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A RENDA DA TERRA E A CONFORMAÇÃO DO ESPAÇO URBANO: O CASO DE VITÓRIA ES

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Geografias, Políticas Públicas e Dinâmicas Territoriais 
De 07 a 10 de outubro de 2013 
 
 
A RENDA DA TERRA E A CONFORMAÇÃO DO ESPAÇO URBANO: O CASO DE 
VITÓRIA – ES 
CLÁUDIO LUIZ ZANOTELLI1 
FRANCISMAR CUNHA FERREIRA2 
1- Introdução 
O presente trabalho é fruto de uma pesquisa maior que busca verificar a expansão 
das fronteiras urbanas a partir da extração de renda da terra, sendo a Região Metropolitana 
da Grande Vitória (RMGV) nosso laboratório. Neste artigo, procuramos analisar em 
especifico a capital do Espírito Santo: Vitória. Objetivamos compreender as relações entre 
alguns agentes produtores do espaço urbano e a organização espacial do município. Para 
isso, procuramos verificar as estratégias de extração da renda da terra pelos proprietários 
fundiários, promotores imobiliários e prefeitura municipal, pois, consideramos que a renda 
da terra é consequência do controle da propriedade fundiária e imobiliária nas áreas centrais 
e nos vazios urbanos. 
Neste sentido, procuramos entender os mecanismos de extração da renda da terra 
por meio de análises sobre a localização, a quantidade e as dimensões dos “vazios” (vazios 
plenos de sentido e de concretude, ou seja, espaços com proprietários que não estão 
“livres”, à disposição, pois são controlados e, portanto, mesmo que não construídos são uma 
cristalização da forma jurídica da propriedade) urbanos, número de unidades imobiliárias 
lançadas nos últimos anos, valor médio do metro quadrado de imóveis e, finalmente, uma 
análise da localização e da quantidade de domicílios vagos em contraponto com o déficit 
habitacional do município. Estas análises permitem explicitar como que a expansão do 
espaço urbanizado capitalista promove a segregação e a fragmentação sócio-espacial. 
A metodologia utilizada consistiu inicialmente, numa revisão bibliográfica sobre a 
renda da terra. Em seguida, mapeamos os “vazios” urbanos de Vitória, em particular as 
áreas superiores a 10.000 m², com o intuito de verificar a concentração e o controle da 
propriedade fundiária a partir dos dados disponibilizados pela Prefeitura Municipal de Vitória 
(PMV). Por sua vez, os estudos inerentes à produção imobiliária de Vitória (quantidade de 
unidades, localização e preço médio do m²) se realizaram a partir dos dados dos censos 
imobiliários (2005/2012) do Sindicato da Indústria da Construção Civil do Espírito Santo 
 
1
 Professor do Departamento e do Programa de Pós-Graduação em Geografia – UFES 
clzanotelli@yahoo.com.br. 
2
 Mestrando em Geografia – UFES - francismar.cunha@gmail.com 
mailto:clzanotelli@yahoo.com.br
mailto:francismar.cunha@gmail.com
 
