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O Evangelho de São Lucas

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O evangelho de 
SÃO LUCAS 
, 
CADERNOS DE ESTUDO BIBLICO 
O evangelho de 
SÃO LUCAS 
Com introdução, comentários e notas de 
Scott Hahn e Curtis Mitch 
e questões para estudo de 
Dennis Walters 
Tradução de Alessandra Lass 
ECCLESIAE 
O evangelho de São Lucas: Cadernos de estudo bíblico 
1• edição-março de 2015-CEDET 
Título original: Catholic Study Bible: 1he Gospel of Luke -© Ignatius Press. 
Os direitos desta edição pertencem ao 
CEDET - Centro de Desenvolvimento Profissional e Tecnológico 
Rua Ângelo Vicentin, 70 CEP: 13084-060 - Campinas -SP 
Telefone: 19-3249-0580 
e-mail: livros@cedet.com.br 
Editor: 
Diogo Chiuso 
Editor-assistente: 
Thomaz Perroni 
Tradução: 
Alessandra Lass 
Revisão: 
Thomaz Perroni 
Editoração & Capa: 
Renan Santos 
Comelho Editorial· 
Adelice Godoy 
César Kyn d'Ávila 
Diogo Chiuso 
Silvio Grimaldo de Camargo 
� ECCLESIAE - www.ecdesiae.com.br 
Reservados todos os direitos desta obra. Proibida toda e qualquer reprodução desta edição por qualquer meio 
ou forma, seja ela eletrônica ou mecânica, fococópfa, gravação ou qualquer meio. 
ÍNDICE 
INTRODUÇÃO A ESTE ESTUDO • 7 
Inspiração e inerrância bíblica • 8 
Auto ridade bíblica • 9 
Os sen tidos da Sagrada Escritura • 10 
Critérios para a in terp retação da Bíblia • l 3 
Usando este estudo • l 5 
Colocando tudo em perspectiva • l 7 
Uma nota final • l 7 
INTRODUÇÃO AO EVANGELHO DE LUCAS • l 9 
Auto ria • 19 
Data• 19 
Destinatários • 20 
Estrutura • 20 
Temática • 2 l 
ESQUEMA DO EVANGELHO DE LUCAS • 23 
O EVANGELHO DE LUCAS • 2 5 
Estudo da palavra: Recebeu • 3 3 
Mapa: O re i n o de He rodes no nasc imento de Jesus • 34 
Ensaio sobre u m tópico: Maria , a Arca da Aliança • 3 5 
Ensaio sobre um tóp ico: O censo de Quir ino • 41 
Quadro: As paráb o l as de Jesus • 68 
Estudo da palavra: Êxodo • 7 4 
Mapa: A peregr in ação dos j udeus da Gal i l é i a a Jerusalém • 78 
Estudo da palavra: Crianc inhas • lo 2 
Ensaio sobre um tópico: Jesus , o Fi lho do Homem • 102 
Mapa: A viagem fi na l p ara Jerusa lém • 108 
Estudo da palavra: Memória • l 2 l 
QUESTÕES PARA ESTUDO • l 3 O 
INTRODUÇÃO A ESTE ESTUDO 
vocÊ ESTÁ SE APROXIMANDO da "palavra de Deus". Esse é o título mais freqüente­
mente atribuído à Bíblia pelos cristãos e é uma expressão rica em significado. Esse é 
também o título atribuído à segunda pessoa da Santíssima Trindade, o Deus Filho 
- Jesus Cristo, que se encarnou para a nossa salvação "e é chamado pelo nome de 
Palavra de Deus" (Ap 19, 13; cf. Jo l, 14).1 
A palavra de Deus é a Sagrada Escritura. A Palavra de Deus é Jesus. Essa associa­
ção sutil entre a palavra escrita de Deus e sua Palavra eterna é intencional e presente 
na tradição da Igreja desde a primeira geração de cristãos. "Toda a Escritura divina 
é um único livro, e este livro é Cristo, 'já que toda Escritura divina fala de Cristo, 
e toda Escritura divina se cumpre em Cristo'2" (CIC 134). Isto não significa que a 
Escritura é divina da mesma maneira que Jesus é divino. Ela é, antes, divinamente 
inspirada e, como tal, é única na história da literatura universal, assim como a En­
carnação da Palavra eterna é única na história da humanidade. 
Podemos dizer ainda que a palavra inspirada assemelha-se à Palavra encarnada 
em muitos e importantes aspectos. Jesus Cristo é a Palavra de Deus encarnada; em 
sua humanidade, Ele é como nós em todas as coisas, exceto no pecado. A Bíblia, 
enquanto obra escrita pelo homem, é como qualquer outro livro, exceto pelo fato de 
não conter erros. Tanto Cristo quanto a Sagrada Escritura nos são dados "para nossa 
salvação" ,3 diz o Concílio Vaticano II, e ambos nos fornecem a revelação definitiva 
de Deus. Portanto, nós não podemos conceber um sem o outro - a Bíblia sem Je­
sus, ou Jesus sem a Bíblia. Um é a chave interpretativa do outro. É por que Cristo 
é o sujeito e o assunto de toda a Escritura que São Jerônimo afirma que "ignorar as 
Escrituras é ignorar a Cristo"4 (CIC 133). 
Ao aproximarmo-nos da Bíblia, então, nós nos aproximamos de Jesus, a Palavra 
de Deus; e para que o encontremos de fato, devemos abordá-lo através de um estudo 
devoto e piedoso da palavra inspirada de Deus, a Sagrada Escritura. 
Jo l, 14: "E a Palavra se fez homem e habitou entre nós. E nós contemplamos a sua glória: glória do Filho único do Pai, 
cheio de amor e fidelidade". A tradução brasileira dos textos bíblicos utilizada ao longo de todo este estudo é a da Bíblia 
da CNBB (NE). 
2 Hugo de São Vítor, De arca Noe, 2, 8: PL 176, 642; cf. ibid., 2, 9: PL 176, 642-643. 
3 Dei Verbum, 11. 
4 Dei Verbum, 25; cf. S. Jerônimo, Commentarii in luziam, Prologus: CCL 73, 1 (PL 24, 17). 
7 
Cadernos de estudo bíblico 
INSPIRAÇÃO E INERRÂNCIA BÍBLICA5 
A Igreja Católica faz afirmações admiráveis em relação à Bíblia. É essencial para 
nós, se quisermos ler a Escritura e aplicá-la à nossa vida do modo como a Igreja pre­
tende que o façamos, que reconheçamos essas afirmações e as admitamos. Não basta 
que simplesmente concordemos, acenando positivamente com a cabeça, quando 
lemos as palavras "inspiradà', "única" ou "inerrante". É preciso que saibamos o que 
a Igreja quer dizer com esses termos e, depois, nos é necessário tornar pessoal essa 
compreensão. Afinal de contas, a forma como cremos na Bíblia influenciará inevita­
velmente o modo como vamos lê-la. E o modo como lemos a Bíblia, por sua vez, é 
o que determina o que nós "tiramos" de suas páginas sagradas. 
Esses princípios são válidos independentemente do que estamos lendo - uma 
reportagem de jornal, um aviso de "procura-se", uma propaganda, um cheque, uma 
prescrição médica, uma nota de despejo .. . O modo como lemos essas coisas (ou até, 
se as lemos ou não) depende muito de nossas noções pré-conceituadas a respeito 
da autoridade e confiabilidade de suas fontes - e também do potencial que têm de 
afetar diretamente nossa vida. Em alguns casos, a má interpretação da autoridade 
de um documento pode levar a conseqüências terríveis; noutros casos, pode nos im­
pedir de desfrutar certas recompensas das quais temos o direito. No caso da Bíblia, 
tanto as conseqüências quanto as recompensas envolvidas têm valor definitivo. 
O que quer dizer a Igreja, então, ao endossar as palavras de São Paulo - "Toda 
Escritura é inspirada por Deus" (2Tm 3, 16)? Uma vez que, nessa passagem, o termo 
"inspiradà' pode ser entendido como "soprada por Deus", segue-se então que Deus 
soprou sua palavra na Escritura assim como você e eu sopramos ar quando falamos. 
5 Na linguagem cotidiana, o termo "errante" costuma significar "andar a esmo", "andar sem rumo" ou "vaguear"; 
"inerrante", nesse sentido, se diria de algo que "anda com prop6sito", "com destino cerro". No entanto, o termo 
"inerrância" é empregado aqui no sentido estrito de "sem erros", mesmo - e assim também "inerrante" quer dizer "que 
não erra". Poder-se ia dizer "infalível", porém o autor faz uma clara distinção entre esses dois termos - "inerrante" e 
"infalível" - quando diz, mais à frente, que "o mistério da inerrância bíblica é de âmbito ainda mais abrangente que o de 
sua infalibilidade". A distinção esclarece que o autor está se referindo à escrita da Bíblia como inerrante, enquanto que 
se refere à interpretação do que foi escrito como infalível- dois adjetivos distintos para duas etapas distintas da relação 
com o texto sagrado: a escrita e a interpretação da escrita. Ambas são feitas pelo proprio Espírito Santo e, portanto, não 
podem falsear. -
Na Carta Encíclica Divino Aj/lante Spiritu, de setembro de 1943, o Papa Pio XII diz da doutrina da inerrância bíblica: 
•O primeiro e maior cuidado de Leão XIII foi expor a doutrina relativa à verdade dos Livros Sagrados e defendê-la dos ataques 
contrários. Por isso em graves termos declarou que não há erro absolutamente nenhum quando o hagiógrafo, /alando de coisas 
foicas, se atém ao que aparece aos sentidos; como escreveu o Angélico [Sto. Tomás de Aquino], exprimindo-se ou de modo 
metafórico, ou segundo o modo comum de falar usadonaqueles tempos e usado ainda hoje em muitos casos na conversação 
ordinária mesmo pe/,os maiores sábios'. De fato, 'não era intenção dos escritores sagrados, ou melhor, do Espírito Santo que por 
eles falava - são palavras de Sto. Agostinho -, ensinar aos homens essas coisas - isto é, a íntima constituição do mundo visível 
- que nada importam para a salvação'. {..] Nem pode ser taxado de erro o escritor sagrado, se aos copistas escaparam algumas 
inexatidões na transcrição dos códices' ou se é incerto o verdadeiro sentido de algum passo'. Enfim, é abs(Jlutamente vedado 'coarctar 
a inspiração unicamente a algumas partes da Sagrada Escritura ou conceder que o próprio escritor sagrado errou; pois que a divina 
inspiração 'de sua natureza não só exclui todo erro, mas exclui-o e repele-o com a mesma necessidade com que Deus, suma verdade, 
não pode ser autor de nenhum erro. Esta é a fé antiga e constante da Igreja" (NE). 
8 
O evangelho de São Lucas 
Isso significa que Deus é o autor primordial da Bíblia. Certamente Ele se serviu tam­
bém de autores humanos para essa tarefa, mas não é que Ele simplesmente os assistiu 
enquanto escreviam, ou então aprovou posteriormente aquilo que tinham escrito. 
Deus Espírito Santo é essencialmente o autor da Escritura, enquanto que os escritores 
humanos o são instrumentalmente. Esses autores humanos escreveram francamente 
tudo aquilo - e somente aquilo - que Deus queria: é a palavra de Deus nas exatas 
palavras de Deus. Esse milagre da dupla-autoria se estende a toda a Escritura e a 
cada uma de suas partes, de modo que tudo o que os seus autores humanos afirmam, 
Deus também afirma através de suas palavras. 
