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Sociologia e Antropologia Jurídica 02

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- -1
SOCIOLOGIA E ANTROPOLOGIA JURÍDICA
PERSPECTIVAS SOCIOLÓGICAS
Marcus Vinícius de Freitas Teixeira Leite
- -2
Olá!
Iniciaremos o estudo da unidade II de Sociologia e Antropologia Jurídica com as abordagens do campo da
Antropologia sobre a cultura. Em seguida, trataremos das relações entre cultura e sociedade na Sociologia. Após
uma breve apresentação das perspectivas de teóricos importantes a respeito da problemática do crime e do
desvio social, estudaremos as perspectivas sociológicas de três dos autores mais importantes e influentes desta
disciplina: Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx. As interseções da obra destes autores com o Direito
também serão abordadas nesta unidade.
Bons estudos!
- -3
Indivíduo, cultura e sociedade
Neste tópico, analisaremos com maior detalhe algumas nuances importantes para o estudo da Sociologia e
Antropologia do Direito: a cultura por uma perspectiva antropológica; cultura e sociedade; crime e desvio social.
São aspectos de grande relevância para o estudo do Direito, uma vez que dizem respeito a fenômenos sociais
abarcados pelo âmbito jurídico em geral.
Assista aí
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/2571477b919df57a3336279c9f071fdc
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Abordagem antropológica da cultura
O entendimento da Ciência Social a respeito do que significa o termo “ ” e que fenômenos ele compreendecultura
se modificou sensivelmente ao longo dos últimos séculos. Antes do surgimento e consolidação da Antropologia
como disciplina – ocorrida a partir do século XIX -, a visão predominante entre filósofos e historiadores europeus
apresentava uma concepção acerca do fenômeno cultural que John Thompson (2000) denominou como
concepção clássica de cultura, por vezes também denominada como normativa.
O termo era frequentemente associado a um processo de desenvolvimento e enobrecimento das faculdades
humanas, o qual seria facilitado pela assimilação de trabalhos artísticos e acadêmicos e estaria ligado ao caráter
progressista da e da racionalidade do período Iluminista.Modernidade
Este último elemento, ligado à perspectiva clássica, foi alvo de fortes críticas e é uma das principais razões para
que esta perspectiva tenha sido superada na produção acadêmica: ela indicava uma superioridade de certos
valores e ofícios em relação a outros e apresentava conotação fortemente eurocêntrica, dando centralidade
excessiva ao legado Iluminista (LOPES, 2014).
O desenvolvimento do na segunda metade do século XIX, associado à proliferação doscampo antropológico
trabalhos etnográficos na disciplina voltados a comunidades fora da Europa, impulsionou mudanças na
concepção predominante sobre o conceito “cultura”, abrindo espaço, inicialmente, para a chamada concepção
descritiva. O primeiro conceito propriamente antropológico de cultura, elaborado por Edward Taylor, considera
o fenômeno como “(...) todo o complexo que inclui conhecimentos, crenças, arte, moral, leis, costumes ou
qualquer outra capacidade ou hábitos adquiridos pelo homem como membro de uma sociedade” (TAYLOR apud
LARAIA, 1997, p. 25).
Historiadores culturais e antropólogos da época, ainda que adotando inovações e particularidades a partir da
ideia apresentada - como, por exemplo, o particularismo e o relativismo da abordagem de Franz Boas, e o
funcionalismo de Bronislaw Malinowski –, partilhavam a perspectiva de que a cultura de um grupo se refere às
ideias, valores, crenças e costumes, assim como os instrumentos materiais e objetos tangíveis que os indivíduos
adquirem enquanto membros de determinada sociedade.
Ao mesmo tempo, se verificavam divergências entre os pesquisadores da época acerca do referencial de
aplicação deste conceito – se a partir de uma ótica evolucionista, ou objeto de uma análise funcional (LOPES.
2014).
Dentre as ressalvas feitas por antropólogos à perspectiva descritiva, estariam a excessiva amplitude e vagueza
do conceito de cultura, que poderia se tornar redundante, confundindo-se com o próprio termo “Antropologia”,
quando não associado a uma maior especificação do método de análise. Para contrapor-se a este problema,
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desenvolveu-se a concepção simbólica de cultura, inicialmente esboçada por L. A. White. O autor considerou que
o ser humano e a cultura são inseparáveis e interdependentes. A atribuição de símbolos e dos significados seria
uma capacidade inerente à humanidade, e a cultura seria realizada por meio destes atos de simbolização
(WHITE, 2009).
Esta conceituação influenciou a construção da de Clifford Geertz, que colocou o tema daperspectiva semiótica
cultura em posição de centralidade nos debates da disciplina. Na conhecida obra A interpretação das culturas,
Geertz (1989) avalia que, ainda que em seu sentido mais amplo a cultura diga respeito à toda produção humana
material e imaterial, esta é uma teia de significados tecida pelo homem, que orienta sua existência. Trata-se de
um padrão de significados, representados na forma de símbolos, que interage em meio às relações
comunicacionais dos indivíduos de forma recíproca. O autor define símbolo como qualquer ato, objeto,
acontecimento ou relação que represente um significado.
As diferenças entre estas duas concepções possuem implicações profundas na pesquisa antropológica. Enquanto
a análise simbólica visa elucidar padrões de significado e interpretar os mesmos de forma incorporada às formas
simbólicas, a pesquisa orientada pela abordagem descritiva se volta à classificação e à análise científica,
interdependência funcional e mudanças evolutivas (LOPES, 2014).
Os opositores da concepção simbólica, como Thompson (2000), alegam a debilidade da mesma para considerar
questões relativas ao poder e ao conflito, a negligência aos contextos sociais onde se produzem e transmitem os
fenômenos culturais.
Este antropólogo buscou formular a chamada , a qual buscaria investigar osconcepção estrutural da cultura
contextos e processos historicamente específicos e socialmente estruturados nos quais formas simbólicas são
produzidas, transmitidas e recebidas (THOMPSON, 2000). Em tal ótica, os fenômenos culturais são percebidos
como formas simbólicas socialmente contextualizadas; enquanto que a análise cultural trata do estudo da
constituição significativa e da contextualização social das mesmas (LOPES, 2014).
A abordagem estrutural se difere da simbólica e apresenta uma vantagem analítica em relação à mesma,
portanto, ao enfatizar, ao mesmo tempo, o caráter simbólico dos fenômenos culturais e o fato de que esses
fenômenos estão sempre inseridos em contextos socialmente estruturados – que envolvem conflitos, relações de
dominação (muitas vezes cristalizadas no direito) e desigualdades na distribuição de recursos (LOPES, 2014).
A construção das abordagens simbólica, semiótica e estrutural da cultura foram responsáveis diretamente pela
ascensão do status elevado atribuído ao tema da cultura a partir da década de 1960. Um marco neste sentido é a
criação da área interdisciplinar dos , cujos principais colaboradores foram Raymond WilliamsEstudos Culturais
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e Stuart Hall. Com isto, a cultura passa a exercer um papel de destaque nas discussões acadêmicas e sociais
envolvendo a estrutura e a organização da vida cotidiana das pessoas, a partir da compreensão de que toda a
prática social, sendo prática discursiva, possui uma dimensão cultural (GODOY; SANTOS, 2014).
Na , o conceito de cultura diz respeito aos aspectos aprendidos e partilhados pelos membros daSociologia
sociedade e que permitem a comunicação e cooperação entre indivíduos e grupos. Ele se refere ao contexto em
que os eles vivem suas vidas e envolve tanto aspectos tangíveis (tecnologia, objetos, símbolos) como intangíveis
(valores, ideiase crenças) (GIDDENS, 2008).