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(SINDUSCON-ES). Em relação às análises dos preços médios de m², a pesquisa não se 
restringiu unicamente ao SINDUSCON-ES, pois os valores apresentados pela instituição 
são restritos a um setor imobiliário ligado a empresas associadas ao sindicado. Para suprir 
estes limites, foi realizado um levantamento de preço de imóveis a partir dos cadernos 
imobiliários semanais dos dois principais jornais do Espírito Santo (A Tribuna e A Gazeta) 
entre os dias 23 de Janeiro a 28 de Março de 2013. Nestes anúncios os imóveis têm 
diferentes características e localizações variadas, indo desde lançamentos até imóveis mais 
antigos. 
2 - Aspectos teóricos sobre a renda da terra 
A renda da terra é uma categoria de análise muito debatida e ao mesmo tempo 
polissêmica e muitas vezes de difícil aplicação. As pesquisas de renda da terra urbana 
revelam inúmeras dificuldades que são tanto de ordem teórico-metodologica quanto 
práticas. Dificuldades inerentes à obtenção de dados sobre localização, dimensão, valor e 
proprietários de uma determinada propriedade são comuns. 
Estas dificuldades refletem as intensas e complexas disputas travadas ao redor da 
propriedade privada da terra e das características que a terra e a propriedade fundiária 
apresentam no contexto capitalista. Diferentemente de outras mercadorias a terra não é 
produzida pelo trabalho humano. A terra se encontra em cada espaço de modo singular, ela 
é indispensável a todos, pois necessitamos de um espaço para re-produzir. A terra se 
apresenta, por outro lado, como um ativo de significativo valor, e, simultaneamente, de 
disputa por seu uso e possessão. Os instrumentos jurídicos fundados nas relações de força 
que se instauram na sociedade contemporânea por intermédio do Estado garantem para 
poucos o monopólio e o controle da propriedade fundiária, assegurando, deste modo, a 
renda da terra. Dito com outras palavras, em nome e em busca da renda da terra, parte da 
sociedade (os proprietários fundiários), exige das outras categorias sociais um tributo pelo 
direito de habitar a terra (MARX, 1988). 
A propriedade fundiária, segundo Marx (1988), pressupõe que certas pessoas têm o 
direito de dispor de determinadas partes do globo terrestre como esferas exclusivas de sua 
vontade privada. Esse monopólio é definido pelo poder jurídico que permite que 
determinadas pessoas usem ou não, partes do globo. O poder jurídico em nada contribui 
para a valorização da propriedade, ele apenas permite que o proprietário proceda com a 
propriedade fundiária assim como qualquer mercadoria (MARX 1988). A valorização 
propriamente dita da propriedade segundo Marx (1988) está associada ao capital fixado na 
terra, o terra-capital. 
 
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O proprietário fundiário dos chamados “vazios” urbanos - comumente são áreas 
“vazias” ou subutilizadas que podem ser encontradas em localizações centrais ou periféricas 
- se apropria tanto do capital privado quanto do capital público investido em uma 
determinada localidade em um determinado momento do processo de produção. Assim, o 
terra-capital ou capital fixo, conforme Marx (1988), são as construções de caráter mais 
estável e permanente, como estradas, pontes e edifícios, que tendem a valorizar as terras 
nos espaços urbanos. As terras que não são ocupadas com construções ou alguma 
atividade são, de maneira geral, nos perímetros urbanos, espaços de reserva de valor. Elas 
são, muitas vezes, “brindadas” por todo o capital fixo investido em uma determinada 
localidade, e, consequentemente, como acidente inseparável da substância solo, o lucro do 
proprietário fundiário será maior, pois agora, o proprietário não vende apenas a terra, mas a 
terra melhorada via capital incorporado a ela e que não lhe custou nada. A figura do 
proprietário fundiário acaba se particularizando neste contexto, pela sua característica 
parasitária e sua capacidade de se apropriar do desenvolvimento do trabalho social. 
Grosso modo, a renda da terra é a forma econômica em que a propriedades fundiária 
se realiza (MARX 1988)3. Botelho (2008) a partir da concepção marxista aponta que a renda 
fundiária se apresenta como sendo uma parcela do excedente global produzido pela classe 
trabalhadora e que é apropriado pelos proprietários fundiários, devido ao monopólio que 
praticam sobre a propriedade da terra. Tal processo permite verificar uma dissociação entre 
terra e trabalho, pois demonstra que os proprietários se apropriam da renda pela condição 
de monopólio, sem de fato ter necessitado participar do processo de produção (CARLOS, 
2011). Em linhas gerais, a renda seria uma espécie de “pedágio” que é pago ao proprietário 
fundiário para disponibilizar a terra – um meio de produção; a outros agentes. 
Uma vez subordinada à lógica capitalista, a terra se apresenta como sendo uma 
mercadoria, pois é monopolizável, e, ainda, por ser valor de uso, exprimindo-se como meio 
de existência, e também valor de troca, pois é valor de uso para outros quenão a possuem. 
Neste sentido, o acesso a terra acaba sendo seletivo, o que consequentemente determina 
relativamente o uso do solo de um lugar. Logo, pensar o uso do solo e a organização do 
espaço urbano, remete a verificar como que a busca pela renda da terra se torna central no 
momento da colisão entre valor de uso e valor de troca que transformam o solo e as 
benfeitorias em mercadorias (HARVEY, 1980). 
 
