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Lidos Recentemente Fechar ICMS - Ed. 2020 ISS - Vol. III - Ed. 2017 Opções Fechar Sair Idioma Português Fonte Arial Tamanho do texto Espaçamento entre linhas Cores Etiquetas Coloridas Etiquetas Coloridas Voltar Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome 1. CARACTERÍSTICAS GERAIS 1. CARACTERÍSTICAS GERAIS 0 1. CARACTERÍSTICAS GERAIS 1.1. O ISS no plano constitucional Na Constituição Federal, o ISS vem disposto em seu artigo 156, inciso III, que vai a seguir transcrito: Art. 156. Compete aos Municípios instituir impostos sobre: (...) III – serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos em lei complementar. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) (...) § 3º Em relação ao imposto previsto no inciso III do caput deste artigo, cabe à lei complementar: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002) I – fixar as suas alíquotas máximas e mínimas; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 37, de 2002) II – excluir da sua incidência exportações de serviços para o exterior. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) III – regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados. (Incluído pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993) A primeira análise do referido dispositivo dá conta de que os serviços de transporte interestadual e intermunicipal, bem como os serviços de comunicação, não são tributados pelo ISS porque estão sujeitos ao ICMS. Daí a razão para o inciso III referir, logo de início, que os serviços alcançados pelo imposto municipal são aqueles de qualquer natureza, mas, “não compreendidos no artigo 155, II”. Também chama a atenção o trecho final do inciso III, cuja redação diz que os serviços de qualquer natureza tributados pelo ISS são aqueles “definidos em lei complementar”. Tal definição estava, no passado, na lista de serviços anexa ao antigo Decreto-lei nº 406/68 e, atualmente, na lista da LC 116/2003. Um breve exame dessa lista demonstra que o legislador, no mais das vezes, faz menção ao termo “e congêneres” ao final da descrição de um serviço. Disso surge a indagação: afinal, para fins de determinação da incidência do ISS, a lista de serviços é taxativa ou enumerativa? As reflexões relativas a esse tema serão feitas ao longo da sessão 2.3 infra. A Constituição Federal entregou outras atribuições à Lei Complementar (conforme já dito, hodiernamente,trata-se da LC 116/2003). A primeira é a fixação das alíquotas máximas do ISS, que atualmente é de 5%, conforme artigo 8º, inciso II, da LC 116/2003. A segunda é a fixação de alíquotas mínimas. Até o final do ano de 2016, a alíquota mínima do ISS não era dada pela Lei Complementar, mas sim pela própria Constituição Federal, que, no artigo 88 dos Atos das Disposições Constitucionais Transitórias (ADCT), acrescentado pela Emenda Constitucional nº 37/02, previu-a em 2%. Este percentual foi reafirmado pela LC 157/16, ao inserir o artigo 8º-A à LC 116/2003. A exclusão da incidência do ISS sobre exportações de serviços, determinada pelo artigo 156, inciso III, § 3º, inciso II, da Constituição Federal, está veiculado no texto do artigo 2º, inciso I, da LC 116/2003. Este tema será mais bem abordado ao longo da seção 2.8. Por fim, o artigo 156, inciso III, § 3º, inciso III, da Constituição Federal dispõe que a Lei Complementar deverá também regular a forma e as condições como isenções, incentivos e benefícios fiscais serão concedidos e revogados pelo Municípios. Apesar de o comando remontar ao ano de 1993, porquanto incluído no contexto do artigo 156 pela Emenda Constitucional nº 3/93, a referida determinação somente foi cumprida por via da LC 157/16. Trata-se de medida tendente à eliminação da chamada guerra fiscal municipal, que será mais bem explorada no Capítulo 6. 1.2. O ISS como imposto indireto e o efeito dessa caracterização na repetição de indébito – Artigo 166 do Código Tributário Nacional O texto desta seção, relativo à caracterização do que é um imposto indireto, foi retirado da seção 1.1 do Volume I, ICMS, da presente Coleção de Tributos Indiretos. Essa opção foi feita porque, conforme será visto mais adiante, o ISS também é tido pela jurisprudência como tal e, por isso mesmo, carrega consigo todos os respectivos efeitos jurídicos. É sabido que os tributos em geral são divididos em dois grupos: diretos e indiretos. No primeiro grupo, enquadram-se os tributos incidentes sobre a renda (IRPJ e CSLL, por exemplo) e sobre a propriedade (IPTU, IPVA, ITR etc). Já no segundo grupo, estão os tributos que oneram as operações/prestações (mercantis ou não) que viabilizam a prestação de serviços, circulação e/ou produção de mercadorias e/ou de produtos. Os exemplos clássicos desse grupo de impostos são o IPI e o ICMS. A confirmar a vocação clássica desses impostos como indiretos, ambos são destacáveis em nota fiscal, seja para informar o montante do próprio imposto que está calculado por dentro, no caso do ICMS1, ou para informar o montante do imposto que está por fora, mas que será somado ao valor total da operação, no caso do IPI2. O efeito disso é simples e, de certo modo, autoexplicativo: haverá, em ambos os casos, a informação às partes interessadas (vendedores, compradores e Fiscos) acerca do montante de imposto que gravou a operação e que será, por isso, repassado no preço. O ISS vai no mesmo caminho. Tanto assim que alguns Municípios, a exemplo de São Paulo, veiculam expressamente em suas legislações a obrigação de destaque do imposto no documento fiscal e, mais ainda, o cálculo por dentro. Vejamos o artigo 14, § 4º, da Lei Paulistana nº 13.701/03: Art. 14. A base de cálculo do Imposto é o preço do serviço, como tal considerada a receita bruta a ele correspondente, sem nenhuma dedução, excetuados os descontos ou abatimentos concedidos independentemente de qualquer condição. (...) § 4º O montante do Imposto é considerado parte integrante e indissociável do preço referido neste artigo, constituindo o respectivo destaque nos documentos fiscais mera indicação de controle. Em outras palavras, por esse texto se conclui, sem sombra de dúvidas, que o ISS paulistano é imposto indireto, porque é calculado por dentro e, muito por isso, é repassado no preço e tem seu valor destacado em nota fiscal. Mas, cumpre ser dito, a mesma conclusão pode ser obtida a partir do exame de legislações municipais que não contam com disposições expressas dessa natureza – isso é, o cálculo por dentro, que será mais bem analisado na seção 5.1.1 infra. Apesar de a classificação dicotômica diretos e indiretos não ser uma classificação jurídica, e sim econômica, essa divisão tem se mostrado importante porque, na prática, expressa a repercussão financeira do tributo ou, em outras palavras, que seu valor é assumido economicamente pelo adquirente do serviço. E dessa reflexão surgem questões relevantes do ponto de vista jurídico: nos impostos indiretos (como o ISS), há sempre a figura do javascript:void(0) javascript:void(0) contribuinte de direito (aquele que, revestido da condição de contribuinte dada pela legislação, sujeita-se à regra matriz de incidência) e do adquirente final, que efetivamente suporta a carga tributária incorporada no preço das mercadorias e/ou produtos. Este último é comumente denominado contribuinte de fato. Essa é a definição dada por Hugo de Brito Machado Segundo,3 nos seguintes termos: “2.2. Ainda de acordo com essa explicação, o contribuinte de direito seria legalmente obrigado ao pagamento do tributo, eis que integraria a relação jurídico tributária, na condição se sujeito passivo. Já o contribuinte de fato não teria relação com o Fisco, sendo essa a razão do adjetivo ‘de fato’, pois na prática é ele quem arca com o ônus representado pelo tributo, que lhe é repassado pelo contribuinte de direito. Por outras palavras, o contribuinte de direito é obrigado ao pagamento, mas transfere a outro esse sacrifício pelo aumento de preço ou outro processo econômico detroca. [...] 2.3. Dentro desse quadro, é com muita simplicidade que se diz, por exemplo, que os impostos que incidem sobre o consumo seriam indiretos, ao passo que aqueles que oneram o patrimônio e a renda seriam diretos. O ICMS, v.g., é pago pelo vendedor de um produto (contribuinte de direito), mas, na prática, seria suportado pelo comprador (contribuinte de fato), sendo pelo primeiro embutido no preço e repassado ao segundo. O Imposto de Renda, a seu turno, é pago pelo beneficiário dos rendimentos, que efetivamente suporta o ônus do tributo, reunindo-se assim, na mesma pessoa, as figuras do contribuinte de direito e do contribuinte de fato.” Saber quem são os contribuintes de direito e de fato se afigura imprescindível porque é essa classificação que denota a legitimidade ativa em ações de repetições de indébito, nos termos do artigo 166 do Código Tributário Nacional, que tem a seguinte redação: “Art. 166. A restituição de tributos que comportem, por sua natureza, transferência do respectivo encargo financeiro somente será feita a quem prove haver assumido o referido encargo, ou, no caso de tê-lo transferido a terceiro, estar por este expressamente autorizado a recebê-la.” javascript:void(0) A leitura do dispositivo leva à conclusão de que somente estará legitimado a pleitear o indébito quem efetivamente suportou seu ônus econômico (contribuinte de fato), a não ser que ele (o contribuinte de fato) expressamente autorize o contribuinte de direito a pleitear a restituição em seu nome. Mais ainda. Cumpre ser dito que a legitimidade do contribuinte de fato é, a princípio, apenas para restituir o indébito. Afinal, segundo o texto legal, não poderá ele, o contribuinte de fato, questionar a exigência fiscal, propriamente, já que esse direito subjetivo é do contribuinte de direito, que é o verdadeiro titular da relação jurídico-tributário e a quem recai a obrigação de pagar o ISS em razão da consumação de um dos fatos geradores previstos na legislação. É esse realmente o espírito do artigo 166 do Código Tributário Nacional. A confirmá-lo, segue