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CIÊNCIAS DOS MATERIAIS PROF. DR. JOÃO FERNANDO VILLARRUBIA LOPES MUNHOZ PAULISTA A Faculdade Católica Paulista tem por missão exercer uma ação integrada de suas atividades educacionais, visando à geração, sistematização e disseminação do conhecimento, para formar profissionais empreendedores que promovam a transformação e o desenvolvimento social, econômico e cultural da comunidade em que está inserida. Av. Cristo Rei, 305 - Banzato, CEP 17515-200 Marília - São Paulo. www.uca.edu.br FACULDADE CATÓLICA PAULISTA Diretor Geral Valdir Carrenho Junior Nenhuma parte desta publicação poderá ser reproduzida por qualquer meio ou forma sem autorização. Todos os gráficos, tabelas e elementos são creditados à autoria, salvo quando indicada a referência, sendo de inteira responsabilidade da autoria a emissão de conceitos. Projeto Gráfico Hey!Design SUMÁRIO ESTRUTURA CRISTALINA E CÉLULAS UNITÁRIAS INTRODUÇÃO 7 CELAS UNITÁRIAS 8 TIPOS DE EMPACOTAMENTO ATÔMICOS 9 FATOR DE EMPACOTAMENTO, POLIMORFISMO E ALOTROPIA FATOR DE EMPACOTAMENTO 13 DENSIDADE 16 POLIMORFISMO E ALOTROPIA 19 SISTEMAS CRISTALINOS E REDES DE BRAVAIS SISTEMAS CRISTALINOS 20 REDES DE BRAVAIS 22 ÍNDICES DE MILLER-DIREÇÕES CRISTALOGRÁFICAS ÍNDICES DE MILLER 26 DIREÇÕES CRISTALOGRÁFICAS 27 ÍNDICES DE MILLER - PLANOS E CRISTAIS HEXAGONAIS PLANOS CRISTALOGRÁFICOS 31 CRISTAIS HEXAGONAIS 34 DEFEITOS CRISTALINOS – DEFINIÇÃO E DEFEITOS PONTUAIS INTRODUÇÃO 37 DEFEITOS PONTUAIS 38 DEFEITOS CRISTALINOS – IMPUREZAS E SOLUçÕES SÓLIDAS IMPUREZAS EM SÓLIDOS 42 SOLUÇÕES SÓLIDAS 43 DEFEITOS CRISTALINOS – DISCORDÂNCIAS OU DEFEITOS LINEARES DEFINIÇÃO 49 DISCORDÂNCIA ARESTA 49 DISCORDÂNCIA ESPIRAL 50 DISCORDÂNCIA MISTA 51 SUMÁRIO DEFEITOS CRISTALINOS – DEFEITOS INTERFACIAIS DEFINIÇÃO 55 SUPERFÍCIES EXTERNAS 55 CONTORNOS DE GRÃO 55 CONTORNOS DE MACLA 58 DEFEITOS INTERFACIAIS DIVERSOS 60 DEFEITOS CRISTALINOS – DEFEITOS VOLUMÉTRICOS DEFINIÇÃO 63 POROS 63 PRECIPITADOS, DISPERSANTES E INCLUSÕES 64 VIBRAÇÕES ATÔMICAS 66 DIFUSÃO – DEFINIÇÃO, CLASSIFICAÇÃO E MECANISMOS DEFINIÇÃO 68 CLASSIFICAÇÃO 68 MECANISMOS DA DIFUSÃO 70 PRIMEIRA LEI DE FICK-DIFUSÃO EM ESTADO ESTACIONÁRIO DIFUSÃO EM ESTADO ESTACIONÁRIO 74 SEGUNDA LEI DE FICK-DIFUSÃO EM ESTADO NÃO-ESTACIONÁRIO DIFUSÃO EM ESTADO NÃO-ESTACIONÁRIO 79 FATORES QUE INFLUENCIAM A DIFUSÃO ESPÉCIES DIFUSIVAS 85 TEMPERATURA 86 OUTROS CAMINHOS DE DIFUSÃO 88 SÓLIDOS NÃO-CRISTALINOS-VIDROS CLASSIFICAÇÃO DE ESTRUTURAS SÓLIDAS 90 SÓLIDOS NÃO-CRISTALINOS 91 ESTRUTURA VÍTREA 91 SÓLIDOS NÃO-CRISTALINOS-POLÍMEROS DEFINIÇÃO 93 CARACTERÍSTICAS DOS POLÍMEROS 97 5 INTRODUÇÃO Praticamente, faz-se o uso de materiais em quase todas as atividades humanas. Na verdade, é desafiante pensar qual prática independe de sua aplicação direta ou indireta. O desenvolvimento humano sempre esteve intrinsecamente ligado à produção, manipulação e criação de no- vos materiais. Determinados períodos da pré-história foram nomeados segundo o nível de progresso: Período da Pedra Lascada (Paleolítico), Período da Pedra Polida (Neolítico) e Idade dos Metais. Em outras pala- vras, a relação entre ser humano e material ocorre desde o início e vem se aprimorando com as eras. Assim sendo, faz-se necessário o conhecimento acerca da estrutura e propriedades dos materiais, a fim de se encontrar uma aplicação, ou, até mesmo, manipulá-lo para atender específicas necessidades. Esta Introdução à Ciência dos Materiais busca elucidar a estrutura microscópica, bem como a interação entre os átomos constituintes da matéria, sua influência em características macroscópicas, tais como pro- priedades mecânicas, elétricas, ópticas e a classificação dos materiais de acordo com seu desempenho. ESTRUTURA CRISTALINA E CÉLULAS UNITÁRIAS AULA 01 7 INTRODUÇÃO Os materiais sólidos podem ser classificados de acordo com a regu- laridade segundo a qual os átomos ou íons estão arranjados em relação uns aos outros. Uma substância cristalina é aquela cujos átomos estão dispostos em um arranjo periódico, ou seja, que se repete ao longo do material. Há uma ordem de longo alcance, de tal modo que, ao ocorrer a solidificação, os átomos irão se dispor em um padrão tridimensional repetitivo, no qual cada átomo está conectado aos seus átomos vizinhos mais próximos, conforme mostra a Figura 1.1. Figura 1.1 – Arranjo periódico tridimensional dos átomos em um cristal de NaCl. Esferas cinzas representam ânions Cl¯ e vermelhas, cátions Na⁺. Fonte: https://chem.libretexts.org Certas propriedades dos sólidos cristalinos dependem da estrutura crista- lina do material, ou seja, de como os átomos, íons ou moléculas estão dispos- tos espacialmente. Existe um número extremamente grande de estruturas cristalinas diferentes, todas elas com ordenação atômica de longo alcance. https://chem.libretexts.org/Bookshelves/General_Chemistry/Book%3A_Chem PRIME_(Moore_et_al.)/1 0Solids%2C_Liquids_and_Solutions/10.02%3A_Lattices_and_Unit_Cells 8 Os átomos ou íons são considerados como esferas sólidas, as quais possuem diâmetros bem definidos (lembrando o Modelo Atômico de Dalton). Esta visualização é denominada modelo da esfera rígida atômi- ca, em que as esferas que representam os átomos vizinhos mais próxi- mos se tocam entre si, ilustrado na Figura 1.2. Figura 1.2 – Modelo da esfera rígida Fonte: https://concepto.de/teoria-atomica-de-dalton/ Deste modo, a matriz tridimensional de pontos que coincidem com as po- sições dos átomos, isto é, o centro das esferas, é nomeado retículo cristalino. CELAS UNITÁRIAS Os átomos dos sólidos cristalinos estão ordenados, tais que formam padrão repetitivo. Assim sendo, é possível subdividir a estrutura em pe- quenas entidades, chamadas células unitárias, representada na Figura 1.3. Figura 1.3 – Exemplos de Células Unitárias https://concepto.de/teoria-atomica-de-dalton/ 9 Fonte: https://chemed.chem.purdue.edu/ As células unitárias, em sua maioria, são prismas de base quadrilátera ou hexagonal, cujos vértices coincidem com os centros atômicos (ou iôni- cos). Uma célula é selecionada para representar a simetria da estrutura cristalina, na qual todas as posições atômicas no cristal podem ser geradas mediante translações proporcionais às distâncias inteiras da célula unitária ao longo de cada uma das suas arestas. Deste modo, a célula unitária é a unidade estrutural básica da estrutura cristalina do material em questão, e a define em virtude da geometria e das posições dos átomos no seu interior. Mais de uma única célula unitária pode ser escolhida para uma estru- tura cristalina específica; entretanto, usa-se a célula unitária que possui o maior grau de simetria geométrica. TIPOS DE EMPACOTAMENTO ATÔMICOS Em materiais metálicos, as ligações entre seus átomos não possuem direção definida, ou seja, como se trata de atração eletrostática, a ligação atômica pode ocorrer em qualquer orientação no espaço. Por isso, não há nenhum tipo de restrição quanto ao número e à posição de átomos Os átomos ou íons são considerados como esferas sólidas, as quais possuem diâmetros bem definidos (lembrando o Modelo Atômico de Dalton). Esta visualização é denominada modelo da esfera rígida atômi- ca, em que as esferas que representam os átomos vizinhos mais próxi- mos se tocam entre si, ilustrado na Figura 1.2. Figura 1.2 – Modelo da esfera rígida Fonte: https://concepto.de/teoria-atomica-de-dalton/ Deste modo, a matriz tridimensional de pontos que coincidem com as po- sições dos átomos, isto é, o centro das esferas, é nomeado retículo cristalino. CELAS UNITÁRIAS Os átomos dos sólidos cristalinos estão ordenados, tais que formam padrão repetitivo. Assim sendo, é possível subdividir a estrutura em pe- quenas entidades, chamadas células unitárias, representada na Figura 1.3. Figura 1.3 – Exemplos de Células Unitárias https://chemed.chem.purdue.edu/genchem/topicreview/bp/ch13/unitcell.php https://concepto.de/teoria-atomica-de-dalton/10 vizinhos, o que leva a um elevado número de átomos adjacentes, do mesmo modo que a empacotamentos densos (ver Figura 1.4), para a maioria das estruturas cristalinas metálicas. Figura 4 – Exemplos das estruturas: a) Cúbica de Face Centrada (CFC), b) Cúbica de Corpo Centrado (CCC) e c) Hexagonal Compacta (HC). Cada esfera representa um núcleo iônico. Fonte: https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/important- -types-of-lattice-structures/ Vale ressaltar que, de acordo com o tipo de empacotamento atômico, há a formação de espaços vazios nos interstícios, segundo a Figura 1.5. Se o átomo da camada superior estiver em contato com três da camada inferior, e posicionado sobre a depressão formada por esses, a brecha terá formato tetraédrico. Todavia, se três átomos da camada superior estiverem tocando três da camada inferior, e a abertura formada pelos dois trios coincidirem, essa terá formato octaédrico. Para facilitar a visualização, o site a seguir fornece animações acerca dos diferentes empacotamentos que produzem as estruturas CFC, CCC e HC: https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/important- -types-of-lattice-structures/ https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/important-types-of-lattice-structur https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/important-types-of-lattice-structur https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/important-types-of-lattice-structures/ https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/important-types-of-lattice-structures/ 11 Figura 1.5 – Fendas intersticiais formadas pelo empacotamento de átomos com forma: (a) tetraédrica e (b) octaédrica. Fonte: https://chem.libretexts.org/Bookshelves/General_Chemistry/ https://chem.libretexts.org/Bookshelves/General_Chemistry/Book%3A_Chem1_(Lower)/07%3A_Solids_and_Li FATOR DE EMPACOTAMENTO, POLIMORFISMO E ALOTROPIA AULA 02 13 FATOR DE EMPACOTAMENTO Estrutura Cúbica de Face Centrada A estrutura cristalina mais comum em metais é a de geometria cúbica, na qual cada átomo ocupa a posição de cada vértice, no centro de cada face. Tal ordenação atômica é intitulada de estrutura cristalina cúbica de faces centradas (CFC). Alguns dos metais mais familiares que possuem essa estrutura cristalina são o cobre, o alumínio, a prata e o ouro. Posto que a célula em questão se trata de um cubo, é possível en- contrar uma relação entre a medida aresta a e o raio R dos átomos que compõem o material. Considerando que os átomos se tangenciam, ou se tocam através da diagonal da face, pode-se usar a expressão: (01) É possível observar que, na estrutura CFC, cada átomo em um vérti- ce é compartilhado por oito células unitárias, enquanto que um átomo centrado em uma face, por apenas duas. Deste modo, um oitavo de cada um dos oito átomos nos vértices, completando um átomo, e metade de cada um dos seis átomos localizados nas faces, num total de quatro átomos inteiros, pode ser atribuído a uma dada célula unitária. Isto está mostrado na Figura 4b, em que apenas frações das esferas estão repre- sentadas dentro dos limites do cubo. 