O princípio da inerrância bíblica decorre logicamente do princípio de sua divina 
autoria. Afinal de contas, Deus não mente, e nem erra. Sendo a Bíblia divinamente 
inspirada, nela não pode haver erro algum quanto àquilo que seus autores, tanto o 
divino quanto os humanos, afirmam ser verdadeiro. Isso quer dizer que o mistério 
da inerrância bíblica é de âmbito ainda mais abrangente que o de sua infalibilidade 
- a saber, o de que é garantido que a Igreja sempre nos ensinará a verdade em tudo 
aquilo que disser respeito à fé e à moral. É claro que o manto da inerrância sempre 
cobrirá também o campo das questões de fé e moral, mas ele se estende para mais 
longe ainda, no sentido de nos assegurar de que todos os fatos e eventos da histó­
ria de nossa salvação estão apresentados de modo exato na Escritura. A inerrância 
bíblica é a nossa garantia de que as palavras e os feitos de Deus narrados na Bíblia 
são verdadeiros e lá estão unificados, declarando numa só voz as maravilhas de seu 
amor salvífico. 
A garantia da inerrância bíblica não quer dizer, no entanto, que a Bíblia é uma 
enciclopédia universal, que serve a todos os propósitos e cobre todos os campos 
de estudo. A Bíblia não é, por exemplo, um compêndio das ciências empíricas - e 
não deve ser tratada como tal. Quando os autores bíblicos relatam fatos de ordem 
natural, podemos ter a certeza de que estão falando de modo puramente descritivo 
e "fenomenológico", de acordo com a maneira como as coisas se apresentaram aos 
seus sentidos. 
AUTORIDADE BÍBLICA 
Implícito nessas doutrinas6 está o desejo de Deus de se fazer conhecido por todo 
o mundo e de estabelecer uma relação de amor com cada homem; mulher e criança 
que Ele criou. Deus nos deu a Escritura não apenas para nos informar ou nos moti­
var; mais do que tudo, Ele quer nos salvar. É este o principal propósito que perpassa 
cada página da Bíblia - e cada palavra sua, na verdade. 
6 As doutrinas da inspiração, da inerrância e da dupla-autoria da Bíblia (NE). 
9 
Cadernos de estudo bíblico 
No intuito de se revelar, Deus usa aquilo que os teólogos chamam de "acomoda­
ção". Às vezes Ele se inclina para se comunicar conosco por "condescendêncià' - ou 
seja, Ele fala à maneira dos homens, como se Ele tivesse as mesmas paixões e fraque­
zas que nós temos (por exemplo, quando Deus diz que "se arrependeu" de ter feito 
o homem sobre a terra, em Gn 6, 6). Noutras vezes, Ele se comunica conosco por 
"elevação" - ou seja, dotando as palavras humanas de um poder divino (por exem­
plo, através dos profetas). Os inúmeros exemplos de acomodação divina na Bíblia 
são a expressão do modo sábio e paternal de proceder de Deus. Com efeito, um pai 
sensitivo fala com seus filhos tanto por condescendência, usando um palavreado in­
fantil, ou por elevação, trazendo o entendimento do filho a um nível mais maduro. 
A palavra de Deus é, portanto, salvífica, paternal e pessoal. Justamente porque fala 
diretamente conosco, nós nunca devemos ser indiferentes ao seu conteúdo; afinal de 
contas, a palavra de Deus é, ao mesmo tempo, objeto, causa e sustento da nossa fé. 
Ela é, na verdade, um teste para a nossa fé, uma vez que nós só vemos na Escritura 
aquilo que nossa fé nos faz ver. Se nosso modo de crer é o mesmo da Igreja, vemos na 
Escritura a revelação salvífica e inerrante de Deus, feita por Ele mesmo. Se cremos de 
modo distinto, vemos um livro totalmente distinto. 
Esse teste é válido e aplicável não só aos fiéis leigos, como também aos teólogos 
da Igreja e até aos seus membros da mais alta hierarquia - inclusive para o seu Ma­
gistério. Recentemente, o Concílio Vaticano II enfatizou que a Escritura deve ser 
"como que a alma da sagrada teologià'. 7 O Papa Emérito Bento XVI, ainda enquan­
to Cardeal Ratzinger, ecoou esse ensinamento com as próprias palavras, insistindo 
que "os teólogos normativos são os autores da Sagrada Escriturà' (grifo nosso). Ele nos 
lembra que a Escritura e o ensinamento dogmático da Igreja estão entrelaçados de 
forma tão firme ao ponto de serem inseparáveis: "O dogma é, por definição, nada 
mais que a interpretação da Escriturà'. Os dogmas já definidos de nossa fé, portan­
to, guardam em si a interpretação infalível da Igreja daquilo que está na Escritura, e 
a teologia é uma reflexão posterior sobre eles. 
OS SENTIDOS DA SAGRADA ESCRITURA 
Como a Bíblia é, ao mesmo tempo, de autoria divina e humana, é necessário, 
para lê-la coerentemente, que dominemos um tipo de leitura distinto daquele ao 
qual estamos acostumados. Primeiramente, temos que lê-la de acordo com seu sen­
tido literal, ou seja, do mesmo modo como lemos qualquer outro escrito humano. 
Neste estágio inicial, devemos nos empenhar na descoberta do significado originário 
que tinham as palavras e expressões usadas pelos escritores bíblicos à época em que 
primeiramente foram escritas e recebidas por seus contemporâneos. Isso quer dizer, 
7 Dei Verbum, 24. 
10 
O evangelho de São Lucas 
entre outras coisas, que não devemos interpretar tudo que lemos "literalmente", 
como se a Escritura nunca falasse de forma figurada ou simbólica {porque freqüen­
temente fala!). Pelo contrário: a lemos de acordo com as regras de escrita que go­
vernam seus diferentes gêneros literários, que variam dependendo do que estamos 
lendo - se é uma narrativa, um poema, uma carta, uma parábola ou uma visão 
apocalíptica. A Igreja nos exorta a ler os livros sagrados dessa maneira a fim de nos 
fazer compreender, com segurança, o que os autores bíblicos estavam se esforçando 
para explicar ao povo de Deus a cada texto. 
O sentido literal, no entanto, não é o único da Escritura; nós interpretamos 
suas sagradas páginas também de acordo com seus sentidos espirituais. Dessa for­
ma, buscamos compreender o que o Espírito Santo está tentando nos dizer para 
além daquilo que afirmaram conscientemente os escritores humanos. Enquanto 
que o sentido literal da Escritura descreve realidades históricas - fatos, ensinamen­
tos, eventos-, os sentidos espirituais desvelam os profundos mistérios abrigados 
através das realidades históricas. Os sentidos espirituais são para o literal o que a 
alma é a para o corpo. Você é capaz de distingui-los; porém, se tentar separá-los, a 
conseqüência imediata é fatal. São Paulo foi o primeiro a insistir nisso e já alertava 
para as conseqüências: "Deus[.. . ] nos tornou capazes de sermos ministros de uma 
aliança nova, não aliança da letra, mas do espírito; pois a letra mata, e o Espírito é 
que dá a vida" (2Co 3, 5-6). 
A tradição católica reconhece três sentidos espirituais que se erguem sobre o alicer­
ce do sentido literal da Escritura {cf. CIC 115): 
Alegórico. O primeiro é o alegórico, que revela o significado espiritual e profético da 
história da Bíblia. As interpretações alegóricas expõem como as personagens, os eventos 
e as leis da Escritura podem apontar para além deles mesmos, em direção ou a grandes 
mistérios ainda por vir (como no caso do Antigo Testamento) , ou aos frutos de mistérios 
já revelados (como no Novo Testamento). Os cristãos freqüentemente lêem o Antigo 
Testamento dessa forma para descobrir de que modo o mistério da Nova Aliança do 
Cristo já estava contido no da Antiga - e também de que modo a Antiga Aliança foi 
manifestada plena e finalmente na Nova. A compreensão alegórica é também latente no 
Novo Testamento, especialmente no relato da vida e da obra de Jesus nos evangelhos. 
Sendo Cristo a cabeça da Igreja e a fonte de sua vida espiritual, tudo aquilo que foi reali­
zado por Ele enquanto viveu no mundo antecipa aquilo que Ele continua realizando em 
seus membros através da Graça. O sentido alegórico fortalece a virtude da fé. 
Moral. O segundo sentido espiritual da Escritura é o moral, ou tropológico, que revela 
como as ações do povo de Deus, no Antigo Testamento, e a vida de Jesus, no Novo, nos 
incitam a criar hábitos virtuosos em nossa própria vida. Nesse sentido, da Escritura se 
II 
Cadernos de estudo bíblico 
tiram alertas contra vícios e pecados, assim como nela se encontra a inspiração para se 
perseguir a pureza e a santidade. O sentido moral fortalece a virtude da caridade. 
Anagógico. O terceiro sentido espiritual é o anagógico, que ascende-nos à glória celes­
te: mostra-nos como um incontável número de eventos contidos na Bíblia prefiguram 
nossa união final com Deus na eternidade; revela-nos como as coisas visíveis na terra são 
imagens das coisas invisíveis do céu. O sentido anagógico leva-nos a contemplar nosso 
destino e, portanto, é próprio para o fortalecimento da virtude da esperança. 
Junto do sentido literal, esses sentidos espirituais extraem a totalidade daquilo 
que Deus quer nos dizer através de sua Palavra e, portanto, abarcam o que a antiga 
tradição chamava de "sentido total" da Sagrada Escritura. 
Tudo isso significa que os feitos e eventos narrados na Bíblia são dotados de um 
sentido que vai além do que é imediatamente aparente ao leitor. Em essência, esse 
sentido é Jesus Cristo e a salvação que, morrendo, Ele nos concedeu. Isso é correto 
sobretudo nos livros do Novo Testamento, que explicitamente proclamam Jesus; 
porém é também verdadeiro para o Antigo Testamento, que fala de Jesus de um 
modo mais camuflado e simbólico. Os autores humanos do Antigo Testamento nos 
revelaram tudo que lhes era possível revelar, mas eles não podiam, à distância em 
que estavam, ver claramente que forma tomariam os eventos futuros. Só o Espírito 
Santo, autor divino da Bíblia, podia predizer a obra salvífica do Cristo (e assim o 
fez), da primeira página do livro do Gênesis adiante. 
O Novo Testamento, portanto, não aboliu o Antigo. Ao contrário, o Novo cum­
priu o Antigo e, assim o fazendo, levantou o véu que mantinha escondida a face da 
noiva do Senhor. Uma vez removido o véu, vemos de súbito o mundo da.Antiga 
Aliança cheio de esplendor. Água, fogo, nuvens, jardins, árvores, montanhas, pom­
bas, cordeiros - todas essas coisas são detalhes memoráveis na história e na poesia 
do povo de Israel. Mas agora, vistas à luz de Jesus Cristo, são muito mais que isso. 
Para o cristão que sabe ver, a água simboliza o poder salvífico do batismo; o fogo é 
o Espírito Santo; o cordeiro imaculado, o próprio Cristo crucificado; Jerusalém, a 
cidade da glória celestial. 
Essa leitura espiritual da Escritura não é novidade alguma. De fato, logo os pri­
meiros 'cristãos já liam a Bíblia dessa maneira. São Paulo descreve Adão como sendo 
uin "tipo" t}ue prefigurava Jesus Cristo (Rm 5, 14).8 Um "tipo" é algo, ou alguém, ou 
um lugar ou um evento - reais - do Antigo Testamento que prenuncia algo maior 
8 Rm 5,' 14: "Ora, a morte reinou de Adão até Moisés, mesmo sobre aqueles que não haviam pecado, cometendo uma 
trarisgressão igual à de Adão, o qual éfigura daquele que devia vir" (grifo adicionado). As traduções deste trecho {não só as 
brasileiras) preferem o termo figura à palavra tipo, que aparece em algumas traduções inglesas. O termo latino encontrado 
na Vulgata é forma. Aqui, mantém-se o termo tipo pela associação imediara que se fàz com o conceito de tipologia (NE). 
