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1 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 Demência • Transtorno Cognitivo Maior (TCM), caracterizado por uma alteração da capacidade de pensar ou da função intelectual afetando funções da vida pessoal. • A demência é mais comumente uma condição progressiva, embora possa haver demências estáticas ou que apresentem remissão. • Na síndrome demencial, assim como na síndrome amnéstica, a memória está significativamente afetada; no entanto, o prejuízo cognitivo é global. E, diferentemente do delirium, não há rebaixamento do nível da consciência. • Nas demências, há um empobrecimento e uma simplificação progressiva de todos os processos psíquicos, cognitivos e afetivos. Especialmente empobrecida é a capacidade de organização tanto no pensamento como no sentir. Há, em consequência disso, uma perturbação básica da capacidade de crítica e julgamento. • Cada um dos transtornos demenciantes pode ter seus primeiros sintomas ocorrendo em uma ampla faixa de idade de início. • Toda demência pode ocorrer em forma hereditária (familiar) ou variedades esporádicas. Até mesmo muitas das formas esporádicas dos transtornos foram verificadas como tendo fatores genéticos que são relevantes para a probabilidade da doença, a idade de início, gravidade ou o padrão de seus sintomas. • Um único transtorno demenciante patológico, genético ou adquirido, pode evidenciar vários quadros clínicos iniciais diferentes. • Embora representem uma pequena minoria, existem formas tratáveis e reversíveis de demência. O mnemônico DEMENTIA, evidenciado abaixo representa essas causas: D rugs - Medicamentos e álcool; E motional depression - Depressão; M etabolic - Metabólico, hipotireoidismo; E yes and ears declining - Sensorial; N ormal pressure hydrocefhalus - Hidrocefalia; T umor or other space-occupyng lesion - Tumores; I nfection - Infecções; A nemia - Deficiência de vitamina B12 e folato. • DSM V: A demência está incorporada à entidade recém-nomeada transtorno neurocognitivo (TNC) maior, embora não esteja excluído o uso do termo demência em subtipos etiológicos nos quais é um termo-padrão. O termo demência é mantido no DSM- 5 para continuidade, podendo ser usado em contextos em que médicos e pacientes estejam acostumados a ele. • Embora demência seja o termo habitual para transtornos como as demências degenerativas, que costumam afetar adultos com mais idade, o termo transtorno neurocognitivo é amplamente empregado, sendo, em geral, o termo preferido para condições que afetam pessoas mais jovens, como o prejuízo secundário a lesão cerebral traumática ou a infecção pelo HIV. A definição de TNC maior, além disso, é mais ampla que o termo demência, no sentido de que pessoas com declínio substancial em um só domínio podem receber esse diagnóstico. • Atualmente, após a atualização do DSM-IV para o DSM-V, basta o indivíduo ter declínio substancial em um só domínio cognitivo, com prejuízo de função, que ele recebe o diagnóstico de demência. • Antes, no DSM IV, a definição de demência requeria a presença de alterações de memória, mas isso não é adequado, porque esse critério obrigatório afasta várias condições de alteração cognitiva progressiva, especialmente a degeneração frontotemporal, em que o distúrbio de memória pode não ser uma característica inicial ou precoce, ou pode não ser proeminente em grande parte da evolução da doença. Epidemiologia • Estima-se que haja 40 MILHÕES DE PACIENTES COM DEMÊNCIAS NO MUNDO; • Transtorno Cognitivo Leve (TCL) é uma etapa que antecede o TCM, apresentando uma taxa de conversão para a Doença de Alzheimer em torno de 10-15% ao ano, enquanto que em indivíduos normais é de 1-2%. Síndrome Demencial 2 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 • Hoje em dia, o TCL é mais prevalente e incidente do que os quadros de demências. • A prevalência da demência/TNC maior, é relacionada com a idade e o envelhecimento, aumenta cerca de duas vezes a cada cinco anos. • 1% de prevalência aos 60 anos (incidência de 0,6%). 