𝑎 = 2𝑅 2� 14 Duas outras características importantes de uma estrutura cristalina são o número de coordenação e o fator de empacotamento atômico (FEA). Para os metais, cada átomo possui o mesmo número de vizinhos mais próximos ou de átomos em contato, o que se constitui no seu nú- mero de coordenação. No caso das estruturas cristalinas CFC, o número de coordenação é 12. O átomo na face frontal possui quatro átomos vizinhos mais próximos, localizados nos vértices ao seu redor, quatro átomos de faces, que se encontram em contato pelo lado de trás, e quatro outros átomos de faces equivalentes localizados na próxima cé- lula unitária, à frente, que não é mostrada. O FEA representa a fração do volume de uma célula unitária que corresponde a esferas sólidas, assumindo o modelo da esfera atômica rígida, ou: (02) Para a estrutura CFC, o fator de empacotamento é de 0,74, ou seja, seu empacotamento é o máximo possível. Nota-se que os valores de FEA para os metais são relativamente elevados, a fim de maximizar a proteção dada pela nuvem de elétrons livres. Estrutura Cúbica de Corpo Centrado A estrutura cristalina Cúbica de Corpo Centrado (CCC) possui oito áto- mos, cujos centros ocupam cada vértice do cubo e um átomo localizado no centro da figura espacial, como mostra a Figura X. Como os átomos 𝐹𝐸𝐴 = 𝑣𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑒 𝑒𝑠𝑓𝑒𝑟𝑎𝑠 𝑣𝑜𝑙𝑢𝑚𝑒 𝑡𝑜𝑡𝑎𝑙 𝑑𝑎 𝑐é𝑙𝑢𝑙𝑎 𝑢𝑛𝑖𝑡á𝑟𝑖𝑎 = 𝑉𝐸 𝑉𝑐 15 tangenciam-se através da diagonal do cubo, a relação entre a aresta a e o raio atômico R, para CCC, será: (03) Uma vez que cada átomo central possui como vizinhos mais próxi- mos os seus oito átomos localizados nos vértices do cubo, e cada átomo do vértice é compartilhado por oito células unitárias, o número de coor- denação para a estrutura CCC é 8. Posto que o número de coordenação é menor na CCC do que na CFC, o fator de empacotamento atômico na CCC (0,68) também é menor do que na CFC (0,74). Estrutura Hexagonal Compacta A última estrutura cristalina comumente observada em metais apresenta uma célula unitária com o formato hexagonal, denominada hexagonal com- pacta (HC). As faces superior e inferior da célula unitária são constituídas por seis átomos que formam hexágonos regulares e que se encontram em volta de um único átomo central. Os planos superior e inferior, cedem três átomos adicionais para a célula unitária. Isto é, observando dos planos superior, inter- mediário e inferior, cada um contém três, sete e três átomos, nessa ordem, formando um triângulo, um hexágono e outro triângulo, respectivamente. Quanto ao número de coordenação, ao tomar o átomo central do plano intermediário, este está rodeado por mais seis adjacentes, três no superior, bem como no inferior. Assim sendo, seu NC é igual a 12. 𝑎 = 4𝑅 3� 16 Vale ressaltar que, como as estruturas HC e CCC possuem o mesmo núme- ro de coordenação, 12, ambos também possuem o mesmo valor de FEA, 0,74. Por fim, considerando que os átomos se tangenciam através da ares- ta de um hexágono regular, ao invés da aresta de um quadrado, como nos casos anteriores, e, além disso, estão dispostos em um prisma he- xagonal, a relação entre a aresta a e o raio atômico R é dada por: a = 2R (04) DENSIDADE O entendimento acerca da estrutura cristalina de um sólido permite o cálculo de sua densidade verdadeira 𝜌, por meio da seguinte relação: (05) Em que n é o número de átomos em cada célula unitária (não con- fundir com número de coordenação), A é a massa atômica, Vc é o volume da célula unitária e NA é o Número de Avogadro, o qual vale 6,022 x 10²³ átomos/mol. Na sequência, a Tabela 1 relaciona o tipo de empacotamento com os respectivos valores de aresta, volume e FEA, a fim de facilitar futuros cálculos. 𝜌 = 𝑛𝐴 𝑉𝑐𝑁𝐴 17 Tabela 1 – Relações entre o tipo de célula unitária e seus respectivos valores de compri- mento de aresta, volume e FEA. Célula Unitária Comprimento da aresta Volume da Célula FEA / % CS 2𝑅 8𝑅3 52 CCC 4𝑅 3� 64𝑅3 3 3� 68 CFC 2𝑅 2� 16𝑅3 2� 74 HC 2𝑅 24𝑅3 2� 74 Fonte: Elaborado pelo autor, 2019. O ródio apresenta raio atômico igual a 0,134 nm, estrutura cristalina do tipo CFC e massa atômica igual a 102,91 g/mol. Calculando sua massa es- pecífica, temos: 𝜌 = 𝑛𝐴 𝑉𝑐𝑁𝐴 = 𝑛𝐴 16𝑅3 2� ×𝑁𝐴 𝜌 = 4 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠× 102,91 𝑔𝑚𝑜𝑙 16 × 1,34 × 10−8 𝑐𝑚 3 × 2� × 6,02 × 1023á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠𝑚𝑜𝑙 𝜌 = 12,55 𝑔 𝑐𝑚3⁄ 18 POLIMORFISMO E ALOTROPIA Alguns materiais podem apresentar mais de uma estrutura crista- lina, um fenômeno conhecido por polimorfismo. Quando encontrado em substâncias simples no estado sólido, esta condição é comumente conhecida por alotropia. A estrutura cristalina que prevalecedepende tanto da temperatura como da pressão externa. Em sua grande maioria, uma transformação polimórfica implica nas variações físico-químicas do material, tais como densidade, dureza, so- lubilidade dentre outras. Um exemplo familiar é encontrado no carbono: a grafita é o polimorfo es- tável nas condições ambientes, enquanto o diamante é formado a pressões extremamente elevadas. Ainda, o ferro puro possui uma estrutura crista- lina CCC à temperatura ambiente, que se altera para uma estrutura CFC à temperatura de 912 ºC. Por último, a Zircônia, Figura 2.1, altera seu sistema cristalino de monoclínico, à temperatura ambiente, para tetragonal, a 1170 ºC, e cúbico, a 2370 ºC. Todas essas notações serão explanadas na aula 3. Figura 2.1 – Diferentes fases cristalinas da zircônia, ZrO₂, conforme variação de temperatura. Esferas verdes representam cátions Zr²⁺ e azuis, O²¯ . Fonte: https://core.ac.uk/download/pdf/43419364.pdf https://core.ac.uk/download/pdf/43419364.pdf SISTEMAS CRISTALINOS E REDES DE BRAVAIS AULA 03 20 SISTEMAS CRISTALINOS É possível dividir as inúmeras diferentes estruturas cristalinas em grupos de acordo com os arranjos dos átomos presentes no material de estudo, ou seja, a geometria da célula unitária. A geometria da célula unitária é completamente definida em termos de seis parâmetros, nomeados parâmetros de rede: os comprimentos das três arestas, a, b e c, e os três ângulos entre os eixos, a, 𝛽 , e y. Considerando todas as combinações possíveis entre tamanhos iguais ou distintos das arestas e valores congruentes ou não dos ângulos, ob- Deste modo, ao se tratarem de figuras geométricas espaciais, faz-se necessária a utilização do sistema tridimensional de coordenadas, conforme ilustra a Figura 3.1. A origem, ponto (0,0,0) deste sistema, localiza-se em um dos vértices da célula unitária, e cada eixo, Ox, Oy e Oz, com os três vértices do prisma em questão. Figura 3.1 – Sistema tridimensional de coordenadas e seus três respectivos planos: xy, comu- mente utilizado, xz e yz. Fonte: http://calculo.iq.unesp.br/sitenovo/Calculo1/tridi_coordenadas.html http://calculo.iq.unesp.br/sitenovo/Calculo1/tridi_coordenadas.html 21 tém-se sete diferentes sistemas cristalinos: cúbico, tetragonal, hexago- nal, ortorrômbico, romboédrico, monoclínico e triclínico. As relações para os parâmetros de rede e as configurações das células unitárias para cada um estão representadas na Tabela 3.1 e na Figura 3.2. Tabela 3.1 – Relação das características dos sete sistemas cristalinos e seus respectivos exem- plos encontrados naturalmente. Sistema Cristalino Arestas Ângulos entre arestas Exemplo Cúbico 𝑎 = 𝑏 = 𝑐 𝛼 = 𝛽 = 𝛾 = 90 ° Fluorita (𝐶𝑎𝐹2) Tetragonal 𝑎 = 𝑏 ≠ 𝑐 𝛼 = 𝛽 = 𝛾 = 90 ° Wulfenita (𝑃𝑏𝑀𝑜𝑂4 ) Ortorrômbico 𝑎 ≠ 𝑏 ≠ 𝑐 𝛼 = 𝛽 = 𝛾 = 90 ° Tanzanita (𝐶𝑎2𝐴𝑙3(𝑆𝑖𝑂4 )(𝑆𝑖2𝑂7)𝑂(𝑂𝐻)) Monoclínico 𝑎 ≠ 𝑏 ≠ 𝑐 𝛼 = 𝛾 = 90 °≠ 𝛽 Azurita (𝐶𝑢3 𝐶𝑂3 2 𝑂𝐻 2) Hexagonal 𝑎 = 𝑏 ≠ 𝑐 𝛼 = 𝛽 = 90 °,𝛾 = 120 ° Amazonita (𝐾𝐴𝑙𝑆𝑖3𝑂8) Romboédrico 𝑎 = 𝑏 = 𝑐 𝛼 = 𝛽 = 𝛾 ≠ 90 ° Esmeralda (𝐵𝑒3𝐴𝑙2 𝑆𝑖𝑂3 6) Triclínico 𝑎 ≠ 𝑏 ≠ 𝑐 𝛼 ≠ 𝛽 ≠ 𝛾 ≠ 90 ° Rodocrosita (MnCO3) Fonte: Elaborado pelo autor, 2019. 22 Figura 3.2 – Sete sistemas cristalinos, definidos pelos comprimentos de suas arestas a, b e c, e dos ângulos compreendidos entre as mesmas, a, 𝛽, e y. Fonte: https://chem.libretexts.org/Bookshelves/General_Chemistry/Book%3A_Chem PRIME_(Moore_et_al.)/10Solids%2C_Liquids_and_Solutions/10.03%3A_Crystal_Systems REDES DE BRAVAIS Os sistemas cristalinos podem ser classificados de acordo com a sua simetria translacional e rotacional, em outras palavras, possuem a mesma aparência após sofrer uma operação de rotação ou translação. Ao se executar todas essas manipulações possíveis, são encontrados 14 retículos distintos denominados Redes de Bravais. O sistema de menor simetria, triclínico, não possui simetria rotacional. Já no monoclínico, é possível obter uma estrutura primitiva, ou simples, e de base centrada, em que um átomo se localiza no meio das faces das bases apenas. De semelhante modo, ocorre com os romboédricos e he- https://chem.libretexts.org/Bookshelves/General_Chemistry/Book%3A_ChemPRIME_(Moore_et_al.)