Embora haja distinções conceituais entre os termos “cultura” e “sociedade”, há fortes conexões entre eles.
Sociedades são, nas palavras de Anthony Giddens (2008), sistemas de interrelações que envolvem coletivamente
um conjunto de indivíduos. Uma sociedade pode englobar milhões de pessoas ou apenas algumas dezenas delas,
mas o elemento que faz tanto uma gigantesca nação, quanto uma pequena tribo indígena ser conceituada com o
mesmo termo, é a organização destes dois conjuntos em relações sociais estruturadas a partir de uma cultura
comum. Desse modo, culturas não podem existir sem sociedades e vice-versa. Consequentemente, variações
culturais identificadas entre seres humanos se relacionam fortemente com as diferenças entre tipos de
sociedade diversos.
Todas as culturas se orientam por um conjunto de ideias abstratas ou valores, os quais atribuem significados e
orientam os indivíduos na interação com o mundo social, e que definem o que é importante, desejável ou útil
(GIDDENS, 2008). Os valores de uma determinada cultura usualmente são refletidos ou incorporados nas regras
de comportamento (normas) da sociedade, reforçando em mão dupla o comportamento das pessoas. Muitas
vezes, hábitos culturais estão de tal forma enraizados e naturalizados que sequer são percebidos como tais, e
podem persistir ainda que setores da sociedade em questão atuem ativamente para modificá-los.
Fique de olho
A tem como pressuposto de que uma cultura precisa ser estudadapesquisa sociológica
considerando os seus próprios valores e significados. Este é necessáriorelativismo cultural 
para que se evite uma conduta oposta e que pode ser danosa para a disciplina: o
etnocentrismo, ou seja, realizar juízos de valor acerca de culturas diferentes tendo como
medida de comportamento a cultura de origem do pesquisador. Tal procedimento envolve
desafios, especialmente em casos limítrofes que coloquem em questão comportamentos que
atentem a princípios centrais e fundamentais para outras culturas.
Como a cultura se refere a elementos que são aprendidos e não inatos, também interessa o
processo pelo qual os membros da sociedade aprendem e apreendem os modos de vida da
comunidade em que se inseriram. A socialização é o principal canal de transmissão cultural ao
longo do tempo, e se trata de um processo vitalício e contínuo de configuração do
comportamento humano através das interações sociais (GIDDENS, 2008) – aspecto temporal
este que também é decisivo na modificação gradual de hábitos e valores adotados
comunitariamente.
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A , embora seja processo fundamental de molde e influência do comportamento dos indivíduos, nãosocialização
anula a individualidade ou o livre arbítrio dos mesmos. Ela é vista como condição e origem da formação da
identidade dos seres humanos, que organiza o sentido e a experiência de suas vidas – quem eles são, o que é
importante para os mesmos e quais atributos eles reivindicam para si.
Em sociedades modernas de grande porte, também é comum que existam valores e ideias contraditórias e em
disputa, conflitos estes que não raro alcançam o terreno da política e do direito. Nesse aspecto, o elemento
demográfico contribui de forma decisiva: há uma tendência de que sociedades de grande porte apresentem
maior nível de diversidade cultural e, inversamente, que sociedades de pequena dimensão apresentem maior
uniformidade cultural. Neste caso, elas são chamadas de monoculturais (GIDDENS, 2008).
É importante ressaltar, contudo, que isso não é uma regra geral: sociedades com dezenas de milhões de
habitantes (como o Japão) podem apresentar menor diversificação que nações de menor porte, sobre as quais
incidiram fortes influências externas, imigração e integração econômica, bem como aquelas com grande
diversidade étnica interna (como diversos países ocidentais, a exemplo dos Estados Unidos).
Estes processos se intensificaram nas últimas décadas, fazendo emergir o que o sociólogo Anthony Giddens
denominou como culturas mistas, ou contribuindo para a proliferação de subculturas. Estas não se resumem a
grupos linguísticos ou étnicos minoritários em uma comunidade, mas se referem a “qualquer segmento da
população que se distinga do resto da sociedade em virtude dos seus padrões culturais” (GIDDENS, 2008, p. 25).
Ao mesmo tempo, também se verificam setores sociais que optam por rejeitar e/ou questionar parte das normas
e valores hegemônicos em uma determinada sociedade, valorizando condutas alternativas, o que se denominou
contracultura.
Diversos autores e correntes teóricas abordaram, sob óticas específicas, fenômenos relacionados à cultura nas
sociedades contemporâneas. Sem a pretensão de esgotar todas as abordagens relevantes no campo da Sociologia
a partir de meados do século XX, indicamos aqui algumas outras perspectivas influentes:
Desenvolvida pelos intelectuais da chamada Escola de Frankfurt. No que se refere aos estudos sobre a cultura,
formulou o conceito da cultura de massa, e uma crítica de longo alcance da indústria cultural – espaço que
promove a padronização e comercialização de expressões artísticas, transformadas em mais uma mercadoria –,
ambos fenômenos típicos das sociedades capitalistas contemporâneas
A noção desenvolvida pelo sociólogo francês se refere aos ativos sociais e conhecimentos culturais específicos
dos indivíduos aptos a conferir status social e poder aos mesmos numa sociedade estratificada.
comunitariamente.
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A noção desenvolvida pelo sociólogo francês se refere aos ativos sociais e conhecimentos culturais específicos
dos indivíduos aptos a conferir status social e poder aos mesmos numa sociedade estratificada.
Perspectiva de que os direitos culturais são exprimidos na defesa de atributos particulares, mas cuja defesa
possui um sentido universal. Nestes estariam inseridos, segundo o autor, diversas das chamadas lutas
“identitárias” modernas, de minorias étnicas, sociais, religiosas ou sexuais.
Figura 1 - Diversidae étnico-racial
Fonte: Rido, Shutterstock, 2020
- -9
2. Crime e desvio social
Como indicado anteriormente, a vida humana em comunidade envolve a adoção de uma série de valores e ideias,
que acabam por nortear o desenvolvimento de normas e regras de conduta nestas sociedades. Em certa medida,
trata-se de elemento essencial para a própria existência e sustentabilidade das sociedades. A depender do
arranjo e da complexidade dessas regras, elas podem assumir formas escritas ou não escritas, positivadas num
sistema legal ou seguidas pelo mero uso ou costume. De qualquer forma, elas delimitam quais condutas são
consideradas corretas ou não na vida social.
A adoção de determinadas regras implica, necessariamente, duas possibilidades aos indivíduos que a elas se
sujeitam: respeitá-las ou não. No segundo caso, caracteriza-se o comportamento desviante; tema de importância
central para o sistema jurídico e político estatal, e que historicamente atraiu o interesse do estudo sociológico
por conta de suas definições, características e de suas diversas implicações.
O pode ser definido, portanto, como ações ou omissões (praticadas individualmente ou em grupo) quedesvio
não estão de acordo com um certo conjunto de normas aceito por um número significativo de pessoas de uma
sociedade. A não conformidade às normas sociais tende a ser acompanhada por uma sanção, que corresponde a
qualquer reação de terceiros ao comportamento de um indivíduo ou grupo com o objetivo de assegurar o
cumprimento de uma norma (GIDDENS, 2008).
Assim como é virtualmente impossível que um indivíduo apresente um comportamento desviante total,
desrespeitando em sua integralidade as normas de sua comunidade, certamente também é extremamente
comum que pessoas rompam, parcial e ocasionalmente, com as regras de seu entorno.
