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COLEÇÃO TRIBUTOS INDIRETOS III- ISS

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ICMS - Ed. 2020 ISS - Vol. III - Ed. 2017
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1. CARACTERÍSTICAS GERAIS
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1.1. O ISS no plano constitucional
Na Constituição Federal, o ISS vem disposto em seu artigo 156,
inciso III, que vai a seguir transcrito:
Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre:
(...)
III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art.
155, II, definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 3, de 1993)
(...)
§ 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste
artigo, cabe à lei complementar: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 37, de 2002)
I – fixar as suas alíquotas máximas e mínimas; (Redação dada
pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002)
II – excluir da sua incidência exportações de serviços para o
exterior. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
III – regular a forma e as condições como isenções, incentivos e
benefícios fiscais serão concedidos e revogados. (Incluído pela
Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
A primeira análise do referido dispositivo dá conta de que os
serviços de transporte interestadual e intermunicipal, bem como os
serviços de comunicação, não são tributados pelo ISS porque estão
sujeitos ao ICMS. Daí a razão para o inciso III referir, logo de início,
que os serviços alcançados pelo imposto municipal são aqueles de
qualquer natureza, mas, “não compreendidos no artigo 155, II”.
Também chama a atenção o trecho final do inciso III, cuja redação
diz que os serviços de qualquer natureza tributados pelo ISS são
aqueles “definidos em lei complementar”. Tal definição estava, no
passado, na lista de serviços anexa ao antigo Decreto-lei nº 406/68 e,
atualmente, na lista da LC 116/2003. Um breve exame dessa lista
demonstra que o legislador, no mais das vezes, faz menção ao termo
“e congêneres” ao final da descrição de um serviço. Disso surge a
indagação: afinal, para fins de determinação da incidência do ISS, a
lista de serviços é taxativa ou enumerativa? As reflexões relativas a
esse tema serão feitas ao longo da sessão 2.3 infra.
A Constituição Federal entregou outras atribuições à Lei
Complementar (conforme já dito, hodiernamente,trata-se da LC
116/2003).
A primeira é a fixação das alíquotas máximas do ISS, que
atualmente é de 5%, conforme artigo 8º, inciso II, da LC 116/2003. A
segunda é a fixação de alíquotas mínimas. Até o final do ano de
2016, a alíquota mínima do ISS não era dada pela Lei Complementar,
mas sim pela própria Constituição Federal, que, no artigo 88 dos Atos
das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), acrescentado
pela Emenda Constitucional nº 37/02, previu-a em 2%. Este
percentual foi reafirmado pela LC 157/16, ao inserir o artigo 8º-A à LC
116/2003.
A exclusão da incidência do ISS sobre exportações de serviços,
determinada pelo artigo 156, inciso III, § 3º, inciso II, da Constituição
Federal, está veiculado no texto do artigo 2º, inciso I, da LC 116/2003.
Este tema será mais bem abordado ao longo da seção 2.8.
Por fim, o artigo 156, inciso III, § 3º, inciso III, da Constituição
Federal dispõe que a Lei Complementar deverá também regular a
forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais
serão concedidos e revogados pelo Municípios. Apesar de o
comando remontar ao ano de 1993, porquanto incluído no contexto
do artigo 156 pela Emenda Constitucional nº 3/93, a referida
determinação somente foi cumprida por via da LC 157/16. Trata-se de
medida tendente à eliminação da chamada guerra fiscal municipal,
que será mais bem explorada no Capítulo 6.
1.2. O ISS como imposto indireto e o efeito dessa caracterização
na repetição de indébito – Artigo 166 do Código Tributário
Nacional
O texto desta seção, relativo à caracterização do que é um
imposto indireto, foi retirado da seção 1.1 do Volume I, ICMS, da
presente Coleção de Tributos Indiretos. Essa opção foi feita porque,
conforme será visto mais adiante, o ISS também é tido pela
jurisprudência como tal e, por isso mesmo, carrega consigo todos os
respectivos efeitos jurídicos.
É sabido que os tributos em geral são divididos em dois grupos:
diretos e indiretos. No primeiro grupo, enquadram-se os tributos
incidentes sobre a renda (IRPJ e CSLL, por exemplo) e sobre a
propriedade (IPTU, IPVA, ITR etc). Já no segundo grupo, estão os
tributos que oneram as operações/prestações (mercantis ou não) que
viabilizam a prestação de serviços, circulação e/ou produção de
mercadorias e/ou de produtos. Os exemplos clássicos desse grupo
de impostos são o IPI e o ICMS. A confirmar a vocação clássica
desses impostos como indiretos, ambos são destacáveis em nota
fiscal, seja para informar o montante do próprio imposto que está
calculado por dentro, no caso do ICMS1, ou para informar o montante
do imposto que está por fora, mas que será somado ao valor total da
operação, no caso do IPI2. O efeito disso é simples e, de certo modo,
autoexplicativo: haverá, em ambos os casos, a informação às partes
interessadas (vendedores, compradores e Fiscos) acerca do
montante de imposto que gravou a operação e que será, por isso,
repassado no preço.
O ISS vai no mesmo caminho. Tanto assim que alguns
Municípios, a exemplo de São Paulo, veiculam expressamente em
suas legislações a obrigação de destaque do imposto no documento
fiscal e, mais ainda, o cálculo por dentro. Vejamos o artigo 14, § 4º,
da Lei Paulistana nº 13.701/03:
Art. 14. A base de cálculo do Imposto é o preço do serviço, como
tal considerada a receita bruta a ele correspondente, sem nenhuma
dedução, excetuados os descontos ou abatimentos concedidos
independentemente de qualquer condição.
(...)
§ 4º O montante do Imposto é considerado parte integrante e
indissociável do preço referido neste artigo, constituindo o respectivo
destaque nos documentos fiscais mera indicação de controle.
Em outras palavras, por esse texto se conclui, sem sombra de
dúvidas, que o ISS paulistano é imposto indireto, porque é calculado
por dentro e, muito por isso, é repassado no preço e tem seu valor
destacado em nota fiscal. Mas, cumpre ser dito, a mesma conclusão
pode ser obtida a partir do exame de legislações municipais que não
contam com disposições expressas dessa natureza – isso é, o
cálculo por dentro, que será mais bem analisado na seção 5.1.1 infra.
Apesar de a classificação dicotômica diretos e indiretos não ser
uma classificação jurídica, e sim econômica, essa divisão tem se
mostrado importante porque, na prática, expressa a repercussão
financeira do tributo ou, em outras palavras, que seu valor é
assumido economicamente pelo adquirente do serviço.
E dessa reflexão surgem questões relevantes do ponto de vista
jurídico: nos impostos indiretos (como o ISS), há sempre a figura do
javascript:void(0)
javascript:void(0)
contribuinte de direito (aquele que, revestido da condição de
contribuinte dada pela legislação, sujeita-se à regra matriz de
incidência) e do adquirente final, que efetivamente suporta a carga
tributária incorporada no preço das mercadorias e/ou produtos. Este
último é comumente denominado contribuinte de fato.
Essa é a definição dada por Hugo de Brito Machado Segundo,3
nos seguintes termos:
“2.2. Ainda de acordo com essa explicação, o contribuinte de
direito seria legalmente obrigado ao pagamento do tributo, eis que
integraria a relação jurídico tributária, na condição se sujeito passivo.
Já o contribuinte de fato não teria relação com o Fisco, sendo essa a
razão do adjetivo ‘de fato’, pois na prática é ele quem arca com o
ônus representado pelo tributo, que lhe é repassado pelo contribuinte
de direito. Por outras palavras, o contribuinte de direito é obrigado ao
pagamento, mas transfere a outro esse sacrifício pelo aumento de
preço ou outro processo econômico detroca.
[...]
2.3. Dentro desse quadro, é com muita simplicidade que se diz,
por exemplo, que os impostos que incidem sobre o consumo seriam
indiretos, ao passo que aqueles que oneram o patrimônio e a renda
seriam diretos. O ICMS, v.g., é pago pelo vendedor de um produto
(contribuinte de direito), mas, na prática, seria suportado pelo
comprador (contribuinte de fato), sendo pelo primeiro embutido no
preço e repassado ao segundo. O Imposto de Renda, a seu turno, é
pago pelo beneficiário dos rendimentos, que efetivamente suporta o
ônus do tributo, reunindo-se assim, na mesma pessoa, as figuras do
contribuinte de direito e do contribuinte de fato.”
Saber quem são os contribuintes de direito e de fato se afigura
imprescindível porque é essa classificação que denota a legitimidade
ativa em ações de repetições de indébito, nos termos do artigo 166
do Código Tributário Nacional, que tem a seguinte redação:
“Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua
natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente
será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no
caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente
autorizado a recebê-la.”
javascript:void(0)
A leitura do dispositivo leva à conclusão de que somente estará
legitimado a pleitear o indébito quem efetivamente suportou seu ônus
econômico (contribuinte de fato), a não ser que ele (o contribuinte de
fato) expressamente autorize o contribuinte de direito a pleitear a
restituição em seu nome. Mais ainda. Cumpre ser dito que a
legitimidade do contribuinte de fato é, a princípio, apenas para
restituir o indébito. Afinal, segundo o texto legal, não poderá ele, o
contribuinte de fato, questionar a exigência fiscal, propriamente, já
que esse direito subjetivo é do contribuinte de direito, que é o
verdadeiro titular da relação jurídico-tributário e a quem recai a
obrigação de pagar o ISS em razão da consumação de um dos fatos
geradores previstos na legislação.
É esse realmente o espírito do artigo 166 do Código Tributário
Nacional. A confirmá-lo, segue abaixo a transcrição de trechos
relevantes da exposição de motivos do Código Tributário Nacional,
que pode ser aferida pelos pronuncimentos da Comissão Especial4
responsável pela elaboração do Projeto do Código Tributário
Nacional, em substituição ao Anteprojeto antes elaborado por Rubens
Gomes de Souza. Vejamos:
Texto dos artigos 130 e 131 do Projeto do Código Tributário
Nacional, que vieram a ser positivados nos artigos 165 e 166
Art. 130. O contribuinte tem direito, independentemente de prévio
protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a
modalidade de seu pagamento, nos seguintes casos:
[...]