/10Solids% https://chem.libretexts.org/Bookshelves/General_Chemistry/Book%3A_ChemPRIME_(Moore_et_al.)/10Solids% 23 xagonais, que possuem também apenas uma disposição possível entre seus átomos. Células tetragonais também possuem duas estruturas: sim- ples e de corpo centrado, átomo no centro do sistema. No caso cúbico, há o arranjo simples, de corpo centrado e de face centrada (conforme visto em seções anteriores). Por fim, no ortorrômbico, encontram-se qua- tro estruturas: primitiva, base centrada, face centrada e corpo centrado. Uma vez que existem 32 grupos pontuais cristalográficos (grupos pontuais de simetria), ao combiná-los com as 14 Redes de Bravais, são obtidos 230 grupos espaciais, os quais descrevem todas as ope- rações simétricas possíveis em três dimensões. Para retículos bidi- mensionais, há apenas 17 grupos planos possíveis, denominados grupos de papel de parede. Na Figura 3.3 abaixo, estão representados as 14 redes de Bravais, para melhor visualização. Figura 3.3 – Os 14 Sistemas de Bravais originados das operações de simetria dos sete Sistemas Cristalinos. 24 Há um software interativo disponível, a fim de facilitar o entendimento acerca dos Sistemas Cristalinos. É possível selecionar a Rede de Bravais de- sejada e rotacioná-la em qualquer direção, para observar o comprimento das arestas e os ângulos formados entre si. https://crystalwalk.herokuapp.com/ https://crystalwalk.herokuapp.com/ ÍNDICES DE MILLER: DIREÇÕES CRISTALOGRÁFICAS AULA 04 26 ÍNDICES DE MILLER Em materiais cristalinos se torna necessário especificar algum plano cristalográfico de átomos específico ou uma direção cristalográfica. As- sim, estabeleceram-se convenções de identificação, em que três números inteiros, ou índices, são utilizados para designar as direções e os planos. A base para determinação dos valores dos índices é a célula unitária, em um sistema de coordenadas espaciais (eixos x, y e z), cuja origem está localizada em um dos vértices e cujos eixos coincidem com as arestas da célula unitária. Isto é melhor visualizado na Figura 4.1 a seguir. Figura 4.1 – Uma célula unitária em um sistema de coordenadas espaciais. É possível observar que as arestas a, b e c coincidem com os eixos x, y e z, respectivamente, e que uma posição atômica se localiza na origem do sistema supracitado. Fonte: https://www.researchgate.net/ https://www.researchgate.net/figure/FIGURA-2-Indices-de-Miller-para-algunos-de-los-planos-de-la-fami 27 DIREÇÕES CRISTALOGRÁFICAS As direções [100], [110] e [111] são direções usuais; elas estão repre- sentadas na célula unitária mostrada na Figura 4.2. Uma direção cristalográfica é definida por um vetor, isto é, um segmento de reta orientado conectando dois pontos. As seguintes etapas são utili- zadas na determinação dos três índices direcionais: 1. Um vetor com o comprimento conveniente é posicionado de tal modo que ele passa através da origem do sistema de coordenadas. Qualquer vetor pode ser movido através do retículo cristalino sem sofrer alterações, desde que seu paralelismo seja mantido; 2. O comprimento da projeção do vetor sobre cada um dos três eixos é determinado; estes são medidos em termos das dimensões da célula unitária, a, b e c; 3. Estes três números são multiplicados ou divididos por um fator comum, a fim de reduzi-los aos menores valores inteiros; 4. Os três índices, não separados por vírgulas, são colocados entre col- chetes: [uvw] (06) em que, os inteiros u, v e w correspondem às projeções reduzidas ao longo dos eixos Ox, Oy e Oz, respectivamente. 28 Figura 4.2 – Representações das direções cristalográficas [100], [010], [001], [101], [110] e [011]. Fonte: http://www.novawafers.com/resources-about-silicon.htmlUma vez que existem tanto coordenadas positivas como negativas, a representação destas últimas se dão por meio de índices negativos, repre- sentados mediante a colocação de uma barra sobre o índice apropriado. Por exemplo, a direção [111] teria uma componente na direção -y. De semelhante modo, a mudança dos sinais de todos os índices produz uma direção antiparalela; melhor dizendo, [111] é diretamente oposta a [111]. Figura 4.3 – Direções cristalográficas com sentidos opostos aos eixos. Fonte: http://www.novawafers.com/resources-about-silicon.html http://www.novawafers.com/resources-about-silicon.html http://www.novawafers.com/resources-about-silicon.html 29 Para algumas estruturas cristalinas, várias direções, desde que não sejam pa- ralelas, com índices diferentes, são, na realidade, equivalentes, significando que o espaçamento entre os átomos ao longo de cada direção é o mesmo. Por exemplo, em cristais cúbicos, todas as direções representadas pelos seguintes índices são equivalentes: [100], [100], [010], [010], [001] e [001]. Por conveniência, as direções equivalentes são agrupadas em uma família, que é representada entre parênte- ses. Deste modo, o grupo de direções do cristal cúbico pode ser representado por <l00>. Vale ressaltar que isto não é, em geral, verdadeiro para outros sistemas cristalinos. Por exemplo, para cristais com simetria tetragonal, as direções [100] e [010] são equivalentes, enquanto as direções [100] e [001] não são. Determinando os índices de Miller para as direções A, B, C e D na célula unitária cúbica abaixo: No caso da direção A, parte de (0,1,1) para (0,1,0), portanto: [011]. Já para B, tem como início (0,1,0) e destino (1 2 ,0,0). Reduzindo ao menor número inteiro possível (multiplicando todos por 2), obtém-se: [120]. Para C, (1,0,0) até (0,1,1), deste modo: [111]. Por último, a direção D, de (0,1 2 ,1) a (1,0,1 2 ), por conseguinte, análogo ao B: [211]. ÍNDICES DE MILLER: PLANOS E CRISTAIS HEXAGONAIS AULA 05 31 PLANOS CRISTALOGRÁFICOS Os planos de uma estrutura cristalina dispõem de representações simi- lares. Com exceção ao sistema cristalino hexagonal, todos os sistemas têm os planos cristalográficos especificados por três índices de Miller, na forma: (hkl) (07) Uma interseção no lado negativo da origem é indicada por uma barra po- sicionada sobre o índice apropriado, análogo ao usado na notação de direções cristalográficas. Além disso, a inversão das direções de todos os índices especifica um outro plano que é paralelo, pelo lado oposto e equidistante, à origem. Quaisquer dois planos que sejam paralelos entre si são equivalentes e possuem índices idênticos. De modo análogo às direções cristalográficas, o procedimento empregado na determinação dos valores dos índices h, k e l é enumerado a seguir. 1. Se o plano selecionado passa através da origem cartesiana, deve-se escolher entre: construir um outro plano paralelo no interior da célula unitária mediante uma translação apropriada, ou estabelecer uma nova origem no vértice de uma outra célula unitária; 2. Desta forma, o plano cristalográfico ou intercepta, ou é paralelo a um dos eixos. O comprimento da interseção planar para cada eixo é determi- nado em termos dos parâmetros de rede a, b, e c; 3. Calcula-se os valores inversos dos números. Um plano paralelo a um eixo pode ser considerado como tendo uma interseção no infinito e, por- tanto, um índice igual a zero; 4. Havendo necessidade, os três números são modificados para o conjunto de menores números inteiros pela multiplicação (MMC) ou divisão por um fator comum (simplificação); 5. Finalmente, os índices inteiros, não separados por vírgulas, são coloca- dos entre parênteses: (hkl); 32 Uma característica peculiar aos cristais cúbicos é o fato de que os pla- nos e direções que possuem os mesmos índices são perpendiculares uns aos outros. Não obstante, no caso dos demais sistemas cristalinos, não há relações geométricas simples relacionando os planos e as direções que contenham os mesmos índices. As Figuras 5.1 e 5.2 ilustram os pla- nos mais característicos de um cubo: suas faces e seus planos diagonais. Figura 5.1 – Os seis planos representando as faces da célula unitária cúbica e seus res- pectivos Índices de Miller. Fonte: https://www.doitpoms.ac.uk/tlplib/miller_indices/lattice_examples.php Figura 5.2 – Planos diagonais da célula unitária cúbica e seus respectivos Índices de Miller. Fonte: https://www.doitpoms.ac.uk/tlplib/miller_indices/lattice_examples.php https://www.doitpoms.ac.uk/tlplib/miller_indices/lattice_examples.php https://www.doitpoms.ac.uk/tlplib/miller_indices/lattice_examples.php 33 Determinando os índices de Miller para os planos A, B e C na célula unitá- ria cúbica abaixo: No caso do plano A, como passa pela origem, uma nova deve ser escolhida, localizada no vértice de uma célula adjacente, ou seja à direita da figura acima e a origem será no ponto (0,1,0). Uma vez que, esse plano intercepta agora em a = 1, b = -1 e c = 1, seus inversos são, respectivamente, 1; -1 e 1 e, por fim, os índices serão (111). Já para B, como é paralelo ao plano xz, ou seja, não intercepta em nenhum ponto, tem-se a = ∞ e c = ∞ , enquanto que 𝑏 = 13. Seus inversos serão 0; 3 e 0. Assim, (030) . Para C, a = 1, b = ∞ (semelhante ao B, porém em y) e 𝑐 = 1 2 , seus inversos serão 1; 0 e 2. Por isso, (102). A determinação dos Índices de Miller para planos cristalográficos pode causar confusões no início. Para auxiliar no processo de aprendizagem, o link a seguir contém um simulador. Basta colocar o valor separados por ponto-vírgula que o software gerará o plano correspondente. https://www.doitpoms.ac.uk/tlplib/miller_indices/lattice_draw.php https://www.doitpoms.ac.uk/tlplib/miller_indices/lattice_draw.php 34 CRISTAIS HEXAGONAIS Cristais que possuem simetria hexagonal contam com algumas dire- ções cristalográficas equivalentes que não dispõem o mesmo