I2 
O evangelho de São Lucas 
do Novo Testamento. É desse termo que vem a palavra "tipologià', referente ao es­
tudo de como o Antigo Testamento prefigura Cristo (CIC 128-130). Em outro tre­
cho, São Paulo retira significados mais profundos da história dos filhos de Abraão, 
declarando: "Isto foi dito em alegorià' (Gl 4, 24).9 Ele não está sugerindo que esses 
eventos distantes nunca aconteceram de fato; ele está dizendo que os eventos não só 
aconteceram mesmo como também significam algo maior ainda por vir. 
O Novo Testamento, depois, descreve o Tabernáculo da antiga Israel como sendo 
a "imitação e sombra das realidades celestes" (Hb 8, 5) e a Lei Mosaica como "uma 
sombra dos bens futuros" (Hb 10, 1). São Pedro, por sua vez, nota que Noé e sua 
família foram "salvos por meio da águà' que, de certo modo, "representavà' o sacra­
mento do Batismo, "que agora salva vocês" (lPd 3, 20-10). É interessante saber que 
a palavra grega que aí foi traduzida para "representavà' é originalmente um termo 
que denota o cumprimento ou contrapartida de um antigo "tipo". 
Não é preciso, no entanto, que busquemos justificar a leitura espiritual da Bíblia 
considerando apenas os discípulos. Afinal de contas, o próprio Jesus lia o Antigo 
Testamento assim. Ele se referia a Jonas (Mt 12, 39), a Salomão (Mt 12, 42), ao 
Templo Oo 2, 19) e à serpente de bronze Oo 3, 14) como "sinais" que apontavam 
para ele mesmo. Vemos no evangelho de Lucas, quando Cristo conversa com os 
discípulos no caminho para Emaús, que "começando por Moisés e continuando por 
todos os Profetas, Jesus explicava para os discípulos todas as passagens da Escritura 
que falavam a respeito dele" (Lc 24, 27). Foi precisamente essa interpretação espiri­
tual do Antigo Testamento que causou um profundo impacto nesses viajantes, antes 
tão desencorajados, e deixou seus corações "ardendo" dentro deles (Lc 24, 32). 
CRITÉRIOS PARA A INTERPRETAÇÃO DA BÍBLIA 
Nós também devemos aprender a discernir o "sentido total" da Escritura e o 
modo como nele estão incluídos o sentido literal e os espirituais. Contudo, isso não 
significa que devemos "exagerar na interpretação", buscando significados na Bíblia 
que não estão de fato nela. A exegese espiritual não é um vôo irrestrito da imagina­
ção. Pelo contrário, é uma ciência sagrada que procede de acordo com certos prin­
cípios e permanece sob a responsabilidade da sagrada tradição, o Magistério, e da 
ampla comunidade de intérpretes bíblicos (tanto os vivos quanto os mortos). 
Na busca do sentido total de um texto, sempre devemos evitar a forte tendência de 
"espiritualizá-lo demais", de modo que a verdade literal da Bíblia seja minimizada ou 
9 GI 4, 24: "Simbolicamente i!;so quer dizer o seguinte: as duas mulheres representam as duas alianças [ ... )" (grifo adicionado). 
No�ente há divergências terminológicas: as traduções ora utilizam o termo simbolicamente, ora o termo alegoria. O termo 
latino encontrado na Vulgata é allegoriam. A tradução brasileira aqui escolhida, especificamente para este caso, é a da Bíblia 
de Jerusalém, São Paulo: Paulus, 2002; assim, mantém-se o termo alegoria no sentido de concordar com a uniformidade 
terminológica do restante da introdução (NE). 
1 3 
Cadernos de estudo bíblico 
até negada.Santo Tomás de Aquino, muito ciente desse problema, asseverou: "Todos 
os sentidos da Sagrada Escritura devem estar fundados no literal" (cf. CIC 116).10 
Por outro lado, jamais devemos confinar o significado de um texto em seu sentido 
literal, indicado pelo seu autor humano, como se o divino Autor não intencionasse 
que aquela passagem fosse lida à luz da vinda do Cristo. 
Felizmente, a Igreja nos deu diretrizes de estudo da Sagrada Escritura. O caráter 
único e a autoria divina da Bíblia nos clamam a lê-la "com o espírito". 11 O Concílio 
Vaticano II delineou de forma prática esse conselho direcionando-nos a ler a Escri­
tura de acordo com três critérios específicos: 
1 . Devemos "prestar muita atenção 'ao conteúdo e à unidade da Escritura inteira" (CIC 1 12) ; 
2. Devemos "ler a Escritura dentro 'da Tradição viva da Igreja inteirà" (CIC 1 1 3) ; 
3 . Devemos "estar atento[s] 'à analogia da fé"' (CIC 1 14; cf. Rm 1 2, 6). 
Esses critérios nos protegem de muitos perigos que iludem alguns leitores da 
Bíblia, do mais novo estudante ao mais prestigiado erudito. Ler a Escritura fora de 
contexto é uma tremenda armadilha, provavelmente a mais difícil de escapar. Num 
desenho animado memorável dos anos 50, um jovem garoto, debruçado sobre as 
páginas da Bíblia, dizia à sua irmã: "Não me perturbe agora; estou tentando achar 
um versículo da Escritura que fundamente meus preconceitos". Não há dúvida de 
que um texto bíblico, privado de seu contexto original, pode ser manipulado a dizer 
algo completamente diferente daquilo que seu autor realmente intencionava. 
Os critérios da Igreja nos guiam justamente porque definem em que consistem 
os "contextos" autênticos de cada passagem bíblica. O primeiro critério dirige-nos 
ao contexto literário de cada verso, no que se inclui não apenas as palavras e pará­
grafos que o compõem e o circundam, mas também todo o corpo de escritos do 
autor bíblico em questão e, ainda, toda a extensão dos escritos da Bíblia. O contexto 
literário completo de qualquer parte da Escritura inclui todo e qualquer texto desde o 
Gênesis até o Apocalipse - já que a Bíblia é um livro unificado, não uma coleção de 
livros separados. Quando a Igreja canonizou o livro do Apocalipse, por exemplo, ela 
reconheceu que ele seria incompreensível se lido separadamente do contexto mais 
amplo de toda a Bíblia. 
O segundo critério posiciona firmemente a Bíblia no contexto de uma comuni­
dade que valoriza sua "tradição vivà'. Tal comunidade é o Povo de Deus através dos 
séculos. Os cristãos viveram sua fé por bem mais que um milênio antes da invenção 
da imprensa. Por séculos, só alguns fiéis possuíam cópias dos evangelhos e, aliás, só 
10 Sto. Tomás de Aquino, Summa Theo/ogica l, l, 10, ad 1. 
1 1 Dei Verbum, 12. 
14 
O evangelho de São Lucas 
poucas pessoas sabiam ler. Ainda assim, eles absorveram o evangelho - através dos 
sermões dos bispos e clérigos, através de oração e meditação, através da arte cristã, 
através das celebrações litúrgicas e através da tradição oral. Essas eram as expressões 
de uma "tradição vivà', de uma cultura de viva fé que se estende da antiga Israel à 
Igreja contemporânea. Para os primeiros cristãos, o evangelho não podia ser enten­
dido à parte dessa tradição. Assim também é conosco. A reverência pela tradição 
da Igreja é o que nos protege de qualquer tipo de provincianismo cultural ou cro­
nológico, como alguns modismos acadêmicos que surgem, arrebatam uma geração 
inteira de intérpretes e logo são rejeitados pela próxima geração. 
O terceiro critério coloca a Escritura dentro do quadro da fé. Se cremos que a 
Escritura é divinamente inspirada, temos de crer também que ela é internamente 
consistente e coerente com todas as doutrinas nas quais os cristãos crêem. É impor­
tante relembrar que os dogmas da Igreja (como o da Presença Real, o do papado, 
o da Imaculada Conceição} não foram adicionados à Escritura; eles são, de fato, a 
interpretação infalível da. Escritura feita pela Igreja. 
USANDO ESTE ESTUDO 
Este estudo foi projetado para conduzir o leitor pela Escritura dentro das di­
retrizes da Igreja - fidelidade ao cânon, à tradição e ao credo. Os princípios in­
terpretativos usados pela Igreja, portanto, é que deram forma unificada às partes 
componentes deste livro, de modo a fazer com que o estudo do leitor seja eficaz e 
recompensador tanto quanto possível. 
Introduções. Nós fizemos uma introdução ao texto bíblico que, na forma de ensaio, 
abarca as questões sobre sua autoria, a data de sua composição, seus objetivos e propó­
sitos originais e seus temas mais recorrentes. Esse conjunto de informações históricas 
ajuda o leitor a compreender e a se aproximar do texto nos seus próprios termos. 
Comentários. Os comentários feitos em toda página ajudam o estudante a ler a Escritu­
ra com conhecimento. De forma alguma eles esgotam os significados do texto sagrado, 
mas sempre providenciam um material informativo básico que auxilia o leitor a encon­
trar o sentido do que lê. Freqüentemente, esses comentários servem para deixar explícito 
aquilo que os escritores sagrados tomavam por implícito. Eles também trazem um gran­
de número de informações históricas, culturais, geográficas e teológicas pertinentes à 
narrativa inspirada - informações que podem ajudar o leitor a suprimir a distância entre 
o mundo bíblico e o seu próprio. 
Notas e refe�cias. Junto do texto bíblico e de seus comentários, em cada página são 
listadas numerosas notas que fazem referência a outras passagens da Escritura relaciona­
das àquela que o leitor está estudando. Essas notas de acompanhamento são essenciais 
Cadernos de estudo bíblico 
para todo e qualquer estudo sério. São também um ótimo meio de se ver como o con­
teúdo da Escritura "se encaixa'' numa unidade providencial. Junto às notas e referências 
bíblicas, os comentários também apontam a determinados parágrafos do Catecismo da 
Igreja Católica (CIC) . Eles não são "provas doutrinais" e sim um auxílio para que a inter­
pretação da Bíblia por parte do estudante esteja de acordo com o pensamento da Igreja. 
Os parágrafos do Catecismo mencionados ou tratam diretamente de algum texto bíblico 
ou tratam, então, de um tema mais amplo da doutrina que lança uma luz essencial ao 
texto bíblico relacionado. 
Ensaios sobre tópicos, Estudos de palavras e Quadros. Esses recursos trazem ao leitor 
um entendimento mais profundo a respeito de determinados detalhes. Os emaios sobre 
tópicos abordam grandes temas no sentido de explicá-los de modo mais minucioso e 
teológico do que o que se usa nos comentários gerais, relacionando-os com freqüência 
às doutrinas da Igreja. Os comentários, inclusive, são ocasionalmente complementados 
de um estudo de palavras que coloca o leitor em contato com as antigas linguagens da 
Escritura. Isso deveria ajudar o estudante a apreciar e a entender melhor a terminologia 
que foi inspirada e que percorre todos os textos sagrados. Também neste livro estão in­
cluídos vários quadros que resumem muitas informações bíblicas "num piscar de olhos" . 
Ícone - Os seguintes ícones, intercalados ao longo dos comentários, correspondem cada 
qual a um dos três critérios de interpretação bíblica promulgados pela Igreja. Pequenas 
bolas pretas ( · ) indicam a que passagem (ou a que passagens) cada ícone se aplica. 
ITI Os comentários marcados pelo ícone do livro relacionam-se ao primeiro critério 
� interpretativo, o do "conteúdo e unidade" da Escritura, a fim de que se torne ex­
plícito o modo como determinada passagem do Antigo Testamento ilumina os· mistérios 
do Novo. Muitas das informações contidas nesses comentários explicam o contexto ori­
ginal das citações e indicam a maneira e o motivo pelo qual aquele trecho tem ligação 
direta com Cristo e com a Igreja. Por esses comentários, o leitor é capaz de desenvolver 
sua sensibilidade à beleza e à unidade do plano salvífico de Deus, que perpassa ainbos os 
Testamentos. 