abaixo a transcrição de trechos relevantes da exposição de motivos do Código Tributário Nacional, que pode ser aferida pelos pronuncimentos da Comissão Especial4 responsável pela elaboração do Projeto do Código Tributário Nacional, em substituição ao Anteprojeto antes elaborado por Rubens Gomes de Souza. Vejamos: Texto dos artigos 130 e 131 do Projeto do Código Tributário Nacional, que vieram a ser positivados nos artigos 165 e 166 Art. 130. O contribuinte tem direito, independentemente de prévio protesto, à restituição total ou parcial do tributo, seja qual for a modalidade de seu pagamento, nos seguintes casos: [...] Art. 131. Existindo disposição legal expressa que determine ou faculte ao contribuinte a transferência do tributo a terceiro, o direito referido no artigo anterior fica subordinado à prova de que a transferência não ocorreu efetivamente, por impossibilidade material ou jurídica, em face das circunstâncias do caso. Parágrafo único. O terceiro, que faça prova de lhe haver sido transferido o tributo pelo contribuinte nos termos deste artigo, sub- roga-se no direito daquele à respectiva restituição. [...] RELATÓRIO javascript:void(0) Apresentado pelo Prof. Rubens Gomes de Souza, relator geral, e aprovado pela Comissão Especial nomeada pelo Ministro da Fazenda para elaborar o Projeto de Código Tributário Nacional [...] Ao contrário, o Projeto não assegurou a restituição ao contribuinte, qualquer que fosse a natureza do tributo. Visava o Anteprojeto, neste passo, reformar a jurisprudência dominante, que recusava ao contribuinte legal a restituição dos impostos indiretos, sob o fundamento de que o respectivo ônus financeiro terá sido transferido ao contribuinte “de fato” ou “econômico”. A Comissão, sem embargo das razões de ordem jurídica aduzidas pelo autor do Anteprojeto em contrário a essa orientação (GOMES DE SOUZA, “Restituição de Impostos Indiretos”, em Revista de Direito Administrativo 21/24), preferiu mantê-la, no interesse de impedir o enriquecimento ilícito do contribuinte legal, quando o contribuinte de fato não exerça contra ele o direito o direto de regresso (GIULIANI FONROUGE, Anteproyecto de Código Fiscal, p. 420). Todavia, a fim de não impor ao contribuinte legal a prova negativa da transferência do imposto, circunscreveu-se, no artigo 131, a hipótese aos casos em que a lei expressamente determine ou faculte aquela transferência; e, para impedir que o fisco possa reter tributos indevidos, assegurou-se, no § único daquele artigo, a sub-rogação, no direito à restituição, ao contribuinte de fato que prove ter suportado o ônus financeiro do tributo [...]. O exame dessas linhas deixa bem claro que as motivações que guiaram a Comissão Especial do Código Tributário Nacional eram no sentido de restringir a entrega, ao contribuinte de direito, do direito amplo e irrestrito à repetição de indébito. Assim, cabe a ele (contribuinte de direito) o direito ao indébito, salvo se o tributo repercutir financeiramente no preço, ocasião em que caberá àquele que suportou o encargo financeiro do tributo ilícito – o contribuinte de fato. A jurisprudência do STJ, sobre a caracterização do ISS como tributo indireto que repercute no preço, vai nesse sentido, vejamos: PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. SUPOSTA VIOLAÇÃO AO ART. 535 DO CPC. INEXISTÊNCIA DE VÍCIO NO ACÓRDÃO RECORRIDO. TRIBUTÁRIO. ISS. LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. REPETIÇÃO DE INDÉBITO. PROVA DA NÃO REPERCUSSÃO. EXIGIBILIDADE. ARTIGO 166 DO CTN. ESPECIAL EFICÁCIA VINCULATIVA DO ACÓRDÃO PROFERIDO NO RESP N. 1.131.476/RS. REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. HONORÁRIOS ADVOCATÍCIOS. GRAU DE SUCUMBÊNCIA. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO E PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. SÚMULA 7/STJ. 1. Não havendo no acórdão recorrido omissão, obscuridade ou contradição, não fica caracterizada ofensa aos arts. 165 e 535 do CPC. 2. A Primeira Seção desta Corte, ao apreciar o REsp n. 1.131.476/RS (recurso submetido à sistemática prevista no art. 543-C do CPC, c/c a Resolução 8/2008 – Presidência/STJ), pacificou entendimento no sentido de que a pretensão repetitória de valores indevidamente recolhidos a título de ISS incidente sobre a locação de bens móveis hipótese em que o tributo assume natureza indireta reclama da parte autora a prova da não repercussão, ou, na hipótese de ter transferido o encargo a terceiro, de estar autorizada por este a recebê-los. 3. O reexame de matéria de prova é inviável em sede de recurso especial (Súmula 7/STJ). 4. Agravo regimental não provido. (STJ. AgRg no AREsp 404249/SC. Rel. Min. Campbell Marques. DJe 04/12/2013) 1.3. O ISS como imposto cumulativo Na seção 1.2 supra, ficou bem claro que o ISS é tributo indireto que repercute no preço do serviço, de modo a ser repassado economicamente ao adquirente do serviço. Esse repasse gera o efeito cumulativo do ISS. Vejamos. A veiculação de regimes não cumulativos tem o objetivo de extirpar o efeito cascata dos tributos indiretos que incidem sobre cada uma das etapas de uma determinada cadeia. Por esse raciocínio, é correto dizer, a contrario sensu, que, quando vigente a cumulatividade, os preços finais de bens e serviços são artificialmente inflados por tributos. Realmente, conforme visto na seção 1.2, pelo fato de repercutirem nos preços, os tributos indiretos em geral têm o efeito natural de integrar o valor pago pelas aquisições de bens e serviços. Assim, não fossem os regimes não cumulativos, o custo de um serviço ou mercadoria seriam contabilizados por seu valor bruto, equivalente ao valor líquido da mercadoria somado ao imposto que gravou a operação na etapa anterior. O efeito econômico disso é simples: pelo fato de o custo ser o ponto de partida para a formação de preços,5 o valor das operações subsequentes com as mercadorias ou serviços adquiridos seria composto indiretamente pelos tributos indiretos que incidiram na operação anterior. Esse valor, por sua vez, seria base de nova incidênciatributária, devida pelo contribuinte, que levará a cabo a nova operação, e assim sucessivamente. Logo, haveria incidência de imposto sobre imposto ao longo de uma cadeia mercantil e/ou de serviços, resultando, portanto, em uma cumulatividade que implicaria em um preço artificial, composto em grande parte de tributos indiretos. Pois bem. O ISS não é um tributo não cumulativo. Pelo contrário, é essencialmente cumulativo, o que quer dizer que, em uma determinada cadeia de serviços, ele se agregará ao custo do serviço apurado pelo prestador que adquiriu um serviço para dar cabo de sua própria prestação. Isso acontecerá ao longo de todas as etapas da referida cadeia de serviços, até o consumidor final. A representação gráfica abaixo auxilia a compreensão da afirmação aqui formulada. Importante salientar que os valores relativos ao preço do serviço e ao próprio ISS já estão calculados por dentro, mais detalhes de como esse cálculo deve ser feito podem ser encontrados na seção 5.1. Mais ainda, no gráfico abaixo, a margem de lucro do Prestador B foi fixada, por premissa, em 40%. Vejamos: Cenário do ISS como imposto cumulativo – Realidade atual javascript:void(0) Para efeitos comparativos, vejamos como seria a apuração do ISS caso se sujeitasse ao regime não cumulativo: Cenário do ISS como imposto não cumulativo – Realidade hipotética A análise das simulações acima dá conta de que, em razão da cumulatividade do ISS, há cerca de R$ 7,75 a mais no preço cobrado ao consumidor final pelo Prestador B, que é apenas ISS (tanto assim que a diferença a maior é de exatos 5%, que é a alíquota utilizada no exemplo). 1.3.1. Exceção ao regime cumulativo do ISS – Dedução das subempreitadas Na obra PIS e Cofins, volume II da presente Coleção de Tributos Indiretos, expus o que é o princípio da neutralidade tributária. Por ele se busca o fortalecimento da capacidade econômica do consumidor sem prejudicar, por outro lado, as riquezas às quais o Erário tem direito de receber por meio das receitas tributárias. Em suma, busca um valor específico que se erradia a todos os agentes econômicos: desoneração tributária. Nesse sentido é a lição de Fernando Zilveti: 6 “Considera-se neutro o sistema tributário que não interfira na otimização da alocação de meios de produção, que não provoque javascript:void(0) distorções e, assim, configura segurança jurídica para o livro exercício da atividade empresarial. A ideia-força contida na neutralidade propõe que se evite onerar a força econômica do contribuinte-empresa, ao mesmo tempo em que se alcance a força econômica do consumidor.” Edison Carlos Fernandes e Ives Gandra da Silva Martins7 apontam que a não cumulatividade que conhecemos é uma das formas de neutralidade em ralação aos tributos plurifásicos. Vejamos: “Nessa linha de raciocínio, a não cumulatividade seria uma forma de operar a neutralidade, de garantir um sistema tributário neutro, especialmente no que diz respeito aos tributos plurifásicos.” Mas, afinal, quais são efetivamente os métodos de que se pode lançar mão para alcançar a neutralidade tributária? De acordo com o direito comparado, os métodos são cinco: (i) método direto subtrativo; (ii) método direto aditivo; (iii) método indireto aditivo; (iv) método indireto subtrativo; e (v) método crédito de tributo. À presente seção interessa o método direto subtrativo, pelo qual se apura o montante do tributo a ser pago mediante a aplicação de determinada alíquota sobre a diferença entre entradas e saídas de bens ou serviços, valoradas, respectivamente, de acordo com o seu valor de aquisição (em relação às entradas – compras) e seu valor de venda ou preço do serviço (em relação às saídas de mercadorias ou prestação de serviços). Essa é a doutrina de Fabiana Del Padre Tomé,8 vejamos: “(a) Método direto subtrativo: consiste na aplicação da alíquota do tributo sobre a diferença entre as saídas e as entradas. Deduz-se da base de cálculo do tributo (preço de venda, do serviço, valor da receita etc.) o montante correspondente às entradas necessárias ao desenvolvimento da atividade tributada, para, sobre esse resultado, aplicar-se a alíquota.” Esse método interessa à presente seção porque é justamente o que se aplica ao regime de apuração do ISS sobre os serviços de construção civil. De acordo com o art. 9.