30% de prevalência aos 85 anos (incidência de 8,4%). • A maioria dos casos de demência em pessoas idosas apresenta sinais patológicos de doença de Alzheimer, embora não seja rara uma patologia mista. Aproximadamente metade tem uma patologia concomitante, com evidências de envolvimento por corpos de Lewy ou infartos cerebrovasculares. Poucos (cerca de ⅓ das necropsias cerebrais) apresentam a doença de Alzheimer ‘’pura’’. • Os transtornos de corpos de Lewy são a segunda forma mais comum, embora a maioria dos cérebros com corpos de Lewy apresente também a patologia de Alzheimer em algum grau. • A degeneração frontotemporal com frequência se torna sintomática a idades mais baixas, na sexta década, e constitui de 5 a 10% dos casos. • A doença cerebrovascular, com pelo menos um infarto sintomático, é comum em pessoas idosas e é encontrada em pelo menos um terço dos cérebros. Topografia • Presença de alterações difusas do tecido cerebral, sobretudo do córtex dos hemisférios cerebrais (mas, atualmente, reconhece-se também a importância das demências subcorticais, acometendo a substância branca subcortical e a glia). • A síndrome demencial é, portanto, decorrente de doença cerebral difusa, crônica e, geralmente, progressiva. Função cognitiva • A cognição é formada por seis domínios cognitivos, descritos pelo DSM- -V, a saber: atenção complexa, função executiva, aprendizagem e memória, linguagem, perceptomotor e cognição social. • A atenção complexa corresponde à atenção sustentada, atenção dividida, atenção seletiva e velocidade de processamento. • A função executiva corresponde ao planejamento, à tomada de decisão, à memória de trabalho, resposta a feedback/correção de erros, substituir hábitos/inibição e flexibilidade mental. • A aprendizagem e memória corresponde a memória imediata, memória recente, memória de muito longo prazo e aprendizagem implícita. • A linguagem corresponde à linguagem expressiva (nomeação, encontrar palavras, fluência, gramática e sintaxe) e à linguagem receptiva. • O domínio perceptomotor corresponde às habilidades abrangidas por termos como percepção visual, visuoconstrutiva, perceptomotora, práxis e gnosia. • A cognição social, como o reconhecimento de emoções. 3 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 • Algumas pessoas apresentam um declínio muito maior do que o esperado para a idade, chegando aos casos conhecidos como TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO MAIOR, nos quais os pacientes apresentam também perda de funcionalidade, além do declínio cognitivo. • No caso dos pacientes com TRANSTORNO NEUROCOGNITIVO MENOR, ocorre declínio em qualquer uma das funções cognitivas, porém sem comprometimento da funcionalidade, ou seja, o paciente consegue realizar suas atividades sozinho. Classificações • A categorização mais útil atualmente das demências se norteia pela base etiopatológica das doenças. Com a correlação clínicopatológica, é agora geralmente possível fazer-se esse diagnóstico durante a vida com precisão de 75 a 85%. • O melhor meio de se classificar etiologicamente os transtornos demenciantes é como endócrinos, metabólicos, cerebrovasculares, inflamatórios, infecciosos, estruturais ou neurodegenerativos (neste último a influência principal é a idade do início dos sintomas). • Em nossa sociedade atual, a maioria esmagadora dos casos de demência em pessoas idosas é de natureza neurodegenerativa. Esses transtornos incluem a doença de Alzheimer, a demência da doença de Parkinson e outros transtornos com corpos de Lewy, demência frontotemporal (incluindo a paralisia supranuclear progressiva e a degeneração corticobasal), doença de Huntington e doença de Creutzfeldt-Jakob (DCJ),assim como a esclerose lateral amiotrófica (ELA) com demência. • Cada um desses transtornos tende a se caracterizar patologicamente pelo acúmulo anormal no cérebro de proteínas agregadas específicas, que podem ser extracelulares ou intracelulares em neurônios, células gliais ou ambos. • Assim, as famílias maiores de demência são classificadas atualmente como envolvendo o depósito de P-amiloide (amiloidopatias, das quais a doença de Alzheimer é o principal representante), sinucleinopatias (transtornos de corpos de Lewy) e taupatias (algumas degenerações frontotemporais), proteinopatias TDP-43 (outras degenerações frontotemporais e ELA-demência) e prionopatias (DCJ e transtornos reladonados). • A graduação da demência é realizada pelo comprometimento funcional. ❖ Leve: ainda não há alteração funcional ou se existir está relacionado a atividades instrumentais; ❖ Moderada: perda importante de atividades instrumentais e atividades básicas moderadamente afetadas. ❖ Grave: perda da capacidade de realizar atividades básicas. Causas de demência • As doenças de Alzheimer, Huntington e Parkinson; distúrbios vasculares; alcoolismo crônico; tumores cerebrais; traumatismos cranioencefálicos; meningoencefalites; hidrocefalia de pressão normal; distúrbios metabólicos, endócrinos e nutricionais. 