conjunto de índices. Isto é resolvido utilizando-se um sistema com quatro eixos, denominado sistema coordenado de Miller-Bravais. Figura 5.3 – Sistema coordenado de Miller-Bravais em um sistema cristalino hexagonal Fonte: http://www.clay.uga.edu/courses/3010/3010lecture06.html http://www.clay.uga.edu/courses/3010/3010lecture06.html 35 Os três eixos a₁, a₂ e a₃ pertencem a um único plano, denominado plano da base, e possuem ângulo 120º entre si, com o eixo Oz perpendicular aos três. Os índices direcionais serão retratados por quatro índices, no formato: [uvtw] (08) Por convenção, os três primeiros índices, u, v e t dizem respeito a projeções ao longo dos respectivos eixos a₁, a₂ e a₃ no plano da base. A conversão do sistema com três índices para o sistema com quatro índi- ces, [u´v´w´] → [uvtw] é feita mediante o uso das seguintes fórmulas: (09) (10) (11) (12) Em que os índices marcados com ´ estão associados ao sistema com três índices, enquanto que os sem o apóstrofo estão correlacionados ao novo sistema Miller-Bravais; n é um fator que pode ser necessário para reduzir u, v, t e w aos menores números inteiros possíveis. Por exemplo, usando esta conversão, a direção [010] torna-se: Considerando n = 3, para reduzir as frações em números inteiros: 𝑢 = 𝑛 3 (2𝑢 ′ − 𝑣′� 𝑣 = 𝑛 3 2𝑣 ′ −𝑢′ 𝑡 = − 𝑢 + 𝑣 𝑤 = 𝑛𝑤′ 𝑢 = 𝑛 3 2 × 0− 1 = − 𝑛 3 𝑣 = 𝑛 3 2 × 1− 0 = 2𝑛 3 𝑡 = − − 𝑛 3 + 2𝑛 3 = − 𝑛 3 𝑤 = 𝑛 × 0 = 0 𝑛 3 2𝑛 3 𝑛 3 0 𝑛 3 2𝑛 3 𝑛 3 0 → [1210]� DEFEITOS CRISTALINOS DEFINIÇÃO E DEFEITOS PONTUAIS AULA 06 37 INTRODUÇÃO Como visto no capítulo anterior, existe uma ordem perfeita ao longo da extensão dos materiais cristalinos. Entretanto, isso não é verificado na prática. Todos os materiais contêm grandes números de defeitos. Em- bora seja visto com uma denotação negativa, as imperfeições cristalinas são responsáveis por muitas das propriedades dos materiais. A fluorita, decomposição química CaF₂, possui diversos tipos de coloração, devido a inúmeros tipos de desvios de sua rede cristalina ideal. Curiosa- mente, quanto mais perfeita a estrutura cristalina, o sólido apresenta-se incolor. A Figura 6.1 exibe diferentes tipos de colorações deste minério (alguns mais raros, como o de tonalidade arco-íris). Figura 6.1 – Diversas estruturas da fluorita,. Suas diferentes colorações se devem às inúmeras e distintas imperfeições na rede cristalina. Fonte: http://www.geologyin.com/2017/02/why-fluorite-comes-in-different-colors.html Mais informações podem ser encontradas pelo seguinte link: http://www.geologyin.com/2017/02/why-fluorite-comes-in-different-colors.html http://www.geologyin.com/2017/02/why-fluorite-comes-in-different-colors.html http://www.geologyin.com/2017/02/why-fluorite-comes-in-different-colors.html 38 Com o devido controle de defeitos específicos, é possível manipular características desejadas do material em questão. Isto será discorrido em capítulos posteriores. É definido “defeito cristalino” a irregularidade na rede cristalina em zero, uma, duas ou três dimensões, na ordem de um diâmetro atômico. A classifi- cação é realizada de acordo com a geometria ou dimensionalidade do defeito. Dentre os diferentes tipos de imperfeições existem os defeitos pon- tuais (associados a uma ou duas posições atômicas), os defeitos lineares (ou unidimensionais), os defeitos interfaciais, ou contornos (bidimensio- nais) e os defeitos volumétricos (tridimensionais). DEFEITOS PONTUAIS Lacunas A lacuna, ou sítio vago da rede cristalina, é um sítio que deveria estar ocupado, porém há um átomo faltando. A Figura 6.2 ilustra tal fenôme- no. Todos os sólidos cristalinos contêm lacunas, é impossível criar um material que esteja isento desse tipo de defeito. Figura 6.2 – Esquema de um defeito pontual do tipo lacuna em uma malha 2D de um cristal. Fonte: http://www.foz.unioeste.br/~lamat/downmateriais/materiaiscap7.pdf http://www.foz.unioeste.br/~lamat/downmateriais/materiaiscap7.pdf 39 Pode-se explicar a necessidade da existência de lacunas através dos princípios da termodinâmica, em especial a entropia. Em princí- pio, a presença de sítios vagos aumenta a entropia, ou seja, a aleato- riedade do cristal. Determinando o número de lacunas no ferro a 900º, sabendo que sua massa específica é igual a 7,65g/cm¯³, seu peso atômico é 55,85 g/ mol e a energia de formação de uma lacuna é de 1,08 eV/átimo: Primeiramente, é preciso converter a temperatura em Kelvin: T = 900 ºC + 273 = 1173 K Do capítulo anterior, a massa específica é dada por: O número de lacunas em equilíbrio, Nv, para uma dada quantidade de material depende da temperatura em que este se encontra, de acordo com a seguinte expressão: (01) Em que, N representa o número total de sítios atômicos, Qv é a energia necessária para a formação de uma lacuna, T é a temperatura absoluta em Kelvin e k é a constante de Boltzmann, ou dos gases, igual a 1,38 x 10¯²³ j/ (átomo K), ou 8,62 x 10¯⁵ eV / (átomo K). Assim sendo, o número de lacunas aumenta exponencialmente em função da temperatura; isto é, à medida se eleva a temperatura. 𝑁𝑉 = 𝑁 exp − 𝑄𝑉 𝑘𝑇 𝜌 = 𝐴 ×𝑁 𝑁𝐴 → 𝑁 = 𝑁𝐴 × 𝜌 𝐴 40 Deste modo: Autointersticiais Defeito autointersticial é aquele no qual um átomo do cristal que, ao invés de se encontrar na sua posição original, localiza-se comprimido no interior de um sítio intersticial (pequeno espaço vazio formado entre os átomos da rede cristalina e que, sob circunstâncias ordinárias, não é ocupado). A Figura 6.3 mostra este tipo de imperfeição. Figura 6.3 – Esquema de um defeito pontual do tipo autointersticial em uma malha 2D de um cristal. Fonte: http://www.foz.unioeste.br/~lamat/downmateriais/materiaiscap7.pdf Nos metais, um autointersticial introduz distorções relativamente grandes na rede cristalina próxima, pois o átomo é substancialmente maior do que a posição intersticial na qual ele está situado. Consequen- temente, a formação desse defeito é mais difícil de ocorrer e existe so- mente em concentrações muito reduzidas. 𝑁𝑉 = 1,9 × 1018 𝑙𝑎𝑐𝑢𝑛𝑎𝑠.𝑐𝑚3 𝑁𝑉 = 𝑁 exp − 𝑄𝑉 𝑘𝑇 = 𝑁𝐴𝜌 𝐴 exp − 𝑄𝑉 𝑘𝑇 𝑁𝑉 = 6,02 × 1023 7,65 𝑔 𝑐𝑚−3⁄ 55,85 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 exp − 1,08 𝑒 𝑉 á⁄ 𝑡𝑜𝑚𝑜 8,62 × 10−5 𝑒 𝑉 á⁄ 𝑡𝑜𝑚𝑜 𝐾 × 1173 𝐾 http://www.foz.unioeste.br/~lamat/downmateriais/materiaiscap7.pdf DEFEITOS CRISTALINOS IMPUREZAS E SOLUÇÕES SÓLIDAS AULA 07 42 IMPUREZAS EM SÓLIDOS Impurezas ou átomos estranhos à rede cristalina original são co- muns, e alguns irão existir como defeitos cristalinos pontuais. Na reali- dade, mesmo com técnicas relativamente sofisticadas, é difícil refinar metais até uma pureza que seja superior a 99,9999%. Nesta proporção, as impurezas estarão presentes em cada metro cúbico do material em uma ordem de 10²² a 10²³ átomos/m³. A adição de impurezas a um metal irá resultar na formação de uma solução sólida e/ou uma nova segunda fase, dependendo dos átomos adicionados, de suas concentrações e da temperatura da liga. De forma análoga às soluções líquidas, no caso das sólidas, o termo Solvente representa o elemento ou composto que está presente em maior quantidade (também são chamados de átomos hospedeiros) e o termo Soluto é usado para indicar um elemento ou composto que está presente em menor concentração. Os metais mais utilizados no cotidiano não são altamente puros, porém, são ligas, nas quais impurezas foram adicionadas intencionalmente para conferir características específicas ao material, como maior resistência mecânica à corrosão. Por exemplo, a prata, de lei, é uma liga composta por 92,5% de prata e 7,5% de cobre. Em condições normais, a prata pura é altamente resistente à corrosão, além de ser muito macia. A formação de uma liga com o cobre incrementa significativamente a resistência me- cânica, sem diminuir em quantidade apreciável a resistência à corrosão. 43 SOLUÇÕES SÓLIDAS À medida que se adiciona átomos do soluto ao material hospedeiro, a estrutura cristalina é mantida, e nenhuma nova estrutura é formada. Semelhante ocorre em uma solução homogênea líquido-líquido. Esta incorporação de impurezas gera dois tipos de defeitos pontuais: substitucional, em que um átomo da matriz cristalina é substituído por um do soluto; e intersticial, no qual uma impureza aloca-se em um interstício da rede cristalina hospedeira. Ambos estão representados a seguir. Figura 7.1 – Esquematização de defeitos pontuais por impurezas. Fonte: https://docplayer.com.br/47338458-O-mais-simples-dos-defeitos-pontuais-e-a- lacuna-posicao-atomica-na-qual-falta-um-atomo-todo-solido-cristalino-contem-lacunas -aumento-da-entropia.html https://docplayer.com.br/47338458-O-mais-simples-dos-defeitos-pontuais-e-a-lacuna-posicao-atomica-na https://docplayer.com.br/47338458-O-mais-simples-dos-defeitos-pontuais-e-a-lacuna-posicao-atomica-na https://docplayer.com.br/47338458-O-mais-simples-dos-defeitos-pontuais-e-a-lacuna-posicao-atomica-na 44 Para soluções sólidas intersticiais, o diâmetro atômico de uma impureza intersticial deve ser substancialmente menor do que o diâmetro dos átomos hospedeiros. Normalmente, a concentração máxima permissível para os átomos de impureza intersticial é baixa, menor que 10%. Mesmo os átomos de impurezas muito pequenos são geralmente maiores do que os sítios in- tersticiais, e por isso introduzem alguma deformação na rede cristalina sobre Existem várias características dos átomos do soluto e do solvente que determinam o grau segundo o qual o primeiro se dissolve no segundo: • Tamanho atômico: quantidades apreciáveis de um soluto podem ser acomodadas neste tipo de solução sólida somente quando a diferença entre os raios atômicos dos dois tipos de átomos é menor do que apro- ximadamente 15%. De outra forma, os átomos do soluto irão criar dis- torções substanciais na rede cristalina e uma nova fase irá se formar; • Estruturacristalina: para que a solubilidade dos sólidos seja apreciável, as estruturas cristalinas de ambos os tipos de átomos devem ser as mesmas; • Eletronegatividade: quanto mais eletropositivo for um elemento e mais eletronegativo for o outro, maior é a tendência de que venham a formar um composto intermetálico em lugar de uma solução sólida substitucional; • Valências: sendo iguais todos os demais fatores, um metal terá uma maior tendência de dissolver um outro metal de maior valência do que um de menor valência. O cobre e o níquel formam um exemplo de solução sólida substitucional. Seus raios atômicos são 0,128nm para o cobre e 0,125nm para o níquel, am- bos possuem estruturas cristalinas do tipo CFC, suas eletronegatividades são 1,9 e 1,8 respectivamente, e as valências mais comuns são +1 para o cobre e +2 para o níquel. 