º, § 2.º, b do Dec.-lei 406/1968, o prestador dos serviços de construção civil pode deduzir da base de cálculo do ISS por ele devido os valores da subempreitada contratada para a prestação do serviço. Vejamos: javascript:void(0) javascript:void(0) Art. 9.º A base de cálculo do imposto é o preço do serviço. (...) § 2.º Na prestação dos serviços a que se referem os itens 19 e 20 da lista anexa o imposto será calculado sobre o preço deduzido das parcelas correspondentes: a) ao valor dos materiais fornecidos pelo prestador dos serviços; b) ao valor das subempreitadas já tributadas pelo imposto” (grifos nossos). No passado, havia dúvidas quanto à aplicabilidade do referido regime no contexto do atual figurino legal do ISS. É que, na redação original contida no Projeto de Lei Complementar nº 1/1991, a dedução da subempreitada estava no artigo 7º, § 2º, II, da LC 116/2003. Entretanto, esse dispositivo foi vetado pelo Presidente da República, por contrariedade ao interesse público. Vejamos suas razões na respectiva mensagem de veto: Inciso II do § 2º do art. 7º “Art. 7º .................................................................................................. § 2º ........................................................................................................ II – o valor de subempreitadas sujeitas ao Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza. ..............................................................................................................” Razões do veto “A norma contida no inciso II do § 2º do art. 7º do projeto de lei complementar ampliou a possibilidade de dedução das despesas com subempreitada da base de cálculo do tributo. Na legislação anterior, tal dedução somente era permitida para as subempreitadas de obras civis. Dessa forma, a sanção do dispositivo implicaria perda significativa de base tributável. Agregue-se a isso o fato de a redação dada ao dispositivo ser imperfeita. Na vigência do § 2º do art. 9º do Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, somente se permitia a dedução de subempreitadas já tributadas pelo imposto. A redação do Projeto de Lei Complementar permitiria a dedução de subempreitadas sujeitas ao imposto. A nova regra não exige que haja pagamento efetivo do ISS por parte da subempreiteira, bastando para tanto que o referido serviço esteja sujeito ao imposto. Assim, por contrariedade ao interesse público, propõe-se o veto ao dispositivo.” Ou seja, em resumo, as razões do veto foram as seguintes: • No antigo Dec.-lei 406/1968, a dedução permitida era aquela decorrente de subempreitadas de obras civis. Mas, no Projeto de Lei Complementar nº 1/1991, a dedução se relacionava ao valor de toda e qualquer subempreitada. Essa modificação poderia trazer significativos prejuízos ao Erário Municipal. • No antigo Dec.-lei 406/1968, permitia-se a dedução da subempreitada já efetivamente tributada pelo ISS e com imposto já recolhido. Na redação do Projeto de Lei Complementar nº 1/1991, entretanto, a possibilidade se estende às subempreitadas apenas sujeitas ao ISS, mas não necessariamente já tributadas e em relação às quais os respectivos contribuintes já tivessem recolhido o ISS. Tendo em vista a clara preferência ao regime anterior de deduções de subempreitadas, a LC 116/2003 não revogou expressamente o art. 9.º, § 2.º, b do Dec.-lei 406/1968. Ocorre que, no passado, não se tinha visão muito clara das razões do veto ao art. 7º, § 2º, II, da LC 116/2003, ou mesmo da não revogação do art. 9.º, § 2.º, b do Dec.-lei 406/1968. Muito por isso, as decisões judiciais vinham no sentido de não permitir, na vigência da LC 116/2003, a dedução da subempreitada. Vejamos: TRIBUTÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL NO AGRAVO DE INSTRUMENTO.CONSTRUÇÃO CIVIL. ISS. BASE DE CÁLCULO. DEDUÇÃO DOS VALORES REFERENTES AOS MATERIAIS EMPREGADOS E ÀS SUBEMPREITADAS. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO NÃO PROVIDO. 1. “A jurisprudência do STJ pacificou o entendimento de que, em se tratando de empresas do ramo de construção civil, a base de cálculo do ISS é o custo integral do serviço, não sendo admitida a dedução do montante relativo às subempreitadas e aos materiais utilizados na obra” (AgRg no Ag 1.257.286/RS, Rel. Min. BENEDITO GONÇALVES, Primeira Turma, DJe 8/6/10). 2. Agravo regimental não provido. (STJ. 1ª Turma. AgRg no Ag 1262610 / MG. Rel. Min. Arnaldo Esteves Lima. DJe 02/08/2011) Entretanto, o STJ reviu seu posicionamento em função de decisão dada pelo STF em sede de Repercussão Geral. Sua jurisprudência, doravante, é pela possibilidade de dedução, da subempreitada, da base de cálculo dos serviços de construção civil. In verbis: PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL EM AÇÃO RESCISÓRIA. VIOLAÇÃO A LITERAL DISPOSITIVO DE LEI. ISSQN. SUBEMPREITADAS. DEDUÇÃO DA BASE DE CÁLCULO. POSSIBILIDADE. REVISÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ, EM CONFORMIDADE COM O ENTENDIMENTO PACÍFICO NO STF. 1. O Supremo Tribunal Federal, ao julgar o RE 603.497/MG, no rito do art. 543-B do CPC, concluiu ser possível, mesmo na vigência da Lei Complementar 116/2003, a dedução da base de cálculo do ISS do material empregado na construção civil. 2. No RE 599.582/RJ, concluiu-se que a orientação adotada no recurso acima é aplicável aos valores das subempreitadas, nos seguintes termos: “embora no RE 603.497 a controvérsia tenha se limitado à dedução da base de cálculo do ISS dos gastos com materiais de construção, o entendimento consagrado naquele julgado também se aplica aos valores das subempreitadas, nos termos da pacífica jurisprudência deste STF”. 3. Com a finalidade de prestigiar a função uniformizadora da jurisprudência, de modo a evitar utilização de recursos cujo resultado já é antecipadamente conhecido, deve ser acolhida a pretensão recursal. Precedente da Primeira Turma no mesmo sentido:AgRg no AgRg no Ag 1410608/RS, Rel. Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, DJe 21.10.2011. 4. Recurso Especial provido para julgar improcedente o pedido deduzido na Ação Rescisória. Inversão dos ônus de sucumbência. (STJ. 2ª Turma. REsp 1327755/RJ. Rel. Min. Herman Benjamin. DJe 05/11/2012) 1 Art. 13, § 4º, inciso I, da Lei Complementar nº 87/96. 2 Art. 182, inciso II, alínea “c”, c/c art. 413, inciso V, alíneas “i” e “j”, do RIPI/10. 3 MACHADO SEGUNDO, Hugo de Brigo. Repetição do tributo indireto: incongruências e contradições. São Paulo: Malheiros: 2011. p. 13. 4 Trabalho da Comissão Especial do Código Tributário Nacional. Rio de Janeiro: Oficinas do Serviço Gráfico do IBGE, 1954, p. 58 e 223. 5 Em regra, o preço é o valor resultante do custo da mercadoria, despesas da empresa, margem de lucro e, ao final, dos tributos incidentes sobre venda (ICMS, ISS, PIS e Cofins). 6 Zilveti, Fernando. Variações sobre o princípio da neutralidade no direito tributário internacional. In: Costa, Alcides Jorge e outros (coords.). Direito tributário atual n. 19. São Paulo: Dialética, 2005. p. 24-25. 7 Fernandes, Edison Carlos; Martins, Ives Gandra da Silva. Não cumulatividade do PIS/Cofins – implicações contábil, societária e fiscal. São Paulo: Quartier Latin, 2007. p. 29. 8 Tomé, Fabiana Del Padre. Natureza jurídica da não cumulatividade da contribuição ao PIS/Pasep e da Cofins: consequências e aplicabilidade. In: Peixoto, Marcelo Magalhães; Fischer, Octávio Campos (coords.). PIS-Cofins questões atuais e polêmicas. São Paulo: Quartier Latin, 2005. p. 542. Lidos Recentemente Fechar ICMS - Ed. 2020 ISS - Vol. III - Ed. 2017 Opções Fechar Sair Idioma Português Fonte Arial Tamanho do texto Espaçamento entre linhas Cores Etiquetas Coloridas Etiquetas Coloridas Voltar Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome Sem Nome 2. INCIDÊNCIA 2. INCIDÊNCIA 0 2. INCIDÊNCIA 2.1. Fato gerador De acordo com o artigo 1º, caput, da LC 116/2003, o fato gerador do ISS é a prestação dos serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam atividade preponderante do prestador. Como complemento, o § 4º do mesmo artigo dispõe que a incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado. Segue sua redação: Art. 1º O Imposto Sobre Serviços de Qualquer Natureza, de competência dos Municípios e do Distrito Federal, tem como fato gerador a prestação de serviços constantes da lista anexa, ainda que esses não se constituam como atividade preponderante do prestador. (...) § 4º A incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado. Dessa leitura resulta que, do caput e também do § 4º do artigo 1º da Lei Complementar n. 116/03, a investigação da incidência do ISS passa pelo exame dos seguintes elementos: (i) qual a extensão do conceito de serviço alcançado pelo ISS; (ii) a taxatividade da lista de serviços; (iii) quais os critérios para se identificar a natureza do serviço tributado pelo imposto. É o que será feito nas seções a seguir. 2.2. A extensão do conceito de serviço Historicamente, o estudo da definição da extensão do conceito de serviço passou sempre pelo binômio obrigação de dar e obrigação de fazer. A doutrina civilista vem, há muito, enveredando esforços para essa definição, que inclusive foi abraçada pelo Supremo Tribunal Federal quando do famoso julgamento do RE nº 116.121-1, no qual se definiu que não há ISS sobre locação de bens móveis. Mais recentemente, essa posição foi reafirmada pela edição da Súmula Vinculante nº 31. Entretanto, não se pode deixar de reconhecer que há outros critérios para a definição do que é serviço. Esse novo vislumbre se apega, entre outros elementos, aos dizeres do artigo 110 do Código Tributário Nacional c/c artigo 3º da Lei nº 8.078/90, intitulada Código de Defesa do Consumidor. As seções 2.2.1 e 2.2.2 infra serão dedicadas ao estudo dos detalhes dessas duas vertentes, conforme vai a seguir. 