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M a r i a L u i z a F e r n a n d e s – E n d o c r i n o l o g i a – P á g i n a | 1 INTRODUÇÃO K Acromegalia é uma doença sistêmica crônica, decorrente da produção excessiva do hormônio de crescimento (GH) e do fator de crescimento semelhante à insulina tipo 1 (IGF-1). QUADRO CLÍNICO K Clinicamente, caracteriza-se pelo surgimento de feições grosseiras e crescimento de extremidades. Esses pacientes têm edemas de tecidos moles, de forma que, muitas vezes, quem se atenta para esse diagnóstico são os dentistas, que visualizam um espaçamento dentário muito grande. Tem cardiopatias, arritmias cardíacas, hipertensão sistólica. Muito comum o paciente acromegálico ter uma prevalência maior de pólipos colônicos (sugerir colonoscopias anuais e, até mesmo, semestrais). K Os sintomas podem ser inespecíficos, tornando a doença subdiagnosticada, o que se associa a elevada morbimortalidade e redução média de 10 anos na expectativa de vida, em função de suas complicações sistêmicas. Na sua quase totalidade, a acromegalia é causada por um adenoma hipofisário secretor de GH (somatotropinoma). K Artralgia, artrites, síndrome do túnel do carpo (compressão do nervo mediano), aumento do nº dos calçados, defeito de campo visual, cefaleia, crescimento de extremidades, pele oleosa, visceromegalias, apneia do sono, irregularidade menstrual, diminuição de libido, galactorreia, skin tags (lesões cutâneas), sudorese, apneia do sono (por conta da macroglossia), diabetes (excesso de GH → leva a resistência insulínica). MODIFICAÇÕES FISIONÔMICAS K Alargamento do nariz. K Aumento dos lábios. K Crescimento exagerado da mandíbula. K Prognatismo. K Separação dos dentes. K Macroglossia. K Aumento das extremidades. Complicações vasculares são as que mais geram morte nos acromegálicos. FISIOLOGIA DO EIXO SOMATOTRÓFICO K A regulação hormonal ocorre sob o controle principal de dois peptídeos hipotalâmicos: K HORMÔNIO LIBERADOR DO HORMÔNIO DE CRESCIMENTO (GHRH): estimula a secreção do hormônio pela hipófise anterior. K SOMATOSTATINA (SRIF): que inibe tal secreção. MECANISMO DE AÇÃO E CONTROLE DE GH K O GH, presente na hipófise anterior, cuja secreção é estimulada pelo GHRH no hipotálamo e quem inibe é a somatostatina. Esse GH é liberado junto como o GHPB (proteína de ligação do GH sérico), que é o transportador e a nível de fígado, vai se transformar em IGF-1, responsável pelo crescimento das cartilagens, ossos e músculos. Acrocórdons (skin tags) podem ser marcadores da existência de pólipos e neoplasias do cólon em acromegálicos. acromegáli M a r i a L u i z a F e r n a n d e s – E n d o c r i n o l o g i a – P á g i n a | 2 K O GH estimula a geração do IGF-1, um hormônio sintetizado predominantemente no fígado e nos tecidos extra-hepáticos (principalmente, osso, músculo e rim), inclusive na própria glândula hipofisária. O IGF-1 tem importante papel na regulação do eixo somatotrófico pela retroalimentação (feedback) negativa sobre o hipotálamo e a hipófise. Ele INIBE A SECREÇÃO DO GH, diretamente pela hipófise e indiretamente por meio da secreção da somatostatina (SRIF), além do efeito inibitório sobre a proliferação celular e indução de apoptose. O GH em excesso provoca resistência insulínica. K O GH possui efeitos somáticos e metabólicos. O crescimento linear ocorre primordialmente de maneira indireta, mediada pelo IGF-1. K Os efeitos metabólicos ocorrem por efeito direto do GH sobre os carboidratos, lipídeos e proteínas. No que se refere aos CARBOIDRATOS, o GH em excesso provoca resistência insulínica, levando a aumento da produção hepática de glicose e menor oxidação e captação da glicose pelos tecidos periféricos. Como consequência, ocorrem hiperinsulinismo secundário, intolerância à glicose e diabetes melito. QUEM LIBERA O HORMÔNIO DO CRESCIMENTO (GH)? K O sono, uma vez que é durante esse período que acontece o pico de GH (sono-REM), e os exercícios físicos. K Lembre que o GH é um hormônio hiperglicemiante, e, quando temos uma hipoglicemia, os hormônios contra- regulatórios (glucagon, catecolaminas, GH, cortisol) são secretados. QUEM