Art. 131. Existindo disposição legal expressa que determine ou
faculte ao contribuinte a transferência do tributo a terceiro, o direito
referido no artigo anterior fica subordinado à prova de que a
transferência não ocorreu efetivamente, por impossibilidade material
ou jurídica, em face das circunstâncias do caso.
Parágrafo único. O terceiro, que faça prova de lhe haver sido
transferido o tributo pelo contribuinte nos termos deste artigo, sub-
roga-se no direito daquele à respectiva restituição.
[...]
RELATÓRIO
javascript:void(0)
Apresentado pelo Prof. Rubens Gomes de Souza, relator geral, e
aprovado pela Comissão Especial nomeada pelo Ministro da Fazenda
para elaborar o Projeto de Código Tributário Nacional
[...]
Ao contrário, o Projeto não assegurou a restituição ao
contribuinte, qualquer que fosse a natureza do tributo. Visava o
Anteprojeto, neste passo, reformar a jurisprudência dominante, que
recusava ao contribuinte legal a restituição dos impostos indiretos,
sob o fundamento de que o respectivo ônus financeiro terá sido
transferido ao contribuinte “de fato” ou “econômico”. A Comissão,
sem embargo das razões de ordem jurídica aduzidas pelo autor do
Anteprojeto em contrário a essa orientação (GOMES DE SOUZA,
“Restituição de Impostos Indiretos”, em Revista de Direito
Administrativo 21/24), preferiu mantê-la, no interesse de impedir o
enriquecimento ilícito do contribuinte legal, quando o contribuinte de
fato não exerça contra ele o direito o direto de regresso (GIULIANI
FONROUGE, Anteproyecto de Código Fiscal, p. 420). Todavia, a fim
de não impor ao contribuinte legal a prova negativa da transferência
do imposto, circunscreveu-se, no artigo 131, a hipótese aos casos em
que a lei expressamente determine ou faculte aquela transferência; e,
para impedir que o fisco possa reter tributos indevidos, assegurou-se,
no § único daquele artigo, a sub-rogação, no direito à restituição, ao
contribuinte de fato que prove ter suportado o ônus financeiro do
tributo [...].
O exame dessas linhas deixa bem claro que as motivações que
guiaram a Comissão Especial do Código Tributário Nacional eram no
sentido de restringir a entrega, ao contribuinte de direito, do direito
amplo e irrestrito à repetição de indébito. Assim, cabe a ele
(contribuinte de direito) o direito ao indébito, salvo se o tributo
repercutir financeiramente no preço, ocasião em que caberá àquele
que suportou o encargo financeiro do tributo ilícito – o contribuinte de
fato.
A jurisprudência do STJ, sobre a caracterização do ISS como
tributo indireto que repercute no preço, vai nesse sentido, vejamos:
PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM
RECURSO ESPECIAL. SUPOSTA VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO
CPC. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ACÓRDÃO RECORRIDO.
TRIBUTÁRIO. ISS. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. REPETIÇÃO DE
INDÉBITO. PROVA DA NÃO REPERCUSSÃO. EXIGIBILIDADE.
ARTIGO 166 DO CTN. ESPECIAL EFICÁCIA VINCULATIVA DO
ACÓRDÃO PROFERIDO NO RESP N. 1.131.476/RS.
REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. HONORÁRIOS
ADVOCATÍCIOS. GRAU DE SUCUMBÊNCIA. REEXAME DO
CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE.
SÚMULA 7/STJ.
1. Não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou
contradição, não fica caracterizada ofensa aos arts. 165 e 535 do
CPC.
2. A Primeira Seção desta Corte, ao apreciar o REsp n.
1.131.476/RS (recurso submetido à sistemática prevista no art. 543-C
do CPC, c/c a Resolução 8/2008 – Presidência/STJ), pacificou
entendimento no sentido de que a pretensão repetitória de valores
indevidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de
bens móveis hipótese em que o tributo assume natureza indireta
reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese
de ter transferido o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a
recebê-los.
3. O reexame de matéria de prova é inviável em sede de recurso
especial (Súmula 7/STJ).
4. Agravo regimental não provido.
(STJ. AgRg no AREsp 404249/SC. Rel. Min. Campbell Marques.
DJe 04/12/2013)
1.3. O ISS como imposto cumulativo
Na seção 1.2 supra, ficou bem claro que o ISS é tributo indireto
que repercute no preço do serviço, de modo a ser repassado
economicamente ao adquirente do serviço. Esse repasse gera o
efeito cumulativo do ISS. Vejamos.
A veiculação de regimes não cumulativos tem o objetivo de
extirpar o efeito cascata dos tributos indiretos que incidem sobre cada
uma das etapas de uma determinada cadeia. Por esse raciocínio, é
correto dizer, a contrario sensu, que, quando vigente a
cumulatividade, os preços finais de bens e serviços são
artificialmente inflados por tributos. Realmente, conforme visto na
seção 1.2, pelo fato de repercutirem nos preços, os tributos indiretos
em geral têm o efeito natural de integrar o valor pago pelas
aquisições de bens e serviços. Assim, não fossem os regimes não
cumulativos, o custo de um serviço ou mercadoria seriam
contabilizados por seu valor bruto, equivalente ao valor líquido da
mercadoria somado ao imposto que gravou a operação na etapa
anterior.
O efeito econômico disso é simples: pelo fato de o custo ser o
ponto de partida para a formação de preços,5 o valor das operações
subsequentes com as mercadorias ou serviços adquiridos seria
composto indiretamente pelos tributos indiretos que incidiram na
operação anterior. Esse valor, por sua vez, seria base de nova
incidênciatributária, devida pelo contribuinte, que levará a cabo a
nova operação, e assim sucessivamente. Logo, haveria incidência de
imposto sobre imposto ao longo de uma cadeia mercantil e/ou de
serviços, resultando, portanto, em uma cumulatividade que implicaria
em um preço artificial, composto em grande parte de tributos
indiretos.
Pois bem. O ISS não é um tributo não cumulativo. Pelo contrário,
é essencialmente cumulativo, o que quer dizer que, em uma
determinada cadeia de serviços, ele se agregará ao custo do serviço
apurado pelo prestador que adquiriu um serviço para dar cabo de sua
própria prestação. Isso acontecerá ao longo de todas as etapas da
referida cadeia de serviços, até o consumidor final. A representação
gráfica abaixo auxilia a compreensão da afirmação aqui formulada.
Importante salientar que os valores relativos ao preço do serviço e ao
próprio ISS já estão calculados por dentro, mais detalhes de como
esse cálculo deve ser feito podem ser encontrados na seção 5.1.
Mais ainda, no gráfico abaixo, a margem de lucro do Prestador B foi
fixada, por premissa, em 40%. Vejamos:
Cenário do ISS como imposto cumulativo – Realidade atual
 
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Para efeitos comparativos, vejamos como seria a apuração do ISS
caso se sujeitasse ao regime não cumulativo:
Cenário do ISS como imposto não cumulativo – Realidade
hipotética
A análise das simulações acima dá conta de que, em razão da
cumulatividade do ISS, há cerca de R$ 7,75 a mais no preço cobrado
ao consumidor final pelo Prestador B, que é apenas ISS (tanto assim
que a diferença a maior é de exatos 5%, que é a alíquota utilizada no
exemplo).
1.3.1. Exceção ao regime cumulativo do ISS – Dedução das
subempreitadas
Na obra PIS e Cofins, volume II da presente Coleção de Tributos
Indiretos, expus o que é o princípio da neutralidade tributária. Por ele
se busca o fortalecimento da capacidade econômica do consumidor
sem prejudicar, por outro lado, as riquezas às quais o Erário tem
direito de receber por meio das receitas tributárias. Em suma, busca
um valor específico que se erradia a todos os agentes econômicos:
desoneração tributária. Nesse sentido é a lição de Fernando Zilveti: 6
“Considera-se neutro o sistema tributário que não interfira na
otimização da alocação de meios de produção, que não provoque
javascript:void(0)
distorções e, assim, configura segurança jurídica para o livro
exercício da atividade empresarial. A ideia-força contida na
neutralidade propõe que se evite onerar a força econômica do
contribuinte-empresa, ao mesmo tempo em que se alcance a força
econômica do consumidor.”
Edison Carlos Fernandes e Ives Gandra da Silva Martins7
apontam que a não cumulatividade que conhecemos é uma das
formas de neutralidade em ralação aos tributos plurifásicos. Vejamos:
“Nessa linha de raciocínio, a não cumulatividade seria uma forma
de operar a neutralidade, de garantir um sistema tributário neutro,
especialmente no que diz respeito aos tributos plurifásicos.”
Mas, afinal, quais são efetivamente os métodos de que se pode
lançar mão para alcançar a neutralidade tributária? De acordo com o
direito comparado, os métodos são cinco: (i) método direto subtrativo;
(ii) método direto aditivo; (iii) método indireto aditivo; (iv) método
indireto subtrativo; e (v) método crédito de tributo.
À presente seção interessa o método direto subtrativo, pelo qual
se apura o montante do tributo a ser pago mediante a aplicação de
determinada alíquota sobre a diferença entre entradas e saídas de
bens ou serviços, valoradas, respectivamente, de acordo com o seu
valor de aquisição (em relação às entradas – compras) e seu valor de
venda ou preço do serviço (em relação às saídas de mercadorias ou
prestação de serviços). Essa é a doutrina de Fabiana Del Padre
Tomé,8 vejamos:
“(a) Método direto subtrativo: consiste na aplicação da alíquota do
tributo sobre a diferença entre as saídas e as entradas. Deduz-se da
base de cálculo do tributo (preço de venda, do serviço, valor da
receita etc.) o montante correspondente às entradas necessárias ao
desenvolvimento da atividade tributada, para, sobre esse resultado,
aplicar-se a alíquota.”