2.2.1. Obrigação de dar versus obrigação de fazer Antes de qualquer definição própria a ser dada quanto ao conceito de serviços, julgo ser de grande valia e extrema relevância transcrever em proêmio a definição (e distinção) do saudoso civilista Caio Mário da Silva Pereira1 quanto às obrigações de dar e fazer. Vejamos: “Quando se diferencia a obrigação de dar da de fazer, tem- se em vista a qualidade da prestação. [...] conservamos aqui estas categorias ou figuras de obrigações separadamente, um tanto por haver a lei guardado fidelidade a tais distinções herdadas do Direito romano, como ainda por conservar em nosso direito perfeita extremação temática a obligatio dandi da obligatio faciendi, à vista de guardar ele a mesma sistemática romana, recusando efeito traslatício do domínio ao contrato, diretamente, em contraposição à orientação francesa e italiana. [...] Os casos extremos não padecem dúvida, pois que uma envolve uma traditio ou entrega, e outra uma ação pura. [...] Entre as obrigações positivas, cuida-se, em primeiro plano, das obrigações de dar, que ocupam praça relevante e são de freqüente incidência na vida de todos os dias. Consistem na entrega de uma coisa, seja a tradição realizada pelo devedor javascript:void(0) ao credor em fase de execução, seja a tradição constitutiva de direito, seja a restituição de ciosa alheia a seu dono. [...] O outro tipo de obrigação positiva é a de fazer, que se concretiza genericamente em um ato do devedor.” (grifei) A doutrina do também saudoso e memorável civilista Orlando Gomes2 caminha nesse sentido: “33. Prestações positivas. São positivas as prestações consistentes em um ou vários atos do devedor. Subdividem-se em prestações de coisas e prestações de fatos. Constituem objeto, respectivamente, das obrigações de dar e de fazer. [...] A distinção entre as obrigações de dar e as de fazer deve ser traçada em vista do interesse do credor, porquanto as prestações de coisas supõem certa atividade pessoaldo devedor e muitas prestações de fatos exigem dação. Nas obrigações de dar, o que interessa ao credor é a coisa que lhe deve ser entregue, pouco lhe importando a atividade do devedor para realizar a entrega. Nas obrigações de fazer, ao contrário, o fim é o aproveitamento do serviço contratado. Se assim não fosse, toda obrigação de dar seria de fazer, e vice- versa.” (grifei) Vale transcrever, também, a doutrina de Álvaro Villaça Azevedo,3 renomado estudioso do Direito Civil e do Direito Romano: “Pela classificação das obrigações elas podem ser de três espécies: positivas de dar e de fazer e negativas de não fazer. [...] javascript:void(0) javascript:void(0) O devedor, que se obrigou a entregar ou a restituir coisa certa, determinada, ao seu credor, deve cumprir sua obrigação de dar, entregando ou restituindo essa mesma coisa, sem que haja qualquer alteração no objeto da prestação jurídica. Assim, quem vendeu sua vitrola deve entregá-la ao comprador, como este deve, também, entregar ao vendedor o preço exato da coisa adquirida. [...] É preciso, repito, que haja a entrega ou a restituição do objeto, ou seja, a tradição da coisa (art. 237 do CC), pois a simples convenção das partes, em nosso Direito, não transfere o domínio dos bens. [...] A obrigação de fazer, obligatio faciendi, é positiva, como a obrigação de dar. Por ela, o devedor compromete-se a prestar uma atividade qualquer, lícita e vantajosa, ao seu credor. [...] Na obrigação de fazer existe alguma coisa que deve ser produzida pela atividade humana de alguém, que a tanto se compromete. A grande diferença entre as obrigações de dar e as de fazer mostrou Robert Joseph Pothier, quando ensinou que aquele que se compromete a dar alguma coisa pode ser constrangido a entregá-la, por autoridade da justiça, quando a coisa se encontrar em seu poder, quer queira quer não queira o devedor. Já quem se obriga a fazer alguma coisa não pode ser constrangido a fazê-la, resolvendo-se a obrigação em perdas e danos, quando não for por ela cumprida devidamente. A obrigação de fazer consiste na realização pessoal, de cunho imaterial ou material.” (grifei) Dada a complexidade do tema a ser enfrentado nas linhas seguintes, não é demais lembrar a doutrina de Arnaldo Rizzardo4 sobre a distinção entre obrigação de dar e obrigação de fazer: “Como a própria palavra está a indicar, a obrigação de dar compreende a entrega de coisa. Por ela, há o compromisso de entregar algo para alguém. Existe um vínculo jurídico através do qual se firmou o dever de fornecer ao credor um determinado bem, que tanto pode ser móvel como imóvel. [...] Quem se obriga a dar coisa certa está autorizando o credor a exigir o cumprimento da obrigação. O devedor compromete- se a fornecer ao credor o bem especificado. A tradição é o elemento que compõe tal compromisso, posto que se constitui com a entrega de uma coisa móvel ou imóvel. A transferência efetiva dimensiona-se na compra e venda ou na doação. Já a concessão de uso revela as figuras do comodato ou do empréstimo. Em todas as espécies há a tradição, que se materializa com a transferência ou a passagem de uma coisa de um indivíduo para outro. [...] O sentido de ‘fazer’ compreende a idéia de prestação, de trabalho, de ação. Há um ato do devedor que deve ser feito. Está ele preso a um compromisso. Cumpre-lhe que preste um serviço. E, assim, combinam-se trabalhos a serem executados, seja de ordem física, artística, científica ou intelectual. [...] As obrigações de fazer traduzem-se em um ato humano, ou, mais corretamente, na realização de atos humanos javascript:void(0) positivos. [...] Na obrigação de fazer existe uma atividade pessoal do devedor, que se dimensiona na execução de um trabalho físico ou intelectual, na realização de obra, na prestação de um fato. Em tudo há o emprego da energia física ou mental, de acordo com o trabalho físico ou intelectual.” (grifei) A partir dessas linhas gerais, é lícito assumir que os devedores de prestações de serviços são aqueles que se obrigam a realizar um ato, um esforço imaterial (intelectual ou não) em favor do credor que, em contrapartida ao esforço realizado, deve remunerar o prestador de serviços na forma avençada em contrato. Em outras palavras, é forçoso concluir que prestações de serviços constituem verdadeiras obrigações de fazer como atividades-fim da avença contratual, porquanto essa atividade do devedor é que constitui o interesse do credor, conforme dito por Orlando Gomes na doutrina transcrita alhures. Tal definição foi acolhida em voto vencedor proferido pelo Min. Marco Aurélio Melo quando do julgamento do RE nº 116.121-1, pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, no qual decidiu pela não incidência do ISS sobre locação de bens móveis justamente porque esse contrato (a locação) não constitui uma obrigação de fazer, nos moldes postos acima, mas uma obrigação de dar. Apesar de tal decisão ter sido proferida em 2001, fato é que os conceitos lá postos ainda hoje são atuais, tanto assim que o aludido RE nº 116.121-1 é um dos precedentes que embasam a Súmula Vinculante nº 31, pelo qual está dito que “é inconstitucional a incidência do Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza – ISS sobre operações de locação de bens móveis”. A premissa dessa Súmula é justamente a identificação de uma prestação de serviços como sendo uma obrigação de fazer. A confirmar a atualidade do entendimento firmado na Súmula Vinculante nº 31, vejamos a decisão abaixo: “AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO EXTRAORDINÁRIO. INCIDÊNCIA DE ISS SOBRE LOCAÇÃO DE BENS MÓVEIS. PRETENSA NECESSIDADE DE NOVA INTERPRETAÇÃO APÓS O ADVENTO DA LC Nº 116/2003. ENTENDIMENTO QUE INDEPENDE DO DIPLOMA DE REGÊNCIA POR ESTAR AMPARADO NO CONCEITO CONSTITUCIONAL DE SERVIÇO. 1. A não incidência do ISS sobre a locação de bens móveis decorre da impossibilidade do poder de tributar vir a modificar o conceito constitucional de serviço que provém do direito privado. Tal conclusão afasta a competência do sujeito ativo com relação a qualquer dos diplomas que tenham disciplinado as normas gerais sobre o imposto. Não é por outro motivo que o item da atual lista de serviços que previa a possibilidade de fazer o tributo incidir sobre a atividade em questão foi objeto de veto presidencial. 2. Agravo regimental a que se nega provimento. (...) 2. Segundo entendimento desta Corte, o poder de tributar municipal não pode alterar o conceito de serviço consagrado pelo direito privado, consoante prevê o art. 110 do Código Tributário Nacional. Ademais, não há que se falar na superação do entendimento da Súmula Vinculante nº 31 pelo advento da edição da LC nº 116/2003. É certo que a Lei Complementar nº 116/2003 revogou a lista de serviço da legislação anterior e estabeleceu um novo rol de materialidades para o imposto. Na lista atual, a locação de bens móveis seria o item 3.01 (Locação de bens móveis) da lista de serviços tributáveis. Entretanto, a intenção do legislador não se confirmou por força do veto presidencial, que foi motivado pela orientação jurisprudencial desta Corte. Confiram-se, as razões adotadas: “Item 3.01 da Lista de serviços ‘3.01 – Locação de bens móveis.’ Razões do veto Verifica-se que alguns itens da relação de serviços sujeitos à incidência do imposto merecem reparo, tendo em vista decisões recentes do Supremo Tribunal Federal. São eles: O STF concluiu julgamento de recurso extraordinário interposto por empresa de locação de guindastes, em que se discutia a constitucionalidade da cobrança do ISS sobre a locação de bens móveis, decidindo que a expressão ‘locação de bens móveis’ constante do item 79 da lista de serviços a que se refere o Decreto-Lei nº 406, de 31 de dezembro de 1968, com a redação da Lei Complementar nº 56, de 15 de dezembro de 1987, é inconstitucional (noticiado no Informativo do STF no 207). O Recurso Extraordinário 116.121/SP, votado unanimemente pelo Tribunal Pleno, em 11 de outubro de 2000, contém linha interpretativa no mesmo sentido, pois a ‘terminologia constitucional do imposto sobreserviços revela o objeto da tributação. Conflita com a Lei Maior dispositivo que imponha o tributo a contrato de locação de bem móvel. Em direito, os institutos, as expressões e os vocábulos têm sentido próprios, descabendo confundir a locação de serviços com a de móveis, práticas diversas regidas pelo Código Civil, cujas definições são de observância inafastável.’ Em assim sendo, o item 3.01 da Lista de serviços anexa ao projeto de lei complementar ora analisado, fica prejudicado, pois veicula indevida (porque inconstitucional) incidência do imposto sob locação de bens móveis.” 3. Também não merece prosperar o argumento de que há fortes indícios da superação do entendimento deste Tribunal a respeito da matéria em exame, uma vez que a jurisprudência permanece afirmando que não incide ISS sobre locação de bens móveis e que a Constituição não concede aos entes municipais da federação a competência para alterar a definição e o alcance de conceitos de Direito Privado para fins de instituição do tributo. Confiram-se, a propósito, os precedentes a seguir: “Imposto sobre serviços (ISS) – Locação de veículo automotor – Inadmissibilidade, em tal hipótese, da incidência desse tributo municipal – Distinção necessária entre locação de bens móveis (obrigação de dar ou de entregar) e prestação de serviços (obrigação de fazer) – Impossibilidade de a legislação tributária municipal alterar a definição e o alcance de conceitos de Direito Privado (CTN, art. 110) – Inconstitucionalidade do item 79 da antiga lista de serviços anexa ao Decreto-Lei nº 406/68 – Precedentes do Supremo Tribunal Federal – Recurso improvido. – Não se revela tributável, mediante ISS, a locação de veículos automotores (que consubstancia obrigação de dar ou de entregar), eis que esse tributo municipal somente pode incidir sobre obrigações de fazer, a cuja matriz conceitual não se ajusta a figura contratual da locação de bens móveis. Precedentes (STF). Doutrina.” (RE 446.003-AgR, Rel. Min. Celso de Mello) “Na espécie, o imposto, conforme a própria nomenclatura, considerado o figurino constitucional, pressupõe a prestação de serviços e não o contrato de locação. Em face do texto da Carta Federal, não se tem como assentar a incidência do tributo na espécie, porque falta o núcleo dessa incidência, que são os serviços. Observem-se os institutos em vigor tal como se contêm na legislação de regência. As definições de locação de serviços e locação de móveis vêm-nos do Código Civil. Em síntese, há de prevalecer a definição de cada instituto, e somente a prestação de serviços, envolvido na via direta o esforço humano, é fato gerador do tributo em comento. Prevalece a ordem natural das coisas cuja força surge insuplantável; prevalecem as balizas constitucionais, a conferirem segurança às relações Estado-contribuinte; prevalece, alfim, a organicidade do próprio Direito, sem a qual tudo será possível no agasalho de interesses do Estado, embora não enquadráveis como primários.” (AI 623.226-AgR, Rel. Min. Marco Aurélio) 4. Diante do exposto, nego provimento ao agravo regimental. (STF. 1ª Turma. RE 602.295 AGR/RJ. Rel. Min. Roberto Barroso. DJe 22/04/2015) A jurisprudência do STJ também vem identificando a prestação de serviço como uma obrigação de fazer que constitua a atividade-fim contratual avençada, a exemplo do que fora decidido no REsp nº 888.852/ES, que, ao julgar a não incidência do ISS sobre determinada atividade, definiu o núcleo de um serviço nos seguintes termos: “4. Desta sorte, o núcleo do critério material da regra matriz de incidência do ISS é a prestação de serviço, vale dizer: conduta humana consistente em desenvolver um esforço em favor de terceiro, visando a adimplir uma ‘obrigação de fazer’ (o fim buscado pelo credor é o aproveitamento do serviço contratado).” (STJ. REsp nº 888.852/ES. Rel. Min. Luiz Fux. DJe 01/12/2008.) Alguns Fiscos Municipais já se pronunciaram a esse respeito, a exemplo de Belo Horizonte. Na Solução de Consulta transcrita abaixo, determinado contribuinte informou que aluga servidores de uma empresa nos EUA e, depois, aluga-os novamente a terceiros aqui no Brasil de forma fracionada. Disse que a locação de espaço virtual dentro desses servidores é para que os seus clientes possam utilizá- los para armazenamento de dados eletrônicos, tais como arquivos de fotos pessoais, e-mail, web-sites, dentre outros, desde que para uso exclusivo do cliente. Ao final, foi manifestado o entendimento de que não há ISS sobre essa atividade, porque não listada no rol da LC 116/2003. Vejamos: RESPOSTA: Preliminarmente, julgamos procedente submeter o questionamento da Consulente à avaliação da Gerência responsável pela administração geral, o controle e o lançamento do ISSQN que se manifestou pela eficácia e confirmação do entendimento exarado em face da Reformulação de Consulta nº 003/2012, referente à Consulta nº 100/2012, concluindo, desta feita, que “de fato, a operação descrita pela requerente à fl. 3 não constitui espécie de quaisquer das hipóteses de incidência tipificadas nos subitens de nos 1.01 a 1.08 da lista. Por conseguinte, existente a referida lacuna normativa, não se sujeita o correspondente negócio jurídico à incidência do ISSQN.” Nestes termos, corroborando o entendimento manifesto pela Gerência, temos que a atividade sob consulta, devidamente qualificada e levada a efeito pela mera “locação de espaço virtual” para terceiros, dentro de servidores que a Consulente aluga de uma empresa nos EUA “para que os seus clientes possam utilizar para armazenamento de dados eletrônicos tais como: arquivos de fotos pessoais, E-mail, Web-Sites, dentre outros, desde que para uso exclusivo do cliente”, conforme asseverado pela Consulente, não está elencada na Lista de Serviços tributáveis anexa à Lei Complementar nº 116/2003, reproduzida na Lei nº 8.725/2003, não configurando, portanto, para fins tributários, válida e legítima prestação de serviços sujeita à incidência do ISSQN. Assim, observada a efetiva ocorrência dos pressupostos materiais vinculados ao fato gerador da obrigação tributária sob análise, é de se concluir que o entendimento exarado em face da Reformulação de Consulta nº 003/2012, referente à Consulta nº 100/2012, permanece válido e eficaz, razão pela qual deve ser integralmente ratificado em toda a sua extensão e efeitos. Por oportuno, cumpre-nos reproduzir o entendimento conclusivo expresso na indigitada Reformulação, ora ratificado: “Não estando a operação de hospedagem de banco de dados ou mesmo a locação de espaço virtual prevista na lista de serviços anexa à LC 116, inocorre quanto àquela o fato gerador do ISSQN, restando, assim, afastada a incidência deste imposto sobre a atividade. Com efeito, estamos propondo a reformulação da resposta da consulta nº 100/2012 para considerar a atividade de locação de espaço virtual ou hospedagem de banco de dados intributável a título de ISSQN”. Embora não esteja explícito na decisão, fato é que a locação de bens não está na lista de serviços justamente porque o item 3.01 foi declarado inconstitucional pelo STF por ser obrigação de dar. Nesse contexto, seguindo-se esse raciocínio, a princípio toda e qualquer atividade que, embora prevista na lista anexa à LC 116/2003, se constitua como verdadeira obrigação de dar não poderia se sujeitar ao ISS, como, por exemplo (mas não apenas): (i) cessão de direito de uso de marcas e de sinais de propaganda (item 3.02); (ii) locação, sublocação, arrendamento, direito de passagem (item 3.04); (iii) cessão de andaimes, palcos, coberturas e outras estruturas de uso temporário (item 3.05); entre outros que cujo núcleo obrigacional venha a assumir verdadeira obrigação de dar, seja o dar relativo à propriedade ou à posse de terminada coisa. Entretanto, há um outro conceito do que possa ser serviço, que certamente pode ser utilizado pelos Fiscos Municipais para a defesa de seu crédito tributário. É o que será visto em seguida. 2.2.2. Um possível novo conceito de serviço a ser utilizado pelos Fiscos Municipais Penso quea melhor definição de serviços é aquela decorrente das conclusões sobre obrigações de fazer, conforme seção 2.2.1 supra. Mas, não se pode deixar de reconhecer que há, no País, uma importante corrente que defende que sejam tributadas as atividades que eram inexistentes em nosso cotidiano até pouco tempo atrás. Essa corrente é adepta à defesa da incidência do IVA – Imposto sobre Valor Agregado, em substituição aos inúmeros tributos previstos no Sistema Tributário Nacional para as relações de consumo, especialmente o ICMS, ISS e as Contribuições PIS e COFINS. Em suma, defende-se que qualquer atividade remunerada deve ser tributada, não sendo plausível que tenhamos, nos dias atuais, a não tributação em razão do uso fechado de conceitos, muitos deles ultrapassados, como, por exemplo, condicionar a incidência do ISS à verificação da existência de uma obrigação de fazer. Em outras palavras, alguns estudiosos argumentam que as relações de consumo, de modo geral, devem ser tributadas pelo ICMS ou pelo ISS, não sendo legal/constitucional que os novos modelos de negócios existentes não sejam tributados simplesmente pelo fato de as atividades não se enquadrarem nos conceitos de “prestação de serviço” e/ou de “venda”. Um bom exemplo do que aqui é dito pode ser encontrado no Parecer da Procuradoria Geral da Fazenda Nacional n° 2.773/07. Apesar de ser relativamente antigo e tratar sobre a definição da natureza jurídica das receitas dos setores financeiro e de seguros para a incidência de PIS e de COFINS, o citado Parecer ressalta a ideia atual do que deveria ser considerado como “prestação de serviço”, cujos fundamentos podem ser aplicados para fins de ISS. A PGFN buscou no direito privado, mais precisamente no Código de Defesa do Consumidor, o conceito de prestação de serviços. Observa-se, através da transcrição abaixo, que a PGFN entende como prestação de serviço qualquer atividade fornecida no mercado de consumo: “53. Não fosse tudo quanto já foi exposto, adicione-se que é usual, mesmo no linguajar jurídico, referir-se ao conjunto de relações jurídicas estabelecidas entre um banco e um cliente como ‘prestação de serviços’. Assim, v.g., a clássica expressão serviços bancários possui larga utilização em direito bancário, para referir-se inclusive a operações bancárias típicas. A própria legislação utiliza-se propositadamente da expressão ‘prestação de serviço’ para referir-se à atividade bancária. Nesse sentido, o art. 52 e o § 2º do art. 3º do Código de Defesa do Consumidor (Lei n.