1111'1 Os comentários marcados pelo ícone da pomba
. 
relacionam-
.se ao segundo critério 
.. interpretativo e examinam as passagens em questão à luz .da "tradição vivà' da 
Igreja. Como o mesmo Espírito Santo foi quem inspirou os sentidos espirituais da Escri­
tura e é quem guia agora o Magistério que a interpreta, as informações contidas nesses 
comentários seguem essas duas vias da interpretação. Por um lado, referem-se aos ensi­
namentos doutrinais da Igreja da maneira como são apresentados por vários papas e 
concílios ecumênicos; por outro lado, eles expõem (e parafraseiam) as intttrpiet�ções 
espirituais de vários Padres Antigos, Doutores da Igreja e santos. 
16 
O evangelho de São Lucas 
l!li1 Os comentários marcados pelo ícone das chaves relacionam-se ao terceiro critério 
� interpretativo, o da "analogia da fé" . Neles é possível decifrar como um mistério 
da fé "desvendà' e explica outro. Esse tipo de comparação entre alguns pontos da fé 
cristã evidencia a coerência e unidade dos dogmas definidos, ou seja, da interpretação 
infalível da Escritura feita pela Igreja. 
COLOCANDO TUDO EM PERSPECTIVA 
Talvez tenhamos deixado por último o mais importante aspecto de todo este 
estudo: a vida interior individual do leitor. O que tiramos ou deixamos de tirar da 
Bíblia depende muito do modo como a abordamos. Se não mantivermos uma vida 
de oração consistente e disciplinada, jamais teremos a reverência, a profunda humil­
dade ou a graça necessária para ver a Escritura como ela de fato é. 
Você está se aproximando da "palavra de Deus". Mas, por milhares de anos - des­
de muito antes de tecer-lhe no ventre de sua mãe -, a Palavra de Deus se aproxima 
de você. 
UMA NOTA FINAL 
O livro que tem nas mãos é apenas uma pequena parte de um trabalho muito 
maior que ainda está em andamento. Guias de estudo como este estão sendo prepa­
rados para todos os livros da Bíblia e serão publicados gradualmente, à medida que 
forem sendo finalizados. Nosso maior objetivo é publicar um grande estudo bíblico 
que, num único volume, inclua o texto completo da Escritura junto de todos os 
comentários, quadros, notas, mapas e os outros recursos encontrados nas páginas 
seguintes. Enquanto isso não acontece, cada livro será publicado individualmente, 
na esperança de que o povo de Deus possa já se beneficiar deste trabalho antes mes­
mo que esteja completo. 
Aqui incluímos ainda uma longa lista de questões de estudo, ao final, para deixar 
este formato o mais útil possível, não apenas para o estudo individual, mas também 
para discussões em grupo. As questões foram projetadas para fazer o estudante tanto 
compreender quanto meditar a Bíblia, aplicando-a à própria vida. Rogamos a Deus 
para que faça bom uso dos seus e dos nossos esforços para renovar a face da terra! 
17 
INTRODUÇÃO AO EVANGELHO DE LUCAS 
AUTORIA 
Os manuscritos primitivos do terceiro evangelho são intitulados "Segundo Lucas" 
(do grego Kata Loukan). Esta rubrica serve como um sinal da tradição apostólica, 
pois os primeiros cristãos atribuíram por unanimidade a obra a Lucas, um médico 
gentio que andava na companhia do apóstolo Paulo (2Tm 4,11; Fm 24). Vários 
Padres da Igreja, como Ireneu (180 d.C.), Tertuliano (200 d.C.) e Clemente de Ale­
xandria (200 d.C.), afirmaram a autoria do terceiro evangelho a Lucas, e uma lista 
anônima de livros do Novo Testamento, chamados de Fragmentos Muratorianos (c. 
170 a.C.), também associam o nome dele. Não há, portanto, razão para duvidar da 
autoria do evangelho de Lucas, uma vez que a tradição é praticamente indiscutível 
no início do cristianismo. 
O próprio Lucas é único entre os autores do Novo Testamento. Primeiro, porque 
ele é o único autor gentio a compor um livro do Novo Testamento. Todos os outros 
eram de origem israelita. Paúlo sugere sua identidade pagã quando enumera "Lucas, 
o querido médico" entre seus companheiros incircuncisos (Cl 4, 14). Ademais, Lucas 
é o único evangelista a escrever uma seqüência. Além deste evangelho, ele escreveu os 
Atos dos Apóstolos como a segunda parte de uma obra de dois volumes. O livro dos 
Atos começa no ponto em que a narrativa do evangelho de Lucas termina, mostrando 
como a atuação do Espírito Santo na vida de Jesus agora opera na comunidade viva 
do corpo místico de Cristo, a Igreja. 
DATA 
Os estudiosos não sabem ao certo quando o evangelho de Lucas foi escrito. Al­
guns defendem uma data do início dos anos 60, enquanto outros preferem uma 
data posterior, nos anos 80. Ao supor a autoria de Lucas, o peso da evidência pende 
para a data mais antiga. Isso se deve, em parte, à estreita ligação entre o evangelho 
de Lucas e à sua seqüência, os Atos dos Apóstolos (At 1,1). 
1 . O livro dos Atos termina abruptamente com a prisão domiciliar de Paulo em Roma 
por volta de 62 d.C., sem qualquer indício quanto ao resultado do seu julgamento ou 
suas atividades subseqüentes. 
2 . Embora nos Atos Lucas muitas vezes nos chame a atenção sobre a relação do cristia­
nismo com o Império Romano, ele não diz nada sobre a perseguição romana aos cristãos 
em meados dos anos 60, nem menciona que Pedro e Paulo - os protagonistas dos Atos 
19 
Cadernos de estudo bíblico 
- foram martirizados nesta época. 
3. Nem o evangelho nem o livro dos Atos nos informa sobre a completa destruição de 
Jerusalém pelo exército romano no ano 70 d.C. 
No seu conjunto, o silêncio de Lucas sobre essas questões importantes é um forte 
indício de que tanto seu evangelho quanto o livro de Atos foram escrito no início 
dos anos 60, antes de qualquer um desses eventos ter se realizado. 
DESTINATÁRIOS 
Lucas dirige seu evangelho a "Teófilo" (1, 3), possivelmente um oficial romano 
que concordou em financiar a publicação da obra. Se é assim, a intenção de Lucas 
pode ter sido que seu evangelho fosse distribuído e lido de forma mais ampla por 
meio do patrocínio de Teófilo. Seu público-alvo provavelmente incluía cristãos gen­
tios em todo o mundo mediterrâneo, bem como israelitas e samaritanos que viviam 
entre eles na Diáspora. Em prol dos leitores gentios, Lucas omite, por vezes, palavras 
semitas, ou simplesmente as substitui por seus equivalentes gregos, para tornar o 
seu enredo mais legível para os crentes não familiarizados com o aramaico. Lucas é 
também muito aprimorado no uso do Antigo Testamento. Embora poucas citações 
diretas apareçam no evangelho, alusões e ecos do Antigo Testamento abundam. Isto 
torna mais provável, então, que Lucas estivesse dirigindo a sua mensagem não só 
para o mundo gentio, mas também para os leitores há muito familiarizados com as 
Escrituras de Israel. 
ESTRUTURA 
O evangelho de Lucas é muito bem escrito e logicamente organizado. Ele nos 
dá um "estudo cuidadoso" (1, 3) de todo o âmbito da vida terrena de Jesus, desde 
o anúncio do seu nascimento até sua ascensão aos céus. A estrutura do evangelho 
é simples e geralmente segue uma linha semelhante a Mateus e Marcos. Depois de 
abrir com um Prólogo clássico (1, 1-4), Lucas começa sua história com a Narrativa 
da Infância (1, 5-2: 52) o nascimento de Jesus e seu precursor, João Batista. Estes 
episódios estão cheios de alegria e esperança de que Jesus vai trazer o cumprimento 
de todas as promessas das Escrituras. A maior parte da seção central do evangelho 
é dedicada à vida pública de Jesus. Após várias Preparações (3, 1-4, 13) para o mi­
nistério, Jesus começa a pregar e ensinar pelo seu Minist�rio Galileu (4, 14 e 9, 50), 
e, em seguida, embarca em uma longa Viagem a jerusalém (9, 51-19, 27), a cidade 
oride o plano redentor de Deus está destinado a se revelar; Finalmente Jesus entra 
na Cidade Santa em uma procissão régia no início das Narrativas da Semana da 
Paixão (19, 28-23, 56). É durante esta semana final e fatal que Jesus é traído, preso e 
crucificado pelos líderes de Jerusalém, em colaboração com as autoridades romanas. 
Finalmente, o evangelho culmina com a Ressurreição e Ascensão (24, 1-53) de Jesus 
como o vencedor do pecado e da morte. 
20 
O evangelho de São Lucas 
TEMÁTICA 
Embora Lucas demonstre interesse em muitas facetas davida e da missão de Je­
sus, o único tema que se eleva acima de todos os outros é a mensagem universal da 
salvação. Pois Lucas enfatiza em todo o seu evangelho que Cristo veio para reunir 
todos os povos e nações na família de Deus. 
1 . A salvação de Israel. Lucas primeiro ancora seu evangelho nas tradições do Antigo 
Testamento, que retrata Jesus como o Salvador do povo de Deus da Antiga Aliança. 
Ele nos mostra, entre outras coisas, que Jesus veio para iniciar a restauração de Israel 
predita pelos profetas (Is 1 1 , 1 0- 1 2; 49, 6; Ez 39, 25-29) . Assim, ele retrata Jesus como 
o Messias real que vem na linhagem e legado do Rei Davi para congregar as tribos 
dispersas de Israel, reunindo-as em seu reino ( 1 , 33, 68, 22, 28-30) . Este tema está 
por trás de inúmeras referências do evangelho a "Israel" ( 1 , 54, 68, 80; 2, 32; 24, 2 1 ) 
e a compreensão positiva que lança sobre o s descendentes dos israelitas do norte, os 
samaritanos ( 1 0, 33; 1 7, 1 6, At 8, 1 4) . 
2. Salvação das Nações. O perdão que Jesus estende a Israel atinge também os gentios, 
fazendo com que a família da Nova Aliança tenha âmbito internacional. Simeão cha­
ma Jesus de "uma luz para iluminar as nações" (2, 32) , enquanto João Batista usa as 
palavras de Isaías para anunciar que "todo homem" pode agora buscar a salvação em 
Cristo (3, 6) . Especialmente as notas finais do evangelho ressoam este tema em que 
Jesus diz aos apóstolos que o perdão deve ser levado de Jerusalém "a todas as nações" 
(24, 47) . 
3 . A salvação dos humildes. A mensagem de Jesus a Israel e às nações é também para os 
exclu�dos, os pobres, e o mal-afamado. Lucas preserva uma série de declarações vigo­
rosas sobre a preocupação de Deus com os humildes e oprimidos ( 1 , 52-53; 4, 1 8 ; 6, 
20-26, 14, 7- 1 1 ) . De modo particular as mulheres são apresentadas favoravelmente ao 
longo deste evangelho, apesar da sua outrora baixa posição social na antiguidade. O 
retrato que Lucas faz da Virgem Maria é simplesmente inigualável no Novo Testamen­
to por sua beleza e sensibilidade ( 1 , 26-56; 2, 1 9 , 5 1 ) . Outras mulheres também de­
sempenham papéis importantes na história: Isabel ( 1 , 39-45) , Ana (2, 36-38) , a viúva 
de Naim (7, 1 1 - 1 7) , a mulher pecadora (7, 36-50) , Maria Madalena (8 , 2) , Joana (8, 
3) , Susana (8, 3 ) , Maria e Marta de Betânia ( 1 0, 38-42) , e a mulher com um espírito 
de enfermidade ( 1 3 , 1 O - 1 7) . As mulheres também figuram nas parábolas de Jesus da 
Moeda Perdida ( 1 5 , 8- 1 0) e do Juiz Injusto ( 1 8, 1 -8) . 