DIMINUI O HORMÔNIO DO CRESCIMENTO (GH)? K Obesidade, beta-adrenérgicos, glicocorticoides (crianças que têm crise de asma frequentes, seja ela de origem alérgica ou não, e tomam muito corticoide). MECANISMO DE AÇÃO E CONTROLE DO IGF- 1 K O IGF-1 atua de modo endócrino em tecidos a distância, mas pode ser sintetizado localmente em tecidos-alvo, nos quais age de modo autócrino/parácrino. O IGF-1 circula no plasma ligado a proteínas carreadoras, cujo representante principal é a IGFBP-3, também GH-dependente. O IGF-1 estimula crescimento e proliferação célula, desenvolvimento da musculatura, aumenta os níveis de glicose no sangue, reduz os níveis de gordura corporal, altera a oxidação lipídica e aumenta a síntese de proteínas. K Os níveis de IGF-1 são mais elevados durante a adolescência tardia e declinam ao longo da vida adulta. Esses níveis, determinados pelo sexo e por fatores genéticos, estão elevados durante a puberdade e a gravidez, e na ACROMEGALIA. Em contrapartida, a produção de IGF-1 encontra-se suprimida em pacientes com desnutrição, doença hepática, hipotireoidismo ou diabetes melito mal controlado. EPIDEMIOLOGIA K A acromegalia é uma doença rara, mas certamente subdiagnosticada. No Brasil, há apenas cerca de 1.000 casos de acromegalia registrados no DATASUS. K A doença ocorre com igual frequência em homens e mulheres, podendo acontecer em qualquer idade, porém é mais comum entre 30 e 50 anos. K O seu diagnóstico é frequentemente feito em torno de 7 a 10 anos após o aparecimento dos primeiros sinais e sintomas. Tal fato é extremamente relevante, uma vez que o diagnóstico e o tratamento mais precoces poderiam evitar ou minimizar o surgimento das complicações cardiovasculares, respiratórias e neoplásicas, principais responsáveis pelo aumento de mortalidade na acromegalia. QUAL A DIFERENÇA ENTRE GIGANTISMO E ACROMEGALIA? Quando a secreção excessiva de GH se inicia antes do fechamento das cartilagens de crescimento, acontecem crescimento linear excessivo e GIGANTISMO, enquanto excesso de GH após a fusão epifisária gera ACROMEGALIA. M a r i a L u i z a F e r n a n d e s – E n d o c r i n o l o g i a – P á g i n a | 3 ETIOLOGIA K Aproximadamente 98% dos pacientes com acromegalia ocorrem por um ADENOMA HIPOFISÁRIO SECRETOR DE GH (somatotropinoma), que pode ser um adenoma de células puras de GH ou um adenoma misto com células de GH e prolactina (PRL). Muito raramente, a acromegalia resulta de hipersecreção de GHRH, hipotalâmica ou ectópica. Excepcionalmente, tumores ectópicos secretores de GH são a causa da acromegalia. K Podem co-secretar prolactina (25%) ou TSH (raro). A associação com padrão família encontra-se na NEM-1, Síndrome de McCune Albright, na acromegalia familiar e na Síndrome de Carney. K Raramente pode resultar da hipersecreção GHRH hipotalâmica ou ectópica, tumores ectópicos secretores de GH e acromegalia familiar. DETERMINANTES PROGNÓSTICOS K Níveis de GH (GH basal >10). K Hipertensão arterial. K Doença cardíaca. K Diabetes melitus. K Duração dos sintomas. CAUSAS DE MORTE K Cardiovascular: 38 – 62%. K Respiratória: 10-25%. K Neoplasia maligna: 09-25%. K FALSO-POSITIVO NA NÃO-SUPRESSÃO DO GH ÀS TOTG: Puberdade, gravidez e hipertireoidismo. K FALSO-NEGATIVO: Desnutrição, anorexia, hipotireoidismo, DM descompensado, doença hepática e renal, estrogenioterapia oral. DIAGNÓSTICO K Envolve a avaliação de aspectos clínicos, laboratoriais e radiológicos. K 1º PASSO: Na suspeita diagnóstica realizar a dosagem do GH e IGF-1. Um GH menor que 0,4ng/ml e um IGF-1 normal excluem o diagnóstico. Os pacientes com GH alto e/ou IGF-1 alto devem ser submetidos ao teste oralde tolerância à glicose. K Em indivíduos saudáveis, existe supressão dos níveis de GH após sobrecarga oral de glicose, possivelmente pela ação estimuladora da glicose sobre a secreção de somatostatina. Em pacientes com acromegalia, a resposta à glicose está diminuída, podendo ocorrer inclusive aumento paradoxal dos níveis de GH. K 2º PASSO: Tentar encontrar o adenoma hipofisário. Para isso, utilizam-se os exames de imagem, como TC e RM (melhor) da sela túrcica. A dosagem de GHRH está indicada quando não for encontrado o tumor. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL K Acromegaloidismo. K Paquidermoperiostose. K Gigantismo cerebral (Síndrome de Sotos). K Esclerose. K Fáceis leonina (Hanseníase). EXAMES SOLICITADOS K Ressonância Magnética (RM) de hipófise para avaliação de tumor hipofisário. K Avaliação neuro-oftalmológica completa se detectada presença de macroadenoma com extensão suprasselar próximo ao quiasma óptico. M a r i a L u i z a F e r n a n d e s – E n d o c r i n o l o g i a – P á g i n a | 4 K Avaliação hormonal dos outros eixos hipofisários: prolactina, estrogênio/progesterona ou testosterona, LH, FSH, globulina ligadora do hormônio sexual (SHBG), cortisol basal às 8h da manhã, ACTH, teste da cortrosina se houver dúvida diagnostica sobre presença ou não de insuficiência adrenal, TSH, T4 livre. Lembrar que o GH causa redução dos valores séricos de SHBG; (insuficiência adrenal aumenta o risco anestésico, sendo um fator de maus prognóstico). K CÁLCIO TOTAL E IÔNICO: Se elevado, solicitar PTH para pesquisar NEM-1. K Polissonografia para avaliar SAOS. K USG de tireoide para investigar nódulos tireoidianos. K ECG e ECO transtorácico para pesquisar cardiopatias. K USG de abdome para examinar visceromegalias. K Densitometria mineral óssea (DMO) se houver hipogonadismo e/ou suspeita de osteoporose. DMO e radiografia de coluna lombar e torácica a cada 2 a 3 anos, se houver osteoporose/osteopenia. K Colonoscopia para analisar presença de pólipos colônicos (principalmente na presença de skin tags). K Nas mulheres, mamografia, colpocitologia oncótica, avaliação ginecológica anual de rotina. K Nos homens, avaliação urológica e antígeno prostático específico (PSA) – controverso. TRATAMENTO K Os objetivos do tratamento são reduzir os níveis séricos hormonais, reduzir o volume tumoral e preservar a função da hipófise. K Diferentemente dos prolactinomas, em que o tratamento clinico é de excelência, no paciente acromegálico, o tratamento de escolha é o cirúrgico, cujo método é o transesfenoidal. Depois tem o uso de drogas, agonistas dopaminérgicos, análogos da somatostatina, antagonistas do receptor de GH. E, como sempre, a radioterapia como última opção terapêutica, essa pode ser convencional, estereotáxica em dose única (radiocirurgia) e estereotáxica fracionada. CIRURGIA TRANSESFENOIDAL K Tratamento de escolha para microadenomas (<1cm), macroadenoma restrito à sela túrcica ou macroadenoma que comprima o nervo óptico. K A chance de cura depende do tamanho do tumor: em microadenomas é cerca de 90% e em macroadenomas 50%. K O controle pós operatório deve ser feito com dosagens séricas de GH (um mês após cirurgia) e IGF-1 (três meses após cirurgia). K Também deve-se solicitar uma imagem da sela túrcica 03 meses após a cirurgia. TRATAMENTO MEDICAMENTOSO K Indicado quando o paciente apresenta risco cirúrgico, recusa-se a operar ou quando possui tumores invasivo. K Também podem ser usados no pré-operatório, melhorando as condições clínicas do paciente. K ANÁLOGOS DA SOMATOSTATINA: Agem através de sua ligação com receptores específicos (SSTR). o Octreotide-LAR (10,20,30mg) e Lanreotida (90 e 120mg), ambos IM. o EFEITOS COLATERAIS: Gastrointestinais (náuseas, desconforto abdominal, etc.). K AGONISTAS DOPAMINÉRGICOS: Atuam nos receptores D2 que também estão expressos nas células tumorais. o Inferiores aos análogos da somatostatina. o Cabergolina (0,5mg): Boa para adenomas cossecretores de GH e prolactina. o Bromocriptina. K ANTAGONSITA DO RECEPTOR DO GH: Está indicada para os pacientes com resistência ou intolerância aos análogos da somatostatina. o Pegvisomanto (10, 15 e 20mg). o É um uso mais recente, ele é como se fosse uma chave falsa, de modo que ele vai impedir a dimerização do GH em IGF-1 a nível hepático, melhorando significativamente os sintomas do paciente, mas sem diminuir o tamanho do tumor. RADIOTERAPIA K Reservada para os casos que não apresentam indicação cirúrgica e não responderam ao tratamento medicamentoso. K O efeito colateral mais comum é o hipopituitarismo.
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