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Olá, seja bem-vindo ao Universo da Biologia Molecular. Eu sou o Eduardo Castan e hoje eu vou te ajudar a enxergar a análise da expressão gênica por RT-qPCR sob outra perspectiva. Vamos lá Sobre o autor QUEM É EDUARDO CASTAN? Mestre e doutor em genética com foco em técnicas de biologia molecular. Por vários anos trabalhou como especialista de produtos na maior empresa de ciências da vida do mundo, atendendo centenas de clientes, incluindo os maiores laboratórios do Brasil e América Latina. Atualmente, Eduardo tem como missão ajudar as pessoas que precisam aprender (ou aprender mais) sobre biologia molecular. Por meio do Universo da Biologia Molecular, lives no Instagram e aulas no YouTube ele vem democratizando o conhecimento sobre essas técnicas e outros temas que orbitam a biologia molecular. O ano é 2048 e a aluna de doutorado está em campo para fazer as análises de seu experimento de expressão gênica. Ela precisou viajar de São Paulo às entranhas da floresta amazônica para encontrar a plantinha que é o alvo principal de seu experimento. Ao encontrar a planta que procurava, ela tira do bolso um equipamento menor que um celular e encosta o seu sensor em uma das folhas da plantinha. Cinco segundos depois, o aparelho apita, informando que os dados sobre o nível de expressão de todos os genes daquela planta foram coletados e analisados corretamente. A doutoranda aperta salvar, coloca o aparelho no bolso e segue em busca da próxima planta. O que esse aparelho fez ou o que ele é? Ele nada mais é do que um tradutor. Um equipamento que tem a capacidade de traduzir uma informação biológica (expressão gênica) em uma informação digital (dados numéricos). As ferramentas de biologia molecular que utilizamos nos dias de hoje (PCR em tempo real, por exemplo) fazem exatamente a mesma coisa. Com a diferença que, entre a obtenção da informação biológica e a obtenção da informação digital, há uma série de procedimentos (ex. coleta da amostra, extração de RNA, síntese de cDNA e a própria qPCR etc.) que, necessariamente, distorcem os resultados. No entanto, tais distorções podem e devem ser evitadas, corrigidas ou normalizadas. De tal maneira que, ao final de um experimento, os resultados obtidos representem de fato o que estava acontecendo dentro da amostra antes de ela ter sido coletada. Essa é a sua função como pesquisador e biologista molecular. Garantir que a tradução tenha sido realizada sem viés e livre de variáveis. Esse caderno é sobre isso. Sobre como utilizar a PCR em tempo real como ferramenta de análise de expressão gênica, reduzindo ao máximo, as variáveis que podem distorcer o processo da tradução da informação biológica em informação digital. PÁG. 6 PÁG. 10 PÁG. 12 PÁG. 13 PÁG. 14 PÁG. 17 PÁG. 19 PÁG. 25 PÁG. 28 Índice A EXPRESSÃO DE GENES O FLUXO DE TRABALHO DA RT-QPCR COLETA E ARMAZENAMENTO EXTRAÇÃO E PURIFICAÇÃO CONTROLE DE QUALIDADE TRANSCRIÇÃO REVERSA PCR EM TEMPO REAL ANÁLISE DOS DADOS DICAS Antes de começarmos, vamos dar um passo para trás O genoma de um organismo armazena uma cacetada de informação. Um monte mesmo. Ali tem informação relacionada à cor de olho de um indivíduo até a sua predisposição a desenvolver certas doenças. Essas informações estão armazenadas em forma de código e em regiões específicas ao longo do genoma – os genes. No entanto, as informações contidas nos genes não são recrutadas pelas células o tempo todo nem na mesma intensidade. Em outras palavras, os genes são expressos quando recebem certos estímulos, sob certas condições (às vezes muito específicas). A EXPRESSÃO DE GENES Ao serem recrutados, os genes têm sua informação transcrita (copiada) a uma molécula de RNA. A informação transportada por essa molécula de RNA poderá ser utilizada de alguma maneira - na produção de uma proteína, por exemplo. Entender a dinâmica de expressão dos genes pode ser muito interessante e informativo. Por isso, muitas pesquisas ao