Outras características marcantes incluem contribuições únicas de Lucas à tra­
dição evangélica. Pois apenas Lucas narra as parábolas do Bom Samaritano (1 O, 
25-37) e do Filho Pródigo (15, 11-32). Só Lucas nos fala da Anunciação de Gabriel 
a Maria (1, 26 38), a experiência da infância de Jesus no Templo (2, 41-51), e os 
detalhes de sua ascensão à glória (24, 50-53). E só Lucas conservou alguns dos mais 
belos hinos da Igreja, como o Magnificat de Maria (1, 46-55), o Benedictus de Za-
2 1 
Cadernos de estudo bíblico 
carias (1, 68-79), o Nunc Dimittis de Simeão (2, 29-35), e o Glória cantado pelos 
anjos na noite de Natal (2, 14). 
Não há dúvidas de que Lucas nos legou uma obra-prima artística e espiritual. O 
seu segundo volume, os Atos dos Apóstolos, pode ser considerado da mesma forma. 
Juntos, esses escritos dão testemunho claro e convincente da grandeza de Jesus Cris­
to, que continua a sua missão de salvar o mundo por meio da Igreja. 
22 
ESQUEMA DO EVANGELHO DE LUCAS 
I. Prefácio 
II. Narrativa da Infância (1, 5 - 2, 52) 
1. Anúncio do nascimento de João e Jesus (1, 5-38) 
2. A visitação (1, 39-56) 
3. Nascimento de João Batista (1, 57-80) 
4. Nascimento e apresentação de Jesus (2, 1-40) 
5. Encontro de Jesus no Templo (2, 41-52) 
III. Preparação para o ministério (3, 1 - 4, 13) 
1. Ministério de João Batista (3, 1-20) 
2. Batismo e genealogia de Jesus (3, 21-38) 
3. Tentação de Jesus (4, 1-13) 
lY. Ministério galileu (4, 14 - 9, 50) 
1. Rejeição em Nazaré (4, 14- 30} 
2. Cura aos doentes e o chamado dos discípulos ( 4, 31 - 6, 16) 
3. Sermão da Montanha (6, 17-49) 
4. Jesus como profeta da cura e dos ensinamentos (7, 1 -9, 27) 
5. A Transfiguração (9, 28-36) 
6. Lições sobre fé e humildade (9, 37-50) 
V. Viagem a Jerusalém (9, 51 - 19, 27) 
1. Primeira à segunda referência a Jerusalém (9, 51- 13, 21) 
2. Segunda à terceira referência a Jerusalém (13, 22- 17, 10) 
3. Terceira à quarta referência a Jerusalém (17, 11 - 18, 30) 
4. Quarta à quinta referência a Jerusalém (18, 31 -19, 27) 
VI. Narrativas da Semana da Paixão (19, 28 - 23, 56) 
1. Quando Jesus entra em Jerusalém e ensina (19, 28 - 20, 47) 
2. O Sermão de Jesus no Monte das Oliveiras (21, 1-38) 
3. Celebração da Páscoa (22, 1-38) 
4. Agonia e prisão de Jesus (22, 39-53) 
5. Julgamentos de Jesus (22, 54 - 23, 25) 
6. Crucificação e sepultamento de Jesus (23, 26-56) 
VII. Ressurreição e Ascensão (24,1-53) 
1. O túmulo vazio (24, 1-12) 
2. Aparições após a Ressurreição (24, 13-49) 
3. Ascensão aos céus (24, 50-53) 
O EVANGELHO DE 
,,.,, 
SAO LUCAS 1 Dedicatória a Teófilo .:_ 1Muitas pessoas já tentaram escrever a história dos acontecimentos 
que se passaram entre nós. 2Elas começaram do que nos foi transmitido por aqueles. que, desde 
o princípio, foram testemunhas oculares e ministros da palavra. 3 Assim sendo, após fazer um 
estudo cuidadoso de tudo o que aconteceu desde o princípio, também eu decidi escrever para você 
uma narração bem ordenada, excelentíssimo Teófilo. 4Desse modo, você poderá verificar a solidez dos 
ensinamentos que recebeu. 
1, 2: !Jo l, I; Ac 1, 2 1 ; Hb 2, 3. · 1, 3: At 1 , 1 . 0 l, 4: Jo 20, 3 1 . 
COMENTÁRIOS 
1 , 1-4: Lucas começa com um prólogo e 
uma dedicatória pessoal. Estilisticamente, ele 
segue um formato convencional que foi usado 
como prefácio de obras históricas no mundo 
helenístico. Desse modo, Lucas delimita o 
registro da história não como uma coleção 
obsoleta de fatos e números, mas como uma 
apresentação evangelística da vida e da missão 
de Jesus. 
1, 2: "nos foi transmitido" - Lucas é pro­
vavelmente um cristão da segunda geração. 
Sua obra é em grande parte devida ao relato de 
testemunhas ocu/,ares e ministros do evangelho 
na Igreja primitiva. Três pontos seguem-se dis-
to: ( 1 ) Lucas é um historiador meticuloso que 
examinou fontes relevantes para a obtenção 
de informações precisas; (2) ele transmite não 
opiniões privadas, mas as tradições apostólicas; 
e (3) ele escreve para fortalecer a fé dos cristãos. 
1, 3: "excelentíssimo Teófilo" - Outrora 
desconhecido em fontes antigas. Ele talvez 
seja uma figura ilustre ou alto funcionário do 
governo romano. A designação formal, exce­
lentíssimo, aparece em outros lugares como 
um título honorífico (At 23, 26; 24, 2; 26, 
25) . Uma dedicatória semelhante serve de 
prefácio à segunda obra de Lucas, o livro dos 
Atos (At 1 , 1 ) . 
O anúncio do nascimento de S,ão)oáo Batista - 5No tempo de Herodes, rei da Judéia, .havia um 
sacerdote chamado Zacarias. Era.do grupo. de Abias. Sua esposa se chamava Isabel, e era descendente 
de Aarão. 60s dois eram justos diante de Deus: obedeciam fielmente a todos os mandamentos e ordens 
do Senhor. 7Não tinham filhos, porque Isabel era estéril, e os dois· já eram de itlade avançada. ªCerta 
ocasião, Zacarias fazia o serviço religioso no Templo, pois era a vez do seu grupo realizar as cerimônias. 
9Conforme o costume do serviço sacerdotal, ele foi sorteado para entrar no Santuário, e fazer a oferta 
do incenso. 1ºNa hora do incenso, toda a assembléia do povo escava rezando no lado de fora. 11Então 
apareceu a Zacarias um anjo do Senhor. Estava de pé, à direita do altar do incenso. 12Ao vê-lo, Zacarias 
ficou perturbado e cheio de medo: 13Mas o anjo disse: "Não tenha medo, Zaçarias! Deus oµviu o seu 
pedido, e a sua esposa Isabel vai ter um Filho, e você lhe dará o nome de João. 14Voqê ficará alegre e feliz, 
e inuica gente
.
se alegrarácdm o nascimento do menino, 15porque ele vai ser grande diante do Senhor. 
Ele não beberá vinho; nem·líebida fermentada e, desde o ventre matemo ficará cheio do Espírito Santo. 
Cadernos de estudo bíblico 
16Ele reconduzirá muitos do povo de Israel ao Senhor seu Deus. 17Caminhará à frente deles, com o 
espírito e o poder de Elias, a fim de converter os corações dos pais aos filhos e os rebeldes à sabedoria 
dos justos, preparando para o Senhor um povo bem disposto." 18Então Zacarias perguntou ao anjo: 
"Como vou saber se isso é verdade? Sou veJho, e minha mulher-é de idade avançada". 
190 anjo respondeu: "Eu sou Gabriel. Estou sempre na presença de Deus, e ele me mandou dar esta 
boa notícia para você. 20Eis que você vai ficar mudo, e não poderá falar, até o dia em que essas coisas 
acontecerem, porque você não acreditou nas minhas palavras, que se cumprirão no tempo certo." 210 
povo ficou esperando Zacarias, e estava admirado com a sua demora no Santuário. 
22Quando saiu, não podia falar, e eles compreenderam que ele tinha tido uma visão no Santuário. 
Zacarias falava com sinais, e continuava mudo. 23Depois que terminou seus dias de serviço no 
Santuário, Zacarias voltou para casa. 24Algum tempo depois, sua esposa Isabel ficou grávida, e se 
escondeu durante cinco meses. 25Ela dizia: "Eis o que o Senhor fez por mim, nos dias em que ele se 
dignou tirar-me da humilhação pública!" . 
1, 5 : Mt 2, ! ; 1 Cr 24, 1 0; 2 Cr 31 , 2. • 1, 9 : Ex 30, 7. • 1, 11 : Lc 2, 9; At 5. 1 9. • 1, 13: Lc ! , 30 , 60. 1, 15 : Nm 6, 3; Lc 7, 33. 
1, 17: Mt l i , 14; 17, 13; MI 4, 5 . · 1, 18: Lc !, 34. • 1, 19: Dn 8, 16; 9, 2 1 ; Mt 1 8, 10. · 1, 25: Gn 30, 23; Is 4, 1 . 
1, 5 - 2, 52: A narrativa da infância no 
evangelho de Lucas reconta os nascimentos 
de João Batista e de Jesus. Estilicarnente, ele 
faz uma transição do formato clássico do seu 
prólogo ( 1 , 1 -4) para um estilo bíblico de es­
crita usado no Antigo Testamento grego. Para 
Lucas, o Antigo Testamento é um livro inaca­
bado cujas notas finais ressoam expectativas e 
promessas não cumpridas. Assim, ele tece nu­
merosas alusões ao Antigo Testamento em sua 
narrativa, o que implica que a história contada 
agora por ele é uma continuação da revelação 
bíblica e, na verdade, o seu esperado ápice. 
1, 5: "No tempo de" - Lucas situa a sua 
narrativa no âmbito mais amplo da história do 
mundo (2, 1 -2, 3, 1 -2) . 
"Herodes": Herodes, o Grande, que foi 
nomeado rei da Palestina pelo senado romano 
em 40 a.C. e reinou em Jerusalém a partir de 
37 a.C. até sua morte em 4 ou 1 a.C. Ver co­
mentário em Mt 2, 1 . 
"Zacarias": Um nome hebraico que signi­
fica "Javé se lembrou" . 
"Grupo de Abias": o sacerdócio levítico 
de Israel era composto por 24 grupos de sa-
cerdotes ( 1 Cr 24, 7- 1 9) . Cada grupo servia 
no Templo de Jerusalém duas semanas dife­
rentes a cada ano, e o oitavo grupo era repre­
sentado por Abias na escala sacerdotal. 
"Isabel": A forma grega do nome hebrai­
co que significa "juramento do meu Deus" . 
Por ser filha de Aarão, era levita ( 1 Cr 6, 1 -3) . 
ITI � 1 , 6: "justos diante de Deus" 
IJU .. - Zacarias e Isabel viviam em 
fiel observância à Antiga Aliança (Dt 6,25; Is 
48, 1 8) . Ver o Estudo da Palavra: Justiça em 
Mt 3 . 
• Lucas coloca o casal em uma corrente de 
personagens justas do Antigo Testamento: 
Noé (Gn 6, 9) , Abraão (Gn 1 5 , 6) , Finéias 
(SI 1 06, 30-3 1 ) , Davi (2 Sam 22, 2 1 -25) , e 
outros tinham dado o exemplo de devoção 
semelhante ao Senhor. 
• Místicamente, 12 Zacarias e Isabel represen­
tam o sacerdócio e a Lei da Antiga Aliança. 