Esse método interessa à presente seção porque é justamente o
que se aplica ao regime de apuração do ISS sobre os serviços de
construção civil. De acordo com o art. 9.º, § 2.º, b do Dec.-lei
406/1968, o prestador dos serviços de construção civil pode deduzir
da base de cálculo do ISS por ele devido os valores da
subempreitada contratada para a prestação do serviço. Vejamos:
javascript:void(0)
javascript:void(0)
Art. 9.º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. (...) §
2.º Na prestação dos serviços a que se referem os itens 19 e 20 da
lista anexa o imposto será calculado sobre o preço deduzido das
parcelas correspondentes: a) ao valor dos materiais fornecidos pelo
prestador dos serviços; b) ao valor das subempreitadas já tributadas
pelo imposto” (grifos nossos).
No passado, havia dúvidas quanto à aplicabilidade do referido
regime no contexto do atual figurino legal do ISS. É que, na redação
original contida no Projeto de Lei Complementar nº 1/1991, a
dedução da subempreitada estava no artigo 7º, § 2º, II, da LC
116/2003. Entretanto, esse dispositivo foi vetado pelo Presidente da
República, por contrariedade ao interesse público. Vejamos suas
razões na respectiva mensagem de veto:
Inciso II do § 2º do art. 7º
“Art. 7º
..................................................................................................
§ 2º
........................................................................................................
II – o valor de subempreitadas sujeitas ao Imposto Sobre Serviços
de Qualquer Natureza.
..............................................................................................................”
Razões do veto
“A norma contida no inciso II do § 2º do art. 7º do projeto de lei
complementar ampliou a possibilidade de dedução das despesas
com subempreitada da base de cálculo do tributo. Na legislação
anterior, tal dedução somente era permitida para as subempreitadas
de obras civis. Dessa forma, a sanção do dispositivo implicaria perda
significativa de base tributável. Agregue-se a isso o fato de a redação
dada ao dispositivo ser imperfeita. Na vigência do § 2º do art. 9º do
Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, somente se permitia
a dedução de subempreitadas já tributadas pelo imposto. A redação
do Projeto de Lei Complementar permitiria a dedução de
subempreitadas sujeitas ao imposto. A nova regra não exige que haja
pagamento efetivo do ISS por parte da subempreiteira, bastando para
tanto que o referido serviço esteja sujeito ao imposto. Assim, por
contrariedade ao interesse público, propõe-se o veto ao dispositivo.”
Ou seja, em resumo, as razões do veto foram as seguintes:
• No antigo Dec.-lei 406/1968, a dedução permitida era
aquela decorrente de subempreitadas de obras civis. Mas,
no Projeto de Lei Complementar nº 1/1991, a dedução se
relacionava ao valor de toda e qualquer subempreitada.
Essa modificação poderia trazer significativos prejuízos ao
Erário Municipal.
• No antigo Dec.-lei 406/1968, permitia-se a dedução da
subempreitada já efetivamente tributada pelo ISS e com
imposto já recolhido. Na redação do Projeto de Lei
Complementar nº 1/1991, entretanto, a possibilidade se
estende às subempreitadas apenas sujeitas ao ISS, mas
não necessariamente já tributadas e em relação às quais os
respectivos contribuintes já tivessem recolhido o ISS.
Tendo em vista a clara preferência ao regime anterior de
deduções de subempreitadas, a LC 116/2003 não revogou
expressamente o art. 9.º, § 2.º, b do Dec.-lei 406/1968.
Ocorre que, no passado, não se tinha visão muito clara das
razões do veto ao art. 7º, § 2º, II, da LC 116/2003, ou mesmo da não
revogação do art. 9.º, § 2.º, b do Dec.-lei 406/1968. Muito por isso, as
decisões judiciais vinham no sentido de não permitir, na vigência da
LC 116/2003, a dedução da subempreitada. Vejamos:
TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE
INSTRUMENTO.CONSTRUÇÃO CIVIL. ISS. BASE DE CÁLCULO.
DEDUÇÃO DOS VALORES REFERENTES AOS MATERIAIS
EMPREGADOS E ÀS SUBEMPREITADAS. IMPOSSIBILIDADE.
AGRAVO NÃO PROVIDO.
1. “A jurisprudência do STJ pacificou o entendimento de que, em
se tratando de empresas do ramo de construção civil, a base de
cálculo do ISS é o custo integral do serviço, não sendo admitida a
dedução do montante relativo às subempreitadas e aos materiais
utilizados na obra” (AgRg no Ag 1.257.286/RS, Rel. Min. BENEDITO
GONÇALVES, Primeira Turma, DJe 8/6/10).
2. Agravo regimental não provido.
(STJ. 1ª Turma. AgRg no Ag 1262610 / MG. Rel. Min. Arnaldo
Esteves Lima. DJe 02/08/2011)
Entretanto, o STJ reviu seu posicionamento em função de decisão
dada pelo STF em sede de Repercussão Geral. Sua jurisprudência,
doravante, é pela possibilidade de dedução, da subempreitada, da
base de cálculo dos serviços de construção civil. In verbis:
PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL EM
AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSITIVO DE LEI.
ISSQN. SUBEMPREITADAS. DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO.
POSSIBILIDADE. REVISÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ, EM
CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO PACÍFICO NO STF.
1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 603.497/MG, no
rito do art. 543-B do CPC, concluiu ser possível, mesmo na vigência
da Lei Complementar 116/2003, a dedução da base de cálculo do ISS
do material empregado na construção civil.
2. No RE 599.582/RJ, concluiu-se que a orientação adotada no
recurso acima é aplicável aos valores das subempreitadas, nos
seguintes termos: “embora no RE 603.497 a controvérsia tenha se
limitado à dedução da base de cálculo do ISS dos gastos com
materiais de construção, o entendimento consagrado naquele julgado
também se aplica aos valores das subempreitadas, nos termos da
pacífica jurisprudência deste STF”.
3. Com a finalidade de prestigiar a função uniformizadora da
jurisprudência, de modo a evitar utilização de recursos cujo resultado
já é antecipadamente conhecido, deve ser acolhida a pretensão
recursal. Precedente da Primeira Turma no mesmo sentido:AgRg no
AgRg no Ag 1410608/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira
Turma, DJe 21.10.2011.
4. Recurso Especial provido para julgar improcedente o pedido
deduzido na Ação Rescisória. Inversão dos ônus de sucumbência.
(STJ. 2ª Turma. REsp 1327755/RJ. Rel. Min. Herman Benjamin.
DJe 05/11/2012)
1
Art. 13, § 4º, inciso I, da Lei Complementar nº 87/96.
2
Art. 182, inciso II, alínea “c”, c/c art. 413, inciso V, alíneas “i” e “j”, do RIPI/10.
3
MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brigo. Repetição do tributo indireto:
incongruências e contradições. São Paulo: Malheiros: 2011. p. 13.
4
Trabalho da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro:
Oficinas do Serviço Gráfico do IBGE, 1954, p. 58 e 223.
5
Em regra, o preço é o valor resultante do custo da mercadoria, despesas da
empresa, margem de lucro e, ao final, dos tributos incidentes sobre venda (ICMS,
ISS, PIS e Cofins).
6
Zilveti, Fernando. Variações sobre o princípio da neutralidade no direito tributário
internacional. In: Costa, Alcides Jorge e outros (coords.). Direito tributário atual n.
19. São Paulo: Dialética, 2005. p. 24-25.
7
Fernandes, Edison Carlos; Martins, Ives Gandra da Silva. Não cumulatividade do
PIS/Cofins – implicações contábil, societária e fiscal. São Paulo: Quartier Latin,
2007. p. 29.
8
Tomé, Fabiana Del Padre. Natureza jurídica da não cumulatividade da contribuição
ao PIS/Pasep e da Cofins: consequências e aplicabilidade. In: Peixoto, Marcelo
Magalhães; Fischer, Octávio Campos (coords.). PIS-Cofins questões atuais e
polêmicas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 542.
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2. INCIDÊNCIA
2. INCIDÊNCIA
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2. INCIDÊNCIA
2.1. Fato gerador
De acordo com o artigo 1º, caput, da LC 116/2003, o fato
gerador do ISS é a prestação dos serviços constantes da lista
anexa, ainda que esses não se constituam atividade
preponderante do prestador. Como complemento, o § 4º do
mesmo artigo dispõe que a incidência do imposto não depende
da denominação dada ao serviço prestado. Segue sua
redação:
Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de
competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como
fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa,
ainda que esses não se constituam como atividade
preponderante do prestador.
(...)
§ 4º A incidência do imposto não depende da denominação
dada ao serviço prestado.
Dessa leitura resulta que, do caput e também do § 4º do
artigo 1º da Lei Complementar n. 116/03, a investigação da
incidência do ISS passa pelo exame dos seguintes elementos:
(i) qual a extensão do conceito de serviço alcançado pelo ISS;
(ii) a taxatividade da lista de serviços; (iii) quais os critérios
para se identificar a natureza do serviço tributado pelo
imposto. É o que será feito nas seções a seguir.
2.2. A extensão do conceito de serviço
Historicamente, o estudo da definição da extensão do
conceito de serviço passou sempre pelo binômio obrigação de
dar e obrigação de fazer. A doutrina civilista vem, há muito,
enveredando esforços para essa definição, que inclusive foi
abraçada pelo Supremo Tribunal Federal quando do famoso
julgamento do RE nº 116.121-1, no qual se definiu que não há
ISS sobre locação de bens móveis. Mais recentemente, essa
posição foi reafirmada pela edição da Súmula Vinculante nº
31.
Entretanto, não se pode deixar de reconhecer que há
outros critérios para a definição do que é serviço. Esse novo
vislumbre se apega, entre outros elementos, aos dizeres do
artigo 110 do Código Tributário Nacional c/c artigo 3º da Lei nº
8.078/90, intitulada Código de Defesa do Consumidor.