De qualquer forma, este conceito tem grande amplitude e corresponde a um fenômeno que abarca uma
quantidade maior de condutas do que, por exemplo, o que é regulado pelo direito, espaço no qual se insereas
violações à lei e conceitos como o ato ilícito e o crime.
Nesse sentido, existem duas disciplinas que se voltam, de forma mais estrita, ao estudo do desvio social. A
Sociologia do desvio procura compreender a razão de certos comportamentos serem vistos como desviantes,
variações das noções relativas ao desvio numa comunidade, dentre outros temas, sem se resumir aos desvios
considerados ilícitos ou crimes pelo direito. Quando o objeto e o espaço da reflexão científica é o espaço dos
comportamentos sancionados pela lei, e mais especificamente abarcados pelo Direito Penal e o sistema de justiça
criminal, estamos no espaço da Criminologia.
Esta, assim como o , possui em seu interior teorias e abordagens metodológicas relevantes comDireito Penal
pouco contato com a Sociologia do desvio, como as de fundo psicológico ou psicanalítico; o estudo da microfísica
- -10
das relações sociais, a genealogia do poder e a análise da metamorfose dos métodos punitivos de Michel
 em Vigiar e punir (FOUCAULT, 1987), dentre outras. Nessa unidade, nos centraremos nas perspectivasFoucault
teóricas que influenciaram historicamente as três disciplinas.
2.1 Teorias e abordagens históricas sobre o desvio e o crime: a Escola 
Positivista
A primeira perspectiva de destaque que tangencia a Sociologia do desvio, a Criminologia e o Direito Penal é a
chamada . Esta se contrapôs à teoria clássica do Direito Penal ancorada na obra de CesareEscola Positivista
Beccaria e no Iluminismo, passando a abordar como objeto de estudo o criminoso e o seu comportamento. Logo,
o delito e o delinquente são considerados patologias sociais, devendo a pena ter um propósito utilitarista
(BITTENCOURT, 2013).
Seus principais nomes – os italianos Enrico Ferri, Raffaele Garófalo e, especialmente, Cesare Lombroso -,
defenderam a possibilidade de se identificar a existência de uma determinação biológica, inata, sobre o
fenômeno da delinquência. Ainda que a socialização pudesse influenciar na manifestação do comportamento
criminoso, certos indivíduos teriam traços físicos e anatômicos que poderiam ser identificáveis e associados à
criminalidade, associáveis a um estágio menos desenvolvido de evolução humana (BARATTA, 1999). O conteúdo
racista e evolucionista, de impacto político e social danoso até os dias atuais foi rechaçado pelas perspectivas
sociológicas posteriores. Ainda que a escola Positivista tenha contribuído para o fomento do olhar científico para
o fenômeno da criminalidade, este era concebido como um fenômeno ontológico, um dado da realidade anterior
à realidade social e que não se constituía a partir das definições desta.
- -11
2.2 Teorias do consenso: o funcionalismo
A partir da obra de Émile Durkheim desenvolveram-se as Teorias funcionalistas sobre o crime e o desvio,
também chamadas de . Para ele, as razões do desvio não envolvem fatores biológicos eTeorias do Consenso
naturais. Este fenômeno é visto como algo inerente à toda estrutura social, e passa a ser negativo apenas quando
se segue a este uma desorganização social de tal modo que provoque uma situação anômica (conceito que será
retomado na sequência da unidade). Dentro de limites funcionais, este tipo de comportamento é necessário para
o equilíbrio e o desenvolvimento social e cultural, ao impulsionar novos desafios no seio da comunidade e ao
contribuir para a manutenção de limites claros entre comportamentos saudáveis e danosos à mesma,
provocando respostas que reforcem a solidariedade do grupo (BARATTA, 1999; GIDDENS, 2008).
Esta visão foi parcialmente modificada por outros nomes célebres do campo das Teorias do consenso: as teorias
dos grupos subculturais e as de Robert Merton (referência da chamada Escola de Chicago). Este agregou a
influência da desigualdade econômica e de oportunidades no fenômeno criminal, alterando o conceito de
anomia, aqui considerada como uma tensão sobre o comportamento dos indivíduos frente ao conflito entre a
realidade social concreta, as normas aceitas e as práticas culturais valorizadas na sociedade. A partir disto,
formulou-se um modelo teórico com cinco modelos de adequação dos indivíduos no meio social, variando da
conformidade à rebelião.
- -12
2.3 Interacionismo e Teoria do etiquetamento
Outra tradição sociológica despontou a partir de meados do século XX, denominada . Esta foi ainteracionista
primeira a romper de forma marcada com a concepção ontológica do crime, rejeitando a noção de que há
condutas desviantes ou criminosas por natureza e passando a percebê-los como fenômenos socialmente
construídos (GIDDENS, 2008). Dentro desta perspectiva, destacam-se duas teorias. Primeiro, a da associação
diferencial, formulada por Edwin Sutherland, que sugeria que o desvio poderia ser aprendido por meio da
interação com outros em determinados ambientes, utilizando como fenômeno específico de análise os chamados
crimes de colarinho branco, cometido por indivíduos de classes sociais mais abastadas.
O interacionismo contribuiu para o desenvolvimento de outra perspectiva dotada de maior criticidade com o seu
objeto de análise: a , ou “labeling approach”. A “desnaturalização” do crime e doTeoria do etiquetamento
criminoso levou a questionamentos de implicações mais profundas relativas ao sistema de justiça criminal. O
foco desta abordagem passou a ser as instâncias legais e institucionais que definem o que é o delito; os
mecanismos de reação social a ele e ao criminoso; e quem são os indivíduos “rotulados” como delinquentes,
portanto, o estudo da criminalidade foi substituído pelos estudos da criminalização (ANITUA, 2007). Referência
de estudo que parte de tal perspectiva é o livro Outsiders, de Howard Becker, escrito entre os anos 1950 e 1960
(BECKER, 2008 [1963]).
Ainda que possua caráter notadamente contestatório e com pontos de contato com as teorias do conflito, a
abordagem do etiquetamento tinha um enfoque em processos microssociológicos, em detrimento de análises de
caráter estrutural e sistêmico. Logo, não tinha como objeto de análise os processos sociais de fundo que
condicionavam o fenômeno da violência e a organização da política criminal nas sociedades capitalistas
contemporâneas.
- -13
2.4 Teorias do conflito e a Crimnologia crítica
Com estes aspectos em mente, e partindo de premissas e marcos teóricos distintos dos funcionalistas e
interacionistas, surgiram a partir dos anos 1970 perspectivas teóricas voltadas à criminologia denominadas 
. Esta teoria partia geralmente. do pensamento marxista, e tinha como referências a relaçãoTeorias do conflito
direito, marxismo e sociologia. Dessa forma, após a publicação do livro The New Criminology, de Taylor et al
(TAYLOR et al., 2013 [1973]), fomentou-se um campo que sustentava que o desvio é uma opção deliberada e não
raro de natureza política; inserida numa sociedade em estado de constante tensão e luta pelo poder; e
estruturada de acordo com os interesses da classe dominante, sendo, assim, o sistema de justiça um dos meios
de controle da classe dominada.
Junto com outras perspectivas filosóficas, sociológicas e jurídicas também de alcance radical – associadas ao
existencialismo, ao pós-estruturalismo e ao pensamento anarquista -, elas o grupo associado à chamada
Criminologia crítica, cujas propostas oscilam entre a ampliação e estruturação de limites rígidos e especificados
à pretensão punitiva estatal; tendo ainda contatos com o positivismo jurídico (garantismo penal); passando pela
orientação jurídico-política de redução do direito penal; por uma política criminal afeita a meios não
encarceradores de responsabilização de condutas desviantes (minimalismo penal); até os postulados pela
abolição total da pena privativa de liberdade, da instituição prisão e, em sua instância mais radical, à abolição de
toda intenção punitiva - o abolicionismo penal (ANITUA, 2007).