Ambos eram justos, corno o sacerdócio era 
santo e a Lei era boa; mas juntos eram inca­
pazes de gerar filhos para Deus ou produzir 
a graça de Cristo. O casal significa, assim, o 
12 São Beda, ln Lucam 
26 
envelhecimento da Antiga Aliança na espera 
das bênçãos da Nova. 
lJJ 1, 7: "estéril" - Era por vezes consi­
derado um sinal da desaprovação de 
Deus (Gn 30, 2) , enquanto que um útero fe­
cundo era visto como uma bênção divina (Dt 
7, 1 4; Sl 1 28, 3-4) . 
• Isabel, juntamente com Sara (Gn 1 1 , 
30), Rebeca (Gn 25 , 2 1 ) , Raquel (Gn 29, 
3 1 ) , a mãe de Sansão Oz 1 3 , 2) , e Ana 
( 1 Sm l , 2) , sofreu a esterilidade até que 
Deus milagrosamente a abençoou com 
um filho. O nascimento de João está, as­
sim, em conformidade com Isaac, Jacó, 
José, Sansão, e Samuel, que eram todos 
representantes da Aliança em Israel. 
1, 9: "Santuário" - O Templo de Jerusa­
lém é muitas vezes o foco do ensino e da ação 
de Jesus em Lucas (2, 27, 37, 46; 4, 9; 1 9, 45; 
20, 1 ; 2 1 ,37; 23, 45 ; 24, 53) . 
1 , 10: "hora do incenso" - Também 
chamada de "hora de oração" (At 3, 1 ) . Os 
sacerdotes queimavam incenso duas vezes por 
dia no templo, nos sacrifícios matutinos e 
vespertinos (Ex 30, 7-8) . A liturgia vespertina 
acontecia perto das três horas enquanto mul­
tidões rezavam no Templo. Como a maioria 
dos sacerdotes recebeu a honra de queimar 
o incenso apenas uma vez na vida, este foi o 
momento culminante do ministério de Za­
carias. Ele iria oferecer orações e incenso no 
segundo aposento mais sagrado do templo, 
o Lugar Santo, e então sair para abençoar o 
povo ( 1 , 2 1 ; Nm 6, 22-27) . Ver comentário 
sobre Lc l , 5 . 
1 , 10: "anjo do Senhor" - Os anjos de­
sempenham papéis importantes na história 
da salvação. (1) Os anjos estão intimamente 
ligados à adoração. Uma vez que o templo era 
O evangelho de São Lucas 
um modelo terrestre do santuário celestial de 
Deus (Hb 8, 1 -5) , os israelitas acreditavam 
que os sacerdotes oficiavam na Terra, assim 
como os anjos no céu (Is 6, 1 -6; Ap 8, 2-6; 
1 5 , 5-8) . O próprio templo foi decorado com 
imagens de anjos, tais como querubins (Ex 
25, 1 8-22; l Rs 6, 23-36) . (2) Os anjos profe­
rem a notícia da concepção e do nascimento, 
como acontece com Ismael (Gn 1 6, 1 1 ) , Isaac 
(Gn 1 8, 1 0) , e de Sansão Oz 1 3 , 3-5) . (3) Os 
anjos aparecem muitas vezes em Lucas ( l , 26; 
2, 9, 1 3; 22, 43, 24, 4) (CIC 332, 336) . 
1 , 13: "não tenha medo" - Palavras de re­
afirmação reminiscentes das visões do Antigo 
Testamento (Gn 1 5 , 1 ; Dn 1 0, 1 2, 1 9) . 
"seu pedido": Zacarias orou não apenas 
pelo povo, mas pelas terríveis circunstâncias 
dele e de sua esposa, já que eram idosos e ain­
da sem filhos. 
"João": um nome hebraico que significa 
"Javé mostrou favor" . 
lJJ 1 , 15: "não beberá vinho, nem bebi­
da fermentada" - Uma alusão a Nm 
6, 3 , que indica que João vai ser consagrado 
ao Senhor como nazireu. Ele, portanto, abs­
ter-se-á de bebidas intoxicantes, de cortar o 
cabelo, e todo o contato com os mortos (Nm 
6, 1 - 1 2) . Em termos práticos, os nazireus vi­
viam uma forma primitiva de vida religiosa 
e eram o equivalente a monges e monjas da 
Antiga Aliança. Eles eram sacerdotes ou lei­
gos, e a consagração do seu serviço podia ser 
temporária ou permanente. 
• A consagração de João lembra a de Sansão 
Oz 13 , 4 7) e Samuel ( 1 Sm 1 , 1 1 ) . Como 
estes nazireus, João terá um papel de destaque 
no plano de Deus para Israel. 
lJJ "cheio do Espírito Santo": Para pre­
parar Israel ao Senhor (Lc l , 1 7) , o 
27 
Cadernos de estudo bíblico 
Senhor em primeiro lugar prepara João com 
sua graça. Ele e a Virgem Maria foram santi­
ficados antes do nascimento (CIC 7 1 7) . Ver 
comentário sobre Lc 1 ,28. 
• A consagração de João lembra o chamado de 
Jeremias desde o ventre de sua mãe Or 1 , 5) . 
se em ambas as extremidades da profecia bí­
blica: tendo predito a vinda do Messias no 
Antigo Testamento, ele agora profere a men� 
sagem da sua chegada em Jesus (Lc 1 , 26-38) 
e em João como o seu precursor { l , 1 3- 1 7) . 
ITI 1 , 25: "humilhação" - Deus remo­
� veu o fardo da frustração de Isabel. 
ITI 1 , 17: "o espírito e o poder de Elias" Embora anteriormente desonrada diante dos 
� - Uma alusão a Ml 3, 1 e 4, 5-6. homens, ela agora é abençoada com uma cri­
• Malaquias anunciou a vinda do Senhor para 
Israel. Os preparativospara sua chegada se­
riam concluídos por um mensageiro como 
Elias, que pregaria o arrependimento, res­
tauraria as tribos de Israel, e trabalharia para 
curar famílias desestruturadas (Eclo 48, 1 1 0; 
Mt 1 1 , 1 3- 1 5 ; CIC 523, 7 1 8-20) . 
"converter" - Uma imagem bíblica para 
arrependimento moral e espiritual. Ver o Es­
tudo da Palavra: Arrependimento em Me l , 4. 
"um povo bem disposto" - Mais tarde, 
Lucas examina o significado do papel de João 
pela ótica de Is 40. Ver comentário sobre Lc 
3, 4-6. 
1, 18: "Como vou saber se isso é ver­
dade?" - Ao contrário de Maria no episódio 
seguinte ( 1 , 45) , Zacarias é prejudicado pela 
dúvida e não recebe a boa notícia com fé. 
Deus determina sua mudez como um sinal 
temporário de disciplina ( 1 ,20) . 
ITI 1 , 19: "Gabriel" - Um nome hebrai­
� co que significa "Deus é poderoso." A 
tradição judaica e cristã o identifica como um 
arcanjo. Como Rafael, ele é um dos sete anjos 
que estão na presença de Deus (Tb 1 2, 1 5 ; Ap 
8 , 2) . 
• No Antigo Testamento, Gabriel interpreta 
visões (Dn 8, 1 5- 1 6) e explica a Daniel acon­
tecimentos que vão acompanhar a vinda do 
Messias (Dn 9, 2 1 -27) . Gabriel, assim, situa-
ança. Ver comentário sobre Lc 1 , 7. 
• Isabel ecoa as palavras exultantes de Raquel, 
que deu à luz José, após anos de esterilidade 
(Gn 30,23) . 
1 , 26: "sexto mês" - Refere-se ao progres­
so da gravidez de Isabel ( 1 , 24, 36) . 
Nazaré: Uma pequena aldeia da Galiléia, 
no norte da Palestina. Para muitos, era uma 
cidade de pouca ou nenhuma importância Qo 
1 , 46) . 
1 , 28: ''Alegre-se" - Ou 
''Ave" . Coroa o tema da ale­
gria e regozijo que pontua a Narrativa da In­
fância no evangelho de Lucas ( 1 , 1 4, 44, 47, 
58; 2, 1 0, 20) . 
• O chamado a alegrar-se ecoa passagens do 
Antigo Testamento que tratam da filha de 
Sião. Nos profetas isso se refere à Mãe Jeru­
salém, cujos filhos fiéis se regozijarão na era 
messiânica, porque Deus escolheu habitar no 
meio deles 01 2, 23-24; Sf 3 , 1 4- 1 7; Zc 9, 
9) . Maria, escolhida para ser a virgem mãe do 
Messias, é saudada com a mesma convocação 
porque ela é a personificação da fidelidade de 
Israel e a destinatária mais privilegiada das 
bênçãos messiânicas de Javé. 
"cheia de graça": Este é o único exemplo 
bíblico em que um anjo se dirige a alguém por 
um título, em vez de um nome pessoal. Duas 
O evangelho de São Lucas 
O anúncio do nascimento de Jesus - 26No sexto mês; o anjo Gabriel foi enviado por Deus a uma 
cidade da Galiléia chamada Nazaré. 27Foi a uma virgem, prometida em casamento a um homem 
chamado José, que era descendente de Davi. E o nome da virgem era Maria. 280 anjo entrou onde 
ela escava, e disse: "Alegre-se, cheia de graça! O Senhor está com você!" 290uvindo isso, Maria ficou 
preocupada, e perguntava a si mesma o que a saudação queria dizer. 300 anjo disse: "Não tenha medo, 
Maria, porque você encontrou graça diante de Deus. 3 1Eis que você vai ficar grávida, terá um filho, e 
dará a ele o nome de Jesus. 32Ele será grande, e será chamado Filho do Aldssirno. E o Senhor dará a ele o 
trono de seu pai Davi, 33e ele reinará para sempre sobre os descendentes de Jacó. E o seu reino não terá 
fim." 34Maria perguntou ao anjo: "Como vai acontecer isso, se não vivo com nenhum homem?" 350 
anjo respondeu: "O Espírito Santo virá sobre você, e o poder do Altíssimo a cobrirá com $ua sombra. 
por isso, o Santo que vai nascer de você será chamado Filho de Deus. 360lhe a sua parenta Isabel: 
apesar da sua velhice, ela concebeu um filho. Aquela que era considerada estéril, já faz seis meses que 
está grávida. 37Para Deus nada é impossível." 38Maria disse: "Eis a escrava do Senhor. Faça-se em mim 
segundo a tua palavrà'. E o anjo a deixou. 
1, 25: Gn 30, 23; Is 4, 1 . • l, 30: Lc 1 . 13 . • l, 31 : Lc 2, 2 1 ; Mr 1 , 2 1 . 1, 33: Mr 28, 1 8 ; 
Dn 2, 44 . • l, 34: Lc 1 , 1 8 . • l, 35 : Mr 1 , 2 0 . • l , 37: Gn 1 8 , 14 . 
considerações ajudam a esclarecer o que isso 
significa. ( 1 ) A expressão "cheia de graça" está 
enraizada na tradição católica e segue o curso 
da tradução de São Jerônimo desse versículo 
na Vulgata Latina. Embora fundamentalmen­
te precisa, falta-lhe um pouco da profundida­
de do original grego. Lucas poderia tê-la des­
crito com as palavras "cheia de graça'' (grego: 
pleres charitos.) como fez com Estevão em At 
6, 8; aqui, no entanto, ele usa uma expressão 
diferente (grego: kecharitomene. ) , que é ainda 
mais reveladora do que a versão tradicional. 
Ela indica que Deus já "agraciou" Maria an­
tes desse momento, fazendo-a um recipiente 
que "foi" e "agora é" cheio da vida divina. (2) 
traduções alternativas como "privilegiada" ou 
"altamente favorecidà' são possíveis, mas in­
suficientes. Por causa do papel inigualável que 
Maria acolhe neste momento decisivo da his­
tória da salvação, a melhor tradução é a mais 
exaltada. Pois Deus dotou Maria com uma 
abundância de graça a fim de prepará-la à vo­
cação da maternidade divina e fazer dela um 
excelente exemplo da santidade cristã (CIC 
490-93, 722) . 