redor do mundo têm como objetivo analisar o nível de expressão gênica em organismos e condições específicas. Para tais análises, existem as ferramentas de biologia molecular, como a técnica de microarray, o sequenciamento de nova geração e a PCR em tempo real. A EXPRESSÃO DE GENES Agora você já entendeu que a PCR em tempo real nada mais é que uma ferramenta que traduz informação biológica, a qual não conseguimos compreender, em informação digital - valores números. O processo de tradução acontece por meio de geração de luz, geração de fluorescência. De um lado entra DNA (cDNA) e do outro lado sai luz. A luz, por sua vez, é utilizada para gerar valores numéricos. A intensidade da fluorescência ao longo da qPCR aumenta de maneira proporcional à produção de cópias do alvo - a cada ciclo da reação. A dinâmica de geração de fluorescência, por sua vez, está diretamente relacionada ao nível de expressão do gene em questão. Coleta da amostra e armazenamento Extração, purificação e c. de qualidade Síntese de cDNA PCR em tempo real Análise de dados Para que a fluorescência seja gerada ao longo da qPCR e depois traduzida em resultados, há uma série de procedimentos que devem ser realizados - desde a coleta da amostra até a obtenção do valor numérico. O que considerar na realização de cada passo para evitar, diminuir, corrigir e/ou normalizar vieses e variabilidades que possam vir a distorcer os resultados. COLETA DA AMOSTRA E ARMAZENAMENTO Trabalhe com rapidez. Armazene a amostra coletada em nitrogênio líquido ou em solução de preservação. Alternativamente, também é possível seguir imediatamente para extração do RNA. Utilize vidrarias, plásticos e reagentes livres de RNase. Evite degradação do RNA: EXTRAÇÃO E PURIFICAÇÃO A amostra em si (tecido vegetal ou animal, líquida ou sólida, cultivo de células, cultivo de bactérias etc.). Seu orçamento. A quantidade de RNA necessário para concluir o experimento. Homogeneíze muito bem a amostra com a solução de lise. Utilize a quantidade adequada de amostra em relação ao volume de solução de lise. Não processe muitas amostras por vez. Utilize um kit ou sistema de purificação compatível com suas condições e amostra. Ou seja, leve em consideração: Preferencialmente deve ser realizada por fluorometria, já que a espectrofotometria (ex. Nanodrop) não tem a capacidade de discriminar DNA de RNA. Ou seja, sabendo que todo sistema de purificação não é 100% eficiente e que, consequentemente, um pouco de DNA será extraído e purificado junto com o RNA, existe grandes chances de se superestimar a quantidade de RNA de uma amostra ao quantificá-la por espectrofotometria. Quantidade ideal de RNA: aquela suficiente para você começar e terminar o experimento, considerando otimizações, padronizações e repetições de reações. CONTROLE DE QUALIDADE QUANTIDADE Existem algumas maneiras de se verificar o nível de pureza de uma amostra, ou seja, verificar o quão livre de proteínas e outros contaminantes ela está. No entanto, a espectrofotometria é de longe a técnica mais fácil, de menor custo e mais acessível. Pureza ideal de RNA: A260/280 = 1,9 a 2,1 A260/230 = 1,5 a 1,8 CONTROLE DE QUALIDADE PUREZA Uma amostra de RNA degradado pode ser um grande fator de distorção da tradução. O ideal é quantificar o nível de integridade do RNA. Esse tipo de análise pode ser realizado por meio de equipamentos como o Bioanalyzer, que utiliza um sistema de pontuação (de 1 a 10) para quantificar a integridade - o RIN (RNA Integrity Number). Entre outros fatores, o RIN de uma amostra é calculado pela integridade e proporção entre os RNAs ribossomais 28S e 18S. Idealmente, o RIN de uma amostra deve estar acima de 7. Se não tiver acesso a um Bioanalyzer, vai de eletroforese em gel de agarose mesmo. Verifique a resolução das bandas referentes aos rRNAs 28S e 18S e a proporção entre elas – deve ser de 2:1 (28S:18S). Também existe a possibilidade de quantificar a integridade do RNA utilizando a própria PCR em