4 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 Avaliação da demência Anamnese • História detalhada, delineando a evolução temporal de anormalidades sentinela ou sinal, a gravidade e como uma alteração qualquer afeta a função. • Deve-se dar uma atenção especial aos sintomas que tinham primazia temporal, assim como aos sintomas que predominavam ao início do quadro clínico. • Devem ser evocados sintomas de alteração da memória (quer a curto prazo ou a longo prazo, isto é, fundo de conhecimentos), de uso da linguagem (problemas em encontrar palavras, diminuição da fluência, compreensão ou designação), práxis (vestir-se, uso de utensílios ou uso de dispositivos mecânicos como telefone ou controles remotos eletrônicos), função executiva (desorganização), insight (como não reconhecimento de sintomas), discalculia ou disfunção comportamental (agitação, desinibição, depressão, obsessões, delírios ou alucinações). • Devem ser também evocados sintomas de alteração motora ou da marcha, movimentos adventícios, envolvimento autônomo (hipotensão, disfunção urinária ou intestinal) ou distúrbio do sono. Perguntas de rastreamento aos familiares, acompanhantes ou cuidados sobre possível síndrome demencial Comparando o comportamento, a memória e as habilidades do paciente no momento atual em relação a 5 ou 10 anos atrás (quando ele ainda estava bem), você diria que: • Ele tem dificuldades para lembrar coisas que aconteceram recentemente? • Tem dificuldade para lembrar onde as coisas costumam ser guardadas? • Tem dificuldade para lembrar coisas sobre a família e os amigos, como nomes, profissões, aniversários e endereços? • Às vezes, confunde pessoas, não sabe quem é uma pessoa previamente conhecida (um sobrinho, um neto, um conhecido da família ou mesmo um filho ou o cônjuge? • Tem dificuldades para lidar com questões financeiras, controlar a conta no banco, lidar com dinheiro, conferir trocos, pegar as contas? • Tem dificuldade para achar a palavra certa quando está falando sobre as coisas? • Tem dificuldade para fazer as coisas rotineiras da casa, como cozinhar, limpar, fazer as compras? • Já se perdeu na cidade? E no seu bairro? Já se perdeu em sua casa? Exame físico • O exame deve incluir um exame sistêmico geral e um detalhado exame neurológico geral e do estado mental. • Os testes neuropsicológicos são frequentemente realizados para avaliar a gravidade e o padrão regional de alteração cognitiva, o que pode ser útil tanto para o diagnóstico como para o tratamento. Manifestações clínicas • Bleuler (1985) - Os doentes apresentam-se com ou sem sintomas nervosos, o doente fracassa lentamente no decurso de vários anos, hora mais rapidamente, em poucas semanas, no trabalho e no seu comportamento social. Torna-se superficial e negligente, esquece de pagar a conta no restaurante, ou se deixa servir sem ter dinheiro [...] não cuida de si mesmo [...] compra quatro guarda-chuvas de uma só vez sem saber por que, não é mais capaz de se orientar nas ruas. A cozinheira esquece de colocar sal na comida ou põe açúcar na sopa. • Em geral o nível de consciência apresenta-se normal; o paciente está desperto, vigil; seu sensório é claro. Não há obnubilação de consciência (ausência do delirium na maior parte do tempo). 5 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 • Podem surgir sintomas psiquiátricos associados, como idéias paranóides, depressão, ansiedade, alucinações, delírios e heteroagressividade. • Alterações de memória: ❖ Carácter multimodal, abarcando várias modalidades de memória (não se restringindo apenas à memória verbal). ❖ A perda de memória concentra-se principalmente na memória recente, de fixação. Apenas em fases avançadas há perda da memória remota e da capacidade de evocação. ★ Hipomnésia de fixação (incapacidade de guardar fatos novos), principalmente, e, em fases avançadas, perda da memória de evocação (perda da memória de fatos já fixados); ❖ Alomnésia (ilusão de memória) ou paramnésia (perturbação do reconhecimento em virtude da qual o fato evocado não corresponde ao objeto original da percepção, ex. o paciente revendo um irmão, considerará seu pai; Outras vezes a paramnésia consiste no processo mental segundo o qual uma atividade de imaginação seria considerada atividade mnésica; em virtude da paramnésia surge o fenômeno do já visto: pessoas observadas pela primeira vez surgem aos olhos do paciente como antigos conhecidos. Há também o fenômeno do nunca visto: um antigo objeto, que o paciente já viu inúmeras vezes, é considerado pelo paciente como coisa inteiramente nova); • Alterações de múltiplas funções cognitivas: ❖ Desorientação ou falsa orientação