Você já refletiu sobre a realidade do sistema de justiça criminal e das prisões brasileiras? No
gráfico sobre o aumento da população carceráriaentre 2005 e 2016, observamos que a
população carcerária brasileira quase dobrou em dez anos, passando de 401,2 mil para 726,7
mil, entre 2006 e 2016. Desde os anos 1990, podemos observar um processo de ampliação da
complexidade e da dureza da legislação penal e processual penal brasileira, ainda que o
processo não seja unívoco, com a ampliação de alternativas penais, hipóteses de medidas
cautelares e a instituição da audiência de custódia. Para compreender a política criminal
contemporânea brasileira, sugerimos o documentário brasileiro Sem Pena (Dir: Eugenio
Puppo, 2014), disponível no link: ).https://www.youtube.com/watch?v=b6RDgB8GVW8
https://www.youtube.com/watch?v=b6RDgB8GVW8
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2.5 Teorias atuariais e do controle social
Por fim, nas últimas décadas também se desenvolveram de modo mais destacado perspectivas radicalmente
distintas à Criminologia crítica e às Teorias do conflito: as . Estas usualmenteTeorias do controle social
ignoram os processos sociais que fornecem o contexto das atividades criminosas, partindo da premissa de que os
indivíduos agem racionalmente, atentos às oportunidades e ao custo-benefício da atividade criminosa. Ao
formular propostas de prevenção e repressão à criminalidade, o foco não é a reabilitação dos indivíduos,
direcionando-se a técnicas e dispositivos de dissuasão. A sua versão mais radicalizada é a chamada “política de
tolerância zero”, sendo uma de suas variações mais conhecidas a chamada “Teoria das Janelas Quebradas”,
implementada de forma controversa em Nova Iorque nos anos 1990. Outras perspectivas similares envolvem o
chamado “atuarialismo” - voltado à gerência do sistema penal efetivamente existente e ao controle de “grupos de
risco” -, o Direito Penal do inimigo, dentre outras.
As diversas perspectivas apresentadas acima permanecem em discussão e embate, seja no âmbito acadêmico, no
social ou no político – sendo que o direito, e, mais especificamente, o Direito Penal e a política criminal dos
Estados contemporâneos possuem dispositivos orientados pelas premissas de diversas teorias, em intensidades
distintas.
Figura 2 - Complexo policial de Teixeira de Freitas (BA)
Fonte: Rido, Shutterstock, 2020
- -15
3. Sociologia Funcionalista de Émile Durkheim
Agora, nos deteremos sobre as principais correntes da Sociologia clássica, abordando sua relação com o Direito.
Para tanto, veremos resumidamente como se fundaram os pensamentos de Émile Durkheim, Max Weber e Karl
Marx. Estes três teóricos podem ser considerados os mais importantes da Sociologia moderna e influenciam até
hoje outras tantas correntes teóricas em diversas áreas, tendo especial importância também para o estudo do
Direito.
Assista aí
https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2
/a4e8d3cbd0984e7ee815f3d4ee33c28e
O francês (1858-1917) produziu obra de vasto e permanente impacto no campo da Sociologia,Émile Durkheim
tendo contribuição central para a consolidação da disciplina e do caráter científico da mesma. O sociólogo
buscou analisar fenômenos da vida social com maior rigor e objetividade em relação a outros pioneiros da área,
como Auguste Comte, e implementou procedimentos científicos ancorados no empirismo, que conferiram à
Sociologia uma discussão metodológica mais adequada e aprofundada.
A Sociologia, na visão durkheimiana, é definida como a ciência da gênese e do funcionamento das instituições,
sendo estas todas as crenças e comportamentos instituídos pela coletividade, as quais exercem funções que
permitem a estabilidade e manutenção no tempo da coesão social (QUINTANEIRO et. al., 2003).
https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/a4e8d3cbd0984e7ee815f3d4ee33c28e
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3.2 Durkheim e fato social
Na obra de Durkheim, o conceito de é primordial para compreendermos o arcabouço teóricofato social
produzido pelo autor. Para ele, fatos sociais são formas de agir e pensar externas aos indivíduos, aspectos da
vida social que determinam ou condicionam a ação dos mesmos por diversas formas (DURKHEIM, 1999;
GIDDENS, 2008). Isto se dá devido ao fato dos fatos sociais exercerem um poder coercitivo sobre os indivíduos,
ainda que isso por muitas vezes ocorra de modo imperceptível ou naturalizado.
O autor parte da perspectiva de que a sociedade não é resultado da soma ou da justaposição dos indivíduos que a
compõem, mas uma síntese de ações e sentimentos particulares que criam um fenômeno específico e novo. Por
esta razão, as explicações para os fatos sociais devem ser buscadas na coletividade. Os exemplos de fatos sociais
envolvem desde fenômenos consolidados e de grande dimensão, como a economia e a religião, até aqueles
fluidos e efêmeros, como movimentos sociais, correntes de pensamento e formas de expressão.
Dentre as expressões do conjunto de fatos sociais, estão as representações coletivas e os valores. Um dos
elementos a comprovar o fato de que aqueles tem caráter coercitivo e são externos aos indivíduos, Durkheim
lembra que o não atendimento a estas convenções pode implicar diversos obstáculos, como a violação a uma lei.
Entretanto, instituições são passíveis de mudança desde que um grupo de indivíduos, em ação combinada,
apresentem comportamentos inovadores e produzam um produto novo que se constitua como um fato social
(QUINTANEIRO et. al., 2003). Uma das formas de cristalização e reconhecimento desta mudança pode ser a
alteração de normas jurídicas.
Ainda que nas palavras do próprio autor “a primeira regra e a mais fundamental é considerar os fatos sociais
como coisas” (DURKHEIM, 2003, p. 15), estes são intangíveis e não observáveis diretamente. A pesquisa e a
análise dos mesmos se dão por meio de uma investigação indireta, dos seus efeitos e de outras formas de
representação dos mesmos, como, por exemplo, a Constituição e as leis (no Direito) e os textos sagrados (no caso
das religiões).
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3.2 Solidariedade mecânica e orgânica
Dentre os maiores interesses de pesquisa do sociólogo francês estava a compreensão de quais elementos eram
responsáveis pela manutenção (ou pela quebra) da solidariedade e da ordem nas sociedades. Em sua visão, a
primeira se mantém “quando os indivíduos se integram com sucesso em grupos sociais e se regem por um
conjunto de valores e costumes partilhados” (GIDDENS, 2008, p. 9).
Durkheim (1999) destacou, em sua conhecida obra Da Divisão Social do Trabalho, a existência de dois tipos de
solidariedade, as quais estariam diretamente relacionadas com a forma de divisão do trabalho em uma
determinada sociedade: a .solidariedade mecânica e a solidariedade orgânica
A primeira, característica de culturas mais tradicionais (ou primitivas) e de menor especialização e divisão do
trabalho – onde os indivíduos possuem ocupações laborais semelhantes –, estaria sustentada na homogeneidade
e no consenso em relação a crenças e costumes. A dissidência no interior destas sociedades seria reprimida pela
comunidade por meio da força e do castigo aos indivíduos que não se adequam.