º 8.078, de 1990), in verbis: ‘Art. 3° Fornecedor é toda pessoa física ou jurídica, pública ou privada, nacional ou estrangeira, bem como os entes despersonalizados, que desenvolvem atividade de produção, montagem, criação, construção, transformação, importação, exportação, distribuição ou comercialização de produtos ou prestação de serviços. § 1° Produto é qualquer bem, móvel ou imóvel, material ou imaterial. § 2° Serviço é qualquer atividade fornecida no mercado de consumo, mediante remuneração, inclusive as de natureza bancária, financeira, de crédito e securitária, salvo as decorrentes das relações de caráter trabalhista.’” (grifos no original) Em complemento, o acórdão do STF proferido pelo Min. Eros Grau no Recurso Extraordinário n° 592.905 (com repercussão geral reconhecida), que tratou sobre a incidência do ISS nos contratos de leasing, traz novos elementos ao entendimento do que possa ser entendido como serviço. De acordo com o Ministro, a existência da prestação do serviço está intrinsicamente relacionada ao núcleo da atividade constante na Lista de Serviços. Nessa medida, segundo seu voto vencedor, mesmo que a atividade resulte em uma obrigação de dar (que, no caso do leasing, é entregar o bem ao arrendatário), pode haver uma prestação de serviço que contratualmente tem maior importância que o resultado em si (que no caso examinado foi o de financiamento). Afinal, concluiu que toda a atividade de dar consubstancia também um fazer e há inúmeras atividades de fazer que envolvem um dar. Finalmente, disse o Min. Eros Grau, o fato de a Constituição Federal dispor que o ISS incide sobre serviços de qualquer natureza indica que não se buscou tributar apenas obrigações de fazer. Na linha desenvolvida no voto, a expressão de qualquer natureza indica que o ISS não incide apenas sobre típicas obrigações de fazer, mas sim sobre toda e qualquer atividade descrita na lista de serviços anexa à LC 116/2003, a quem cabe descobrir o que é serviço para os fins do inciso III do art. 156 da Constituição Federal. Vejamos: “Em síntese, há serviços, para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição, que, por serem de qualquer natureza, não consubstanciam típicas obrigações de fazer. Raciocínio adverso a este conduziria à afirmação de que haveria serviço apenas nas prestações de fazer, nos termos do que define o direito privado. Note-se, contudo, que afirmação como tal faz tábula rasa da expressão ‘de qualquer natureza’, afirmada do texto da Constituição. Não me excedo em lembrar que toda a atividade de dar consubstancia também um fazer e há inúmeras atividades de fazer que envolvem um dar. A lei complementar não define o que é serviço, apenas o declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da Constituição. Não o inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição. No arrendamento mercantil (leasing financeiro), contrato autônomo que não é contrato misto, o núcleo é o financiamento, não uma prestação de dar. E financiamento é serviço, sobre o qual o ISS pode incidir, resultando irrelevante a existência de uma compra nas hipóteses do leasing financeiro e do lease-back.” (grifei) Também temos a posição exarada pelo ilustre Gerd Willi Rothmann na mesa de debates do Instituto Brasileiro de Direito Tributário – IBDT, realizada em 12/02/20155, na qual apresentou a ideia de que serviços sujeitos ao ISS são os elencados na Lista de Serviços, pois a Constituição determinou a incidência do imposto sobre “os serviços” e não javascript:void(0) sobre “prestações de serviços”. Em outras palavras, o professor sustenta que o ISS deve incidir sobre o resultado de uma atividade, e não sobre a atividade em si. Vejamos transcrição de parte do debate: “ [...] O que diz a Constituição sobre essa competência de tributar dos municípios? Ela diz, ‘competência para incidir tributo sobre serviços’. Ela não diz sobre a prestação de serviço. Ela diz sobre o serviço, portanto, sobre o resultado de uma atividade e não sobre a atividade. [...] Nós temos um imposto que incide sobre serviços, e como não tem conceito, listados, taxativamente, aí vem aquela discussão toda, numa lista, exatamente pela dificuldade da ausência do conceito satisfatório. [...] Então o aspecto do conceito, o que é serviço? Na verdade, serviço é aquilo que está na lista. No sentido não de exercício de uma atividade, mas da entrega de um bem imaterial. ” (grifei) Em termos concretos, verifica-se um esboço de uma nova corrente doutrinária que caminha em direção diametralmente oposta à posição contida na Súmula Vinculante nº 31. Caso essa corrente se saia vencedora no futuro, novos modelos de negócios serão efetivamente tributados pelo ISS, mesmo que neles se verifique uma obrigação de dar (ceder). Lançando olhos sobre as atividades baseadas em streaming – como Spotify e Netflix –, os Fiscos Municipais podem entender que se tratam de atividades ofertadas ao mercado de consumo mediante remuneração, o que, por sua vez, caracterizam serviços a serem tributados pelo ISS (interpretação conforme artigo 3º, § 2º, do Código de Defesa do Consumidor, c/c artigo 110 do Código Tributário Nacional). Também se pode dizer que as atividades do Netflix e Spotify, apesar de conterem indeléveis características de obrigação de dar, também devem ser consideradas prestações de serviços, na medida em que estas plataformas organizam vídeos e músicas, respectivamente, e provêm uma série de atividades que, no conjunto, caracterizamum serviço. Nesse raciocínio há uma prestação de serviço que antecede a obrigação de dar e esta “prestação” antecedente não pode ser simplesmente ignorada para dispensa de tributação. 2.3. A taxatividade da lista de serviços Conforme o artigo 156, inciso III, da Constituição Federal, a incidência do ISS se dá sobre serviços de qualquer natureza definidos em lei complementar. No passado, era a lista anexa ao Decreto-lei nº 406/68 que definia os serviços a serem tributados pelo ISS. Atualmente, a tarefa é cumprida pela lista anexa à LC 116/2003. A breve leitura do texto constitucional já dá conta, por si, da importância de tal definição pela lei complementar, porquanto é verdadeira delimitadora da competência tributária dos municípios. A se considerar a avaliação de Gerd Willi Rothmann nas discussões da mesa de debates do IBDT de 12/02/2015, comentada na seção 2.2.2 supra, a valia da lista de serviços ganha feições ainda mais relevantes porque, segundo ele, “na verdade, serviço é aquilo que está na lista”. Ou seja, a lei complementar carrega consigo até mesmo o poder de dizer o que é serviço, para fins de ISS. Isso vai na linha das palavras do Ministro Eros Grau proferidas em seu voto vencedor no Recurso Extraordinário n° 592.905, segundo as quais “a lei complementar não define o que é serviço, apenas o declara, para os fins do inciso III do artigo 156 da Constituição. Não o inventa, simplesmente descobre o que é serviço para os efeitos do inciso III do artigo 156 da Constituição”. Ocorre que, no mais das vezes, o legislador faz menção ao termo “e congêneres” ao final da descrição de um serviço. Para além disso, a prática demonstrou que alguns contribuintes celebravam contratos com variados nomes, quiçá para sustentar que seu determinado serviço não era aquele descrito na legislação e, com esse argumento, escapar da tributação. Os debates em torno disso levaram a um tema maior: para fins de determinação da incidência do ISS, a lista de serviços é taxativa ou enumerativa? A doutrina de Frederico Araújo de Moura6, publicada nos idos de 2008, já abordava o tema. Verbis: (...) Nesse contexto, a lista de serviços anexa à Lei Complementar n. 116/2003, define o que é ISS, em termos materiais. Não há sugestão ou exemplificação em seus enunciados, mas prescrição positiva inescapável, dirigida a todos os Municípios, que são os destinatários imediatos. (...) A lista é, pois, taxativa. Ela determina tudo o que que os Municípios podem tributa, especificando quais serviços hão de sofrer incidência do ISS, conforme jurisprudência pacífica de nossas mais elevadas Cortes, ou seja, prescreve, denotativamente, o que deve ser entendido ser entendido “por serviço”, para efeitos tributários. É assim que a lei complementar defini os fatos geradores de ISS (...) Essa discussão, bastante travada no passado, atualmente está pacificada pelo STJ, que, ao julgar o REsp nº 1.111.234/PR em sede de Recurso Repetitivo, assim se pronunciou: “(...) O aresto recorrido não merece reparo, pois adotou a orientação desta Corte, ao concluir que, embora a lista anexa ao Decreto-lei 406/68 e à Lei Complementar n. 116/2003 seja taxativa, permite-se a interpretação extensiva, devendo javascript:void(0) prevalecer não a denominação utilizada pelo banco, mas a efetiva natureza do serviço prestado por ele. Tal posição foi abraçada pelo STF, como indicado no acórdão RE 75.952/SP, relatado pelo Ministro Thompson Flores e hoje encontra-se sedimentada neste Tribunal, conforme se depreende dos arestos que destaco: (...) A lógica é evidente porque, se assim não fosse, teríamos, pela simples mudança de nomenclatura de um serviço, a incidência ou não-incidência do ISS. Entretanto, é preciso fazer a distinção dos serviços que estão na lista, independentemente do nomen juris, dos serviços que não se enquadram em nenhum dos itens da lista, sequer por semelhança. Nesta oportunidade é preciso registrar que embora não possa o STJ imiscuir-se na análise de cada um dos itens dos serviços, é preciso que as instâncias ordinárias, a quem compete a averiguação dos tipos de serviço que podem ser tributados pelo ISS, na interpretação extensiva, devendo-se observar que os serviços prestados, mesmo com nomenclaturas diferentes, devem ser perqueridos quanto à substância de cada um deles. Assim, a incidência dependerá da demonstração da pertinência dos serviços concretamente prestados, aos constantes da Lista de Serviços, como aliás o fez o acórdão recorrido. Com essas considerações, nego provimento ao recurso especial.” (STJ. 1ª Seção. REsp nº 1.111.234/PR. Rel. Min. Eliana Calmon. DJe 08 de outubro de 2009) Assim, embora a lista de serviços seja efetivamente taxativa, é necessário que sua interpretação seja extensiva. Isso para que, no plano concreto, seja possível aos Fiscos Municipais identificar a real natureza de determinado serviço prestado pelo contribuinte, ao invés de se prender à nomenclatura dada a ele em contrato. Daí a razão ao STJ sustentar que se deve “observar que os serviços prestados, mesmo com nomenclaturas diferentes, devem ser perqueridos quanto à substância de cada um deles”, para, ao final, arrematar que “a incidência dependerá da demonstração da pertinência dos serviços concretamente prestados, aos constantes da Lista de Serviços”. Eis, aí, a pertinência do § 4º do artigo 1º da LC 116/2003, ao dispor que “a incidência do imposto não depende da denominação dada ao serviço prestado”, mas sim, segundo o STJ, da identificação da real natureza do serviço prestado. Este é o tema a ser tratado na seção 2.4 infra. 