alopsíquica (estado de orientação com o meio exterior); ❖ Diminuição da capacidade de abstração, de raciocínio, julgamento e planejamento; ❖ Perda das habilidades visuoespaciais (inteligência); hipotenacidade (atenção); pensamento empobrecido, prolixo e perseverante; afasia (distúrbio de linguagem); e agnosia (perda da sensopercepção, da capacidade de reconhecer um objeto apesar da função sensorial intacta). ❖ Além das alterações cognitivas, comumente ocorrem progressivamente: aparência descuidada; atitude indiferente; apraxia (Dificuldade ou impossibilidade de realizar atos motores intencionais, voluntários), ecopraxia (Repetição automática e despropositada das ações motoras executadas por outra pessoa) e perseveração motora (psicomotricidade); hipobulia (diminuição ou enfraquecimento da vontade) ou impulsividade (conação); e embotamento (dificuldades em expressar emoções e sentimento), labilidade, incontinência ou rigidez afetiva. • Alterações das funções executivas: ❖ Associadas ao lobo frontal: perda da capacidade de planejamento e monitorização de atos complexos, da capacidade para solução de problemas novos e de habilidades aritméticas (acalculia), diminuição da fluência verbal, perseveração, perda da flexibilidade cognitiva, dificuldades com o pensamento abstrato, etc. • Alterações da personalidade: ❖ Perda dos hábitos sociais mais refinados e do controle emocional, com atitudes grosseiras e inadequadas. Verifica-se também progressivo desleixo com higiene pessoal, vestimenta, alimentação, atividades fisiológicas e de toalete. Há, consequentemente, tendência à desinibição da personalidade e à deterioração do comportamento social global. • Eventualmente pode ser encontradona demência: ❖ Hipoprosexia (debilidade da atenção) ou labilidade da atenção; ❖ Alentecimento do curso do pensamento, desagregação do pensamento e ideias deliroides (alterações do pensamento); ❖ Ecmnésia (distúrbio da memória a partir de um determinado momento ou situação, com lembranças do passado presentes), ecolalia (repetição da fala de outra pessoa), estereotipia verbal (repetição automática de uma palavra, sílaba ou som, que se intercala entre as frases, sem nenhuma finalidade), palilalia (é a repetição automática e estereotipada pelo paciente das últimas palavras que ele próprio emitiu) ou logoclonia (semelhante a palilalia, mas é apenas das últimas sílabas), pararrespostas (respostas disparadas em relação às perguntas) e hipoprosódia (Diminuição da modulação afetiva da fala, que se torna monocórdica e monótona). 6 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 ❖ Negativismo ou sugestionabilidade patológica e alotriofagia (ingestão de substâncias estranhas- terra, barro, cabelo); ❖ Hipercinesia ou hipocinesia (psicomotricidade); desorientação autopsíquica parcial; ❖ Diminuição da capacidade imaginativa. Critérios diagnósticos • O diagnóstico é clínico, associando anamnese adequada e avaliação cognitiva. • O DSM-V – caracteriza a síndrome demencial como um declínio cognitivo importante avaliado em: ❖ 1 ou mais domínios cognitivos afetados (linguagem, memória e aprendizagem, função executiva, atenção complexa, preceptomotor, cognição social); Queixa dos pacientes ou dos acompanhantes; aplicação de testes diagnósticos, Ex. MEEM, teste do relógio. ❖ Prejuízo funcional; De atividades instrumentais (AIVD - preparar refeição, trabalho doméstico, cuidar das finanças) ou básicas da vida diária (ABVD - higiene pessoal, controle de esfíncteres, alimentação). ❖ Excluir delirium e doenças psiquiátricas. • Basta o indivíduo ter declínio substancial em um só domínio cognitivo, com prejuízo de função, que ele recebe o diagnóstico de demência. • Recomenda-se o rastreio cognitivo, feito através de pequenos testes aplicados no consultório, que conseguem avaliar a existência de comprometimentos cognitivos. Esses testes apresentam alta sensibilidade e baixa especificidade, mas têm a vantagem de serem práticos para a aplicação rápida. • O maior e mais utilizado teste é o Mini Exame do Estado Mental, ou MiniMental, que é um teste muito bem estruturado e validado no Brasil. • Além do MiniMental, existem outros testes, como o da fluência verbal, o teste do desenho do relógio e o MoCA (Montreal Cognitive Assesment), que é um teste com validade para o Brasil, mais elaborado e que pode ser utilizado para pacientes com alta cognição. • O padrão ouro para o diagnóstico de declínio na função cognitiva é a avaliação neuropsicológica, que é feita por psicólogos especializados em neuropsicologia. • Algumas escalas são utilizadas