3
 Marx (1988) apresenta em sua obra que a renda da terra se manifesta de diferentes de espécies no 
modo de produção capitalista: a renda de absoluta, a renda diferencial (I e II) e finalmente a renda de 
monopólio. Elas estão em linhas gerais, relacionadas e caracterizadas conforme os contextos 
espaciais, econômicos e temporais específicos de uma economia de marcado competitivo. 
 
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Para se construir um determinado imóvel, em muitas ocasiões, os promotores 
imobiliários necessitam de recorrer a novas áreas. Entretanto, o monopólio da terra num 
primeiro instante pode se apresentar como sendo uma barreira para o investimento 
imobiliário. O promotor imobiliário se inscreve em um meio competitivo, ele necessita 
continuar reinvestindo seu capital devido às “leis coercitivas da concorrência” (HARVEY, 
2011), logo, ele deve estar preparado para pagar uma taxa ao proprietário fundiário (renda) 
para garantir o preço de sua perpetuação. É exatamente neste ponto que se verifica uma 
das facetas da influência da renda da terra no solo urbano, pois, o preço do terreno pago 
pelo promotor imobiliário, vai aparecer no preço dos imóveis e aluguéis. Ele, o preço do 
terreno, será a parte do sobrelucro dos capitais que não pode ser reproduzida, mas que será 
monopolizada pelo proprietário da terra (TOPALOV, 1979 apud BOTELHO, 2008). 
Entretanto, essa barreira imposta pela renda da terra ao acesso à propriedade, pode 
ser superada quando o proprietário fundiário e o promotor imobiliário representam as duas 
faces de um mesmo agente. Neste sentido, a renda da terra deixa de ser uma barreira ao 
promotor imobiliário, e se manifesta no momento da venda ou aluguel dos imóveis. 
Além da valorização realizada por influência do capital fixo (produção social da 
localização) e do trabalho não pago, a renda da terra também pode ser aumentada por meio 
de associações ocasionais de diferentes elementos: a especulação imobiliária sobre os 
imóveis construídos e sobre os vazios urbanos; uma crescente demanda por moradia em 
função do aumento da população; existência de um preço de monopólio que está associado 
à avidez do comprador em comprar e pagar um determinado preço definido individualmente 
que independe, parcialmente, do processo geral de produção; e, finalmente, o Estado que 
interfere nas rendas fundiárias através de ações e regulamentações do uso do solo por meio 
de leis de zoneamento, elaboração de políticas de financiamentos imobiliários para 
construção e compra de imóveis, oferta de equipamentos urbanos e etc. 
Em síntese, a renda da terra adquirida a partir do monopólio da propriedade se 
apresenta como sendo parte da mais–valia gerada pelo capital que recai sobre o proprietário 
fundiário ou proprietário do bem imóvel (MARX, 1988), que a partir de sua posição 
parasitaria se apropria do trabalho social. Em contrapartida, e de maneira contraditória, a 
renda e a propriedade da terra, se apresentam, ao mesmo tempo, como sendo um 
obstáculo à livre circulação do capital e, também, como uma das condições para a 
reprodução das relações de produção capitalista (BOTELHO 2008). Esses processos se 
manifestam no urbano por meio de uma expansão permanente dos espaços urbanizáveis 
com fins especulativos, provocando, paradoxalmente, uma cidade em permanente expansão 
 