45 os átomos hospedeiros adjacentes. O carbono forma uma solução sólida intersticial quando adicionado ao ferro; a concentração máxima de carbono é de aproximadamente 2%. O raio atômico do átomo de carbono é muito menor do que do átomo de ferro, 0,071 e 0,124nm respectivamente. Especificação de composição Torna-se necessário expressar a composição, ou proporção, de uma liga em termos dos seus elementos constituintes. As duas formas mais comuns de se especificar a composição são a porcentagem em peso (ou massa) e a porcen- tagem atômica. A base para a porcentagem em peso é o peso de um elemento específico em relação ao peso total da liga. Para uma liga que contém dois áto- mos, X e Y, a concentração do átomo X em percentagem Cx é definida como: (02) Em que mx e my, representam, respectivamente, o peso (ou massa) dos elementos X e Y. A concentração do átomo Y é calculada de maneira análoga. A base para os cálculos da porcentagem atômica é o número de mo- les de um elemento em relação ao número total de moles de todos os elementos na liga. O número de moles em alguma massa especificada de um elemento hipotético X, nmx, pode ser calculado da seguinte maneira: (03) 𝐶𝑋 = 𝑚𝑋 𝑚𝑋 + 𝑚𝑌 × 100 % 𝑛𝑚𝑋 = 𝑚𝑋 𝐴𝑋 46 Sendo: mx e Ax representam, respectivamente, a massa e o peso atô- mico para o elemento X. A concentração para o elemento X em termos da porcentagem atômi- ca em uma liga contendo os átomos X e Y, C´x, é definida pela expressão: (04) De maneira semelhante, a porcentagem atômica para o átomo Y pode ser determinada. Os cálculos da porcentagem atômica também podem ser executados com base no número de átomos em lugar do número de moles, uma vez que um mol de todas as substâncias contém o mesmo número de átomos. É possível expressar a composição C´x em função da porcentagem de X no material. A massa total M de uma liga com apenas os elementos X e Y presentes será: (05) Substituindo a equação (03) em (04): (06) Antes de prosseguir, ao se rearranjar a equação (02), tem-se: (07) 𝐶′𝑋 = 𝑛𝑚𝑋 𝑛𝑚𝑋 + 𝑛𝑚𝑌 × 100 % 𝑀 = 𝑚𝑋 +𝑚𝑌 𝐶′𝑋 = 𝑚𝑋 𝐴𝑋 𝑚𝑋 𝐴𝑋 +𝑚𝑌𝐴𝑌 × 100 % 𝑚𝑋 = 𝐶𝑋 𝑚𝑋+ 𝑚𝑌 100 = 𝐶𝑋𝑀 100 47 De forma análoga, para o elemento Y: (08) Por fim, utilizando-se (07) e (08) em (06): (09) Simplificando: (10) Determinando o percentual atômico de uma liga 97% Al e 3% Cu, sabendo que as respectivas massas atômicas são 63,55 e 26,98 g/mol. Para o alumínio: Para o cobre: Ou simplesmente: 𝐶𝐴𝑙′ = 𝐶𝐴𝑙𝐴𝐴𝑙 𝐶𝐴𝑙𝐴𝐴𝑙 +𝐶𝐶𝑢𝐴𝐶𝑢 × 100 % 𝐶𝐴𝑙′ = 97 63,55 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 97 63,55 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 + 3 26,98 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 × 100 %≅ 98,7 % 𝐶𝐶𝑢′ = 𝐶𝐶𝑢𝐴𝐶𝑢 𝐶𝐴𝑙𝐴𝐴𝑙 +𝐶𝐶𝑢𝐴𝐶𝑢 × 100 % 𝐶𝐴𝑙′ = 3 26,98 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 97 63,55 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 + 3 26,98 𝑔 𝑚⁄ 𝑜𝑙 × 100 % ≅1,3 % 𝐶𝐶𝑢′ = 100 %−𝐶𝐴𝑙′ = 100 %−98,7 % = 1,3 % 𝑚𝑌 = 𝐶𝑌𝑀 100 𝐶′𝑋 = 𝐶𝑋𝑀 100𝐴𝑋 𝐶𝑋𝑀 100𝐴𝑋 + 𝐶𝑌𝑀100𝐴𝑌 × 100 % 𝐶′𝑋 = 𝐶𝑋𝐴𝑋 𝐶𝑋𝐴𝑋 + 𝐶𝑌𝐴𝑌 × 100 % DEFEITOS CRISTALINOS DISCORDÂNCIAS OU DEFEITOS LINEARES AULA 08 49 DEFINIÇÃO Uma discordância é um defeito unidimensional, ou linear, que consiste no desalinhamento de átomos. A Figura 8.1 a seguir ilustra tal fenômeno. Figura 8.1 – Dois tipos de discordâncias em um cristal. Da esquerda para a direita: dis- cordância aresta e discordância espiral. Fonte: https://www.researchgate.net/figure/Schematic-diagrams-of-A-an-edge-and-B-s- crew-dislocation-in-an-atomic-lattice_fig1_270761961 DISCORDÂNCIA ARESTA É conhecido por discordância aresta, quando uma aresta de átomos extras termina no interior do cristal. Este é um defeito linear centraliza- do em átomos da linha que fica definida ao longo da extremidade do semiplano de átomos adicionais, conhecido por linha da discordância. Isto é demonstrado na Figura 8.2 abaixo. https://www.researchgate.net/figure/Schematic-diagrams-of-A-an-edge-and-B-screw-dislocation-in-an-at https://www.researchgate.net/figure/Schematic-diagrams-of-A-an-edge-and-B-screw-dislocation-in-an-at 50 Figura 8.2 – Demonstração do mecanismo de discordância aresta. Uma linha extra de átomos provoca a formação de uma nova coluna no cristal. Fonte: https://structuredatabase.wordpress.com/intracrystalline/ Dentro da região ao redor da linha da discordância, há uma distorção localizada da rede cristalina. Os átomos acima da linha da discordância são pressionados uns contra os outros, e os átomos abaixo são puxados um para longe do outro. O resultado disso é a ligeira curvatura para os planos verticais. A intensidade desta distorção diminui com o afasta- mento da linha da discordância. Em posições afastadas da linha da dis- cordância, o retículo cristalino é praticamente perfeito (considerando, claro, que haja apenas este tipo de defeito no cristal). DISCORDÂNCIA ESPIRAL Um outro tipo de discordância, denominado discordância espiral, é formada por uma tensão cisalhante aplicada para produzir a distorção, de acordo com a Figura 8.3. Uma animação sobre como ocorre a discordância aresta está disponível no link: https://www.youtube.com/watch?v=iKKxTP6xp74 https://structuredatabase.wordpress.com/intracrystalline/ https://www.youtube.com/watch?v=iKKxTP6xp74 51 Figura 8.3 – Mecanismo da discordância espiral. O cristal sofre um cisalhamento, resul- tando na seção esquerda subir e a direita descer, num movimento de torção, gerando um degrau de escorregamento. A linha de discordância indica o centro do defeito. Fonte: https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6421-defeitos-em-linha-nos- -materiais-cristalinos#.Xdv8B9XQ_IU A região superior do cristal é deslocada uma distância atômica para cima, produzindo um degrau no cristal. Essa inclinação em espiral, ou helicoidal, que é traçada em torno da linha da discordância (centro da espiral) pelos planos atômicos de átomos. DISCORDÂNCIA MISTA A maioria das discordâncias encontradas em cristais não é somente ares- ta ou apenas espiral, porém, exibe componentes que são característicos de ambos os tipos. Tais são conhecidas por discordâncias mistas, Figura 8.4. Uma animação sobre como ocorre a discordância espiral está disponível no link: https://www.youtube.com/watch?v=z3MzDiyLtWc https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6421-defeitos-em-linha-nos-materiais-cristalinos#.X https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6421-defeitos-em-linha-nos-materiais-cristalinos#.X https://www.youtube.com/watch?v=z3MzDiyLtWc 52 Figura 8.4 – Discordância mista, ou seja, contém aresta e espiral simultaneamente. O vetor de Burgers possui um ângulo agudo com a linha de discordância. Fonte: https://www.docsity.com/pt/imperfeicoes-em-solidos-cristalinos/4796197/ A magnitude e a direção da distorção da rede cristalina são expressas em termos de um vetor de Burgers, b. Desta forma, a natureza de uma discordância é definida pelas orientações relativas da linha da discor- dância e pelo vetor de Burgers. Para uma discordância aresta, esta e o vetor são perpendiculares, enquanto para uma discordância espiral, sãoparalelos; não são nem perpendiculares nem paralelos para uma discordância mista. https://www.docsity.com/pt/imperfeicoes-em-solidos-cristalinos/4796197/ 53 Figura 8.5 – Vetor de Burgers demonstrado na discordância aresta, figura superior, e na discordância espiral, figura inferior. No primeiro caso, o vetor e a linha da discordância são perpendiculares entre si, enquanto que estes são paralelos no segundo caso. Fonte: http://www.geosci.usyd.edu.au/users/prey/Teaching/Geol-3101/RheologyOne02/crystal.htm Embora uma discordância mude de direção e de natureza no interior de um cristal (por exemplo, de uma discordância aresta para uma dis- cordância mista, ou para uma discordância espiral), o vetor de Burgers será o mesmo em todos os pontos ao longo da sua linha (Figura 8.5). Na prática, todos os materiais cristalinos contêm algumas discor- dâncias que surgiram durante a solidificação, ou através de deformação plástica, ou ainda como uma consequência das tensões térmicas que resultam de um resfriamento rápido. http://www.geosci.usyd.edu.au/users/prey/Teaching/Geol-3101/RheologyOne02/crystal.htm DEFEITOS CRISTALINOS DEFEITOS INTERFACIAIS AULA 09 55 DEFINIÇÃO Defeitos interfaciais são contornos bidimensionais, que separam regiões dos materiais, sejam de diferentes estruturas cristalinas e/ou orientações cristalográficas, sejam de substâncias distintas. Tais imper- feições incluem as superfícies externas, os contornos de grão, contornos de macla, contornos de fases e falhas de empilhamento. SUPERFÍCIES EXTERNAS Um dos contornos mais óbvios é a superfície externa, onde termina a estrutura do cristal. Os átomos da superfície não estão ligados ao nú- mero máximo de vizinhos mais próximos, portanto possuem um estado de maior energia do que os que estão nas posições interiores. Por isto, estes átomos não ligados completamente dão origem a uma energia de superfície. A fim de reduzir esta energia, os materiais tendem a minimi- zar a área total da superfície, se possível. De modo análogo, os líquidos assumem uma forma que possui uma área mínima, e as gotículas se tomam esféricas. Obviamente, isso não é possível com os sólidos, que são mecanicamente rígidos. CONTORNOS DE GRÃO O contorno de grão é aquele que separa dois pequenos grãos ou cristais que possuem diferentes orientações cristalográficas em mate- riais policristalinos, como mostra a Figura 9.1 a seguir. 