para avaliar a perda de função do paciente, como a ESCALA DE LAWTON, que avalia as AIVDS e a ESCALA DE KATZ, que avalia as ABVDS. • Após a constatação de déficit cognitivo e prejuízo funcional nas atividades da vida diária, o profissional de saúde deve solicitar exames complementares apenas para investigar causas reversíveis. Exames complementares (rastreio de demências reversíveis) • Testes laboratoriais básicos: química sanguínea e contagens celulares (eletrólitos, HMG, VHS); • Função hepática e renal; • Testes laboratoriais para deficiência de vitamina B12 (com solicitação de homocisteína e de metilmalonato se o nível de B12 se mostrar fronteiriço ou baixo) e para deficiência da tireoide (TSH, sendo solicitado o nível de T4 livre se o TSH estiver fora dos limites normais). • Testes sorológicos: Exposição à sífilis (VDRL e FTA-ABS), Doença de Lyme (IAE exploratória, com imunoblotting Western para confirmação) ou HIV (anticorpo ao HIV 1/2) podem ser úteis. • Outros testes paraclínicos são também opcionais, incluindo EEG, SPECT ou FDG-PET. O EEG pode ser útil para se avaliar a possibilidade de transtornos paroxísticos e a SPECT ou a FDG-PET pode ser útil para mostrar os padrões topográficos de disfunção cerebral, que podem ser relativamente específicos da doença. • A punção lombar para a análise do LCR é uma opção para se afastar etiologias infecciosas ou inflamatórias de demência, e hoje em dia é realizada mais frequentemente para fornecer informações em relação a doenças neurodegenerativas, como a doença de Alzheimer ou a DCJ, pelo uso de biomarcadores proteicos. Os biomarcadores estão sendo cada vez mais desenvolvidos para fornecer índices substitutos de gravidade e de evolução da demência. Exames de imagem • A American Academy of Neurology (reafirmadas em 2004) recomenda a aquisição de imagens estruturais (geralmente RM) para se afastar 7 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 transtornos que contribuam para os sintomas cognitivos, que de outra forma poderiam não ser reconhecidos. • A RM permite a avaliação da patologia vascular cerebral e a descoberta potencial de um tumor cerebral, abscesso ou hidrocefalia. • Geralmente a tomografia computadorizada é suficiente para screening, possibilitando a exclusão de diagnósticos diferenciais de demência, como acidente vascular cerebral (AVC), hemorragia, tumor cerebral, entre outros. Tipos de TCNM – Demências Foram selecionadas as três principais etiologias das demências em nosso meio. Doença de ALZHEIMER • Condição progressiva, decorrente de processo neurodegenerativo, que se manifesta por perdas cognitivas, em particular da memória, da linguagem e das funções visuoespaciais, com empobrecimento progressivo das habilidades e atividades diárias. • As manifestações da doença evoluem uniformemente dos primeiros sinais de distúrbio de memória à perda cognitiva grave. • É a principal causa de demência no mundo e tem prevalência elevada com o avanço da idade. Acredita-se que seja uma doença geneticamente determinada, associada à hereditariedade. • As perdas cognitivas e da personalidade ocorrem associadas ao processo degenerativo do tecido cerebral, de etiologia ainda não totalmente esclarecida. • A instalação do quadro é insidiosa; e a evolução, lenta (geralmente por mais de dois anos). • Início na velhice, principalmente a partir dos 60 anos de idade; se o início ocorrer antes dos 65, denomina-se de “subforma pré-senil (tem componente genético familiar evidente, curso mais rápido e mais grave)”; se ocorrer após os 65 anos, denomina-se “subforma senil”. • Alterações histoquímicas características da doença de Alzheimer: produção e o acúmulo no cérebro do peptídeo beta-amilóide. • Exceto pelo estado mental, o exame neurológico se mostra geralmente normal, mas são relativamente frequentes na doença os sinais extrapiramidais, incluindo rigidez, bradicinesia, marcha de pés arrastados e alterações posturais. • As funções motoras e sensoriais primárias são poupadas. • Anormalidades oculomotoras, cerebelares ou de nervos periféricos no exame físico levantam fortemente a possibilidade de alguma outra forma de demência. • Sintomas psicopatológicos não cognitivos ocorrem com frequência na doença de Alzheimer; alterações do humor e da volição (depressão, desinibição) surgem precocemente na doença e acompanham o seu curso. • Sintomas psicóticos (delírios, ilusões e alucinações), assim como a agitação psicomotora, ocorrem mais nas fases intermediárias e finais da doença. • A alteração da memória para informações adquiridas recentemente é comumente a queixa inicial, enquanto a memória para eventos remotos se mostra relativamente inalterada. • Com a evolução da doença, podem ser relatadas ao questionamento específico alterações da linguagem, do raciocínio abstrato e da função executiva.