29 
• A declaração de Gabriel indica a Imaculada 
Conceição de Maria. De acordo com a "Jnef 
fabilis Deus" de Papa Pio IX em 1 854, a nar­
rativa da Anunciação no evangelho de Lucas 
é um importante indicador da santidade ao 
longo da vida de Maria. Deus é o seu "Salva­
dor" ( 1 , 47) da maneira mais perfeita possí­
vel: ele santificou Maria na primeira instância 
de sua concepção e a preservou totalmente do 
pecado e até mesmo da inclinação ao pecado 
que nós experimentamos. 
Fra Angelico - A Anunciação • 14 3 7-46 
Museu Nacional de São Marcos, Florença, Itália 
Cadernos de estudo bíblico 
1, 31 : "Jesus" - Um nome hebraico que 
significa "Javé salvà' (CIC 430) . Ver comen­
tário sobre Mt l , 2 1 . 
1 , 32-33: Jesus é o Messias esperado da 
dinastia de Davi (2 Sam 7, 12- 1 6, Sl 89, 26-
29; 1 32, 1 1 ; Is 9, 6-7) . Seguindo o costume 
judaico, a paternidade adotiva de José era 
equivalente à paternidade natural em matéria 
sucessória. José confere, assim, os privilégios 
de um descendente de Davi a Jesus ( 1 , 27) , ao 
passo que Deus Pai unge-o como rei (Me 1 6, 
1 9; CIC 437) . 
ITI 1 , 33: "os descendenteS,de Jacó" -
LJU isto é, o reino de Israel. 
• Desde o século VIII a.C. , as tribos do nor­
te de Israel foram espalhadas entre os gentios 
(2 Rs 1 7, 2 1 -23) , e desde o século VI a.C., 
muitas das tribos do sul de Judá e Benjamin 
tinham também vivido no exílio durante a 
antiguidade (2 Rs 25, 8- 1 1 ) . Os profetas la­
mentaram essa desintegração tribal do povo 
de Deus, mas anunciaram uma futura reu­
nião dos descendentes de Jacó sob o Messi­
as davídico (Is 1 1 , 1 2; Ez 37, 1 5-24; Os 1 , 
1 0- 1 1 ; Am 9 , 9- 1 2) . Jesus, diz Gabriel, é este 
governante davídico ungido que vai voltar a 
reunir as tribos de Israel, juntamente com to­
das as nações, em seu glorioso reino (Mt 28, 
1 8-20; At 1 5 , 1 5 - 1 8; Rrn 1 1 , 25-27) (CCC 
709- 1 0) . Ver comentário sobre Lc 4,43. 
� 1 , 34: "como vai acontecer isso?" -
.. Ou, melhor, "Como vai ser isso . . . ?" . 
Maria não está questionando a capacidade de 
Deus para lhe dar um filho, mas questiona 
como esse plano vai se desdobrar. A pergunta 
dela, diferente da pergunta de Zacarias (Lc l , 
1 8) procede da fé e busca entender a ação de 
Deus, e não duvidar dela. 
"Não vivo com nenhum homem'': O 
anúncio de que Maria iria conceber fez com 
que ela perguntasse como Deus iria aben­
çoá-la com um filho e ainda assim preservar 
sua virgindade. O texto não diz "Eu não vivi 
com nenhum homem", mas "Eu não vivo 
com nenhum homem'' , ou seja, "Eu não te­
nho relações sexuais" . A pergunta de Maria 
expressa sua intenção em manter o estado 
virginal mesmo dentro do matrimônio. Caso 
contrário suas palavras seriam inexplicáveis. 
Pois nada no anúncio do anjo de que teria um 
filho haveria de surpreendê-la a menos que ti­
vesse a intenção de renunciai: às relações sexu­
ais ordinárias até mesmo como uma mulher 
casada. Ver comentáriosobre Mt 1 , 1 8 . 
• De acordo com alguns Padres da Igreja, 
como São Gregório de Nissa e Santo Agosti­
nho, Maria já tinha feito um voto de virgin­
dade por toda a vida. Ver comentários sobre 
Mt l , 25 e 1 2, 46. 
ITI ri,lg 1, 35: "cobrirá com sua som­
LJU rQ bra" - A concepção de Jesus 
no ventre de Maria será totalmente sobrena­
tural, ou seja, o resultado da obra criadora de 
Deus no seu interior (Mt 1 , 1 8-25; CIC 497, 
723) . 
• A expressão usada pelo anjo é a mesma utili­
zada na versão grega do Ex 40,35 para descrever 
como o Senhor "cobriu com sua sombra'' o Ta­
bernáculo, fazendo dele sua morada em Israel. 
• Gabriel menciona o Espírito Santo, o Altíssi­
mo, e o Filho de Deus, oferecendo a Maria um 
vislumbre da Trindade. 
ITI 1, 37: "nada é impossível" - A reafir­
LJU mação de Gabriel ilumina a totalida­
de de Lc 1 . Ele insiste que Deus pode superar 
todos os obstáculos à maternidade, incluindo 
a infertilidade de Isabel e a virgindade de Ma­
ria (CIC 269, 273) . 
3 0 
O evangelho de São Lucas 
Maria visita Isabel; o clntico de louvor de Maria - 39Naqueles dias, Maria partiu para a região 
montanhosa, dirigindo-se, às pressas, a uma cidade da Judéia. 40Entrou na casa de Zacarias, e saudou 
Isabel. 41Quando Isabel ouviu a saudação de Maria, a criança se agitou no seu ventre, e Isabel ficou cheia 
do Espírito Santo. 42Com um grande grito exclamou: "Você é bendita entre as mulheres, e é bendito 
o fruto do seu ventre! 43Como posso merecer que a mãe do meu Senhor venha me visitar? 44Logo que 
a sua .saudação chegou aos meus ouvidos, a criança saltou de alegria no meu ventre. 45Bem-aventurada 
aquela que acreditou, porque vai acontecer o que o Senhor lhe prometeu." 46Entáo Maria disse: "Minha 
alma proclama a grandeza do Senhor, 47meu espírito se alegra em Deus, meu salvador, 48porque olhou 
para a humilhação de sua serva. Doravante todas as gerações me felicitarão, 49porque o Todo-poderoso 
realizou grandes obras em meu favor: seu nome é santo, 50e sua misericórdia chega aos que o temem, 
de geração em geração. 5 1Ele realiza proezas com seu braço: dispersa os soberbos de coração, 52derruba 
do trono os poderosos e eleva os humildes; 53aos famintos enche de bens, e despede os ricos de mãos 
vazias. 54Socorre Israel, seu servo, lembrando-se de sua misericórdia, 55conforme prometera aos nossos 
pais - em favor de Abraão e de sua descendência, para sempre". 56Maria ficou três meses com Isabel; e 
depois voltou para casa. 
1, 42: Lc 1 1 . 27-28. • l, 46-55: 1 Sam 2,1-10. • 1, 47: 1Trn 2, 3; Tt 2,IO; Ju 25. • l, 55: Mie ?, 20; Gn 17,7; 18 , 18; 22, 17. 
• A declaração carrega conotações do Anti­
go Testamento, especialmente Gn 1 8 , 14 e 
Jr 32, 17 . 
1 , 38: "faça-se em mim" - Maria livre 
e ativamente abraça o convite de Deus para 
carregar o Messias no seu ventre. A expressão 
grega denota mais que a mera aceitação pas­
siva, indica que ela quer ou deseja realizar a 
vontade de Deus em sua vida. Ao contrário 
de Zacarias, ela acolhe as palavras do anjo sem 
a restrição da dúvida (CIC 148, 494, 26 17). 
Ver comentário sobre Lc l , 1 8. 
lJJ 1, 41: "agitou no seu ventre" - A ex­
periência de Isabel é semelhante a de 
Rebeca em Gn 25. 
• Tanto Lucas como o Antigo Testamento gre­
go usam o mesmo verbo (grego: skirtao) para 
descrever infantes que pulam ou se agitam no 
útero. Como a experiência de Rebeca sinalizou 
a preeminência de Jacó sobre seu irmão mais 
velho Esaú (Gn 25, 22-23) , assim a experiência 
análoga de Isabel era um sinal de que Jesus seria 
maior que o seu primo mais velho João (3, 1 6; 
Jo 3, 27 -30) 
IT1 1 , 42: "você é bendita" - Isabel aben­
� çoa Maria com palavras outrora ditas 
a Jael e Judite no Antigo Testamento Oz 5, 
24-27; Jud 1 3, 1 8). 
• Essas mulheres foram abençoadas por sua fé 
heróica e sua coragem de repelir exércitos ini­
migos hostis a Israel. A vitória foi assegurada 
quando Jael e Judite assassinaram os coman­
dantes militares com um golpe mortal na cabe­
ça. Maria vai seguir os seus passos, mas, no caso 
dela, tanto o inimigo destruído como a vitória 
obtida será maior, pois ela dará à luz o Salvador 
que esmaga sob os pés a cabeça do pecado, da 
morte e do diabo (Gn 3, 1 5 ; 1 Jo 3, 8; CIC 
64, 489) . 
� 1 , 43: "mãe do meu Senhor" - Este 
.. título revela os mistérios duplos da di­
vindade de Jesus e da maternidade divina de 
Maria (CIC 449, 495). Nota-se que todas as 
ocorrências da palavra Senhor no contexto 
imediato ( 1 , 45) e adjacente se refere a Deus 
( 1 , 28, 32, 38, 46, 58, 68). 
• A Maternidade divina de Maria foi o primeiro 
dogma mariano anunciado pela Igreja. O Con­
cílio Ecumênico de Éfeso (43 1 d.C.) definiu a 
Cadernos de estudo bíblico 
O nascimento de São João Batista - 57Terminou para Isabel o tempo de gravidez, e ela de� à luz um filho. 
580s vizinhos e parentes ouviram dizer como o Senhor tinha sido bom para Isabel, e se alegraram com ela. 
59No oitavo diá, foram circuncidar o menino, e queriam dar-lhe o nome de seu pai, Zacarias. 60 A mãe, po­
rém, disse: "Não! Ele vai se chamar João." 610s outros disseram: "Você não tem nenhum parente com esse 
nome!" 62Entáo fizeram sinais ao pai, perguntando como ele queria que o menino se chamasse. 63Zacarias 
pediu uma rabuinha, e escreveu: "O· nome dele é João." E todos ficaram admirados. 64No mesmo instante, 
a boca de Zacarias se abriu, sua língua se soltou, e ele começou a louvar a Deus. 65Todos os vizinhos ficaram 
com medo, e a notícia se espalhou por toda a região montanhosa da Judéia. 66E todos os que ouviam a 
notícia, ficavam pensando: "O que será que esse menino vai ser?" De fato, a mão do Senhor estava com ele. 
l, 59: Lv 12, 3; Gn 17, 12. · 1, 63: Lc 1 , 1 3. 
singular relação de Maria com Cristo e hon­
rou-a com o órulo de "Mãe de Deus" (grego: 
Theotokos) . Isso foi reafirmado em 1 964 no 
Concílio Vaticano II. 1 3 
ITI 1 , 46-55: O Magnificat {latim para 
LJU "engrandece") é um hino de louvor e 
um recital de fidelidade à Aliança de Deus. 
Maria exalta a humildade ( 1 , 48) e se alegra 
com as bênçãos de Deus sobre os humildes 
( 1 , 47, 52-53) . A canção também introduz o 
tema da "misericórdià' de Deus ( 1 , 50, 54) , 
que transborda no episódio seguinte ( 1 , 58, 
72, 78; CIC 2097, 26 1 9) . 