56 Figura 9.1 – Micrografia de um contorno de grão. Fonte: http://www.fem.unicamp.br/~sergio1/pos-graduacao/MR640/questresp.html Dentro da região do contorno, que possui largura próxima ao diâme- tro de alguns poucos átomos, existem alguns desencontros atômicos na transição da orientação cristalina de um grão para aquela de outro grão adjacente. Quando esse desencontro da orientação é pequeno, poucos graus, é chamado contorno de grão de baixo ângulo. Os contornos podem ser descritos também em termos de arranjos de discordâncias. Um contorno de grão de baixo ângulo simples é for- mado quando discordâncias aresta estão alinhadas, de acordo com a Figura 9.2 a seguir. http://www.fem.unicamp.br/~sergio1/pos-graduacao/MR640/questresp.html 57 Figura 9.2 – Esquematização do ângulo de desalinhamento. Na parte superior é obser- vável o contorno de grão de alto ângulo, enquanto que, na inferior, de baixo ângulo. Fonte: http://docplayer.com.br/73844128-Defeitos-cristalinos-conceitos-gerais.html Este tipo é chamado de um contorno inclinado, com o ângulo de desorien- tação, 𝜃. Quando 𝜃 é paralelo ao contorno, obtém-se um contorno torcido, o qual pode ser descrito mediante um arranjo de discordâncias espiral. Os átomos estão ligados de maneira irregular ao longo de um con- torno de grão (por exemplo, os ângulos de ligação são mais longos). Consequentemente, há uma energia interfacial ou do contorno de grão, a qual é semelhante à energia de superfície (seção anterior). A intensida- de desta energia é uma função do grau de desorientação. Quanto maior o ângulo 𝜃, maior a energia do contorno. Assim sendo, esta região é mais reativa do que os grãos propriamente ditos. Além disso, os átomos de impureza com frequência se segregam preferencialmente ao longo desses contornos, devido aos seus maiores estados de energia. http://docplayer.com.br/73844128-Defeitos-cristalinos-conceitos-gerais.html 58 A energia interfacial total é menor em materiais com grãos grandes ou grosseiros do que em materiais com grãos mais finos, uma vez que existe menos área de contorno total naqueles primeiros. O crescimento dos grãos ocorre, quando se encontram a temperaturas elevadas, de modo a reduzir a energia de contorno total. Apesar desse arranjo desordenado dos átomos, e da falta de uma ligação regular ao longo dos contornos de grãos, um material policris- talino ainda e muito forte. Isto se deve a forças de coesão presentes no interior e através do contorno. Além do que, a densidade de uma amostra de um material policristalino é virtualmente idêntica àquela de um monocristal feito do mesmo material. CONTORNOS DE MACLA Um contorno de macla é um tipo especial de contorno de grão, no qual há uma simetria especular da rede cristalina, isto é, os átomos dos dois lados do contorno são imagens de espelho, conforme ilustra a Figura 9.3. Figura 9.3 – Micrografia de um contorno de macla de uma liga Fonte: https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6422-defeitos-planares#.Xd1CMNXQ_IU https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6422-defeitos-planares#.Xd1CMNXQ_IU 59 A região entre esses contornos é chamada de macla. Esta se origina através de deslocamentos atômicos que são produzidos a partir de for- ças mecânicas de cisalhamento aplicadas, conhecidas como maclas de deformação, ou também durante tratamentos térmicos de recozimento realizados após deformações, denominadas maclas de recozimento. A maclagem ocorre em um plano cristalográfico definido e em uma direção específica, ambos os quais dependem da estrutura cristalina. As maclas de recozimento ocorrem comumente em metais que possuem uma estrutura cristalina CFC, enquanto as de deformação são observa- das em estruturas CCC e HC. Figura 9.4 – Micrografia do aço inoxidável. Nota-se a formação de maclas devido ao tratamento térmico do material. Fonte: http://www.scielo.br/pdf/rmat/v13n4/a03v13n4.pdf http://www.scielo.br/pdf/rmat/v13n4/a03v13n4.pdf 60 DEFEITOS INTERFACIAIS DIVERSOS Outros defeitos interfaciais possíveis são as falhas de empilhamento, os contornos de fase e as paredes de domínio ferromagnético. As falhas de empilhamento são encontradas em metais de estrutura CFC, na qual há uma interrupção na sequência de empilhamento dos planos compactos. Figura 9.5 – Exemplo de falha de empacotamento. Na parte superior, há um empaco- tamento hexagonal compacto, enquanto que, na inferior, um cúbico de face centrada. Fonte: https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/crystallographic-defects/ Já os contornos de fase existem em materiais com múltiplas fa- ses, através dos quais há uma mudança brusca nas características físico-químicas. https://www.tec-science.com/material-science/structure-of-metals/crystallographic-defects/ 61 Figura 9.6 – Contorno de fase de uma amostra de ferro. Na parte superior, a estrutura cristalina é CFC, enquanto que, na inferior, é CCC. A linha em branco indica o contorno das fases. Fonte: https://www.tf.uni-kiel.de/matwis/amat/iss/kap_5/backbone/r5_3_2.html Por fim, para materiais ferromagnéticos e ferrimagnéticos, o contor- no que separa as regiões que possuem diferentes direções de magne- tização é conhecido como uma parede de domínio. Figura 9.7 – Ilustração de uma parede de domínio, onde se encontram as diferentes direções de magnetização do mesmo material. Fonte: https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4212163/mod_resource/content/1/ Ferromagnetismo%20e%20o%20Processo%20de%20Magnetiza%C3%A7%C3%A3o.pdfhttps://www.tf.uni-kiel.de/matwis/amat/iss/kap_5/backbone/r5_3_2.html https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4212163/mod_resource/content/1/Ferromagnetismo%20e%20o%20 https://edisciplinas.usp.br/pluginfile.php/4212163/mod_resource/content/1/Ferromagnetismo%20e%20o%20 DEFEITOS CRISTALINOS DEFEITOS VOLUMÉTRICOS AULA 10 63 DEFINIÇÃO Defeitos tridimensionais presentes em todos os materiais sólidos são denominados defeitos volumétricos. Estes incluem trincas, poros, inclu- sões e outras fases. São normalmente introduzidos durante as etapas de processamento e fabricação. POROS Os poros são espaços vazios ocasionados por gases que ficaram pre- sos durante a solidificação do material. Devido a isso, alteram a estrutura original do cristal de forma tridimensional e, dependendo do raio do poro, é possível visualizá-lo a olho nu. Figura 10.1 – Micrografia de poros em compactado de pó de ferro Fonte: https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6423-defeitos-volumetricos#.Xd0rS9XQ_IU https://www.cimm.com.br/portal/material_didatico/6423-defeitos-volumetricos#.Xd0rS9XQ_IU 64 PRECIPITADOS, DISPERSANTES E INCLUSÕES Impurezas podem se alocar na matriz cristalina, durante o processa- mento do material. Podem formar fases coerentes ou incoerentes com a estrutura cristalina hospedeira (ver Figura 10.2). Figura 10.2 – Representação de defeitos volumétricos com: a) fase coerente e b) fase incoerente. Fonte: Handbook of Materials Structures, Properties, Processing and Performance, 2015. Conforme a dimensão dessas, são classificadas em: • Precipitados, tamanho menor que um mícron (Figura 10.3); • Dispersantes: podem ser precipitados grandes, grãos ou par- tículas poli granuladas distribuídas nos cristais (Figura 10.4); • Inclusões: grandes aglomerados de impurezas, comportam- -se como uma segunda fase e influenciam o comportamento do material de origem. Por isso, são indesejadas na maioria das vezes (Figura 10.5). 65 Figura 10.3 – Precipitados em uma liga Al-6061 (96% Al e 4 % Cu). Fonte: Handbook of Materials Structures, Properties, Processing and Performance, 2015. Figura 10.4 – Micrografia de partículas de 𝑇ℎ𝑂2 dispersas em 𝑁𝑖 metálico. Fonte: Handbook of Materials Structures, Properties, Processing and Performance, 2015. Figura 10.5 – Micrografia da inclusão de SiO₂, Al₂O₃ e MgO em ferro fundido nodular. Fonte: https://docplayer.com.br/63797746-Defeitos-de-fundicao-inclusoes.html https://docplayer.com.br/63797746-Defeitos-de-fundicao-inclusoes.html 66 VIBRAÇÕES ATÔMICAS Todos os átomos presentes em um material sólido estão em cons- tante e rápida vibração em torno da sua posição reticular dentro do cristal. Em um certo sentido, essas vibrações podem ser consideradas imperfeições ou defeitos. Num certo momento, esses mesmos átomos não estão todos vibrando com a mesma frequência e/ou amplitude, tampouco com a mesma energia. Para uma dada temperatura existirá uma distribuição das energias dos átomos constituintes em torno de um valor de energia médio. Ao passar do tempo, a energia vibracional de qualquer átomo espe- cífico também irá variar de uma maneira aleatória. Com o aumento da temperatura, essa energia média aumenta, e, de fato, a temperatura de um sólido é realmente apenas uma medida da atividade vibracional média dos átomos e moléculas que compõem o sólido. À temperatura ambiente, uma frequência de vibração típica está na ordem de 1013 vi- brações por segundo, enquanto a amplitude é de uns poucos milésimos de nanômetro. Muitas propriedades e processos em sólidos são manifestações des- te movimento de vibração apresentado pelos átomos. Por exemplo, a fusão ocorre quando as vibrações são vigorosas o suficiente para rom- per grandes números de ligações atômicas. DIFUSÃO – DEFINIÇÃO, CLASSIFICAÇÃO E MECANISMOS AULA 11 68 DEFINIÇÃO A obtenção de materiais depende da transferência de massas dos reagentes envolvidos. Este fluxo pode ocorrer no próprio interior de um sólido específico (no caso de ligas, um composto sólido irá se alo- car no interior de um metal hospedeiro) ou a partir de um líquido, de um gás ou outra fase sólida. Este fenômeno de transporte de material através do movimento dos átomos é denominado difusão. Através da compreensão do mecanismo dessa e dos fatores que a influenciam, é possível quantificar a concentração do componente difundido e, assim, obter materiais com características desejadas. CLASSIFICAÇÃO Interdifusão A ocorrência da difusão pode ser demonstrada através do uso de um par de difusão. Este é formado ao se unir barras de dois metais distintos, a fim de que haja um contato íntimo entre as duas faces. A Figura 11.1 ilustra dois pedaços de cobre e níquel metálicos que estão em contato. Ao se aquecer este par a uma alta temperatura, porém abaixo do ponto de fusão de ambos, por um extenso período de tempo, os átomos de Cu vão em sentido da placa de Ni, e vice-versa. 