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horizontal e vertical e a criação de um superávit habitacional, sintoma de uma febre aguda 
de construção especulativa. 
3 - A renda da terra e o espaço urbano de Vitória 
O município de Vitória capital do estado do Espírito Santo possui uma área de 
aproximadamente 86,33 km² e uma população de 327.801 habitantes (IBGE, 2010) que se 
encontra distribuída em 83 bairros. Em torno de 25,45% (21,96 km²) da superfície do 
município é composta de Áreas de Proteção Ambiental, Estações Ecológicas, Parques e etc. 
A área efetivamente ocupada é de aproximadamente 45 km² o que representa 52,15% do 
município que é todo ele classificado como perímetro urbano. 
Diferentemente de outros municípios da região metropolitana da Grande Vitória 
(RMGV) a concentração fundiária na capital não é tão intensa (Zanotelli et. all, 2013), mas 
tal fato não implica afirmar que em Vitória não exista uma concentração, afinal, se trata de 
um território de extensão relativamente pequena com a densidade mais elevada da RMGV 
(3.797 habitantes por Km² contra 730 Km² para a região) e com um alto grau de ocupação, e 
que há várias décadas – precisamente desde a década de 1970; vêm sendo local de 
intensas atividades imobiliárias (CAMPOS JR, 2002). Neste sentido, uma propriedade de 
área superior a 10.000 m² já representa uma grande influência na organização do espaço, 
uma vez que, são áreas que estão inseridas dentro de um perímetro urbano, que são 
dotadas de algumas infraestruturas, e são locais para uma possível expansão da malha 
urbana da cidade e de reorientação do uso do solo. 
Ao todo, conforme a PMV existem em Vitória 72 propriedades de terra “vazias” com 
área superior a 10.000 m². Destas, 24 são propriedades da prefeitura, uma da Infraero, uma 
da empresa brasileira de correios e telégrafos, 8 de empresas ligadas diretamente ao setor 
imobiliário, seja em incorporação, participação ou construção e finalmente 38 propriedades 
que estão registradas em nome de pessoas físicas e empresas de diferentes setores, sendo 
algumas ligadas ao capital financeiro. 
Analisando a base de lotes de Vitória juntamente com o auxilio de ortofoto, foi 
possível verificar que além destas áreas “vagas” expostas acima, existem outras 
propriedades “vazias”, algumas chegando até a apresentar área igual ou superior a 10.000 
m² e outras significativas áreas “vagas” que já foram loteadas em pequenos lotes. Estas 
áreas verificadas a partir desta metodologia estão no presente trabalho classificadas como 
lotes “vagos” gerais. No mapa 01 pode ser verificada a localização das propriedades vagas. 
 
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Mapa 01: Vazios urbanos em Vitória. 
 
Estudando o mapa 01 nota-se que os “vazios” de maiores extensões (lotes “vagos” 
gerais e lotes “vagos” com mais de 10.000 m²) estão majoritariamente localizados em áreas 
de proteção ambiental do Maciço Central de Vitória. Nas áreas particulares desta região é 
comum se verificar pastos e uma pequena criação de gado e pequenos cultivos de 
eucaliptocultura (ZANOTELII et. all. 2013). Além disto, é nesta região onde se localiza as 
propriedades fundiárias municipais de maiores extensões em função da localização de 
parques municipais, estaduais e APPs. As propriedade fundiárias particulares situadas 
dentro do maior parque do município (Parque Estadual da Fonte Grande) que é 
administrado pela PMV compõem um mosaico de propriedades desapropriadas, que estão 
sendo ou ainda não foram desapropriadas e que deste fato, juntamente com as 
propriedades situadas na APA do Maciço Central de Vitória que se encontra no entorno do 
Parque, representam um problema de difícil solução, pois há litígios na justiça sobe os 
valores das indenizações. Em função disto os antigos proprietários e seus herdeiros de 
maneira sistemática tem tentadodificultar a unidade do parque e apoiado projetos de 
construção de estradas que atravessariam o parque, bem como a municipalização do 
parque para facilitar as pressões sobre os vereadores e prefeito do município para 
descaracterizar o parque e assim facilitar os ganhos potenciais com suas propriedades. 
Incêndios recorrentes têm acontecido no parque como forma de desestabilizá-lo, prática que 
se reproduz em outros parques do Espírito Santo. 
 