As seções 2.2.1 e 2.2.2 infra serão dedicadas ao estudo
dos detalhes dessas duas vertentes, conforme vai a seguir.
2.2.1. Obrigação de dar versus obrigação de fazer
Antes de qualquer definição própria a ser dada quanto ao
conceito de serviços, julgo ser de grande valia e extrema
relevância transcrever em proêmio a definição (e distinção) do
saudoso civilista Caio Mário da Silva Pereira1 quanto às
obrigações de dar e fazer. Vejamos:
“Quando se diferencia a obrigação de dar da de fazer, tem-
se em vista a qualidade da prestação. [...] conservamos aqui
estas categorias ou figuras de obrigações separadamente, um
tanto por haver a lei guardado fidelidade a tais distinções
herdadas do Direito romano, como ainda por conservar em
nosso direito perfeita extremação temática a obligatio dandi da
obligatio faciendi, à vista de guardar ele a mesma sistemática
romana, recusando efeito traslatício do domínio ao contrato,
diretamente, em contraposição à orientação francesa e
italiana.
[...]
Os casos extremos não padecem dúvida, pois que uma
envolve uma traditio ou entrega, e outra uma ação pura.
[...]
Entre as obrigações positivas, cuida-se, em primeiro plano,
das obrigações de dar, que ocupam praça relevante e são de
freqüente incidência na vida de todos os dias. Consistem na
entrega de uma coisa, seja a tradição realizada pelo devedor
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ao credor em fase de execução, seja a tradição constitutiva de
direito, seja a restituição de ciosa alheia a seu dono.
[...]
O outro tipo de obrigação positiva é a de fazer, que se
concretiza genericamente em um ato do devedor.” (grifei)
A doutrina do também saudoso e memorável civilista
Orlando Gomes2 caminha nesse sentido:
“33. Prestações positivas. São positivas as prestações
consistentes em um ou vários atos do devedor.
Subdividem-se em prestações de coisas e prestações de
fatos. Constituem objeto, respectivamente, das obrigações de
dar e de fazer.
[...]
A distinção entre as obrigações de dar e as de fazer deve
ser traçada em vista do interesse do credor, porquanto as
prestações de coisas supõem certa atividade pessoaldo
devedor e muitas prestações de fatos exigem dação. Nas
obrigações de dar, o que interessa ao credor é a coisa que
lhe deve ser entregue, pouco lhe importando a atividade do
devedor para realizar a entrega. Nas obrigações de fazer, ao
contrário, o fim é o aproveitamento do serviço contratado. Se
assim não fosse, toda obrigação de dar seria de fazer, e vice-
versa.” (grifei)
Vale transcrever, também, a doutrina de Álvaro Villaça
Azevedo,3 renomado estudioso do Direito Civil e do Direito
Romano:
“Pela classificação das obrigações elas podem ser de três
espécies: positivas de dar e de fazer e negativas de não fazer.
[...]
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javascript:void(0)
O devedor, que se obrigou a entregar ou a restituir coisa
certa, determinada, ao seu credor, deve cumprir sua obrigação
de dar, entregando ou restituindo essa mesma coisa, sem que
haja qualquer alteração no objeto da prestação jurídica. Assim,
quem vendeu sua vitrola deve entregá-la ao comprador, como
este deve, também, entregar ao vendedor o preço exato da
coisa adquirida.
[...]
É preciso, repito, que haja a entrega ou a restituição do
objeto, ou seja, a tradição da coisa (art. 237 do CC), pois a
simples convenção das partes, em nosso Direito, não transfere
o domínio dos bens.
[...]
A obrigação de fazer, obligatio faciendi, é positiva, como a
obrigação de dar.
Por ela, o devedor compromete-se a prestar uma atividade
qualquer, lícita e vantajosa, ao seu credor.
[...]
Na obrigação de fazer existe alguma coisa que deve ser
produzida pela atividade humana de alguém, que a tanto se
compromete.
A grande diferença entre as obrigações de dar e as de
fazer mostrou Robert Joseph Pothier, quando ensinou que
aquele que se compromete a dar alguma coisa pode ser
constrangido a entregá-la, por autoridade da justiça, quando a
coisa se encontrar em seu poder, quer queira quer não queira
o devedor. Já quem se obriga a fazer alguma coisa não pode
ser constrangido a fazê-la, resolvendo-se a obrigação em
perdas e danos, quando não for por ela cumprida
devidamente.
A obrigação de fazer consiste na realização pessoal, de
cunho imaterial ou material.” (grifei)
Dada a complexidade do tema a ser enfrentado nas linhas
seguintes, não é demais lembrar a doutrina de Arnaldo
Rizzardo4 sobre a distinção entre obrigação de dar e obrigação
de fazer:
“Como a própria palavra está a indicar, a obrigação de dar
compreende a entrega de coisa. Por ela, há o compromisso de
entregar algo para alguém. Existe um vínculo jurídico através
do qual se firmou o dever de fornecer ao credor um
determinado bem, que tanto pode ser móvel como imóvel.
[...]
Quem se obriga a dar coisa certa está autorizando o credor
a exigir o cumprimento da obrigação. O devedor compromete-
se a fornecer ao credor o bem especificado. A tradição é o
elemento que compõe tal compromisso, posto que se constitui
com a entrega de uma coisa móvel ou imóvel. A transferência
efetiva dimensiona-se na compra e venda ou na doação. Já a
concessão de uso revela as figuras do comodato ou do
empréstimo. Em todas as espécies há a tradição, que se
materializa com a transferência ou a passagem de uma coisa
de um indivíduo para outro.
[...]
O sentido de ‘fazer’ compreende a idéia de prestação, de
trabalho, de ação. Há um ato do devedor que deve ser feito.
Está ele preso a um compromisso. Cumpre-lhe que preste um
serviço. E, assim, combinam-se trabalhos a serem executados,
seja de ordem física, artística, científica ou intelectual.
[...]
As obrigações de fazer traduzem-se em um ato humano,
ou, mais corretamente, na realização de atos humanos
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positivos.
[...]
Na obrigação de fazer existe uma atividade pessoal do
devedor, que se dimensiona na execução de um trabalho físico
ou intelectual, na realização de obra, na prestação de um fato.
Em tudo há o emprego da energia física ou mental, de acordo
com o trabalho físico ou intelectual.” (grifei)
A partir dessas linhas gerais, é lícito assumir que os
devedores de prestações de serviços são aqueles que se
obrigam a realizar um ato, um esforço imaterial (intelectual ou
não) em favor do credor que, em contrapartida ao esforço
realizado, deve remunerar o prestador de serviços na forma
avençada em contrato. Em outras palavras, é forçoso concluir
que prestações de serviços constituem verdadeiras obrigações
de fazer como atividades-fim da avença contratual, porquanto
essa atividade do devedor é que constitui o interesse do
credor, conforme dito por Orlando Gomes na doutrina
transcrita alhures.
Tal definição foi acolhida em voto vencedor proferido pelo
Min. Marco Aurélio Melo quando do julgamento do RE nº
116.121-1, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no qual
decidiu pela não incidência do ISS sobre locação de bens
móveis justamente porque esse contrato (a locação) não
constitui uma obrigação de fazer, nos moldes postos acima,
mas uma obrigação de dar. Apesar de tal decisão ter sido
proferida em 2001, fato é que os conceitos lá postos ainda
hoje são atuais, tanto assim que o aludido RE nº 116.121-1 é
um dos precedentes que embasam a Súmula Vinculante nº 31,
pelo qual está dito que “é inconstitucional a incidência do
Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre
operações de locação de bens móveis”. A premissa dessa
Súmula é justamente a identificação de uma prestação de
serviços como sendo uma obrigação de fazer. A confirmar a
atualidade do entendimento firmado na Súmula Vinculante nº
31, vejamos a decisão abaixo:
“AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. INCIDÊNCIA DE ISS SOBRE LOCAÇÃO
DE BENS MÓVEIS. PRETENSA NECESSIDADE DE NOVA
INTERPRETAÇÃO APÓS O ADVENTO DA LC Nº 116/2003.
ENTENDIMENTO QUE INDEPENDE DO DIPLOMA DE
REGÊNCIA POR ESTAR AMPARADO NO CONCEITO
CONSTITUCIONAL DE SERVIÇO. 1. A não incidência do ISS
sobre a locação de bens móveis decorre da impossibilidade do
poder de tributar vir a modificar o conceito constitucional de
serviço que provém do direito privado. Tal conclusão afasta a
competência do sujeito ativo com relação a qualquer dos
diplomas que tenham disciplinado as normas gerais sobre o
imposto. Não é por outro motivo que o item da atual lista de
serviços que previa a possibilidade de fazer o tributo incidir
sobre a atividade em questão foi objeto de veto presidencial. 2.
Agravo regimental a que se nega provimento.
(...)
2. Segundo entendimento desta Corte, o poder de tributar
municipal não pode alterar o conceito de serviço consagrado
pelo direito privado, consoante prevê o art. 110 do Código
Tributário Nacional. Ademais, não há que se falar na
superação do entendimento da Súmula Vinculante nº 31 pelo
advento da edição da LC nº 116/2003. É certo que a Lei
Complementar nº 116/2003 revogou a lista de serviço da
legislação anterior e estabeleceu um novo rol de
materialidades para o imposto. Na lista atual, a locação de
bens móveis seria o item 3.01 (Locação de bens móveis) da
lista de serviços tributáveis. Entretanto, a intenção do
legislador não se confirmou por força do veto presidencial, que
foi motivado pela orientação jurisprudencial desta Corte.
