terminar teses,
livros e artigos, de Howard Becker (1928), realizada por C. Lima,
mostra como o sociólogo norte-americano preocupa-se com a temática
da produção científica e escrita acadêmica.
Em seu trabalho Qual a contribuição dos métodos quantitativos em
Ciências Sociais para o conhecimento da sociedade brasileira?,
apresentado no XXV Encontro Anual da ANPOCS, a pesquisadora
Neuma Aguiar já se preocupava com a integração entre a abordagem
quantitativa e a qualitativa.
CONTEUDISTA
Mirian Goldenberg
 CURRÍCULO LATTES
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