A solidariedade orgânica, por sua vez, teria se desenvolvido em meio à rápida e profunda transformação social e
econômica nas sociedades ocidentais, em meio aos processos de industrialização, complexificação econômica e
urbanização. O desenvolvimento da sociedade capitalista implica na intensificação da interdependência
econômica entre os indivíduos, ampliando relações de reciprocidade e reduzindo a importância de se partilhar
crenças e costumes específicos.
Um dos principais meios de se observar a predominância de um ou outro tipo de solidariedade nas sociedades
contemporâneas seria, para Durkheim, o Direito. Segundo Quintaneiro et al. (2003, pp. 74-75):
Durkheim utiliza-se da predominância de certas normas do Direito como indicador da presença de
um ou do outro tipo de solidariedade, já que esta, por ser um fenômeno moral,não pode ser
diretamente observada. Não obstante se sustente nos costumes difusos, o Direito é uma forma
estável e precisa, e serve, portanto, de fator externo e objetivo que simboliza os elementos mais
essenciais da solidariedade social. Por outro lado, as sanções que são aplicadas aos preceitos do
Direito mudam de acordo com a gravidade destes, sendo assim possível estudar suas variações. O
papel do Direito seria, nas sociedades complexas, análogo ao do sistema nervoso: regular as funções
do corpo. Por isso expressa também o grau de concentração da sociedade devido à divisão do
trabalho social, tanto quanto o sistema nervoso exprime o estado de concentração do organismo
gerado pela divisão do trabalho fisiológico, isto é, sua complexidade e desenvolvimento. Enquanto as
sanções impostas pelo costume são difusas, as que se impõem através do Direito são organizadas.
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Elas constituem duas classes: as repressivas - que infligem ao culpado uma dor, uma diminuição,
uma privação; e as restitutivas - que fazem com que as coisas e relações perturbadas sejam
restabelecidas à sua situação anterior, levando o culpado a reparar o dano causado. A maior ou
menor presença de regras repressivas pode ser atestada através da fração ocupada pelo Direito
Penal ou Repressivo no sistema jurídico da sociedade
A velocidade e intensidade destes processos na modernidade, porém, tem o poder de abalar costumes, valores e
padrões de conduta (religiosos, morais etc.), sem que um outro arranjo ocupe estes espaços de forma decisiva,
inclusive para direcionar ou circunscrever a conduta dos indivíduos. Este vazio de sentidos e objetivos em meio
à vida social moderna é o que caracterizaria a para o sociólogo francês.anomia
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3.3 Anomia e normas morais: o suicídio e a religião
Esta perspectiva orientou o conceituado estudo do autor a respeito do fenômeno do suicídio na obra O Suicídio,
publicada pela primeira vez em 1897. Mais do que um ato pessoal e orientado pela angústia ou pelo
desequilíbrio mental estrito dos indivíduos que o cometem, Durkheim optou por analisar esse ato como um fato
social, passível de possuir padrões gerais observáveis e influenciado por fatores sociais. Em sua pesquisa, ele
confirmou sua expectativa: verificou que determinados segmentos estavam mais vulneráveis ao suicídio do que
outros: protestantes mais do que católicos, ricos mais do que pobres, homens mais do que mulheres. Além disso,
guerras e mudanças econômicas também afetavam sensivelmente as estatísticas (DURKHEIM, 2000).
Estes aspectos reforçaram a posição do autor sobre a condição anômica em relação à perda de pontos de
referência e de fontes de regulação social, bem como a importância do enfraquecimento de laços sociais no caso
dos chamados suicídios egoístas. Reforçou, portanto, a perspectiva de que fatores sociais externos ao indivíduo
interferem de forma significativa em condutas antes vistas como atos estritamente pessoais. E que esta
influência podia ser investigada por meio da análise sociológica.
Também interessava ao autor a análise das normas morais das sociedades, que prescreveriam o modo como o
sujeito deve se portar em determinadas circunstâncias e tem uma finalidade desejável e desejada por parte
daqueles que se sujeitam a elas.
Em sociedades menos complexas, a moral cívica teria maior nível de associação com a religião pública, levando,
portanto, a um nível maior de controle e disciplina de seus indivíduos. As sociedades modernas, por sua vez,
apresentam maior nível de complexidade, nas quais o Estado possui grande variedade de funções, mas convive
com outros grupos (família, corporações, instituições religiosas). Nesta associação tendente ao equilíbrio,
desenvolvem-se as liberdades individuais.
A partir desta análise e reflexões, Durkheim empreende o estudo das religiões. O autor analisou especialmente
aquelas praticadas em sociedades menos complexas, compreendidas como um sistema de crenças e práticas
relativas às coisas sagradas que é comum a todos aqueles que se unem numa comunidade moral, chamada por
ele de igreja (DURKHEIM, 1996).
Durkheim erigiu, portanto, um pensamento ancorado no método positivista e confiante na capacidade de
convivência de indivíduos e grupos distintos nas sociedades modernas. Sua teoria do consenso e o funcionalismo
foram especialmente influentes na antropologia e na sociologia norte-americana, aspecto que fora brevemente
exemplificado na seção anterior.
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4 Sociologia compreensiva de Max Weber
Assista aí
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/4c0979076e27318631d862ac07c0dfbe
A obra do alemão (1864-1920) abarcou diversas áreas do conhecimento, como Direito, Filosofia eMax Weber
História, sendo influente também em disciplinas que se desenvolveriam de forma mais nítida apenas
posteriormente, como a Ciência Política. Entretanto, o autor refletiu acerca do papel e do objeto do estudo
sociológico, buscando estabelecer a Sociologia como uma disciplina preocupada com a diferença e a
particularidades culturais e sociais.
Em seu texto A Ciência como Vocação, Weber discorre sobre o significado da ciência – vista como procedimento
racional empreendido para explicar as consequências de determinados fenômenos –, e a respeito da postura do
cientista frente ao seu ofício (WEBER, 2011). Este deve, em sua visão, selecionar e sugerir medidas com
finalidade de solucioná-las, buscando respostas por meio do uso dos instrumentos metodológicos mais
adequados (QUINTANEIRO et. al., 2003).
O sociólogo alemão também discorreu sobre a relação entre valores que orientam o pesquisador e a pretensão
de objetividade nas Ciências Sociais, ao considerar que os “valores devem ser incorporados conscientemente à
pesquisa e controlados através de procedimentos rigorosos de análise” (QUINTANEIRO et. al., 2003, p. 99). Uma
atividade científica social que seja racional quanto às suas finalidades e valores não pode reduzir a realidade
empírica a leis; a explicação de um determinado acontecimento envolve o agrupamento, por parte do cientista,
do agrupamento da constelação de fatores que deem sentido ao mesmo.
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4.1 Tipo ideal, ação social e relação social
Para tornar compreensível a natureza das conexões que se estabelecem na observação científica empírica,
Weber parte de um modelo de interpretação e investigação chamado , caracterizado pelatipo ideal
unilateralidade, racionalidade e caráter utópico. Como resumido por Quintaneiro et al. (2003, p. 103), na
concepção weberiana “um conceito típico-ideal é um modelo simplificado do real, elaborado com base em traços
considerados essenciais para a determinação da causalidade, segundo os critérios de quem pretende explicar um
fenômeno”. De forma resumida, Weber vê o tipo ideal como um “recurso técnico que facilita uma disposição e
terminologia mais lúcidas” (WEBER, 1979, p. 372), instrumento útil para conduzir o autor na investigação de
uma realidade complexa e multifacetada.