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Cabe ressaltar que mesmo sendo a região do Maciço Central uma área de interesse 
ambiental e de apresentar uma paisagem impar devido às características físicas da região, 
as atividades imobiliárias realizada neste local são ínfimas – evidentemente devido em 
partes limitações legais; comparadas aos bairros litorâneos e centrais como Praia do Canto, 
Enseada do Suá, Mata da Praia, Jardim Camburi, Jardim da Penha e etc. 
Essas áreas vagas em sua totalidade são elementos constituintes do sistema de 
vazios urbanos de Vitória. Esses que de maneira geral podem ser compreendidos como 
sendo espaços não ocupados por construções imobiliárias, e que se encontram no interior 
do perímetro urbano. Os vazios urbanos emergem como verdadeiros imbróglios para os 
meios urbanos, pois, a partir deles podem surgir diferentes problemas que podem ser de 
ordem econômica - uma vez que seus proprietários vislumbram melhores condições de se 
obter maior renda; e política – devido às pressões sobre o Estado (prefeitura e Estado) para 
se transformar os lotes em zonas construtíveis. 
Nos bairros onde se verifica uma intensa atividade imobiliária e lugares de moradia 
das classes dominantes, da burguesia e das “classes médias” superiores - como Praia do 
Canto, Enseada do Suá, Mata da Praia, Jardim Camburi, Jardim da Penha e etc.; marcados 
pela verticalização e consequentemente por um grande número de lançamentos de 
unidades residenciais e comerciais, não é comum a existência de grandes vazios urbanos 
sob domínio de um único dono, em contrapartida, os vazios se apresentam sob a forma de 
pequenos e médios lotes que se destacam por se apresentarem como raridades pela 
escassez de espaço construtível e ao mesmo tempo pelos seus elevados preços que 
representam o sobrelucro capturado graças ao capital fixo investido coletivamente na 
produção destas localizações e evidentemente à captura das vantagens locacionais 
(proximidade de serviços, infraestruturas e de espaços naturais como as praias). 
Em função do processo de valorização de terras e de uma “carência” dos espaços 
construtíveis, o capital imobiliário acabou migrando do município de Vitória para os outros 
municípios da RMGV, onde encontravam espaços construtiveis e terras relativamente mais 
baratas. Neste sentido destaca-se a expansão do capital imobiliário para o município de Vila 
Velha a partir da década de 1990 (GONÇALVES, 2010), para o município de Serra a partir 
de 2000 (ZANOTELLI e FERREIRA 2011) e mais recentemente para o município de 
Cariacica. Cabe ressaltar que além da escassez de terras para a construção somada aos 
seus elevados preços, essa expansão do capital imobiliário também se justifica, pelo menos 
em parte, mais recentemente, pela promoção do Programa Minha Casa Minha Vida 
(PMCMV) do governo federal lançado em 2009. Com essa migração do capital imobiliário 
 