• O Magnificat é imbuído de temas e imagens 
do Antigo Testamento. Ele se assemelha a Can-
1 3 Lumen Gentium, 53 
çáo de Ana em 1 Sm 2, 1 - 1 0, enquanto outras 
passagens esclarecem os acontecimentos (SI 89, 
1 0, 1 3; 98, 3; 1 1 1 , 9; Eclo 33, 1 2; Hab 3, 1 8) . 
1, 59: "circuncidar" - Pais judeus costu­
mam dar nome a seus filhos do sexo mascu­
lino no dia de sua circuncisão, o oitavo dia 
após o nascimento (2, 2 1 ) . Estes eram acon­
tecimentos de grande importância, que sina­
lizavam o início da participação da criança na 
Aliança em Israel (Gn 1 7, 9- 1 4; Lv 12 , 3) . 
1 , 64: "sua língua se soltou" - Após nove 
meses de silêncio, Zacarias experimenta uma 
dramática recuperação ( 1 , 20) . Ele não tem 
mais dúvidas, mas aceita com alegria a chega­
da da criança ( 1 , 68-79) . 
1 , 68-79: O Benedictus (Latim para "ben-
A Profecia de Zacarias - 670 pai Zacarias cheio �o Espírito Santo, profetiwu dizendo: .68"Ben_diéo seja o 
Senhor, Deus de Israel, porque visitou e redimiu o seu povo. 69Fez aparecer uma força de salvação na casa de 
Davi, seu servo; 70conforme tinha anunciado 'desde outrora pela boca de seus santos profetas. 71É a salvação 
que nos livra de nossos inimigos e da mão de todos os que nos odeiam. 72El� realizou a misericórdia que teve 
com nossos pais, recordando sua sanra aliança, 73e p juramento que fez ao nosso pai Abraão. 74Para conceder­
nos que, livres do medo e arrancados das mãos dos inimigos, 75nós o sirvamos com santidade e justiça, em 
sua presença, todos os nossos dias. 76E a você, menino, chamarão profeta do Altíssimo, porque irá à frente do 
Senhor; para preparar-lhe os caminhos, 77 anunciando ao seu povo a salvação, o perdão dos pecados. 78Graças 
ao misericordioso coraçãodo nosso Deus, o sol que nasce do alto nos visitará, 79para iluminar os que vivem 
nas trevas e na sombra da morte; para guiar nossos passos no caminho da paz". 800 menino ia crescencl,o, e 
ficando forte de espírito. João viveu. no desJ::rto,. até o dia em que se manifesto� a Israel. 
l, 76: Lc 7, 26; MI 4, 5. • l, 77: Me 1 , 4. • l, 78: MI 4, 2: Ef5, 14. • l, 79: ls 9, 2; Mc 4, 16. • 1, 80: Lc 2, 40; 2, 52. 
dito") louva a Deus por sua fidelidade a Israel 
e sua orquestração cuidadosa da história da 
salvação. No ponto culminante desse plano 
está Jesus, cuja vinda cumpre os juramentos 
da aliança de Deus ( 1 ) para estabelecer o tro­
no de Davi para sempre (2 Sm 7, 1 2- 1 6; SI 
89, 1 -4, 26-37) , e (2) para abençoar todas 
as nações através da descendência de Abraão 
(Gn 22, 16- 1 8; CIC 422, 706) . 
1 , 69: "uma força" - Um símbolo da for­
ça (Sl 18 , 2; Eclo 47, 1 1 ; Mq 4, 1 3) . Zacarias 
o aplica a Jesus como o Ungido do Senhor (SI 
1 32, 1 7; cf. Ez 29, 2 1 ) . Ver comentário sobre 
Lc 1 , 32-33. 
1, 72: "recordando sua santa aliança" -
O juramento da aliança de Deus com Abraão 
(Gn 22, 1 6- 1 8) se aproxima do seu cumpri­
mento no papel preparatório dos pais de João. 
Até mesmo seus nomes simbolizam que Deus 
se lembra (Zacarias) do seu juramento (Isabel) 
e irá cumpri-lo em breve através da missão de 
João e Jesus. Ver comentário sobre Lc 1 , 5 . 
1, 76: "profeta do Altíssimo" - A voca­
ção de João está intimamente ligada a Jesus, 
mas seus títulos os distinguem: João é o pro­
feta do Altíssimo, ao passo que Jesus é o Filho 
do Altíssimo ( 1 , 32) . ltl 1, 78: "o sol" - Também traduzido 
como "a aurorà', ou simplesmente "o 
" nascente . 
• À luz do Amigo Testamento, as palavras 
de Zacarias podem ser vistas de diferentes 
ângulos. ( 1 ) O "nascente" é usado para des­
crever idiomaticamente o nascer do sol ao 
amanhecer ou as estrelas à noite. Vários tex­
tos recorrem a essa noção para descrever o 
Messias como uma luz ou estrela (Nm 24, 
1 7; ls 9 , 2 ; MI 4 , 2) . (2) O "nascente" tam­
bém se vincula com Jr 23, 5 e Zc 3, 8; 6, 1 2 
3 3 
O evangelho de São Lucas 
do Antigo Testamento grego. Nesses textos, 
a mesma expressão descreve o Messias como 
um ramo que surge ou brota da linhagem 
real de Davi . Uma vez que Zacarias mencio­
na Davi ( 1 , 69) e a luz do Messias ( 1 , 79) 
neste contexto, ambas as conotações são 
possíveis. Ver comentário sobre Mt 2, 23. 
ESTUDO DA PALAVRA: RECEBEU 1 1 (MT 3 , 15) 
Katecheo (grego): significa "instruir" ou "ensi­
nar oralmente", e é base da palavra "catequese" 
na língua ponuguesa. O verbo é usado oito ve­
zes no Novo Testamento. Ele é freqüentemente 
associado com a transmissão primitiva do evan­
gelho, quando os apóstolos e seus companheiros 
instruíam os crentes verbalmente. Lucas escreve 
o seu evangelho a um ceno Teófilo, que já havia 
sido catequizado desse modo, a fim de confirmar 
e aprofundar sua compreensão da vida e dos ensi­
namentos de Jesus (Lc 1, 4). Apolo também havia 
aprendido os rudimentos da doutrina cristã por 
instrução oral (Ar 18,25). Paulo emprega esse ter­
mo anos antes, quando incentiva os jovens cris­
tãos a apoiar financeiramente os seus catequistas 
locais (Gl 6, 6), e quando salienta que o ensino 
inteligível na fé é mais proveitoso para o povo de 
Deus do que o discurso ininteligível das línguas 
carismáticas (lCor 14, 19). 
14 A versão em inglês traduz Katecheo como informed, 
enquanto que a versão em português usa a palavra 
"recebeu" . Ambas se referem aos ensinamentos que 
foram transmitidos - NT. 
Cadernos de estudo bíblico 
MAPA: O REINO OE HERODES NO NASCIMENTO OE JESUS 
3 4 
O evangelho de São Lucas 
ENSAI O S OB RE UM TÓPICO: MARIA, A ARCA DA ALIANÇA 
O evangelho de Lucas nos diz mais sobre a Mãe de Jesus que qualquer outro livro do Novo Testamento. A maior parte da informação está condensada nos primeiros dois capítulos, em que Lucas encadeia algu­
mas das mais belas tradições que temos sobre a vida e missão de Maria. Quanto 
mais profundo mergulhamos na narrativa de Lucas, mais apreciamos o modo 
que Lucas nos conta a história de Maria. Um exemplo disso encontra-se na his­
tória da Visitação. Num ponto, ele nos conta sobre um exultante encontro entre 
duas grávidas; num outro, recorda histórias memoráveis contadas no Antigo 
Testamento sobre a Arca da Aliança. Ao aludir a essas tradições primitivas, Lu­
cas expande consideravelmente a visão do leitor atento. Ele nos leva a ver Maria 
como a Arca da Nova Aliança de Deus e sugere que a Sagrada Arca da Antiga 
Aliança meramente prefigura uma Arca ainda mais maravilhosa que há de vir: a 
Mãe do divino Messias. 
Uma tradição que Lucas se baseia está em 2 Sm. Ele intencionalmente apon­
ta a semelhança sutil, mas significante, entre a Visitação de Maria a Isabel, e os 
esforços de Davi para trazer a Arca da Aliança a Jerusalém, narrado em 2 Sm 6. 
Quando Lucas nos diz que Maria "dirigiu-se às pressas" para a região monta­
nhosa da Judéia para visitar sua parenta (Lc 1 , 39) , ele nos recorda como Davi 
"dirigiu-se às pressas" para a mesma região séculos antes a fim de transportar a 
Arca (2 Sm 6, 2) . Com a chegada de Maria, Isabel é tocada pelo mesmo sen­
timento de reverência e indignidade perante Maria (Lc 1 , 43) que Davi sentiu 
diante da Arca da Aliança (2 Sam 6, 9) . A semelhança continua quando o júbilo 
em torno desse grande encontro faz com que o infante João se agite de alegria 
no ventre (Lc l , 41) , assim como Davi dançou rejubilante perante a Arca (2 
Sm 6, 1 6) . Finalmente, Lucas acrescenta que Maria ficou na "casa de Zacarias" 
por "três meses" (Lc 1 , 40, 56) , recordando que a Arca da Aliança permaneceu 
temporariamente na "casa de Obed-Edom'' por um período de "três meses" (2 
Sam 6, 1 1) . Tomadas em conjunto, essas semelhanças nos mostram que Maria 
agora assume um papel na história da salvação que foi outrora dese�penhado 
pela Arca da Aliança. Como esse baú de ouro, ela é l!m vaso sagrado onde a 
presença do Senhor habita intimamente com o seu povo. 
Lucas também se baseia em uma segunda tradição do Livro das Crônicas. 
Dessa vez ele leva para sua história uma expressão altamente significativa ou­
trora ligada à Arca. O termo aparece em Lc l , 42 quando ISabel solta um grito 
exultante à chegada de Maria e seu Filho. Embora o verbo grego traduzido como 
"exclamou'' pareça suficientemente habitual, quase nunca é usado na bíblia. De 
fato, de todo o Novo Testamento, é encontrado apenas aqui. Sua presença no 
3 5 
Cadernos de estudo bíblico 
Antigo Testamento grego também é esparsa; aparece apenas cinco vezes . Por que 
isso é importante? Porque toda vez que essa expressão é usada no Antigo Testa­
mento, constitui parte das histórias em torno da Arca da Aliança. Em particular, 
refere-se aos sons melódicos produzidos por cantores e músicos levíticos quando 
glorificam o Senhor com o cântico. Isso descreve, portanto, a voz "exultante" 
dos instrumentos que foram tocados perante a Arca quando Davi a carregou em 
procissão para Jerusalém (1 Cr 1\ 28; 1 6, 4-5) e quando Salomão transferiu a 
Arca para sua morada definitiva no Templo (2 Cr. 5 , 1 3) . Referindo-se a esses 
episódios, Lucas vincula a mesma expressão com o grito melódico de outro des­
cendente levita, a anciã Isabel (Lc l , 5) . Ela também ergue sua voz em louvor 
litúrgico, não perante um baú de ouro, mas perante Maria. A marcante familia­
ridade de Lucas com essas histórias primitivas o permite eleger até mesmo uma 
única palavra para sussurrar aos seus leitores que essa jovem Mãe do Messias é a 
nova Arca da Aliança. 
Ao leitor que possui olhos para ver e ouvidos para ouvir, Lucas concedeu 
uma visão da Virgem Maria que se torna ainda mais gloriosa à medida que 
nos aprofundemos nas Escrituras. Nossa habilidade em ver Maria como ele viu 
depende em parte do nosso conhecimento do Antigo Testamento e em parte 
da nossa sensibilidade ao engenhoso uso que Lucas faz dele. Ao escolher suas 
palavras

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