• Depressão com insônia ou anorexia ocorre em 5 a 8% dos pacientes, sem relação com a gravidade, e o humor deprimido pode ocorrer paralelamente ao início do declínio da memória. • Os delírios e o comportamento psicótico aumentam progressivamente e persistem em 20% dos casos. • A agitação pode coexistir em até 20% dos pacientes, aumentando na doença avançada. As alucinações ocorrem com frequência semelhante e podem ser visuais ou auditivas. Demência por Corpos de Lewy • Segunda principal causa de demência degenerativa, acometendo principalmente indivíduos homens acima de 70 anos. • A demência por corpúsculos de Lewy é marcada pela degeneração e morte neuronal. Não há exemplificação de fatores de risco bem estabelecidos para essa patologia. • Sua etiologia ainda não é bem conhecida, porém, sua característica anatomopatológica é a presença de corpos de Lewy com distribuição cortical 8 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 predominante, podendo haver concomitância de alterações patológicas da doença de Alzheimer. • Essas estruturas também são encontradas na substância negra, porém em menor intensidade do que na doença de Parkinson. • Corpos de Lewy: trata-se de inclusões citoplasmáticas de proteínas esféricas intraneuronais espalhadas por todos os núcleos subcorticais, substância negra e córtex (nesse caso, predominantemente nas regiões paralímbicas). • QUADRO CLÍNICO: consiste basicamente em Parkinsonismo (tremores, rigidez e instabilidade postural) + síndrome demencial progressiva, especialmente com alucinações visuais e flutuação cognitiva (flutuação do nível de consciência e da capacidade atencional). • Geralmente, o paciente abre o quadro com demência e evolui com parkinsonismo, ou vice- versa. A alucinação, nesses casos, é bem definida e caracterizada pela visualização de pessoas (Ex. ver crianças correndo pela casa ou elementos que não existem a sua volta). • O declínio cognitivo é principalmente na atenção, na função executiva e na função visuoespacial. Além disso, o paciente apresenta distúrbio comportamental no sono REM, perda progressiva da memória e dificuldade de avaliar distâncias (ocasiona traumas por quedas). • O paciente pode apresentar também sintomas extrapiramidais (rigidez e hipocinesia). Os sintomas extrapiramidais precedem ou acompanham as perdas cognitivas. • Os pacientes com demência por corpos de Lewy diferem dos portadores de Parkinson, pois apresentam menos tremor de repouso, mais mioclonias (espasmos rápidos e repentinos, contrações em um músculo ou grupo de músculos), mais alterações de memória, alterações visuoespaciais e frontais, assim como mais alucinações, delírios e pior resposta à L-dopa. • OBS. Inicialmente, a atenção e estado de alerta podem estar mais prejudicados que a memória. Ainda estágios iniciais há flutuação das funções mentais. • DIAGNÓSTICO: Ocorre pela história clínica detalhada e exclusão de outras causas como, por exemplo, demência vascular ou DA. Aplicação dos testes de status mental e podem ser necessários os exames de TC ou RNM. Fique atento, pois a doença por corpúsculos de Lewy pode existir concomitante a outras causas de demência, sendo então denominada demência mista. • TRATAMENTO: medidas de apoio e prevenção de acidentes como, por exemplo, melhorando a iluminação dos ambientes na casa, organizando horários de alimentação e ciclo-sono vigília, retirada de tapetes e móveis que sejam propícios a quedas. A intervenção medicamentosa pode ser realizada com anticolinesterásicos, mas também não há evidências de impedimento da progressão da doença. Se necessário, por sintomas graves, podem ser utilizados os medicamentos benzodiazepínicos, mas jamais neuroléptico típico, pois tende a piorar os sintomas e gerar surtos. Demência vascular • Segunda causa geral de demências e é marcada por um quadro de demência associado à presença de fatores de risco cerebrovasculares (HAS; DM; DLP; Obesidade; Tabagismo; sopro carotídeo; DCV). • Utiliza-se o termo demência vascular para agrupar o conjunto de quadros de perdas cognitivas e alterações da personalidade associadas a certas doenças cerebrovasculares. • O paciente pode apresentar piora progressiva, piora única (bem demarcada) ou em degraus, também demarcada. • A evolução das demências vasculares, devido a esses períodos alternados de piora rápida e posterior estabilização, revela, com certa frequência, o perfil de evolução do tipo “em escada”, diferindo, portanto, da evolução das demências degenerativas (Alzheimer, Pick, etc.), que apresentam evolução das perdas cognitivas mais insidiosa e homogênea. • Pode-se identificar, em alguns pacientes com demência vascular, história de ataques isquêmicos transitórios, com sinais e sintomas neurológicos focais. Esses pequenos infartos cerebrais são, geralmente, seguidos de comprometimento cognitivo progressivo. 