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para novas áreas, Vitória deixou de liderar o ranking de lançamentos imobiliários conforme 
demonstra a tabela 01. 
Tabela 01: Número de lançamentos de unidades imobiliárias entre 2005 e 2012 na RMGV4. 
Municípios 2005 2006 2007 2008 2009 2010 2011 2012 Total 
Vitória 1.850 2.534 3.079 3324 1.774 1680 862 938 16041 
Vila Velha 1453 1736 2026 3024 1602 3439 5.574 3.813 22667 
Serra 152 553 2150 4214 2.134 6.054 4.334 1.295 20886 
Cariacica 0 192 168 594 0 242 669 324 2189 
Total por ano 3455 5015 7423 11156 5510 11415 11439 6370 61783 
Fonte: SINDUSCON-ES 
Em contrapartida à queda do número de unidades imobiliárias lançadas em Vitória 
no período recente, emerge no município o predomínio de um padrão construtivo voltado 
para os imóveis comerciais e residenciais de luxo voltados para as classes dominantes. Os 
imóveis comerciais/empresariais lançados recentemente se localizam, em parte, no novo 
bairro central (Enseada do Suá) conquistado por aterro ao mar, que acolheu a partir dos 
anos 1990 a nova Assembleia Legislativa e os tribunais de justiça transferidos do antigo 
centro considerado exíguo e ultrapassado, bem como o maior Shopping Center da Região 
Metropolitana. Os serviços e comércios de luxo, e, também, os serviços bancários, 
empresas de prestações de serviços e sedes de grandes empresas multinacionais, 
nacionais, regionais voltadas para exportação se localizam no último bairro descrito e, 
também, em Praia do Canto e seus abordos. Os dois bairros (Enseada do Suá e Praia do 
Canto) dispõem de uma relevante gama de equipamentos urbanos e se apresentam, 
juntamente com Jardim da Penha e Jardim Camburi, no contexto municipal e metropolitano, 
como importantes centros de comércios e serviços que se localizam próximos ao mar. 
Essa concentração do capital imobiliário em determinadas regiões demonstra a 
influência da capital fixo empregado na produção de uma determinada localização sobre os 
preços dos imóveis, o que consequentemente desempenha uma seletividade espacial, 
tornando inacessível a fixação nesses bairros de classes econômicas menos favorecidas. 
Nos gráficos da figura 01 pode ser verificado o preço médio do metro quadrado por tipologia 
das unidades imobiliárias de Vitória, bem como verificar a comparação de preços médios do 
metro quadrado de Vitória em relação aos outros municípios da RMGV onde se verifica a 
atuação intensa do capital imobiliário. Evidentemente que estes preços não são preços de 
negociação final, assim não se pode saber exatamente qual foi o valor pelo qual os 
 
4
 Além dos municípios elencados na tabela 01, a Região Metropolitana da Grande Vitória –RMGV, 
constituída em 1995, é formada ainda pelos municípios de Fundão, Guarapari e Viana. 
 
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apartamentos e casas foram vendidos, mas se pode ter uma ideia dos preços que os 
agentes imobiliários demandam nos lançamentos. 
Figura 01: Gráficos de preço médio do metro quadrado em Vitória e na RMGV5. 
 
Esses preços apresentados pelo Sindicato dos Empresários da Construção Civil do 
Espírito Santo contabilizam apenas empreendimentos de empresas que são afiliadas ao 
sindicato. Entretanto, o mercado imobiliário não é desenvolvido apenas por empresas, mas 
sim por distintos agentes de distintas classes que conferem ao imóvel uma possibilidade de 
lucro. Neste sentido, realizando um contraponto a esses dados via pesquisas de valor de 
imóveis em jornais, onde se anuncia não apenas imóveis novos e em lançamentos, mas 
imóveis de diferentes características, indo desde lançamentos até imóveis mais velhos, 
destaca-se uma diferença significativa no preço médio do metro quadrado. Na Tabela 02, 
podem ser constatadas as diferenças de preços anunciados pelo SINDUSCON-ES com os 
preços médios coletados nos anúncios dos jornais. 
 
Tabela 02: Preço médio do m² por bairros de moradias em Vitória6 
Bairros Preço médio do m² SINDUSCON-ES Preço médio do m² jornais 
Enseada do Suá 5.960,12 3.801,7 
Jardim da Penha 4.805,5 3.242,8 
Jardim Camburi 3.432,15 2.924,16 
Mata da Praia 7.132,15 3.811,6 
Fonte: SINDUSCON-ES
7
 e jornais A Tribuna e A Gazeta 
Os jornais apontam, assim como o SINDUSCON-ES, uma enorme concentração de 
anúnciosnas regiões onde predominam as atividades do capital imobiliário e de maior 
 
5
 O gráfico que aponta o valor médio do m² por município na RMGV é resultado da média dos valores 
de casas e apartamentos 1, 2, 3 e 4 quartos de cada município. 
6
 O valor médio resulta da média dos valores de casas e apartamentos. 
7
 Além dos bairros apresentados na tabela 02, o SINDUSCON-ES realiza o levantamento de imóveis 
lançados nos bairros, Bento Ferreira, Praia do Suá, Praia de Santa Helena, Santa Lucia, Barro 
Vermelho e Praia do Canto. 
 