2.4. A identificação da natureza do serviço prestado A identificação da natureza do serviço prestado passa, necessariamente, pelo estudo do direito das obrigações, porque dali se saberá qual a natureza de uma obrigação em razão de uma relação jurídica havida. Segundo o direito das obrigações, a obrigação contratual está alicerçada em três elementos: (i) o sujeito ativo (credor), a quem a prestação é devida; (ii) o sujeito passivo (devedor), que deverá cumprir a obrigação, seja ela de dar, fazer ou não fazer (a nós interessam apenas as obrigações de dar e fazer) e; (iii) o objeto da obrigação. Nessa perspectiva, a prestação obrigacional sempre se constitui na prática de um ato humano e a relação contratual surge quando o sujeito ativo (credor) tem o direito de exigir do sujeito passivo (devedor) o cumprimento da prestação (realização de um trabalho, entrega de algo etc.). 7 Em contrapartida, a isto há a contraprestação, que é remuneração. Por essas linhas vai se afigurando que, no âmbito do direito civil, a obrigação contratual é a atividade-fim prevista no contrato. javascript:void(0) A atividade-fim é aquela à qual o contribuinte se propõe a executar ao seu cliente em contrato (verbal ou escrito), mediante remuneração específica. É a atividade que, uma vez executada, gera ao prestador de serviços o direito de receber remuneração por parte do respectivo tomador, tendo em vista a satisfação dos interesses empresariais que motivaram a contratação de um prestador de serviços. Por exemplo, configura-se uma atividade-fim o ato de construir ou reformar um prédio, realizar serviços de engenharia, advocacia, contabilidade ou qualquer outro serviço que consista em uma “obrigação de fazer”, ou seja, um esforço imaterial em favor de terceiro (conforme dito no próprio acórdão). É lícito assumir, portanto, que a caracterização de determinada atividade como atividade-fim está estreita e diretamente relacionada aos interesses do credor da relação contratual (tomador de serviços), que, após delinear quais as suas necessidades empresariais, contrata determinado prestador de serviços para cumprir certas obrigações. Uma vez satisfeito esses interesses do credor da relação jurídica (o tomador de serviços), a pessoa jurídica que se obrigou a cumprir os objetivos (o prestador de serviços, devedor da relação contratual) faz jus a uma remuneração. Por outro lado, como atividade-meio deve-se entender como aquela que é realizada com ofim de dar condições para que determinada entidade jurídica atinja seus objetivos, como, por exemplo, os serviços de digitação de resultados (atividade- meio) por empresas que prestam serviços de análises laboratoriais (atividade-fim), a comunicação verbal de um professor aos alunos (atividade-meio) para que uma entidade educacional preste os serviços de ministério de aulas (atividades-fim) para os quais foi contratada, entre outras. Assim se vê que uma atividade-fim se sujeita, sem dúvida alguma, à tributação prevista na legislação. Mas, uma atividade-meio jamais poderá ser objeto de incidência tributária, qualquer que seja o tributo, porque não é nem mesmo um negócio jurídico. Aplicando-se esses elementos ao temário do conceito de serviços, é forçoso concluir que prestações de serviços constituem verdadeiras obrigações contratuais assumidas como atividades-fim na avença contratual, porquanto essa atividade do devedor é que constitui o interesse do credor que, muito por isso, gera receitas ao tomador de serviços. E, se assim o é, então a verificação do que é serviço passa, antes, pela averiguação, no contrato, de quais as obrigações assumidas pelo prestador de serviços satisfarão o interesse do credor (o tomador de serviços), cujo efetivo cumprimento fará nascer ao prestador o direito ao recebimento da respectiva remuneração, que, ao final, será tributada pelo ISS. Desse modo, a verificação da natureza de determinado serviço passa pela avaliação comparativa entre o serviço descrito na lista de serviços e o objeto da obrigação contratual assumida pelo prestador. Os elementos factuais apresentados darão conta do real negócio jurídico firmado e, portanto, da natureza do serviço. O contrato é especialmente importante porque, sendo o direito tributário um direito de superposição (artigos 109 e 110 do CTN) e, por outro lado, sendo o contrato verdadeira fonte de obrigações jurídicas no âmbito do direito civil, então é ele (o contrato) que deve servir de realidade jurídica à incidência tributária. Parece ser relevante um último apontamento à presente seção. Conforme visto nas seções 2.2.1 e 2.2.2, a caracterização do que pode ser tido como serviço conta com duas linhas de interpretação muito claras: a primeira, a clássica teoria da obrigação de fazer, segundo a qual serviço é apenas aquela obrigação contratual que corresponda a um esforço imaterial; a segunda, a tese desenvolvida por alguns hodiernamente pela qual serviço é toda atividade remunerada, posta ao mercado de consumo, que esteja descrita na lista de serviços, ainda que em seu contexto se verifique uma obrigação de dar (interpretação do artigo 3º do Código de Defesa do Consumidor c/c entendimento jurisprudencial contido no Recurso Extraordinário n° 592.905). Pois bem, após a identificação do real negócio jurídico firmado e do serviço prestado, caberá ao intérprete avaliar, na sua visão, qual a melhor teoria sobre o que é serviço, para, ao final, manifestar seu juízo de valor sobre a incidência do ISS. 2.5. Importação de serviços A incidência do ISS sobre a importação de serviços está dada pelo artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003, que assim prescreve: “Art. 1º (...) § 1º. O imposto incide também sobre o serviço proveniente do exterior do País ou cuja prestação se tenha iniciado no exterior do País.” Dessa leitura, poder-se-ia dizer que o resultado financeiro seria um elemento indutor ao pagamento de ISS sob a rubrica importação de serviços. Seguindo essa linha, se houver remessa, pagamento, crédito, entrega, emprego ou remessa de valores, por empresas domiciliadas no País, a residentes ou domiciliados no exterior como contraprestação por serviço prestado, haverá o surgimento do fato gerador do ISS. Em outras palavras, o dispêndio financeiro por empresas domiciliadas no País implicaria na afirmação de que uma empresa do exterior auferiu receitas a partir de um serviço por ela prestado, razão pela qual, nesse contexto, haveria importação de serviços pela empresa brasileira, já que houve um serviço proveniente do exterior. Ocorre que, como sabido, há casos em que o serviço, pago por empresa brasileira, não necessariamente provém do exterior, porquanto é no exterior que é iniciado e, depois, finalizado. É dizer, o nascimento e a extinção das obrigações contratuais, que compõem o serviço prestado, são inteiramente no exterior. E também há casos em que o serviço, apesar de ser iniciado e finalizado no exterior, pode vir a ter sua utilidade verificada no País. Nesse panorama, fica claro que a redação do artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003 é insuficiente para definir o real fato gerador do ISS na importação de serviços. Afigura-se relevante, portanto, refletir sobre os possíveis elementos indutores que possam vir a deflagrar a obrigação de recolhimento do imposto. 