tempo real. Clique aqui e veja esse post quefiz há alguns dias sobre isso. CONTROLE DE QUALIDADE INTEGRIDADE https://www.instagram.com/p/CKeRzhADa-2/?utm_source=ig_web_copy_link SÍNTESE DE cDNA A PCR ou a qPCR não funciona ao utilizar moléculas de RNA como molde. Por isso, é necessário fazer uma reação anteriormente à qPCR chamada transcrição reversa ou, simplesmente, RT. Durante a reação de RT as moléculas de RNA de uma amostra serão utilizadas para a produção de moléculas de DNA. Esse processo é realizado por uma DNA polimerase “especial” chamada transcriptase reversa. Os produtos da RT, ou seja, as moléculas de DNA complementares às moléculas de RNA, são chamados de cDNA. O cDNA representa o RNA original da amostra e pode ser utilizado como molde na qPCR. SÍNTESE DE cDNA Utilizar uma transcriptase reversa termo estável para que a reação possa acontecer em temperaturas mais altas – o que facilita a ruptura das estruturas secundárias das moléculas de RNA. Utilizar uma transcriptase reversa com baixa atividade de RNase H – o que está associada à processividade da enzima (capacidade de gerar fragmentos longos). Manter a linearidade da reação: proporção entre a quantidade de RNA utilizada no início da reação e a quantidade de cDNA produzida no final da reação. Um bom kit de transcrição reversa deve: PCR em tempo real Agentes intercalantes – ex. SYBR Green Sondas de hidrólise – ex. Sondas TaqMan Todos os passos do fluxo de trabalho mencionados anteriormente, só existiram para que pudéssemos chegar aqui. A qPCR, para análise de expressão de genes, pode ser realizada por meio de diferentes sistemas de detecção, ou seja, por diferentes “produtores” de luz ou fluorescência. Os dois mais conhecidos são: A principal vantagem dos agentes intercalantes é o preço. Eles são consideravelmente mais baratos que as sondas de hidrólise. Sua principal desvantagem é a falta de especificidade, já que essas moléculas têm afinidade a qualquer DNA dupla fita e não somente cDNA a ser quantificado. Justamente por isso, o usuário de intercalantes de DNA precisa realizar um procedimento ao final de cada corrida de qPCR para verificar se não houve amplificação inespecífica de DNA – esse procedimento é chamado de curva de dissociação ou curva de melting. A principal vantagem das sondas de hidrólise é a especificidade, já que as sondas, assim como os primers, são olignucleotídeos complementares a uma região específica do cDNA (gene) a ser quantificado. Sua principal desvantagem é o preço, o que pode inviabilizar a execução de alguns experimentos. PCR em tempo real Verificar a especificidade dos primers e sondas Determinar a concentração ideal de cada conjunto de primer e sonda Verificar a eficiência de amplificação de cada alvo Ainda falando da qPCR... É fundamental que o pesquisador faça algumas verificações e padronizações antes de iniciar o experimento de fato. 1. 2. 3. Realizar algumas corridas com controle negativo (água no lugar de cDNA) para verificar se não há geração de fluorescência. Se houver, pode ser um indicativo de contaminação ou dímero de primers - no caso de usuários de agentes intercalantes. Realizar algumas corridas com controle positivo (amostra sabidamente funcional – que gera resultado) para verificar se não há fluorescência inespecífica sendo gerada. Essa verificação pode ser feita pela curva de dissociação para usuários de intercalantes de DNA ou por eletroforese com gel de agarose para usuários de sondas de hidrólise. PCR EM TEMPO REAL VERIFICAR A ESPECIFICIDADE DOS PRIMERS E SONDAS 100 nM 300 nM 600 nM 50 nM 100 nM 150 nM 200 nM 250 nM Para cada alvo, diferentes concentrações de primers e sonda devem ser testadas com controles positivos e controles negativos. A melhor concentração é aquela que gera o menor Cq (amplifica mais rapidamente ao longo da qPCR) nos controles positivos, sem formar dímeros nos controles negativos. Recomendação de concentrações finais a serem testadas para cada primer na