Confiram-se, as razões adotadas:
“Item 3.01 da Lista de serviços ‘3.01 – Locação de bens
móveis.’ Razões do veto Verifica-se que alguns itens da
relação de serviços sujeitos à incidência do imposto merecem
reparo, tendo em vista decisões recentes do Supremo Tribunal
Federal. São eles: O STF concluiu julgamento de recurso
extraordinário interposto por empresa de locação de
guindastes, em que se discutia a constitucionalidade da
cobrança do ISS sobre a locação de bens móveis, decidindo
que a expressão ‘locação de bens móveis’ constante do item
79 da lista de serviços a que se refere o Decreto-Lei nº 406, de
31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei
Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, é
inconstitucional (noticiado no Informativo do STF no 207). O
Recurso Extraordinário 116.121/SP, votado unanimemente
pelo Tribunal Pleno, em 11 de outubro de 2000, contém linha
interpretativa no mesmo sentido, pois a ‘terminologia
constitucional do imposto sobreserviços revela o objeto da
tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o
tributo a contrato de locação de bem móvel. Em direito, os
institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprios,
descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis,
práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições
são de observância inafastável.’ Em assim sendo, o item 3.01
da Lista de serviços anexa ao projeto de lei complementar ora
analisado, fica prejudicado, pois veicula indevida (porque
inconstitucional) incidência do imposto sob locação de bens
móveis.”
3. Também não merece prosperar o argumento de que há
fortes indícios da superação do entendimento deste Tribunal a
respeito da matéria em exame, uma vez que a jurisprudência
permanece afirmando que não incide ISS sobre locação de
bens móveis e que a Constituição não concede aos entes
municipais da federação a competência para alterar a
definição e o alcance de conceitos de Direito Privado para fins
de instituição do tributo. Confiram-se, a propósito, os
precedentes a seguir:
“Imposto sobre serviços (ISS) – Locação de veículo
automotor – Inadmissibilidade, em tal hipótese, da incidência
desse tributo municipal – Distinção necessária entre locação
de bens móveis (obrigação de dar ou de entregar) e prestação
de serviços (obrigação de fazer) – Impossibilidade de a
legislação tributária municipal alterar a definição e o alcance
de conceitos de Direito Privado (CTN, art. 110) –
Inconstitucionalidade do item 79 da antiga lista de serviços
anexa ao Decreto-Lei nº 406/68 – Precedentes do Supremo
Tribunal Federal – Recurso improvido. – Não se revela
tributável, mediante ISS, a locação de veículos automotores
(que consubstancia obrigação de dar ou de entregar), eis que
esse tributo municipal somente pode incidir sobre obrigações
de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura
contratual da locação de bens móveis. Precedentes (STF).
Doutrina.” (RE 446.003-AgR, Rel. Min. Celso de Mello)
“Na espécie, o imposto, conforme a própria nomenclatura,
considerado o figurino constitucional, pressupõe a prestação
de serviços e não o contrato de locação. Em face do texto da
Carta Federal, não se tem como assentar a incidência do
tributo na espécie, porque falta o núcleo dessa incidência, que
são os serviços. Observem-se os institutos em vigor tal como
se contêm na legislação de regência. As definições de locação
de serviços e locação de móveis vêm-nos do Código Civil. Em
síntese, há de prevalecer a definição de cada instituto, e
somente a prestação de serviços, envolvido na via direta o
esforço humano, é fato gerador do tributo em comento.
Prevalece a ordem natural das coisas cuja força surge
insuplantável; prevalecem as balizas constitucionais, a
conferirem segurança às relações Estado-contribuinte;
prevalece, alfim, a organicidade do próprio Direito, sem a qual
tudo será possível no agasalho de interesses do Estado,
embora não enquadráveis como primários.” (AI 623.226-AgR,
Rel. Min. Marco Aurélio)
4. Diante do exposto, nego provimento ao agravo
regimental.
(STF. 1ª Turma. RE 602.295 AGR/RJ. Rel. Min. Roberto
Barroso. DJe 22/04/2015)
A jurisprudência do STJ também vem identificando a
prestação de serviço como uma obrigação de fazer que
constitua a atividade-fim contratual avençada, a exemplo do
que fora decidido no REsp nº 888.852/ES, que, ao julgar a não
incidência do ISS sobre determinada atividade, definiu o
núcleo de um serviço nos seguintes termos:
“4. Desta sorte, o núcleo do critério material da regra matriz
de incidência do ISS é a prestação de serviço, vale dizer:
conduta humana consistente em desenvolver um esforço em
favor de terceiro, visando a adimplir uma ‘obrigação de fazer’
(o fim buscado pelo credor é o aproveitamento do serviço
contratado).”
(STJ. REsp nº 888.852/ES. Rel. Min. Luiz Fux. DJe
01/12/2008.)
Alguns Fiscos Municipais já se pronunciaram a esse
respeito, a exemplo de Belo Horizonte. Na Solução de
Consulta transcrita abaixo, determinado contribuinte informou
que aluga servidores de uma empresa nos EUA e, depois,
aluga-os novamente a terceiros aqui no Brasil de forma
fracionada. Disse que a locação de espaço virtual dentro
desses servidores é para que os seus clientes possam utilizá-
los para armazenamento de dados eletrônicos, tais como
arquivos de fotos pessoais, e-mail, web-sites, dentre outros,
desde que para uso exclusivo do cliente. Ao final, foi
manifestado o entendimento de que não há ISS sobre essa
atividade, porque não listada no rol da LC 116/2003. Vejamos:
RESPOSTA:
Preliminarmente, julgamos procedente submeter o
questionamento da Consulente à avaliação da Gerência
responsável pela administração geral, o controle e o
lançamento do ISSQN que se manifestou pela eficácia e
confirmação do entendimento exarado em face da
Reformulação de Consulta nº 003/2012, referente à Consulta
nº 100/2012, concluindo, desta feita, que “de fato, a operação
descrita pela requerente à fl. 3 não constitui espécie de
quaisquer das hipóteses de incidência tipificadas nos subitens
de nos 1.01 a 1.08 da lista. Por conseguinte, existente a
referida lacuna normativa, não se sujeita o correspondente
negócio jurídico à incidência do ISSQN.”
Nestes termos, corroborando o entendimento manifesto
pela Gerência, temos que a atividade sob consulta,
devidamente qualificada e levada a efeito pela mera “locação
de espaço virtual” para terceiros, dentro de servidores que a
Consulente aluga de uma empresa nos EUA “para que os seus
clientes possam utilizar para armazenamento de dados
eletrônicos tais como: arquivos de fotos pessoais, E-mail,
Web-Sites, dentre outros, desde que para uso exclusivo do
cliente”, conforme asseverado pela Consulente, não está
elencada na Lista de Serviços tributáveis anexa à Lei
Complementar nº 116/2003, reproduzida na Lei nº 8.725/2003,
não configurando, portanto, para fins tributários, válida e
legítima prestação de serviços sujeita à incidência do ISSQN.
Assim, observada a efetiva ocorrência dos pressupostos
materiais vinculados ao fato gerador da obrigação tributária
sob análise, é de se concluir que o entendimento exarado em
face da Reformulação de Consulta nº 003/2012, referente à
Consulta nº 100/2012, permanece válido e eficaz, razão pela
qual deve ser integralmente ratificado em toda a sua extensão
e efeitos.
Por oportuno, cumpre-nos reproduzir o entendimento
conclusivo expresso na indigitada Reformulação, ora ratificado:
“Não estando a operação de hospedagem de banco de
dados ou mesmo a locação de espaço virtual prevista na lista
de serviços anexa à LC 116, inocorre quanto àquela o fato
gerador do ISSQN, restando, assim, afastada a incidência
deste imposto sobre a atividade. Com efeito, estamos
propondo a reformulação da resposta da consulta nº 100/2012
para considerar a atividade de locação de espaço virtual ou
hospedagem de banco de dados intributável a título de
ISSQN”.
Embora não esteja explícito na decisão, fato é que a
locação de bens não está na lista de serviços justamente
porque o item 3.01 foi declarado inconstitucional pelo STF por
ser obrigação de dar.
Nesse contexto, seguindo-se esse raciocínio, a princípio
toda e qualquer atividade que, embora prevista na lista anexa
à LC 116/2003, se constitua como verdadeira obrigação de dar
não poderia se sujeitar ao ISS, como, por exemplo (mas não
apenas): (i) cessão de direito de uso de marcas e de sinais de
propaganda (item 3.02); (ii) locação, sublocação,
arrendamento, direito de passagem (item 3.04); (iii) cessão de
andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas de uso
temporário (item 3.05); entre outros que cujo núcleo
obrigacional venha a assumir verdadeira obrigação de dar,
seja o dar relativo à propriedade ou à posse de terminada
coisa.
Entretanto, há um outro conceito do que possa ser serviço,
que certamente pode ser utilizado pelos Fiscos Municipais
para a defesa de seu crédito tributário. É o que será visto em
seguida.
2.2.2. Um possível novo conceito de serviço a ser
utilizado pelos Fiscos Municipais
Penso quea melhor definição de serviços é aquela
decorrente das conclusões sobre obrigações de fazer,
conforme seção 2.2.1 supra.
Mas, não se pode deixar de reconhecer que há, no País,
uma importante corrente que defende que sejam tributadas as
atividades que eram inexistentes em nosso cotidiano até
pouco tempo atrás.
Essa corrente é adepta à defesa da incidência do IVA –
Imposto sobre Valor Agregado, em substituição aos inúmeros
tributos previstos no Sistema Tributário Nacional para as
relações de consumo, especialmente o ICMS, ISS e as
Contribuições PIS e COFINS. Em suma, defende-se que
qualquer atividade remunerada deve ser tributada, não sendo
plausível que tenhamos, nos dias atuais, a não tributação em
razão do uso fechado de conceitos, muitos deles
ultrapassados, como, por exemplo, condicionar a incidência do
ISS à verificação da existência de uma obrigação de fazer. Em
outras palavras, alguns estudiosos argumentam que as
relações de consumo, de modo geral, devem ser tributadas
pelo ICMS ou pelo ISS, não sendo legal/constitucional que os
novos modelos de negócios existentes não sejam tributados
simplesmente pelo fato de as atividades não se enquadrarem
nos conceitos de “prestação de serviço” e/ou de “venda”.