Em Economia e Sociedade, Weber (2004a) desenvolve em maior profundidade o conceito de , centralação social
em sua obra. A ação – conduta humana dotada de significado pelo indivíduo que a executa –, passa a ser definida
como uma ação social quando esta se orienta para a ação de outros (seja um indivíduo, grupo específico ou a
coletividade), de modo que tal conduta social tenha seu sentido partilhado. Esta noção é tão importante para a
Sociologia weberiana que, na perspectiva do autor, a função do sociólogo é precisamente compreender e
interpretar as ações sociais, observando suas características, efeitos, e verificando nexos causais que as
determinam.
Como desdobramento da lógica dos tipos ideais, o sociólogo desenvolveu quatro elaboraçõesconceituais para
classificar as ações sociais.
Classificação
das ações
sociais
Ação social afetiva: a conduta é movida por sentimentos, emoções e instintos .
Ação social tradicional: tem como fontes motivadoras costumes ou hábitos arraigados -
ligados à cultura consuetudinária –, ou a reação a estímulos usuais e naturalizados.
Ação social racional com relação a valores, o agente se orienta conscientemente por
crenças, convicções e princípios próprios.
Ação social racional sem relação a fins: tomada com o mínimo de interferência de tradições
e afetos, com alto grau de reflexão da adequação entre meios e fins.
Weber ressalta, contudo, que estes são modelos conceituais ideais/puros, e que as ações humanas geralmente se
encaixam em mais de uma das categorias acima mencionadas. Ressalta ainda que elas não se confundem com
ações reativas, instintivas, de imitação ou outras onde não há relação de sentido.
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Quando uma conduta social é plural e tem seu sentido ou significado partilhado e compreendido por diversos
atores em uma sociedade, passa a se constituir uma relação social. Esta pode se estabelecer independentemente
da correspondência por uma das partes ou da duração desta relação, desde que haja compatibilidade entre as
expectativas dos indivíduos sobre o significado da mesma. Instituições como o Estado ou a família, para Weber,
se caracterizam por ser desenvolvimentos específicos da ação social de indivíduos.
A regularidade de certas condutas e relações pode ocorrer devido simplesmente a um hábito - que é classificado
como uso -, que, quando duradouro, torna-se um costume.
Em consonância com esta posição, a unidade fundamental da análise sociológica weberiana é o
agente individual – concepção também denominada de individualismo metodológico. Esse
conceito parte do pressuposto de que as consciências sociais são entidades capazes de conferir
significado às próprias ações, e que estes sentidos podem ser compartilhados por um grupo de
indivíduos (QUINTANEIRO et. al., 2003). É por meio das ações e sentidos que os agentes
conferem às esferas da vida social que estas podem ter sua lógica modificada.
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4.2 Direito, poder, dominação e autoridade na Sociologia Weberiana
Por outro lado, um modelo de conduta pode adquirir legitimidade quando é considerado válido para um ou mais
agentes, seja por receio de reprovação da comunidade pela discordância a outro, caso no qual este modelo é
denominado convenção. Ou por receio de se tornar uma ordem pela ameaça de coação ou sanção pelo
descumprimento do que é visto como obrigação. Neste caso, a ordem é o direito.
Aqui se inserem as questões no pensamento weberiano, chaves parado poder, da dominação e da autoridade
o estudo sociológico. O poder para Weber significa a probabilidade, em uma relação social, de impor a vontade
própria ao comportamento de terceiros, ainda que em face de resistência, e independente do fundamento de tal
probabilidade (WEBER, 2004a). Os meios utilizados para alcança-lo são variados, abarcando desde a violência
até procedimentos organizados.
Há três formas de justificação da dominação legitimada: racional (dependente dos interesses, avaliações de
vantagens e desvantagens no ato de obedecer); tradicional (orientada pelo costume, hábito); e afetiva (fundada
em afetos ou inclinações pessoais em relação à liderança). A elas correspondem os três tipos de dominação
legítima: .legal, tradicional e carismática
A primeira, relacionada à estrutura de dominação pela forma burocrática, é o domínio exercido pela
administração moderna e racionalmente organizada do Estado. Nela a legitimidade se estabelece através da
crença na legalidade das normas estatuídas e dos direitos de mando dos que exercem a autoridade (WEBER,
2004a).
A luta pelo estabelecimento de uma forma de dominação legítima - de conteúdos considerados válidos pelos
participantes das relações sociais -, marca a evolução de cada uma das esferas da vida coletiva em particular e
define o conteúdo das relações sociais no seu interior (QUINTANEIRO et. al. 2003). A dominação não é um
fenômeno exclusivo da esfera política, mas engloba e envolve a organização de regras para a mesma. O autor
acresce, ainda, que nas relações entre dominantes e dominados a dominação costuma apoiar-se e fundar sua
legitimidade interna em bases jurídicas. O abalo da crença nesta legitimidade pode acarretar consequências de
grande alcance.
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4.3 Classes, estamentos e partidos
Segundo a concepção weberiana de sociedade, as diversas esferas da vida coletiva – econômica, política, jurídica,
religiosa, cultural e social –, possuem lógicas particulares de funcionamento. Em diferentes momentos históricos,
alguma (s) dessa (s) esfera (s) possuía dominância na definição das diferenças sociais. Nas sociedades
capitalistas modernas o econômico (propriedade, riqueza) é o fundamento da posição especial, o principal
elemento de classificação dos indivíduos.
Classes, estamentos e partidos são conceitos estabelecidos pelo sociólogo alemão no plano coletivo para
entender mecanismos diversos de distribuição de poder. Uma classe é um grupo de indivíduos que se encontram
numa situação comum referente à propriedade de bens ou de trabalho. As ações de tais agentes têm um sentido
definido, de forma comum, pela posição deles no mercado (WEBER, 2004a).
Quando as ações individuais são condicionadas por critérios da ordem social, na aderência a modos de vida
específicos e definidos, aí se estabelece a relação estamental. Estes estamentos podem ser fechados – quando sua
posição se define por laços familiares, por exemplo –; ou abertos, sustentados por sentimentos comunitários ou
de honra. Classes e estamentos tendem a se superpor, mas isto não ocorre em todas as ocasiões: tensões nesse
sentido podiam ser verificadas tanto na época de Weber, entre a nobreza europeia tradicional, legada do período
feudal, e a nova burguesia enriquecida; como hoje, nos atritos entre burguesia tradicional e os novos ricos.
Membros de uma mesma classe, entretanto, geralmente empreendem ações sociais enquanto grupo baseados em
interesses racionais em respeito a fins. Os conflitos e diferenças gerados na ordem econômica entre classes e na
ordem social entre os estamentos produzem, na esfera do poder social, os partidos. Estes são organizações que
têm ação tipicamente racional e lutam pelo domínio da direção em uma associação ou comunidade (WEBER,
2004a; QUINTANEIRO et. al., 2003). Se dirigem a fins estabelecidos e à realização de programas de propósitos
ideais ou materiais definidos.
Classes, estamentos e partidos são, portanto, fenômenos de distribuição de poder no seio das sociedades e
manifestações organizadas da luta cotidiana travada no interior destas pela imposição dos interesses e vontades
de algumas das partes contra outras. Na visão weberiana, esta é a essência da política, da vida social e da lógica
do mercado.