2.5.1. O resultado financeiro como elemento indutor do ISS sobre importação de serviços Conforme já dito na seção 2.5 supra, o já citado artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003 dispõe que o ISS incide sobre o serviço proveniente do exterior. E, também conforme já mencionado, se se levasse em conta o resultado financeiro como elemento indutor de pagamento de ISS, a mera remessa de valores ao exterior, por empresas domiciliadas no País, pagamento de um serviço, seria suficiente para se fazer incidir o imposto, nos moldes do artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003. Entretanto, a tomada do resultado financeiro como único critério a se interpretar o artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003 pode levar a sérias distorções jurídicas, mormente nas hipóteses em que o serviço é integralmente prestado no exterior. Há, segundo penso, incongruência de ordem constitucional nesse pensamento. E isso em razão do princípio da territorialidade, princípio básico que incide ao ISS. Explico. O artigo 102 do CTN estatuiu o dito princípio da territorialidade ao dispor que a legislação de Estados, Municípios e do Distrito Federal vigora dentro de seus respectivos territórios. É admitida a extraterritorialidade, mas apenas nos limites de Convênios ou de normas do próprio Código Tributário Nacional, ou outras normas gerais expedidas pela União. In verbis: “Art. 102. A legislação tributária dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios vigora, no País, fora dos respectivos territórios, nos limites em que lhe reconheçam extraterritorialidade os convênios de que participem, ou do que disponham esta ou outras leis de normas gerais expedidas pela União”. Não se pode perder de vista o contexto histórico do próprio Código Tributário Nacional, de 1966, que veio a lume na vigência da Constituição Federal de 1946. Nesse panorama, o direcionamento óbvio do referido art. 102 era ao imposto sobre vendas e consignações (imposto estadual), bem como ao imposto sobre indústrias e profissões e atos de sua economia ou assuntos de competência municipal (impostos municipais). O aludido dispositivo foi recepcionado pela Constituição Federal de 1967, pela Emenda Constitucional nº 01/69 e, finalmente, pela Constituição Federal de 1988, que prevê o ISS como imposto constante das competências municipais. Logo, não há dúvidas de que o referido artigo 102 do Código Tributário Nacional é em tudo aplicável ao ISS. Pois bem. Em 2001 veio a LC 104, que introduziu a possibilidade de o Imposto de Renda incidir também sobre rendimentos auferidos no exterior. Foi inaugurado, aí, o princípio da universalidade da renda, com a nova redação dada ao art. 43 do CTN pela mencionada LC 104/2001, vejamos: “Art. 43. O imposto, de competência da União, sobre a renda e proventos de qualquer natureza tem como fato gerador a aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica: (...) § 1.º A incidência do imposto independe da denominação da receita ou do rendimento, da localização, condição jurídica ou nacionalidade da fonte, da origem e da forma de percepção. § 2.º Na hipótese de receita ou de rendimento oriundos do exterior, a lei estabelecerá as condições e o momento em que se dará sua disponibilidade, para fins de incidência do imposto referido neste artigo”.Isso quer dizer que apenas a União está autorizada a fazer incidir imposto sobre a totalidade de rendimentos auferidos, inclusive fora do País. Nesse sentido, admitir que o ISS vinculado à importação de serviços possa incidir sobre quaisquer serviços prestados por empresas localizadas fora do País, especialmente nos casos em que a empresa estrangeira inicia e finaliza sua prestação no exterior, seria dizer que ao ISS se aplicaria o princípio da universalidade, o que não é correto. O Tribunal de Justiça do Estado de São Paulo vem aplicando esse entendimento. In verbis: “APELAÇÃO – Declaratória – ISS. Importação de serviços. Artigo 1º, § 1º, da LC 116/2003. Descabimento. Ofensa ao princípio da territorialidade. Precedentes deste Tribunal. Recurso Provido.” (TJSP. Apelação nº 9221533- 34.2007.8.26.0000. 14ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. João Alberto Pezarini. Julgado em 4 de outubro de 2012) “MANDADO DE SEGURANÇA – Caráter preventivo – Pretensão pautada na inaplicabilidade da Lei Municipal 13.701/03 no caso de serviço prestado no exterior – Legislação municipal que não pode alcançá-lo, diante da regra da territorialidade da lei brasileira, mesmo que haja importação de serviços – Prestador que se encontra no exterior, não podendo se sujeitar à lei tributária brasileira – Sentença reformada – Recurso provido.” (TJSP. Apelação nº 0101584- 09.2006.8.26.0000. 14ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. Gonçalves Rostey. Julgado em 30 de junho de 2011) “MANDADO DE SEGURANÇA – Caráter preventivo – Pretensão pautada na inaplicabilidade da Lei Municipal 13.701/03 no caso de serviço prestado no exterior – Legislação municipal que não pode alcançá-lo, diante da regra da territorialidade da lei brasileira, mesmo que haja importação de serviços – Prestador que se encontra no exterior, não podendo se sujeitar à lei tributária brasileira – Sentença reformada para conceder a segurança – Recurso provido para esse fim.” (TJSP. Apelação nº 0155480-98.2005.8.26.0000. 14ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. Gonçalves Rostey. Julgado em 14 de julho de 2011) “Ação declaratória de inexistência de relação jurídico- tributária – ISS – Competência para realização a cobrança é do local da prestação do serviço – Projeto de construção de campo de golfe – Natureza intelectual do serviço prestado – Atividade desenvolvida nos Estados Unidos da América – Lei Municipal não pode alcançar fato gerador ocorrido no exterior – Recurso de apelação não provido. Ônus de sucumbência invertido”. (TJSP. Apelação nº 0188668-14.2007. 15ª Câmara de Direito Público. Rel. Des. Flávio da Cunha da Silva. Julgado em 20 de outubro de 2008) Eis, aí, as razões pelas quais não são consistentes os fundamentos da linha de raciocínio que entende o resultado do serviço a partir da perspectiva financeira. 2.5.2. A utilidade do serviço como elemento indutor do ISS sobre Importação de serviços A incidência do ISS vinculado à importação de serviços pela sua utilidade pode ser examinada a partir do debate em torno da não incidência do ISS sobre exportação de serviços. Afinal, a tomada do critério da utilidade do serviço está estreita e umbilicalmente ligada ao resultado do serviço, para que então o tomador possa utilizá-lo. Nesse contexto, o art. 2.º, I, parágrafo único, da LC 116/2003, ao dispor que não há incidência de ISS sobre exportações de serviços, informa que não se enquadram entre as exportações de serviços os desenvolvidos no Brasil cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior. Pois bem. A busca da identificação do resultado de um serviço foi perquirida pelo STJ quando do julgamento do conhecido REsp 831.124. A leitura do relatório do recurso dá conta de que aquele caso teve início quando um contribuinte manejou ação judicial para obstar eventual ato de cobrança de ISS sobre prestação de serviços de retificação, reparo e revisão de motores e turbinas de aeronaves, contratadas por empresas aéreas do exterior. Sustentou o contribuinte que, embora o serviço de retífica de motores seja realizado no território nacional (local da prestação), tratava-se de efetiva exportação de serviços, na medida em que a prestação de serviços somente se conclui com o pagamento dos valores devidos que, por conseguinte, apenas se perfaz quando os clientes verificam o resultado do serviço encomendado – que é o funcionamento, em voo, das turbinas. E dado que os voos ocorrem no exterior, os resultados lá acontecem, razão pela qual não seria devido o ISS ao Município. Ao fim do julgamento, o STJ afastou o argumento do contribuinte, porquanto não havia, ali, a alegada exportação de serviço. Isso porque, disse a Corte Superior, na acepção semântica, “resultado” é consequência, efeito, seguimento. E continua dizendo que, para que haja efetiva exportação do serviço desenvolvido no Brasil, ele não poderá aqui ter consequências ou produzir efeitos. A contrario sensu, os efeitos decorrentes dos serviços exportados devem-se produzir em qualquer outro país. É necessário, pois, ter-se em mente os verdadeiros resultados do serviço prestado, os objetivos da contratação e da prestação. Vejamos a ementa do julgado: “(...) 4. Nos termos do art. 2.º, I, parágrafo único, da LC 116/2003, o ISSQN não incide sobre as exportações de serviços, sendo tributáveis aqueles desenvolvidos dentro do território nacional cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior. In casu, a recorrente é contratada por empresas do exterior e recebe motores e turbinas para reparos, retífica e revisão. Inicia, desenvolve e conclui a prestação do serviço dentro do território nacional, exatamente em Petrópolis, Estado do Rio de Janeiro, e somente depois de testados, envia-os de volta aos clientes, que procedem à sua instalação nas aeronaves. 5. A LC 116/2003 estabelece como condição para que haja exportação de serviços desenvolvidos no Brasil que o resultado da atividade contratada não se verifique dentro do nosso País, sendo de suma importância, por conseguinte, a compreensão do termo ‘resultado’ como disposto no parágrafo único do art. 2.º. 6. Na acepção semântica, ‘resultado’ é consequência, efeito, seguimento. Assim, para que haja efetiva exportação do serviço desenvolvido no Brasil, ele não poderá aqui ter consequências ou produzir efeitos. A contrário senso, os efeitos decorrentes dos serviços exportados devem-se produzir em qualquer outro País. É necessário, pois, ter-se em mente que os verdadeiros resultados do serviço prestado, os objetivos da contratação e da prestação. 7. O trabalho desenvolvido pela recorrente não configura exportação de serviço, pois o objetivo da contratação, o resultado, que é o efetivo conserto do equipamento, é totalmente concluído no nosso território. É inquestionável a incidência do ISS no presente caso, tendo incidência o disposto no parágrafo único, do art. 2.º da LC 116/2003: ‘Não se enquadram no disposto no inciso I os serviços desenvolvidos no Brasil, cujo resultado aqui se verifique, ainda que o pagamento seja feito por residente no exterior’. 8. Recurso especial parcialmente conhecido e não provido” (STJ. REsp 831.124/RJ. 1.ª T. DJ 25.09.2006). A leitura do julgamento deixa fora de dúvida que o STJ manteve a cobrança de ISS porque o trabalho desenvolvido pela então recorrente não configura exportação de serviço, pois o objetivo da contratação, o resultado, que é o efetivo conserto do equipamento, é totalmente concluído no nosso território. Naquele caso, ficou inquestionável a incidência do ISS. Disso é lícito concluir que, segundo a premissa do STJ, o resultado de um serviço não é a sua utilidade, isto é, onde o resultado do serviço será útil ao tomador de serviço, e sim a finalização do contrato celebrado com o prestador, onde a extinção natural das obrigações contratuais será verificada. As mesmas conclusões são aplicáveis à importação de serviços. Desse modo, não haverá ISS importação na hipótese de determinada empresa brasileira contratar serviço com outra
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