9 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 • Mais frequentemente, a demência vascular é expressão de uma doença vascular isquêmica subcortical (36 a 67% das demências vasculares). Trata-se de um quadro demencial secundário a infartos lacunares e lesões isquêmicas da substância branca, de efeito cumulativo, decorrentes de alterações degenerativas de pequenos vasos arteriais. • Demência pós-AVC representa 20 a 30% das causas de demência vascular. Nesses casos, o paciente que está hígido, tem um AVC e apresenta um declínio cognitivo correspondente à área cerebral acometida. Esta demência pode se manifestar em até 6 meses após o AVC. • DIAGNÓSTICO: é essencial à associação entre história clínica, exame físico, avaliação neuropsicológica e exames complementares, tanto laboratoriais quanto de imagem. • Dentre os exames de imagem destacam-se a USG de carótidas, TC e RNM para avaliar lesões cerebrais. • São elencados três critérios diagnósticos: 1- diagnóstico de demência; 2) evidência da presença de doença cerebrovascular, demonstrada pela história, pelo exame clínico ou pelos exames de neuroimagem; 3) a demência e a doença cerebrovascular precisam estar relacionadas. • TRATAMENTO: Após identificada a patologia, o tratamento é iniciado com prevenção de riscos e agravamento da doença como cuidados em casa e apoio familiar; combate a fatores de risco para outros eventos embólicos isquêmicos como cessar o tabagismo e controle de doenças crônicas como diabetes mellitus, se presentes. • Há indicação de anticoagulantes se evidenciado risco de trombose elevado para evitar outros eventos isquêmicos associados a drogas antiplaquetárias como aspirina que também são úteis na prevenção de AVC. Acompanhamento interdisciplinar com fisioterapia e psicologia, por exemplo, são essenciais para a recuperação de déficits focais e definem melhor prognóstico. Tratamento – Demências • Quase todas as demências: suporte multidisciplinar associado à terapia farmacológica. ❖ MEDICAMENTOSO: Antidepressivos e/ou antipsicóticos, anticolinesterásicos, memantina, antiparkinsonianos (demência por corpos de Lewy), medicamentos para doença de base (vascular). ❖ COMPORTAMENTAL: Atividades de estimulação cognitiva, social e física, suporte multidisciplinar (demência por corpos de Lewy e demência vascular) e controle dos fatores de risco cerebrovasculares (demência vascular) ❖ CIRÚRGICO: hidrocefalia de pressão normal. • No entanto, os quadros com demência já instalada, costumam não apresentar boa resposta ao tratamento medicamentoso, sendo usado apenas para controle de sintomas. • Nas demências por Corpos de Lewy, são utilizados os anticolinesterásicos (donepezila, rivastigmina, galantamina) para o quadro demencial, enquanto que para os sintomas de Parkinson → levodopa). • O tratamento da demência vascular visacontrolar os fatores de risco cerebrovasculares, com controle da alimentação, prática de exercícios físicos, controle da adesão ao tratamento das causas de base, entre outras medidas. Transtorno de personalidade paranóide • O paciente com comportamento paranóide pode apresentar quaisquer das características do transtorno de personalidade paranóide. • Desconfiança e suspeitas em relação aos outros, de modo que as intenções são interpretadas como maldosas, que se manifesta no início da idade adulta e está presente em um diversos contextos: 1. Suspeita, sem fundamento suficiente, de estar sendo explorado, maltratado ou enganado; 2. Preocupa-se com dúvidas infundadas acerca da lealdade ou confiabilidade de amigos ou colegas; 3. Reluta em confiar nos outros por um medo infundado de que essas informações possam ser maldosamente usadas contra si; 4. Interpreta significados ocultos, de caráter humilhante ou ameaçador em observações ou acontecimentos benignos; 5. Guarda rancores persistentes, ou seja, é implacável com insultos, injúrias ou deslizes. 