Um bom exemplo do que aqui é dito pode ser encontrado
no Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional n°
2.773/07. Apesar de ser relativamente antigo e tratar sobre a
definição da natureza jurídica das receitas dos setores
financeiro e de seguros para a incidência de PIS e de COFINS,
o citado Parecer ressalta a ideia atual do que deveria ser
considerado como “prestação de serviço”, cujos fundamentos
podem ser aplicados para fins de ISS. A PGFN buscou no
direito privado, mais precisamente no Código de Defesa do
Consumidor, o conceito de prestação de serviços. Observa-se,
através da transcrição abaixo, que a PGFN entende como
prestação de serviço qualquer atividade fornecida no mercado
de consumo:
“53. Não fosse tudo quanto já foi exposto, adicione-se que
é usual, mesmo no linguajar jurídico, referir-se ao conjunto de
relações jurídicas estabelecidas entre um banco e um cliente
como ‘prestação de serviços’. Assim, v.g., a clássica
expressão serviços bancários possui larga utilização em direito
bancário, para referir-se inclusive a operações bancárias
típicas. A própria legislação utiliza-se propositadamente da
expressão ‘prestação de serviço’ para referir-se à atividade
bancária. Nesse sentido, o art. 52 e o § 2º do art. 3º do Código
de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 1990), in verbis:
‘Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública
ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes
despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção,
montagem, criação, construção, transformação, importação,
exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou
prestação de serviços.
§ 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou
imaterial.
§ 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de
consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza
bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as
decorrentes das relações de caráter trabalhista.’” (grifos no
original)
Em complemento, o acórdão do STF proferido pelo Min.
Eros Grau no Recurso Extraordinário n° 592.905 (com
repercussão geral reconhecida), que tratou sobre a incidência
do ISS nos contratos de leasing, traz novos elementos ao
entendimento do que possa ser entendido como serviço. De
acordo com o Ministro, a existência da prestação do serviço
está intrinsicamente relacionada ao núcleo da atividade
constante na Lista de Serviços. Nessa medida, segundo seu
voto vencedor, mesmo que a atividade resulte em uma
obrigação de dar (que, no caso do leasing, é entregar o bem
ao arrendatário), pode haver uma prestação de serviço que
contratualmente tem maior importância que o resultado em si
(que no caso examinado foi o de financiamento). Afinal,
concluiu que toda a atividade de dar consubstancia também
um fazer e há inúmeras atividades de fazer que envolvem um
dar. Finalmente, disse o Min. Eros Grau, o fato de a
Constituição Federal dispor que o ISS incide sobre serviços de
qualquer natureza indica que não se buscou tributar apenas
obrigações de fazer. Na linha desenvolvida no voto, a
expressão de qualquer natureza indica que o ISS não incide
apenas sobre típicas obrigações de fazer, mas sim sobre toda
e qualquer atividade descrita na lista de serviços anexa à LC
116/2003, a quem cabe descobrir o que é serviço para os fins
do inciso III do art. 156 da Constituição Federal. Vejamos:
“Em síntese, há serviços, para os efeitos do inciso III do
artigo 156 da Constituição, que, por serem de qualquer
natureza, não consubstanciam típicas obrigações de fazer.
Raciocínio adverso a este conduziria à afirmação de que
haveria serviço apenas nas prestações de fazer, nos termos do
que define o direito privado. Note-se, contudo, que afirmação
como tal faz tábula rasa da expressão ‘de qualquer natureza’,
afirmada do texto da Constituição. Não me excedo em lembrar
que toda a atividade de dar consubstancia também um fazer e
há inúmeras atividades de fazer que envolvem um dar.
A lei complementar não define o que é serviço, apenas o
declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da Constituição.
Não o inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os
efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição. No
arrendamento mercantil (leasing financeiro), contrato
autônomo que não é contrato misto, o núcleo é o
financiamento, não uma prestação de dar. E financiamento é
serviço, sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante
a existência de uma compra nas hipóteses do leasing
financeiro e do lease-back.” (grifei)
Também temos a posição exarada pelo ilustre Gerd Willi
Rothmann na mesa de debates do Instituto Brasileiro de
Direito Tributário – IBDT, realizada em 12/02/20155, na qual
apresentou a ideia de que serviços sujeitos ao ISS são os
elencados na Lista de Serviços, pois a Constituição
determinou a incidência do imposto sobre “os serviços” e não
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sobre “prestações de serviços”. Em outras palavras, o
professor sustenta que o ISS deve incidir sobre o resultado de
uma atividade, e não sobre a atividade em si. Vejamos
transcrição de parte do debate:
“ [...] O que diz a Constituição sobre essa competência de
tributar dos municípios? Ela diz, ‘competência para incidir
tributo sobre serviços’. Ela não diz sobre a prestação de
serviço. Ela diz sobre o serviço, portanto, sobre o resultado de
uma atividade e não sobre a atividade.
[...]
Nós temos um imposto que incide sobre serviços, e como
não tem conceito, listados, taxativamente, aí vem aquela
discussão toda, numa lista, exatamente pela dificuldade da
ausência do conceito satisfatório.
[...]
Então o aspecto do conceito, o que é serviço? Na verdade,
serviço é aquilo que está na lista. No sentido não de exercício
de uma atividade, mas da entrega de um bem imaterial. ”
(grifei)
Em termos concretos, verifica-se um esboço de uma nova
corrente doutrinária que caminha em direção diametralmente
oposta à posição contida na Súmula Vinculante nº 31. Caso
essa corrente se saia vencedora no futuro, novos modelos de
negócios serão efetivamente tributados pelo ISS, mesmo que
neles se verifique uma obrigação de dar (ceder).
Lançando olhos sobre as atividades baseadas em
streaming – como Spotify e Netflix –, os Fiscos Municipais
podem entender que se tratam de atividades ofertadas ao
mercado de consumo mediante remuneração, o que, por sua
vez, caracterizam serviços a serem tributados pelo ISS
(interpretação conforme artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa
do Consumidor, c/c artigo 110 do Código Tributário Nacional).
Também se pode dizer que as atividades do Netflix e Spotify,
apesar de conterem indeléveis características de obrigação de
dar, também devem ser consideradas prestações de serviços,
na medida em que estas plataformas organizam vídeos e
músicas, respectivamente, e provêm uma série de atividades
que, no conjunto, caracterizamum serviço. Nesse raciocínio
há uma prestação de serviço que antecede a obrigação de dar
e esta “prestação” antecedente não pode ser simplesmente
ignorada para dispensa de tributação.
2.3. A taxatividade da lista de serviços
Conforme o artigo 156, inciso III, da Constituição Federal, a
incidência do ISS se dá sobre serviços de qualquer natureza
definidos em lei complementar. No passado, era a lista anexa
ao Decreto-lei nº 406/68 que definia os serviços a serem
tributados pelo ISS. Atualmente, a tarefa é cumprida pela lista
anexa à LC 116/2003.
A breve leitura do texto constitucional já dá conta, por si, da
importância de tal definição pela lei complementar, porquanto é
verdadeira delimitadora da competência tributária dos
municípios. A se considerar a avaliação de Gerd Willi
Rothmann nas discussões da mesa de debates do IBDT de
12/02/2015, comentada na seção 2.2.2 supra, a valia da lista
de serviços ganha feições ainda mais relevantes porque,
segundo ele, “na verdade, serviço é aquilo que está na lista”.
Ou seja, a lei complementar carrega consigo até mesmo o
poder de dizer o que é serviço, para fins de ISS. Isso vai na
linha das palavras do Ministro Eros Grau proferidas em seu
voto vencedor no Recurso Extraordinário n° 592.905, segundo
as quais “a lei complementar não define o que é serviço,
apenas o declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da
Constituição. Não o inventa, simplesmente descobre o que é
serviço para os efeitos do inciso III do artigo 156 da
Constituição”.
Ocorre que, no mais das vezes, o legislador faz menção ao
termo “e congêneres” ao final da descrição de um serviço.
Para além disso, a prática demonstrou que alguns
contribuintes celebravam contratos com variados nomes, quiçá
para sustentar que seu determinado serviço não era aquele
descrito na legislação e, com esse argumento, escapar da
tributação. Os debates em torno disso levaram a um tema
maior: para fins de determinação da incidência do ISS, a lista
de serviços é taxativa ou enumerativa?
A doutrina de Frederico Araújo de Moura6, publicada nos
idos de 2008, já abordava o tema. Verbis:
(...) Nesse contexto, a lista de serviços anexa à Lei
Complementar n. 116/2003, define o que é ISS, em termos
materiais. Não há sugestão ou exemplificação em seus
enunciados, mas prescrição positiva inescapável, dirigida a
todos os Municípios, que são os destinatários imediatos.
(...)
A lista é, pois, taxativa. Ela determina tudo o que que os
Municípios podem tributa, especificando quais serviços hão de
sofrer incidência do ISS, conforme jurisprudência pacífica de
nossas mais elevadas Cortes, ou seja, prescreve,
denotativamente, o que deve ser entendido ser entendido “por
serviço”, para efeitos tributários. É assim que a lei
complementar defini os fatos geradores de ISS (...)
Essa discussão, bastante travada no passado, atualmente
está pacificada pelo STJ, que, ao julgar o REsp nº
1.111.234/PR em sede de Recurso Repetitivo, assim se
pronunciou:
“(...) O aresto recorrido não merece reparo, pois adotou a
orientação desta Corte, ao concluir que, embora a lista anexa
ao Decreto-lei 406/68 e à Lei Complementar n. 116/2003 seja
taxativa, permite-se a interpretação extensiva, devendo
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prevalecer não a denominação utilizada pelo banco, mas a
efetiva natureza do serviço prestado por ele.
Tal posição foi abraçada pelo STF, como indicado no
acórdão RE 75.952/SP, relatado pelo Ministro Thompson
Flores e hoje encontra-se sedimentada neste Tribunal,
conforme se depreende dos arestos que destaco:
(...)