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4.4 Desencantamento do mundo, religião e resignação
A obra de Max Weber, por outro lado, também é marcada com um tom pessimista e resignado com o que ele via
como consequências inevitáveis do processo de racionalização progressiva e burocratização modernas. A
rotinização e racionalização ocorrem com tal força que mesmo lideranças carismáticas de cunho político ou
religioso acabam sendo assimiladas pela “lógica férrea das instituições” (QUINTANEIRO et. al., 2003). Este
processo de migração de sociedades marcadas pela ideia do sagrado, mágico e da espiritualidade para aquelas
marcadas pela técnica e a ciência e orientada à materialidade é chamado de .desencantamento do mundo
O autor se interessou pela Sociologia da religião ao perceber a relevância e o impacto das doutrinas religiosas em
outras áreas da vida coletiva, especialmente por conta das consequências práticas da religiosidade no tecido
social. Ao estudar religiões não-cristãs, como o confucionismo e o budismo, Weber se interessou especialmente
pela capacidade de algumas religiões de,a partir de seu conteúdo, fomentar o racionalismo prático e metódico
na conduta cotidiana dos indivíduos. Essas religiões seriam marcadas pelo ascetismo mundano à participação
nos processos da vida, orientando seus impulsos naturais à doutrina religiosa.
Nesta lógica se insere a famosa obra A Ética Protestante e o Espírito do Capitalismo, escrita pelo autor em
edições de 1905 e 1920. Se o desenvolvimento do Capitalismo estava vinculado à racionalização na vida prática,
Weber identificou uma afinidade entre as disposições práticas dos indivíduos que se orientavam pela doutrina
protestante calvinista. Esta rejeitava a contemplação, os instintos e prazeres instintivos, valorizando a atividade
incessante e o trabalho como valor em si mesmo. Tal disposição implicava, na ordem econômica, na profunda
dedicação de empresários orientados por essas doutrinas à produção de riqueza e de trabalhadores
disciplinados (WEBER, 2004b).
A valorização espiritual da prosperidade na vida terrena, associada com a restrição do consumo em paixões
mundanas, teria provocado como consequência concreta a acumulação capitalista e a poupança privada
(WEBER, 2004b). Esse “espírito religioso” que favoreceu o desenvolvimento capitalista tornou-se desnecessário
com o posterior desenvolvimento do sistema, também admitindo a busca de riquezas para a saciedade de
interesses materiais “mundanos”.
A concepção “liberal desencantada” weberiana permanece fortemente influente nas Ciências Sociais,
contribuindo para a compreensão dos contínuos processos de burocratização e racionalização na vida social,
inclusive com a ampliação, complexificação e variedade dos aspectos abarcados pelo Direito, a regulação e a
normatividade na Contemporaneidade.
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5 Sociologia crítica de Karl Marx
Karl Marx (1818-1883) é um autor cuja obra não pode ser ligada a apenas uma área do conhecimento ou
disciplina específica. O alemão, cujas referências teóricas e de pesquisa principais podem ser identificadas na
filosofia hegeliana, na economia clássica inglesa (especialmente Adam Smith e David Ricardo) e no socialismo
utópico francês – para divergir, em pontos distintos, de todos estes –, produziu extensos escritos nos ramos da
Filosofia, da Economia e, no que interessa em especial para este tópico, produziu importantes reflexões
sociológicas. A militância política e social e os interesses de pesquisa de Marx o levaram a refletir e teorizar
acerca do surgimento e do desenvolvimento do Capitalismo na .Modernidade
- -27
5.1 Materialismo histórico: forças produtivas, relações sociais de produção 
e superestrutura jurídico-política
O filósofo e sociólogo desenvolveu a , por meio da qual orientouconcepção materialista e dialética da História
seu olhar para a sociedade burguesa moderna, sem deixar de fazer a análise histórica de sistemas sociais
anteriores. A tese que orienta o , nas palavras de Friedrich Engels, grande amigo ematerialismo histórico
colaborador em vida de Marx, é a de que “a produção, e com ela a troca dos produtos, é a base de toda a ordem
social” (ENGELS, 2011, p. 55). Neste esquema teórico, três conceitos são centrais: as forças produtivas, as
.relações sociais de produção, e a superestrutura jurídico-política
O conceito de forças produtivas em Marx, como abordado na Contribuição à crítica da economia política, envolve
os recursos produtivos físicos para o trabalho humano -instrumentos, matérias primas, espaço físico (os meios
de produção), e a força de trabalho -, o que inclui não apenas a força física dos indivíduos, mas também
habilidades e conhecimento técnico aplicados no trabalho (COHEN, 2010). Envolve, portanto, o modo como os
indivíduos obtém, num contexto específico, os bens de que necessitam.
As relações sociais de produção, por sua vez, dizem respeito às formas estabelecidas de distribuição dos meios
de produção e do produto e o tipo de divisão social do trabalho numa sociedade, em um período histórico
determinado. Expressa as relações sociais que os indivíduos precisam se inserir para sobreviver e produzir.
Apesar da sociedade ser o produto da ação recíproca dos homens, esta não opera de acordo com seus desejos
particulares.
Desse modo, a estrutura de uma sociedade dependeria do estado de desenvolvimento de suas forças produtivas,
em primeiro lugar; e das relações sociais de produção que lhes são correspondentes (QUINTANEIRO et. al.,
2003). Este arranjo material é a base que orienta e sustenta a superestrutura jurídica e política dessas
sociedades, bem como as expressões ideológicas e culturais das mesmas.
A transformação dos sistemas sociais, em tal configuração, ocorre quando se modificam as condições das forças
produtivas e, em seguida, das relações de produção de uma determinada sociedade, gerando tensionamentos
com a superestrutura jurídico-política da mesma. Conflito este que pode se desdobrar de forma gradual ou por
meio de uma mudança abrupta: as revoluções.
Marx verificou este quadro ao analisar historicamente a passagem das sociedades de caçadores-coletores para
os sistemas escravagistas arcaicos, seguida da transição para o Feudalismo e, por fim, da substituição deste pelo
Capitalismo. O desenvolvimento da burguesia com a ampliação e a complexificação das relações comerciais,
associadas ao impulso tecnológico essencial representado pela Revolução Industrial iniciada na Inglaterra no
século XVIII, seguida por outras nações europeias no início do século seguinte, modificou de forma decisiva o
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arranjo social. A ordem feudal e a hegemonia da nobreza fundiária foram suplantadas, consolidando-se uma
nova ordem social.
Especialmente no Capitalismo, as relações de produção são relações de poder econômico sobre a força de
trabalho e os meios de produção, de cujo privilégio alguns gozam, enquanto os demais carecem (COHEN, 2010).
Sobre esta infraestrutura, erige-se uma superestrutura jurídico-política que é formada em função daquela. Isto
significa que a explicação das formas jurídicas, políticas e das ideias que circulam numa sociedade se encontra na
base econômica e material da mesma. Em tal problemática, insere-se o Direito: o sistema de normas de conduta e
princípios regente sob uma sociedade capitalista se orienta para a cristalização e regulação de direitos de
propriedade e relações comerciais sob este sistema econômico, geralmente sob a forma do contrato.
A respeito da visão marxista sobre o Direito burguês, Karl Marx questionou em escritos como
Sobre a Questão Judaica, a concepção de que a emancipação política e a garantia do voto na
sociedade civil burguesa teriam o condão de solucionar as demandas populares. Nesse
contexto, as cartas de direitos surgidas no contexto iluminista se orientavam por uma ótica
burguesa, restrita a direitos civis e políticos e de caráter excludente e individualista. Marx tem
um objetivo mais profundo: deseja a emancipação humana, a qual não será atingida com a
pretensa inclusão de uma população no Estado burguês da época, mas com o reconhecimento
e organização, por parte dos homens, de suas forças próprias como forças sociais (MARX,
2010). As interpretações acerca da relação do marxismo com o Direito ensejaram grandes
controvérsias nos movimentos socialistas e comunistas que reivindicavam o legado do autor
alemão: desde perspectivas favoráveis à possibilidade de um “Direito socialista”, como Petr
Stutchka, àqueles que consideravam o Direito como a forma jurídica específica do modo de
produção capitalista, associando a primeira à forma mercadoria, como Evgéni Pachukanis.