6. Percebe ataques a seu caráter ou reputação que não são visíveis pelos outros e reage rapidamente com raiva ou contra-ataque; 7. Tem suspeitas recorrentes, sem justificativa, quanto à fidelidade do cônjuge ou parceiro sexual; 10 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 11 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 Exame do estado mental • Linguagem e fala: compreensão, repetição, fluência, nominação, leitura, escrita, cálculo, fala. • Motor e comportamento: humor, conteúdo do pensamento, alucinações, delírios, abstração, julgamento. • Função sensorial integrativa: astereognosia, agrafestesia, discriminação de dois pontos, alestesia, extinção, negligência unilateral e anosognosia, distúrbios da orientação espacial. • Função motora integrativa: apraxia. Envelhecimento natural x demência • A demência não é uma consequência natural do envelhecimento, ela resulta de doenças que envolvem o córtex. • O envelhecimento normal pode estar associado com alterações menores da função neurológica e com alterações neuroanatômicas, no entanto esses achados não são indicativos de demência. • A memória também pode estar comprometida no envelhecimento normal, porém é uma alteração leve, enquanto na demência existe alteração na memória acompanhada de alteração no julgamento, raciocínio, comportamento e/ou linguagem. Piramidal x extra-piramidal • PIRAMIDAL: relaciona-se a movimentos voluntários, partindo do córtex, com dois feixes que são os cortico-espinhal anterior e lateral e os ramos cranianos e espinhais. Os 12 pares cranianos e os nervos espinhais são todos os nervos que vão fazer a movimentação. Paralisia central, AVC, neuropatia periférica, guillain-barre, síndrome medular, tudo isso estará relacionado a síndrome piramidal. • EXTRA-PIRAMIDAL: não parte do córtex, ele parte da região subcortical, dos gânglios da base, vai emitir 4 feixes que são os: reticulo-espinhal, rubro-espinhal, vestíbulo-espinhal e olivo-espinhal ou teto-espinhal. A função do sistema extra- piramidal é na realização de movimentos autônomos, ou seja, toda alteração de movimentos involuntários como tremores. Alterações de lentificação de movimentos, hipocinesia e hipertonia ou hipotonia. Ao pensar em tremores, deve-se considerar algum acometimento extra- piramidal, podendo haver alteração de neurotransmissores. Tremor • Movimento oscilatório rítmico, melhor caracterizado por sua relação com a atividade motora voluntária. É intensificado pelo estresse emocional e desaparece com o sono. • Tremor estático ou tremor de repouso: ocorre quando o membro está em repouso. • Tremor postural: tremor presente durante a manutenção de uma postura. Embora possa continuar durante o movimento, os movimentos não aumentam sua gravidade. ❖ Tremor fisiológico: base fisiológica é incerta; ❖ Tremor fisiológico exacerbado: medo ou ansiedade, após atividade física excessiva ou privação do sono. Pode complicar o tratamento com certos fármacos (lítio, antidepressivos tricíclicos, valproato de sódio e broncodilatadores), sendo evidente em pacientes alcoolistas ou durante a abstinência alcoólica ou de outras drogas. É comum na tireotoxicose e no envenenamento (mercúrio, chumbo, arsênico e monóxido de carbono). Não existe tratamento medicamentoso específico. 12 Beatriz Machado de Almeida Síndrome demencial – Caso 9 ❖ Outras causas: tremor essencial benigno (mais comum dos casos “anormais” e tem base familiar), doença de Wilson ou distúrbios cerebelares. ❖ Asterixe: pode estar associada a tremor postural, mas é considerada uma forma de mioclonia do que um tremor. Presente em pacientes com encefalopatia metabólica (insuficiência hepática ou renal). Desaparece com a melhora da encefalopatia metabólica. • Tremor intencional ou cinético: quando o tremor está presente durante o movimento, mas não durante o repouso. Ocorre durante a atividade. Esta forma de tremor algumas vezes é interpretada erroneamente como uma ataxia de membro, mas esta última não apresenta um componente oscilatório rítmico. Observado em pacientes com doença de Wilson. Etiologia: lesão afetando o pedúnculo cerebelar superior. Consequência: como este tremor é muito grosseiro, pode levar a incapacidade funcional grave. • OBS: tremor postural e o tremor intencional também são denominados tremores de ação. • Tremor residual: é característico do parkinsonismo, seja o distúrbio idiopático ou o secundário (origem pós-encefálica, tóxica ou induzida por drogas). • Tremor do parkinsonismo: frequência do tremor, sua relação com a atividade e a presença de rigidez ou hipocinesia em geral distinguem o tremor do parkinsonismo das demais formas de tremor.
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