A lógica é evidente porque, se assim não fosse, teríamos,
pela simples mudança de nomenclatura de um serviço, a
incidência ou não-incidência do ISS. Entretanto, é preciso
fazer a distinção dos serviços que estão na lista,
independentemente do nomen juris, dos serviços que não se
enquadram em nenhum dos itens da lista, sequer por
semelhança.
Nesta oportunidade é preciso registrar que embora não
possa o STJ imiscuir-se na análise de cada um dos itens dos
serviços, é preciso que as instâncias ordinárias, a quem
compete a averiguação dos tipos de serviço que podem ser
tributados pelo ISS, na interpretação extensiva, devendo-se
observar que os serviços prestados, mesmo com
nomenclaturas diferentes, devem ser perqueridos quanto à
substância de cada um deles. Assim, a incidência dependerá
da demonstração da pertinência dos serviços concretamente
prestados, aos constantes da Lista de Serviços, como aliás o
fez o acórdão recorrido.
Com essas considerações, nego provimento ao recurso
especial.” (STJ. 1ª Seção. REsp nº 1.111.234/PR. Rel. Min.
Eliana Calmon. DJe 08 de outubro de 2009)
Assim, embora a lista de serviços seja efetivamente
taxativa, é necessário que sua interpretação seja extensiva.
Isso para que, no plano concreto, seja possível aos Fiscos
Municipais identificar a real natureza de determinado serviço
prestado pelo contribuinte, ao invés de se prender à
nomenclatura dada a ele em contrato. Daí a razão ao STJ
sustentar que se deve “observar que os serviços prestados,
mesmo com nomenclaturas diferentes, devem ser perqueridos
quanto à substância de cada um deles”, para, ao final,
arrematar que “a incidência dependerá da demonstração da
pertinência dos serviços concretamente prestados, aos
constantes da Lista de Serviços”.
Eis, aí, a pertinência do § 4º do artigo 1º da LC 116/2003,
ao dispor que “a incidência do imposto não depende da
denominação dada ao serviço prestado”, mas sim, segundo o
STJ, da identificação da real natureza do serviço prestado.
Este é o tema a ser tratado na seção 2.4 infra.
2.4. A identificação da natureza do serviço prestado
A identificação da natureza do serviço prestado passa,
necessariamente, pelo estudo do direito das obrigações,
porque dali se saberá qual a natureza de uma obrigação em
razão de uma relação jurídica havida.
Segundo o direito das obrigações, a obrigação contratual
está alicerçada em três elementos: (i) o sujeito ativo (credor), a
quem a prestação é devida; (ii) o sujeito passivo (devedor),
que deverá cumprir a obrigação, seja ela de dar, fazer ou não
fazer (a nós interessam apenas as obrigações de dar e fazer)
e; (iii) o objeto da obrigação. Nessa perspectiva, a prestação
obrigacional sempre se constitui na prática de um ato humano
e a relação contratual surge quando o sujeito ativo (credor)
tem o direito de exigir do sujeito passivo (devedor) o
cumprimento da prestação (realização de um trabalho, entrega
de algo etc.). 7 Em contrapartida, a isto há a contraprestação,
que é remuneração.
Por essas linhas vai se afigurando que, no âmbito do direito
civil, a obrigação contratual é a atividade-fim prevista no
contrato.
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A atividade-fim é aquela à qual o contribuinte se propõe a
executar ao seu cliente em contrato (verbal ou escrito),
mediante remuneração específica. É a atividade que, uma vez
executada, gera ao prestador de serviços o direito de receber
remuneração por parte do respectivo tomador, tendo em vista
a satisfação dos interesses empresariais que motivaram a
contratação de um prestador de serviços. Por exemplo,
configura-se uma atividade-fim o ato de construir ou reformar
um prédio, realizar serviços de engenharia, advocacia,
contabilidade ou qualquer outro serviço que consista em uma
“obrigação de fazer”, ou seja, um esforço imaterial em favor de
terceiro (conforme dito no próprio acórdão).
É lícito assumir, portanto, que a caracterização de
determinada atividade como atividade-fim está estreita e
diretamente relacionada aos interesses do credor da relação
contratual (tomador de serviços), que, após delinear quais as
suas necessidades empresariais, contrata determinado
prestador de serviços para cumprir certas obrigações. Uma
vez satisfeito esses interesses do credor da relação jurídica (o
tomador de serviços), a pessoa jurídica que se obrigou a
cumprir os objetivos (o prestador de serviços, devedor da
relação contratual) faz jus a uma remuneração.
Por outro lado, como atividade-meio deve-se entender
como aquela que é realizada com ofim de dar condições para
que determinada entidade jurídica atinja seus objetivos, como,
por exemplo, os serviços de digitação de resultados (atividade-
meio) por empresas que prestam serviços de análises
laboratoriais (atividade-fim), a comunicação verbal de um
professor aos alunos (atividade-meio) para que uma entidade
educacional preste os serviços de ministério de aulas
(atividades-fim) para os quais foi contratada, entre outras.
Assim se vê que uma atividade-fim se sujeita, sem dúvida
alguma, à tributação prevista na legislação. Mas, uma
atividade-meio jamais poderá ser objeto de incidência
tributária, qualquer que seja o tributo, porque não é nem
mesmo um negócio jurídico.
Aplicando-se esses elementos ao temário do conceito de
serviços, é forçoso concluir que prestações de serviços
constituem verdadeiras obrigações contratuais assumidas
como atividades-fim na avença contratual, porquanto essa
atividade do devedor é que constitui o interesse do credor que,
muito por isso, gera receitas ao tomador de serviços. E, se
assim o é, então a verificação do que é serviço passa, antes,
pela averiguação, no contrato, de quais as obrigações
assumidas pelo prestador de serviços satisfarão o interesse do
credor (o tomador de serviços), cujo efetivo cumprimento fará
nascer ao prestador o direito ao recebimento da respectiva
remuneração, que, ao final, será tributada pelo ISS.
Desse modo, a verificação da natureza de determinado
serviço passa pela avaliação comparativa entre o serviço
descrito na lista de serviços e o objeto da obrigação contratual
assumida pelo prestador. Os elementos factuais apresentados
darão conta do real negócio jurídico firmado e, portanto, da
natureza do serviço. O contrato é especialmente importante
porque, sendo o direito tributário um direito de superposição
(artigos 109 e 110 do CTN) e, por outro lado, sendo o contrato
verdadeira fonte de obrigações jurídicas no âmbito do direito
civil, então é ele (o contrato) que deve servir de realidade
jurídica à incidência tributária.
Parece ser relevante um último apontamento à presente
seção. Conforme visto nas seções 2.2.1 e 2.2.2, a
caracterização do que pode ser tido como serviço conta com
duas linhas de interpretação muito claras: a primeira, a
clássica teoria da obrigação de fazer, segundo a qual serviço é
apenas aquela obrigação contratual que corresponda a um
esforço imaterial; a segunda, a tese desenvolvida por alguns
hodiernamente pela qual serviço é toda atividade remunerada,
posta ao mercado de consumo, que esteja descrita na lista de
serviços, ainda que em seu contexto se verifique uma
obrigação de dar (interpretação do artigo 3º do Código de
Defesa do Consumidor c/c entendimento jurisprudencial
contido no Recurso Extraordinário n° 592.905).
Pois bem, após a identificação do real negócio jurídico
firmado e do serviço prestado, caberá ao intérprete avaliar, na
sua visão, qual a melhor teoria sobre o que é serviço, para, ao
final, manifestar seu juízo de valor sobre a incidência do ISS.
2.5. Importação de serviços
A incidência do ISS sobre a importação de serviços está
dada pelo artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003, que assim
prescreve:
“Art. 1º (...)
§ 1º. O imposto incide também sobre o serviço proveniente
do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no
exterior do País.”
Dessa leitura, poder-se-ia dizer que o resultado financeiro
seria um elemento indutor ao pagamento de ISS sob a rubrica
importação de serviços. Seguindo essa linha, se houver
remessa, pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa
de valores, por empresas domiciliadas no País, a residentes
ou domiciliados no exterior como contraprestação por serviço
prestado, haverá o surgimento do fato gerador do ISS. Em
outras palavras, o dispêndio financeiro por empresas
domiciliadas no País implicaria na afirmação de que uma
empresa do exterior auferiu receitas a partir de um serviço por
ela prestado, razão pela qual, nesse contexto, haveria
importação de serviços pela empresa brasileira, já que houve
um serviço proveniente do exterior.
Ocorre que, como sabido, há casos em que o serviço, pago
por empresa brasileira, não necessariamente provém do
exterior, porquanto é no exterior que é iniciado e, depois,
finalizado. É dizer, o nascimento e a extinção das obrigações
contratuais, que compõem o serviço prestado, são
inteiramente no exterior. E também há casos em que o serviço,
apesar de ser iniciado e finalizado no exterior, pode vir a ter
sua utilidade verificada no País.
Nesse panorama, fica claro que a redação do artigo 1º, §
1º, da LC 116/2003 é insuficiente para definir o real fato
gerador do ISS na importação de serviços. Afigura-se
relevante, portanto, refletir sobre os possíveis elementos
indutores que possam vir a deflagrar a obrigação de
recolhimento do imposto.
2.5.1. O resultado financeiro como elemento indutor do
ISS sobre importação de serviços
Conforme já dito na seção 2.5 supra, o já citado artigo 1º, §
1º, da LC 116/2003 dispõe que o ISS incide sobre o serviço
proveniente do exterior. E, também conforme já mencionado,
se se levasse em conta o resultado financeiro como elemento
indutor de pagamento de ISS, a mera remessa de valores ao
exterior, por empresas domiciliadas no País, pagamento de um
serviço, seria suficiente para se fazer incidir o imposto, nos
moldes do artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003.
Entretanto, a tomada do resultado financeiro como único
critério a se interpretar o artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003 pode
levar a sérias distorções jurídicas, mormente nas hipóteses em
que o serviço é integralmente prestado no exterior. Há,
segundo penso, incongruência de ordem constitucional nesse
pensamento. E isso em razão do princípio da territorialidade,
princípio básico que incide ao ISS.
Explico.