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verticalização, entretanto, em menor proporção eles trazem anúncios de outras regiões do 
município. No mapa 02 pode ser verificado o preço médio do metro quadrado de diversos 
bairros do município de Vitória a partir das analises dos jornais. 
Mapa 02: Preço médio do metro quadrado por bairro em Vitória. 
 
 Nos bairros onde a atividade do capital imobiliário é mais intensa em Vitória verifica-
se que além da influência da produção da localização via emprego do capital fixo e a ação 
do Estado na promoção de diversos equipamentos, que a influência especulativa sobre os 
preços médios é significativa. Esta especulação que pode ser verificada genericamente na 
comparação entre os preços anunciados pelo SINDUSCON-ES com os levantados em 
jornais. Além disso, essa especulação se verifica também quando se analisa a quantidade 
de domicílios vagos por bairro em Vitória. Estes estão concentrados principalmente nas 
áreas mais valorizadas e onde mais se construiu/constrói ultimamente, como Praia do 
Canto, Jardim da Penha, Mata da Praia, Jardim Camburi. No mapa 03 pode ser verificada a 
quantidade de domicílios vagos por bairro em Vitória. 
 Além da grande quantidade de domicílios vagos nos bairros onde mais se construiu e 
que mais se aumentou os preços médios nos últimos anos (cf. figura 1) denotando uma 
produção de uma superoferta e uma eventual bolha, nota-se que o Centro antigo da cidade 
de Vitória aparece com elevado número de domicílios vagos o que demonstra um processo 
de esvaziamento do centro, pois imóveis ali se encontram abandonados e em decrepitude. 
Tal processo manifesta o reflexo da cidade sujeitada/subordinada à lógica de produção 
dominante da especulação, do sobrepreço e de uma insustentável situação, onde ao mesmo 
 
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tempo em que a malha e o tecido urbano explodem empurrando as populações dominadas 
para longe do município centro, o Centro antigo perde sua potencia social e implode 
(LEFEBVRE, 2001). 
Tabela 03: Número de domicílios vagos por bairro em Vitória segundo o IBGE (2010) 
Bairros Nº de domicílios vagos 
Enseada do Suá 400 
Jardim da Penha 1233 
Jardim Camburi 1704 
Mata da Praia 284 
Praia do Canto 857 
Barro Vermelho 228 
Centro 648 
 
Ao todo segundo o IBGE (2010), Vitória possui cerca de 11.779 domicílios vagos e 
em contrapartida um déficit habitacional de 1.472 moradias, segundo o Instituiu Jones do 
Santos Neves (IJSN, 2008), o que demonstra que apenas 12,49% deste domicílios vagos 
seriam suficientes para responder a demanda habitacional, além daqueles que se 
encontram em construção e em lançamento que farão aumentar o superávit dos imóveis na 
capital. Porém deve-se considerar que nem sempre os domicílios vagos se encontram onde 
estão as demandas de domicílios por parte das categorias sociais dominadas, mas estas 
poderiam mudar de domicílio e se instalar no Centro antigo e nos Centros novos se o 
Estado invertesse a lógica de priorizar a propriedade privada do solo e dos imóveis e 
implementasse uma política social inclusiva. 
Diante do exposto até aqui, nota-se alguns elementos chaves para a compreensão 
da urbanização de Vitória que passam pelo crivo da renda da terra e da renda imobiliária. 
Inicialmente, os vazios urbanos representados por fazendas e lotes em diferentes pontos da 
cidade representam possíveis zonas de expansão urbana da capital, que vem se sujeitando 
a uma lógica mercadológica do espaço liderado principalmente pelo capital imobiliário 
atrelado ao capital financeiro. Ambos necessitam fabricar cidades para pagar seus 
acionistas, o que consequentemente remete à busca de áreas disponíveis para a construção 
- estritamente desnecessárias no caso de Vitória quando se compara os imóveis livres em 
conformidade com os dados do último Censo do IBGE - que prontamente implicam no 
aumento do preço do solo dos vazios urbanos existentes no município. Alias, vale lembrar 
que muitos desses vazios já se encontram sob domínio de promotores imobiliários. Destarte, 
o espaço de Vitória vem se (re)produzindo não com finalidade de cumprir uma função social 
ou de buscar manter o caráter orgânico de comunidade que a cidade herdou da aldeia, mas 
segundo a lógica do mercado que a principio, faz com que o valor de troca e a 
 