69 Figura 11.1 – Esquematização do par de difusão Cu-Ni. Após aquecimento por um longo período de tempo, há um fluxo de átomos de um metal em sentido ao outro. Isto au- menta a concentração de ambos na interface. Fonte: https://slideplayer.com.br/slide/5110465/ Realizando-se uma análise química da situação proposta acima, será re- velado que cobre e níquel puros encontrar-se-ão somente nas duas extremi- dades das barras e, conforme se aproxima da interface, haverá a formação de uma liga. As concentrações de ambos os metais variam de acordo com a posição, conforme está mostrado nos gráficos da Figura 11.1. Isto indica que os átomos de cobre migraram, ou seja, se difundiram para o interior do níquel, e que, de modo semelhante, o níquel se difundiu para o interior do cobre. Tal processo é chamado de interdifusão, ou difusão de impurezas. A interdifusão pode ser analisada comparando-se com soluções líquidas. Nes- te caso, átomos da região de alta concentração (hipertônica) migram para a região de baixa concentração (hipotônica). Isto também é notado no caso Cu-Ni acima. https://slideplayer.com.br/slide/5110465/ 70 Autodifusão A difusão também ocorre nos metais puros, todavia todos os áto- mos que estão mudando de posição são do mesmo tipo. Este evento é conhecido por autodifusão. Obviamente, a autodifusão não está nor- malmente sujeita a observação pelo acompanhamento de mudanças na composição, como na interdifusão. MECANISMOS DA DIFUSÃO Para um átomo movimentar-se dentro de uma matriz cristalina, duas condições devem ser atendidas: é necessário haver um sítio adjacente vazio, e o átomo deve possuir energia suficiente para quebrar as ligações atômicas que o une aos seus átomos vizinhos e, então, causar alguma distorção na rede cristalina durante o deslocamento. Tal energia é de natureza vibracional. A uma certa temperatura, uma pequena fração de átomos é capaz de realizar movimento por difusão. Assim, pode-se afirmar que a difusão é proporcional à temperatura do material. A Figura 11.1 pode ser melhor compreendida, através da animação presen- te no endereço: http://web.unideb.hu/zerdelyi/diffusion-on-the-nanoscale/ volume-diffusion/ http://web.unideb.hu/zerdelyi/diffusion-on-the-nanoscale/volume-diffusion/ http://web.unideb.hu/zerdelyi/diffusion-on-the-nanoscale/volume-diffusion/ 71 Difusão por lacuna Um átomo pode sair de sua posição normal da rede cristalina para um sítio vago do retículo, lacuna, adjacente, conforme representa o esquema da Figura 11.2. Esse mecanismo é apropriadamente chamado de difusão por lacuna. A extensão segundo a qual este tipo de difusão acontece é uma função do número desses defeitos presentes. Em temperaturas ele- vadas, é possível obter quantidades significativas de lacunas. Figura 11.2 – Esquematização do mecanismo de difusão por lacunas. Fonte: https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4532/1/Projeto%20Final%20-%20Renato%20 Figueiredo%20Cabral%20%28sem%20assinaturas%29.pdf Posto que os átomosem difusão e as lacunas trocam de posições, am- bos possuem sentidos opostos de movimento: os átomos movem-se para as lacunas e vice-versa. Tanto a autodifusão como a interdifusão ocorrem por meio deste mecanismo, excetuando que, no caso da última, os áto- mos de impureza estão difundindo-se, ao invés dos átomos hospedeiros. Difusão Intersticial Um outro tipo de difusão envolve átomos que migram de uma posição intersticial para uma outra vizinha e vazia. Tal fenômeno é observado na inter- https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4532/1/Projeto%20Final%20-%20Renato%20Figueiredo%20Cabral%20%28 https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4532/1/Projeto%20Final%20-%20Renato%20Figueiredo%20Cabral%20%28 72 difusão de impurezas como hidrogênio, carbono, nitrogênio e oxigênio, que possuem raio atômico pequenos o suficiente para se alocarem no interior das posições intersticiais. Átomos hospedeiros e impurezas substitucionais raramente formam intersticiais, e normalmente não se difundem através deste mecanismo. Essa ocorrência é chamada de difusão intersticial. Figura 11.3 – Esquematização do mecanismo de difusão intersticial. O átomo azul repre- senta uma impureza de raio atômico inferior ao do átomo hospedeiro. Fonte: https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4532/1/Projeto%20Final%20-%20Renato%20 Figueiredo%20Cabral%20%28sem%20assinaturas%29.pdf Na maioria das ligas metálicas, a difusão intersticial ocorre mais ra- pidamente do que a por lacunas, já que os átomos intersticiais são me- nores, e, consequentemente, possuem maior mobilidade. Além do que, há mais posições intersticiais vazias do que lacunas em um cristal e, portanto, a probabilidade de um movimento atômico intersticial é maior do que para a difusão por lacunas. Representações animadas desses mecanismos de difusão (além de alguns mais específicos), estão presentes no site a seguir. https://www.tf.uni-kiel. de/matwis/amat/def_en/kap_3/backbone/guidedtour_r3_2_1.html https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4532/1/Projeto%20Final%20-%20Renato%20Figueiredo%20Cabral%20%28 https://app.uff.br/riuff/bitstream/1/4532/1/Projeto%20Final%20-%20Renato%20Figueiredo%20Cabral%20%28 https://www.tf.uni-kiel.de/matwis/amat/def_en/kap_3/backbone/guidedtour_r3_2_1.html https://www.tf.uni-kiel.de/matwis/amat/def_en/kap_3/backbone/guidedtour_r3_2_1.html PRIMEIRA LEI DE FICK: DIFUSÃO EM ESTADO ESTACIONÁRIO AULA 12 74 DIFUSÃO EM ESTADO ESTACIONÁRIO Como a difusão é um processo que depende do tempo, a quantidade de átomos transportados no interior de um material é uma função do tempo. Desta forma, faz-se necessário saber a taxa de transferência de massa, isto é, o fluxo de difusão J, definido como: (01) Em que M é a massa de átomos difundidos, A é a área através da qual a difusão está ocorrendo e t é o tempo de difusão decorrido. Diferen- ciando-se essa expressão (uma vez que se trata de uma taxa): (02) sendo J medido em kg/(m²s) ou átomos/(m²s). Se o fluxo difusivo J não variar com o tempo, tem-se uma condição de estado estacionário. Um exemplo comum disso é a difusão dos átomos de um gás através de uma placa metálica para a qual as concentrações (ou pressões) do componente em difusão em ambas as superfícies da placa são mantidas constantes. Isso está ilustrado na Figura 12.1. 𝐽 = 𝑀 𝐴𝑡 𝐽 = 1 𝐴 𝑑𝑀 𝑑𝑡 75 Figura 12.1 – Difusão em estado estacionário de um determinado gás com pressão pA por uma placa metálica. Ao atravessá-la, o gás possui uma nova pressão pb < pA. A direita, uma representa- ção gráfica da concentração do gás em função da espessura x da placa. Fonte: https://docplayer.com.br/33011024-Movimento-de-atomos-e-ions-nos-materiais-difusao.html Quando a concentração C é plotada em função da posição (ou dis- tância) no interior do sólido, x, a curva resultante é conhecida por perfil de concentração (Figura 4) e seu coeficiente angular, ou inclinação da reta, é o gradiente de concentração ∇𝐶: (03) com C em kg/m³ ou g/cm³. Admitindo-se que o perfil de concentração é linear, conforme mos- trado na Figura 4: (04) ∇𝐶 𝑥 = 𝑑𝐶 𝑑𝑥 ∇𝐶 𝑥 = ∆𝐶 ∆𝑥 = 𝐶𝐴 − 𝐶𝐵 𝑥𝐴 − 𝑥𝐵 https://docplayer.com.br/33011024-Movimento-de-atomos-e-ions-nos-materiais-difusao.html 76 Pelo fato de o fluxo ser proporcional ao gradiente de concentração, obtém-se a expressão: (05) Sendo a constante de proporcionalidade D chamada de coeficiente de difusão e expressa em m²/s. O sinal negativo indica que a direção da difusão é contra o gradiente de concentração, ou seja, da concentração mais alta para a mais baixa. A (05) é denominada de primeira lei de Fick. 