reação: Recomendação de concentrações finais a serem testadas para sondas na reação: PCR EM TEMPO REAL DETERMINAR A CONCENTRAÇÃO IDEAL DE CADA CONJUNTO DE PRIMER E SONDA A verificação da eficiência de amplificação de cada alvo é fundamental para determinar que tipo de método de análise será utilizado no processo de quantificação do nível de expressão gênica. Para essa verificação, é necessário realizar a qPCR de uma diluição seriada para cada um dos alvos. A diluição seriada, por sua vez, pode ser produzida por meio de amostras controles e cinco (ou mais) pontos, com diferença de concentração de 10 vezes entre eles. PCR EM TEMPO REAL VERIFICAR A EFICIÊNCIA DE AMPLIFICAÇÃO DE CADA ALVO Análise dos dados Dois pontos fundamentais em relação à análise dos dados: 1 – Método de análise para a quantificação relativa da expressão 2 – Escolha dos genes de referência Com base no teste de eficiência de amplificação dos alvos, escolha o método de quantificação: Método do ΔΔ Cq Mais fácil de fazer, menos custoso, mais fácil de analisar. Porém, demanda que todos os alvos do experimento estejam amplificando com eficiências parecidas de reação (± 10% de variação é aceitável) Método da curva padrão relativa, Compatível com alvos que amplificam com eficiências diferentes. Porém, é mais trabalhoso, mais difícil de fazer e de analisar e é mais caro. ANÁLISE DOS DADOS MÉTODO DE ANÁLISE PARA A QUANTIFICAÇÃO RELATIVA DA EXPRESSÃO Os genes de referência (controles endógenos) têm a função de corrigir as pequenas variabilidades experimenteis capazes de causar deturpações na geração de fluorescência de cada reação. Ou seja, corrigir fatores que interferem no processo da tradução da informação biológica em informação numérica. Por exemplo: erro de pipetagem, diferentes níveis de degradação e pureza entre as amostras, variação na eficiência da transcrição reversa etc. Quase toda pequena variabilidade inserida no experimento pode ser corrigida por meio dos genes de referência, contanto que: Os genes de referência tenham um nível expressão constante entre todas as amostras do experimento. Duas observações: 1 – Para calcular a estabilidade do nível de expressão, é necessário realizar testes com pelo menos 3 candidatos a gene de referência. 2 – Não existe um gene de referência universal. Cada experimento tem suas condiçõese características específicas. ANÁLISE DOS DADOS ESCOLHA DOS GENES DE REFERÊNCIA Evite utilizar consumíveis de lotes e fornecedores diferentes ao longo do experimento. Por exemplo, se começou suas reações utilizando um dado mastermix, tente seguir com a mesma marca e, de preferência, com o mesmo lote. Extraia uma quantidade de RNA que seja suficiente para começar e terminar o experimento. Evite fazer lotes diferente de cDNA para uma mesma amostra. Trate o RNA com DNase. Faça um negativo da transcrição reversa. Tente seguir todos os passos do fluxo de trabalho de uma única vez. Evite fragmentar esses passos ao longo de muitos meses ou anos. Mantenha as pipetas sempre calibradas. Faça triplicatas técnicas. Não encha o saco do coleguinha. Seja cortês no ambiente de trabalho. DICAS EXTRAS PARA PARA VOCÊ UTILIZAR A qPCR COMO UMA FERRAMENTA ADEQUADA DE QUANTIFICAÇÃO DE EXPRESSÃO DE GENES Agora você está munido de informação e, consequentemente, mais seguro para entrar no laboratório. Valeu demais! SEU CADERNO ACABA POR AQUI Eduardo Castan O Universo da Biologia Molecular tem como objetivo auxiliar qualquer profissional que trabalha ou pretende trabalhar com biologia molecular a alcançar seus objetivos. Ainda que um pouquinho, estamos contribuindo com a formação de profissionais e com a pesquisa desse nosso Brasilzão! Acompanhe o Universo da Biomol: Cadastre-se no site universodabiomol.com e tenha acesso a aulas semanais e gratuitas no YouTube, e a outros materiais como esse caderno. O UNIVERSO DA BIOLOGIA MOLECULAR @UNIVERSODABIOMOL UNIVERSO DA BIOLOGIA MOLECULAR
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