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Geografias, Políticas Públicas e Dinâmicas Territoriais 
De 07 a 10 de outubro de 2013 
 
 
generalização da mercadoria subordine a si, a realidade urbana (LEFEBVRE, 2001) e 
consequentemente faz com que a renda da terra, a propriedade fundiária, o capital 
imobiliário e financeiro, fomentam a desigualdade social, urbana e espacial. (MARICATO, 
2011). 
4 - Considerações finais 
O presente estudo procurou verificar como que o monopólio e o controle da propriedade 
fundiária e imobiliária nas áreas centrais e nos vazios urbanos garantem a renda da terra a 
seus possuidores. Deste modo, sumariamente verificamos a existência de três agentes 
rentistas neste processo, os proprietários fundiários, os promotores imobiliários e o Estado. 
Esses que de maneira conjunta, vem definido o uso do solo urbano de Vitória, tornando o 
mesmo segregado e fragmentado. Logo, os conflitos que se apresentam no espaço urbano 
de Vitória, de maneira geral, vêm sendo mediados por interesses capitalistas rentistas e 
financeiros, que com suas dinâmicas avassaladoras ignoram os territórios, as sociedades, 
as culturas e os recursos naturais submetendo-os ao fetichismo da mercadoria. 
(MARICATO, 2011). 
5 - Bibliografia 
BOTELHO, A. A renda fundiária urbana: uma categoria de análise ainda válida. Revista Geographia 
– UFF – v. 10, n. 19. 2008, p. 25-45. 
CAMPOS JR, C. T. A construção da cidade: formas de produção imobiliária em Vitória. Vitória: 
Flor&cultura, 2002. 
CARLOS, Ana Fani A. A condição espacial. São Paulo: Contexto, 2011. 
CORRÊIA, R. L. O espaço Urbano. 2º Ed. São Paulo: Ática, 1993. 
GONCALVES, T. M. Novas estratégias da produção imobiliária na Grande Vitoria: um estudo 
sobre as recentes transformações do espaço urbano de Serra-ES. Dissertação Mestrado. Mestrado 
em Geografia - UFES, 2010. 
HARVEY, David. A Justiça Social e a Cidade. São Paulo: Hucitec,1980. 
HARVEY, David. O enigma do capital e as crises do capitalismo. São Paulo: Boitempo, 2011. 
LEFEBVRE, H. O direito à cidade. São Paulo: Centauro, 2001. 
MARICATO, Ermínia. O impasse da política urbana no Brasil. São Paulo: Editora Vozes, 2011. 
MARX, Karl. O Capital: O processo global da produção capitalista. Tomo 2 (Parte Segunda). 
Tradução Regis Barbosa e Flávio R. Kothe. São Paulo: Nova Cultura, 1988. Vol. V. Livro Terceiro. 
ZANOTELLI, C. L.; FERREIRA, F. C. A disseminação dos condomínios fechados em Serra - 
Região Metropolitana da Grande Vitória, ES - e os impactos ambientais da implantação de 
Alphaville. In: XII Simpósio Nacional de Geografia Urbana (XII Simpurb). Belo Horizonte, 2011. 
ZANOTELLI, C. L. et. all. A expansão da Região Metropolitana da Grande Vitória. In: 14º Encontro 
de Geógrafos da América Latina, 2013, Lima. 14 Encontro de Geógrafos da América Latina: 
Reencuentro de saberes territorialesLatinoamericanos. Lima: 14 Egal, 2013.

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