𝐽 = −𝐷 𝑑𝐶 𝑑𝑥 Uma placa de ferro está exposta a 700ºC em uma atmosfera carbonetante, rica em carbono, em um de seus lados, e a uma atmosfera descarbonetante no outro. Se uma condição de regime estacionário é atingida, é possível calcular o fluxo de difusão do carbono através da placa, dado que as concentrações de carbono nas posições 5 e 10 mm abaixo da superfície são 1,2 e 0,8 kg/m³ respectivamente. Considere um coeficiente de difusão de 3 x 10 ¯¹¹ m²/s nessa temperatura. Sendo a massa molar do carbono igual a 12,01 g/mol, tem-se: 𝐽 = −𝐷 𝑑𝐶 𝑑𝑥 = −𝐷 ∆𝐶 ∆𝑥 𝐽 = −𝐷 𝐶𝐴 − 𝐶𝐵 𝑥𝐴 − 𝑥𝐵 = −(3 × 10−11 𝑚2 𝑠⁄ ) 0,8 𝐾 𝑔 𝑚3⁄ )− (1,2 𝑘𝑔 𝑚3⁄ 0,010 𝑚)− (0,005 𝑚 𝐽 = 2,4 × 10−9 𝑘𝑔 𝑠⁄ 𝐽 = 2,4 × 10−12𝑔 𝑠⁄ × 6,02 × 1023 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠 12,01 𝑔 = 1,2 × 10 11 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠 𝑠⁄ 77 O termo força motriz é usado como aquilo que induz a ocorrência de um fenômeno. Para difusões, quando esta se dá de acordo com a equação (05), o gradiente de concentração é a força motriz. Um exemplo prático da difusão em estado estacionário é a purificação do gás hidrogênio (Figura 12.2). Um dos lados de uma chapa fina de paládio metálico é exposta ao gás impuro, ou seja, contendo também gases como o nitrogênio, o oxigênio e vapor d’água. Somente o hidrogênio se difunde através da chapa, para o lado oposto, que é mantido sob uma pressão de hidrogênio constante e inferior. Figura 12.2 – Purificação do gás hidrogênio, através de sua difusão seleti- va em um filme de paládio. Fonte: https://hub.wsu.edu/ise/design/purification/ https://hub.wsu.edu/ise/design/purification/ SEGUNDA LEI DE FICK: DIFUSÃO EM ESTADO NÃO-ESTACIONÁRIO AULA 13 79 DIFUSÃO EM ESTADO NÃO-ESTACIONÁRIO Situações de difusão de estado não-estacionário são mais comuns do que em estado estacionário. Em outras palavras, o fluxo de difusão e o gradiente de concentração em um ponto específico no interior de um sólido variam ao longo do tempo, resultando em acúmulo ou esgota- mento líquido do componente que se encontra em difusão. A Figura 13.1 representa essa circunstância, em que concentrações de uma mesma es- pécie em difusão são tomadas em três momentos diferentes do processo. Nenhuma curva coincide, diferente do que foi descrito na seção anterior. Figura 13.1 – Concentrações de uma mesma espécie em função da distância em difusões de estado não-estacionário, em três tempos diferentes, sendo t₃ > t₂ > t₁. Fonte: http://www.engineeringenotes.com/metallurgy/diffusion/diffusion-coefficient-an- d-laws-ficks-laws-metallurgy/41803 http://www.engineeringenotes.com/metallurgy/diffusion/diffusion-coefficient-and-laws-ficks-laws-meta http://www.engineeringenotes.com/metallurgy/diffusion/diffusion-coefficient-and-laws-ficks-laws-meta 80 Sob condições de estado não-estacionário, a equação da Primeira Lei de Fick não mais é adequada, sendo necessário o uso de uma dife- rencial parcial: (01) Conhecida por Segunda Lei de Fick. Se o coeficiente de difusão in- depender da composição, a equação torna-se: (02) As soluções dessa expressão são obtidas através da especificação de condições de contorno, isto é, que possuem um sentido físico. Neste caso, essas condições são a concentração inicial da espécie difusa no material, C₀; a concentração a uma determinada profundidadex, Cx; e a concentração na superfície do material, Cs. Deste modo, a solução da equação (07) será: (03) ∂𝐶 ∂𝑡 = ∂ ∂𝑥 𝐷 ∂𝐶 ∂𝑥 ∂𝐶 ∂𝑡 = 𝐷 ∂2𝐶 ∂𝑥2 𝐶𝑥 − 𝐶0 𝐶𝑠 − 𝐶0 = 1 − 𝑥 2 𝐷𝑡� Um simulador de difusão em sólidos está no link abaixo. Através desse software, é possível manipular a quantidade de espécie difundida, a tem- peratura e o tempo de difusão. https://demonstrations.wolfram.com/DiffusionInSolids/ https://demonstrations.wolfram.com/DiffusionInSolids/ 81 A plotagem da equação (03) gera a curva da Figura 7. A altura máxima da curva representa a diferença Cs - C₀, enquanto que a altura menor do ponto desejado x é dada por Cx - C0. A expressão 𝑥 2 𝐷𝑡� é a função erro de Gauss,3 cujos valores são obtidos pela equação: (04) E os valores estão tabelados a seguir. Tabela 13.1 – Valores da função de erro de Gauss. z (z) z (z) z (z) 0,00 0,0000 0,55 0,5633 1,30 0,9340 0,025 0,0282 0,60 0,6039 1,40 0,9523 0,050 0,0564 0,65 0,6420 1,50 0,9661 0,10 0,1125 0,70 0,6778 1,60 0,9763 0,15 0,1680 0,75 0,7112 1,70 0,9838 0,20 0,2227 0,80 0,7421 1,80 0,9891 0,25 0,2763 0,85 0,7707 1,90 0,9928 0,30 0,3286 0,90 0,7970 2,00 0,9953 0,35 0,3794 0,95 0,8209 2,20 0,9981 0,40 0,4284 1,00 0,8427 2,40 0,9993 0,45 0,4755 1,10 0,8802 2,60 0,9998 0,50 0,5205 1,20 0,9103 2,80 0,9999 Fonte: Elaborado pelo autor. Vale ressaltar que, para a solução de um problema envolvendo a equação (03), basta substituir a variável z da equação (04) por 𝑥 2 𝐷𝑡� . 𝑧 = 2 𝜋� � 𝑧 0 𝑒−𝑦 2 𝑑𝑦 82 Figura 13.2 – Gráfico da segunda lei de Fick, solucionada pelas condições de contorno Cs, Cx, x e C₀. Fonte: http://www.engineeringenotes.com/metallurgy/diffusion/diffusion-coefficient- and-laws-ficks-laws-metallurgy/41803 Realiza-se a difusão de boro numa pastilha de silício durante 7h a 1100 ºC. A pastilha, inicialmente, está isenta de boro. Qual a profundidade, abaixo da su- perfície, na qual a concentração de boro será de 10¹⁷ átomos/cm³, se a concen- tração de boro na superfície for mantida constante e igual a 10¹⁸ átomos/cm³? Dado: coeficiente de difusão de boro no silício a 1100 ºC: 4,0 x 10¯¹³ cm²/s 𝐶𝑥 − 𝐶0 𝐶𝑠 −𝐶0 = 1− erf 𝑥 2 𝐷𝑡� 1017 á𝑡𝑜𝑚𝑜 𝑠 𝑐𝑚3⁄ ) − (0 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠 𝑐𝑚3⁄ 1018 á𝑡𝑜𝑚𝑜 𝑠 𝑐𝑚3⁄ ) − (0 á𝑡𝑜𝑚𝑜𝑠 𝑐𝑚3⁄ = 1− erf 𝑥 2 4,0× 10−13 𝑐𝑚2 𝑠⁄ )(7 ℎ� 0,1 = 1− erf 𝑥 2(1,7× 10−6) 0,9 = erf 𝑥 3,3 × 10−6 Tomando 𝑥 3,3×10−6 = 𝑧: 0,9 = erf 𝑧 http://www.engineeringenotes.com/metallurgy/diffusion/diffusion-coefficient-and-laws-ficks-laws-meta http://www.engineeringenotes.com/metallurgy/diffusion/diffusion-coefficient-and-laws-ficks-laws-meta 83 Da Tabela 1, não é possível encontrar um valor exatamente igual a 0,9. Por- tanto será preciso realizar uma interpolação dos dados. Para isso, deve-se encontrar valores próximos menores e maiores que o desejado. No caso acima, para z = 1,1 → erf(z) = 0,8802 e para z = 1,2 → erf(z) = 0,9103 . Então, o valor de z para erf(z) = 0,9 deve estar entre os valores descritos. Portanto: Por fim, para encontrar x: 𝑧 = 1,1658 1,2− 1,1 𝑧 −1,1 = erf 1,2 − erf 1,1 erf 𝑧 − erf 1,1 1,2−1,1 𝑧 −1,1 = 0,9103−0,8802 0,9− 0,8802 𝑥 3,3 × 10−6 = 𝑧 𝑥 ≅ 3,9 × 10−6𝑚= 3,9 𝜇𝑚 𝑥 3,3 × 10−6 = 1,1658 FATORES QUE INFLUENCIAM A DIFUSÃO AULA 14 85 ESPÉCIES DIFUSIVAS A intensidade do coeficiente de difusão D sugere a taxa segundo a qual os átomos se difundem no interior do material. A Tabela 14.1 exi- be alguns coeficientes de difusão (autodifusão e/ou interdifusão) para vários sistemas metálicos. Tabela 14.1 – Valores calculados de difusão de algumas espécies em determinados metais hospedeiros em temperaturas distintas. Fonte: Callister, 2004. Como visto pelos dados acima, o coeficiente de difusão é influenciado pelo tipo de espécie difusiva e pelo material hospedeiro. No caso do Fe, por exemplo, sua autodifusão e a interdifusão do carbono, ambos a 500 ºC, possuem uma diferença de magnitude da ordem de 10⁹. É possível observar também o contraste entre as taxas de difusão por lacuna (au- todifusão), mais lenta, e intersticial, mais rápida. 86 TEMPERATURA Um dos fatores de maior influência sobre os coeficientes e taxas de difusão é a temperatura. De acordo com a tabela 14.1, a autodifusão do Fe no Fe-α (CCC) aumenta em próximo de seis ordens de magnitude, ao se elevar a temperatura de 500 para 900 ºC. Essa dependência dos coeficientes de difusão com a temperatura é expressa pela equação: (01) em que D0 é o coeficiente de difusão máxima (temperatura infinita) em m2/s; Qd é a energia de ativação para a difusão dada por J/mol, ou cal/ mol, ou ainda eV/mol; R é a constante universal dos gases, no valor de 8,31 J/(mol K) = 1,987 cal/(mol K) = 8,62 x 10¯⁵ eV/átomo; e T a temperatura absoluta em Kelvin. A energia de ativação é aquela necessária para produzir o movimento difusivo de um mol de átomos. Se tiver valor elevado, gerará um coefi- ciente de difusão relativamente pequeno. Esses valores de energia de ativação também estão representados na Tabela 14.1. 𝐷 = 𝐷0 exp − 𝑄𝑑 𝑅𝑇 87 Um gráfico da equação (2) terá a aparência da Figura 14.1, tomando os eixos x e y como 1 𝑇 e In D, nessa ordem. Figura 14.1 – Coeficiente de difusão do carbono em ferro como função da temperatura. Fonte: http://sv.rkriz.net/classes/MSE2034_NoteBook/MSE2034_kriz_NoteBook/diffu- sion/analytic/anal2.html É possível realizar uma regressão linear da equação (1), tomando os loga- ritmos naturais de ambos os lados: (02) Ou utilizando logaritmos na base 10: (03) Já que D0, Qd e R são constantes, a plotagem da equação (2) ou (3) resultará em uma reta. Lembrando que a equação reduzida da reta é dada por: (04) com y em função de x e com coeficientes linear e angular b e m respecti- vamente. Comparando-se as equações (02) e (04), y = In D, 𝑥 = 1𝑇 , 𝑏 = log𝐷0 e 𝑚 = −𝑄𝑑𝑅 . ln𝐷 = ln𝐷0 − 𝑄𝑑 𝑅 1 𝑇 log𝐷 = log𝐷0 − 𝑄𝑑 2,3𝑅 1 𝑇 𝑦 = 𝑏+𝑚𝑥 http://sv.rkriz.net/classes/MSE2034_NoteBook/MSE2034_kriz_NoteBook/diffusion/analytic/anal2.html http://sv.rkriz.net/classes/MSE2034_NoteBook/MSE2034_kriz_NoteBook/diffusion/analytic/anal2.html 88 OUTROS CAMINHOS DE DIFUSÃO Além dos métodos supracitados, a migração atômica também pode ocorrer ao longo das discordâncias, contornos de grão e superfícies ex- ternas. São chamados de caminhos de difusão de curto-circuito, porque as taxas de difusão são muito maiores do que aquelas para a difusão no meio do volume sólido. Entretanto, na maioria das situações, as contri- buições para o fluxo de difusão global devido aos curtos-circuitos são insignificantes, pois as áreas de seção reta para esses caminhos são extremamente pequenas. Qual o coeficiente de difusão do carbono em Fe-α a 600 ºC? Pela Tabela 2, D0 = 6,2 x 10¯⁷ m²/s e Qd = 80 kJ/mol. Então: 𝐷 ≅ 1,9 × 10−5𝑚2 𝑠⁄ 𝐷 = 𝐷0 exp − 𝑄𝑑 𝑅𝑇 𝐷 = (6,2 × 10−7 𝑚2 𝑠⁄ ) exp − 80.000 𝐽 𝑚⁄ 𝑜𝑙 8,31 𝐽 (⁄ 𝑚𝑜𝑙 𝐾))(873 𝐾 SÓLIDOS NÃO- CRISTALINOS: VIDROS AULA 15 90 CLASSIFICAÇÃO DE ESTRUTURAS SÓLIDAS Nos sólidos, as redes podem ser diferenciadas entre: • Cristalina: possui periodicidade translacional, uma forma especial de ordenação a longo alcance, e um diagrama de difração essen- cialmente discreto. Pode possuir ordem de simetria de 2, 3, 4 ou 6; • Quase-cristalina: há ordenação a longo alcance, sem periodici- dade translacional. Não existe sobreposição de celas unitárias e, ao calcular a ordem de simetria, obter-se-ão valores incom- patíveis com uma cela unitária cristalina (5, 7, 8, 10 ou 12); • Não-cristalina: não há ordem posicional de longo alcance, po- dendo ser topologicamente ordenada ou desordenada. A Figura 15.1 esquematiza os quatro tipos de rede para melhor en- tendimento. Figura 15.1 – Representação 2D dos quatro tipos de rede: (a) cristalina, (b) quase-crista- lina, (c) não-cristalina topologicamente ordenada e (d) desordenada. FONTE: GUPTA, 1995.
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