O artigo 102 do CTN estatuiu o dito princípio da
territorialidade ao dispor que a legislação de Estados,
Municípios e do Distrito Federal vigora dentro de seus
respectivos territórios. É admitida a extraterritorialidade, mas
apenas nos limites de Convênios ou de normas do próprio
Código Tributário Nacional, ou outras normas gerais expedidas
pela União. In verbis:
“Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito
Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos
territórios, nos limites em que lhe reconheçam
extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que
disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas
pela União”.
Não se pode perder de vista o contexto histórico do próprio
Código Tributário Nacional, de 1966, que veio a lume na
vigência da Constituição Federal de 1946. Nesse panorama, o
direcionamento óbvio do referido art. 102 era ao imposto sobre
vendas e consignações (imposto estadual), bem como ao
imposto sobre indústrias e profissões e atos de sua economia
ou assuntos de competência municipal (impostos municipais).
O aludido dispositivo foi recepcionado pela Constituição
Federal de 1967, pela Emenda Constitucional nº 01/69 e,
finalmente, pela Constituição Federal de 1988, que prevê o
ISS como imposto constante das competências municipais.
Logo, não há dúvidas de que o referido artigo 102 do Código
Tributário Nacional é em tudo aplicável ao ISS.
Pois bem. Em 2001 veio a LC 104, que introduziu a
possibilidade de o Imposto de Renda incidir também sobre
rendimentos auferidos no exterior. Foi inaugurado, aí, o
princípio da universalidade da renda, com a nova redação
dada ao art. 43 do CTN pela mencionada LC 104/2001,
vejamos:
“Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a
renda e proventos de qualquer natureza tem como fato
gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica:
(...)
§ 1.º A incidência do imposto independe da denominação
da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica
ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de
percepção.
§ 2.º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do
exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que
se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto
referido neste artigo”.Isso quer dizer que apenas a União está autorizada a fazer
incidir imposto sobre a totalidade de rendimentos auferidos,
inclusive fora do País. Nesse sentido, admitir que o ISS
vinculado à importação de serviços possa incidir sobre
quaisquer serviços prestados por empresas localizadas fora do
País, especialmente nos casos em que a empresa estrangeira
inicia e finaliza sua prestação no exterior, seria dizer que ao
ISS se aplicaria o princípio da universalidade, o que não é
correto.
O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem
aplicando esse entendimento. In verbis:
“APELAÇÃO – Declaratória – ISS. Importação de serviços.
Artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003. Descabimento. Ofensa ao
princípio da territorialidade. Precedentes deste Tribunal.
Recurso Provido.” (TJSP. Apelação nº 9221533-
34.2007.8.26.0000. 14ª Câmara de Direito Público. Rel. Des.
João Alberto Pezarini. Julgado em 4 de outubro de 2012)
“MANDADO DE SEGURANÇA – Caráter preventivo –
Pretensão pautada na inaplicabilidade da Lei Municipal
13.701/03 no caso de serviço prestado no exterior –
Legislação municipal que não pode alcançá-lo, diante da regra
da territorialidade da lei brasileira, mesmo que haja importação
de serviços – Prestador que se encontra no exterior, não
podendo se sujeitar à lei tributária brasileira – Sentença
reformada – Recurso provido.” (TJSP. Apelação nº 0101584-
09.2006.8.26.0000. 14ª Câmara de Direito Público. Rel. Des.
Gonçalves Rostey. Julgado em 30 de junho de 2011)
“MANDADO DE SEGURANÇA – Caráter preventivo –
Pretensão pautada na inaplicabilidade da Lei Municipal
13.701/03 no caso de serviço prestado no exterior –
Legislação municipal que não pode alcançá-lo, diante da regra
da territorialidade da lei brasileira, mesmo que haja importação
de serviços – Prestador que se encontra no exterior, não
podendo se sujeitar à lei tributária brasileira – Sentença
reformada para conceder a segurança – Recurso provido para
esse fim.” (TJSP. Apelação nº 0155480-98.2005.8.26.0000. 14ª
Câmara de Direito Público. Rel. Des. Gonçalves Rostey.
Julgado em 14 de julho de 2011)
“Ação declaratória de inexistência de relação jurídico-
tributária – ISS – Competência para realização a cobrança é
do local da prestação do serviço – Projeto de construção de
campo de golfe – Natureza intelectual do serviço prestado –
Atividade desenvolvida nos Estados Unidos da América – Lei
Municipal não pode alcançar fato gerador ocorrido no exterior
– Recurso de apelação não provido. Ônus de sucumbência
invertido”. (TJSP. Apelação nº 0188668-14.2007. 15ª Câmara
de Direito Público. Rel. Des. Flávio da Cunha da Silva. Julgado
em 20 de outubro de 2008)
Eis, aí, as razões pelas quais não são consistentes os
fundamentos da linha de raciocínio que entende o resultado do
serviço a partir da perspectiva financeira.
2.5.2. A utilidade do serviço como elemento indutor do
ISS sobre Importação de serviços
A incidência do ISS vinculado à importação de serviços
pela sua utilidade pode ser examinada a partir do debate em
torno da não incidência do ISS sobre exportação de serviços.
Afinal, a tomada do critério da utilidade do serviço está estreita
e umbilicalmente ligada ao resultado do serviço, para que
então o tomador possa utilizá-lo. Nesse contexto, o art. 2.º, I,
parágrafo único, da LC 116/2003, ao dispor que não há
incidência de ISS sobre exportações de serviços, informa que
não se enquadram entre as exportações de serviços os
desenvolvidos no Brasil cujo resultado aqui se verifique, ainda
que o pagamento seja feito por residente no exterior.
Pois bem.
A busca da identificação do resultado de um serviço foi
perquirida pelo STJ quando do julgamento do conhecido REsp
831.124. A leitura do relatório do recurso dá conta de que
aquele caso teve início quando um contribuinte manejou ação
judicial para obstar eventual ato de cobrança de ISS sobre
prestação de serviços de retificação, reparo e revisão de
motores e turbinas de aeronaves, contratadas por empresas
aéreas do exterior. Sustentou o contribuinte que, embora o
serviço de retífica de motores seja realizado no território
nacional (local da prestação), tratava-se de efetiva exportação
de serviços, na medida em que a prestação de serviços
somente se conclui com o pagamento dos valores devidos
que, por conseguinte, apenas se perfaz quando os clientes
verificam o resultado do serviço encomendado – que é o
funcionamento, em voo, das turbinas. E dado que os voos
ocorrem no exterior, os resultados lá acontecem, razão pela
qual não seria devido o ISS ao Município.
Ao fim do julgamento, o STJ afastou o argumento do
contribuinte, porquanto não havia, ali, a alegada exportação de
serviço. Isso porque, disse a Corte Superior, na acepção
semântica, “resultado” é consequência, efeito, seguimento. E
continua dizendo que, para que haja efetiva exportação do
serviço desenvolvido no Brasil, ele não poderá aqui ter
consequências ou produzir efeitos. A contrario sensu, os
efeitos decorrentes dos serviços exportados devem-se
produzir em qualquer outro país. É necessário, pois, ter-se em
mente os verdadeiros resultados do serviço prestado, os
objetivos da contratação e da prestação. Vejamos a ementa do
julgado:
“(...) 4. Nos termos do art. 2.º, I, parágrafo único, da LC
116/2003, o ISSQN não incide sobre as exportações de
serviços, sendo tributáveis aqueles desenvolvidos dentro do
território nacional cujo resultado aqui se verifique, ainda que o
pagamento seja feito por residente no exterior. In casu, a
recorrente é contratada por empresas do exterior e recebe
motores e turbinas para reparos, retífica e revisão. Inicia,
desenvolve e conclui a prestação do serviço dentro do território
nacional, exatamente em Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro,
e somente depois de testados, envia-os de volta aos clientes,
que procedem à sua instalação nas aeronaves.
5. A LC 116/2003 estabelece como condição para que haja
exportação de serviços desenvolvidos no Brasil que o
resultado da atividade contratada não se verifique dentro do
nosso País, sendo de suma importância, por conseguinte, a
compreensão do termo ‘resultado’ como disposto no parágrafo
único do art. 2.º.
6. Na acepção semântica, ‘resultado’ é consequência,
efeito, seguimento. Assim, para que haja efetiva exportação do
serviço desenvolvido no Brasil, ele não poderá aqui ter
consequências ou produzir efeitos. A contrário senso, os
efeitos decorrentes dos serviços exportados devem-se
produzir em qualquer outro País. É necessário, pois, ter-se em
mente que os verdadeiros resultados do serviço prestado, os
objetivos da contratação e da prestação.
7. O trabalho desenvolvido pela recorrente não configura
exportação de serviço, pois o objetivo da contratação, o
resultado, que é o efetivo conserto do equipamento, é
totalmente concluído no nosso território. É inquestionável a
incidência do ISS no presente caso, tendo incidência o
disposto no parágrafo único, do art. 2.º da LC 116/2003: ‘Não
se enquadram no disposto no inciso I os serviços
desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda
que o pagamento seja feito por residente no exterior’.
8. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido”
(STJ. REsp 831.124/RJ. 1.ª T. DJ 25.09.2006).
A leitura do julgamento deixa fora de dúvida que o STJ
manteve a cobrança de ISS porque o trabalho desenvolvido
pela então recorrente não configura exportação de serviço,
pois o objetivo da contratação, o resultado, que é o efetivo
conserto do equipamento, é totalmente concluído no nosso
território. Naquele caso, ficou inquestionável a incidência do
ISS.
Disso é lícito concluir que, segundo a premissa do STJ, o
resultado de um serviço não é a sua utilidade, isto é, onde o
resultado do serviço será útil ao tomador de serviço, e sim a
finalização do contrato celebrado com o prestador, onde a
extinção natural das obrigações contratuais será verificada.
As mesmas conclusões são aplicáveis à importação de
serviços. Desse modo, não haverá ISS importação na hipótese
de determinada empresa brasileira contratar serviço com outra

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