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5.2 Capitalismo: estruturação econômica e social
Marx se dedicou extensamente à análise do – para ele, a forma de organização mais desenvolvida eCapitalismo
complexa existente até aquele momento histórico –, na sua grande obra O Capital, a qual o autor terminou de
escrever apenas o primeiro volume.
A unidade analítica base da sociedade capitalista e expressão da riqueza da mesma é a , forma que émercadoria
assumida pelos produtos epela força de trabalho e compõe-se pelo valor de uso - necessita ser útil e se efetivar
no consumo -, e valor de troca. O valor desta última é medido pelo tempo de trabalho socialmente necessário
para sua produção em um momento determinado (MARX, 2013).
Neste sistema, o é uma noção essencial: trata-se de qualquer ativo financeiro que possa ser utilizado oucapital
investido para produção e reprodução de bens. Aqueles que detém esses meios de produção em abundância são
os capitalistas, a classe burguesa, e eles ocupam a posição de dominância na sociedade moderna.
Os proprietários dos obtêm lucro por meio da apropriação do esforço dos indivíduos quemeios de produção
oferecem sua força de trabalho. Ao observar esta relação, o autor alemão desenvolveu o conceito de :mais-valia
quando a força de trabalho do trabalhador, negociada com o capitalista, produz mais riqueza do que seu próprio
valor de troca, na qual se obtém um valor que é superior ao dos fatores (meios de produção e força de trabalho)
consumidos no processo produtivo (QUINTANEIRO et. al., 2003).
Os grupos e indivíduos que não possuem estes ativos, mas necessitam de encontrar formas para sua
subsistência, se veem obrigados a oferecer sua força de trabalho aos detentores dos meios de produção, um
contrato que lega ao trabalhador o salário como contrapartida. Esta classe, a mais numerosa, surgiu
especialmente por meio da migração de antigos camponeses que migraram para as cidades por conta de
mudanças na regulação da terra no meio rural, devido ao cercamento dos campos. Os agora trabalhadores nas
indústrias capitalistas acabaram por formar o que Marx denominou proletariado, a classe operária industrial
urbana.
O capitalismo erigiu, portanto, um marcado pelo conflito entre burguesia e proletariado,sistema de classes
numa relação de mútua dependência, mas na qual os últimos se localizam numa situação de exploração e
alienação estrutural. Para Marx, nesse sistema, os trabalhadores têm controle restrito ou nulo sobre o trabalho
que exercem e de suas condições, estando numa condição de dominação por forças da sua própria criação, de
modo a encarar o produto de seu trabalho como um poder estranho (MARX, 2008).
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5.3 Luta de classes, revolução e comunismo
Partindo desta abordagem, Marx concluiu que “toda a história humana é, até o momento, a história da luta de
” (MARX, 1998) – uma classe é um conjunto de membros de uma sociedade identificados porclasses
compartilhar certas condições objetivas (QUINTANEIRO et. al., 2003). Na configuração do capitalismo, temos um
modelo em cuja base estão, de um lado, os proprietários dos meios de produção, e, de outro, os que não os
possuem. Entretanto, quando Marx empregou seu materialismo histórico para analisar os acontecimentos
políticos de seu tempo, como em O 18 Brumário de Luís Bonaparte, o autor identificou a presença de outras
classes sociais relevantes para a análise da conjuntura.
O modelo de sociedade que se estabeleceu após o Feudalismo, portanto, teriam apenas substituído as velhas
condições de opressão por outras novas, mantendo o contexto de luta de classes. Para Marx, assim como ocorreu
nos modelos anteriores, o Capitalismo estaria fadado ao seu esgotamento, devido às contradições inerentes ao
sistema, entre as forças produtivas que emergem do mesmo e seu choque com as relações de produção, ou
superestrutura, que acabariam por perpetrar um processo de revolução social.
O proletariado, criado pelo Capitalismo e mantido em posição de exploração e alienação, é o agente
transformador desta sociedade, força produtiva e a classe verdadeiramente revolucionária, a qual, por meio da
consciência de sua situação social e a organização, tem as condições de abolir a propriedade privada dos meios
de produção e abolir a sociedade civil burguesa estruturada em função desta.
As características e a estrutura da futura sociedade comunista – e a socialista, estágio de transição posterior à
revolução -, não foram tratados exaustivamente por Marx, que delineou alguns princípios e premissas destas
sociedades em sua Crítica do Programa de Gotha, de 1871.
A sociologia crítica marxista, assim, não apenas questiona teoricamente as premissas e o funcionamento do
sistema capitalista, mas também problematiza a postura dos intérpretes sociais anteriores e os de seu tempo,
adotando uma postura militante e orientada à intervenção na realidade efetiva. Como dito pelo autor nas Teses
sobre Feuerbach: “os filósofos (...) interpretaram o mundo de diferentes maneiras; do que se trata é de
transformá-lo” (MARX, 2001, p. 103).
Ainda que Marx não tenha se preocupado especificamente com a consolidação da Sociologia como uma disciplina
e ciência autônomas, o autor é considerado um dos autores clássicos da Sociologia graças à profunda influência
de sua teoria e métodos de análise da realidade social na produção sociológica, e ao grande impacto social e
político do pensamento marxista, tendo produzido um extenso e duradouro legado sociológico.
- -31
é isso Aí!
Nesta unidade, você teve a oportunidade de:
• Aprender as principais perspectivas no campo da Antropologia a respeito do conceito de cultura 
(clássica, descritiva, simbólica, estrutural), bem como às relações entre cultura e sociedade no campo da 
Sociologia.
• Analisar as abordagens históricas dadas ao desvio social, considerado amplamente, e suas manifestações 
no Direito na forma do delito e do crime.
• Compreender os principais aspectos relativos à produção teórica de três dos maiores e mais influentes 
nomes das Ciências sociais: Émile Durkheim, Max Weber e Karl Marx, bem como as implicações das 
reflexões destes autores para o Direito e a Sociologia Jurídica.
Referências
ANITUA, G. I. História dos Pensamentos Criminológicos. Rio de Janeiro: Revan, 2007,
BARATTA, A. Criminologia Crítica e Crítica ao Direito Penal. Rio de Janeiro: Revan, 1999.
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	Olá!
	Indivíduo, cultura e sociedade
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	Abordagem antropológica da cultura
	2. Crime e desvio social
	2.1 Teorias e abordagens históricas sobre o desvio e o crime: a Escola Positivista
	2.2 Teorias do consenso: o funcionalismo
	2.3 Interacionismo e Teoria do etiquetamento
	2.4 Teorias do conflito e a Crimnologia crítica
	2.5 Teorias atuariais e do controle social
	3. Sociologia Funcionalista de Émile Durkheim
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	3.2 Durkheim e fato social
	3.2 Solidariedade mecânica e orgânica
	3.3 Anomia e normas morais: o suicídio e a religião
	4 Sociologia compreensiva de Max Weber
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	4.1 Tipo ideal, ação social e relação social
	4.2 Direito, poder, dominação e autoridade na Sociologia Weberiana
	4.3 Classes, estamentos e partidos
	4.4 Desencantamento do mundo, religião e resignação
	5 Sociologia crítica de Karl Marx
	5.1 Materialismo histórico: forças produtivas, relações sociais de produção e superestrutura jurídico-política
	5.2 Capitalismo: estruturação econômica e social
	5.3 Luta de classes, revolução e comunismo
	é isso Aí!
	Referências

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