Baixe o app para aproveitar ainda mais
Prévia do material em texto
Stephane D’arc 5º semestre - Medicina Fisiologia da Deglutição O aparelho de deglutição é composto pela língua, palato mole, faringe, laringe (glote), Esfíncter Esofagiano Superior (EES), corpo do esôfago e Esfíncter Esofagiano Inferior (EEI). A faringe, o esfíncter esofagiano superior (músculo cricofaríngeo) e o terço superior do esôfago (“esôfago cervical”) são constituídos de musculatura esquelética, enquanto os 2/3 inferiores do esôfago (“esôfago torácico”) e o Esfíncter Esofagiano Inferior (EEI) são constituídos de musculatura lisa – este fato tem muita importância, como veremos adiante, ao analisarmos determinadas condições específicas que comprometem este órgão. O processo de deglutição começa por uma fase voluntária (fase oral), na qual o bolo alimentar é lançado à faringe pela contração da musculatura da língua. A partir desse instante, uma série de movimentos musculares involuntários (o “reflexo da deglutição”), plenamente coordenados, se inicia, permitindo que em menos de um segundo o bolo alimentar chegue ao esôfago, sem penetrar no trato respiratório... Durante esse curtíssimo tempo, a laringe se move para cima e para frente (fechando a epiglote e protegendo a via aérea), enquanto a contração da faringe superior e do palato mole empurram o alimento para baixo, iniciando o movimento peristáltico. O EES relaxa, permitindo o trânsito do bolo alimentar até o corpo do esôfago. Essa fase reflexa é controlada pelo SNC, utilizando nervos cranianos bulbares: glossofaríngeo (IX par), que provêm a inervação sensitiva (aferência); e os nervos vago (X par) e hipoglosso (XII par), que provêm a inervação motora (eferência). A musculatura lisa presente no corpo e EEI sofre influência dos interneurônios do plexo mioentérico (rede neuronal do tubo digestivo) que, por sua vez, faz contato com o sistema nervoso autônomo. O movimento peristáltico inclui uma fase inicial de relaxamento (inibição), seguida de contração. Ele é feito de forma sincronizada, sempre empurrando o alimento na direção do estômago. Existem dois tipos de peristalse esofágica: (1) primária – aquela em resposta ao reflexo da deglutição; (2) secundária – em resposta à distensão mecânica do esôfago pelo bolo alimentar remanescente. Os movimentos terciários (não peristálticos) não são sincronizados, podendo ocorrer espontaneamente ou após deglutição ou distensão esofágica. A deglutição promove o relaxamento fisiológico do EEI, permitindo que o alimento passe livremente para o estômago, ao ser empurrado pela peristalse. Ao término da deglutição (quando o alimento já alcançou o estômago), o EEI contrai, impedindo o refluxo do material gástrico para o esôfago. A distensão gástrica também pode levar a um relaxamento transitório do EEI, permitindo a eructação.. O esôfago possui três funções básicas: Conduzir o alimento da faringe ao estômago (peristalse, relaxamento dos esfíncteres). Stephane D’arc 5º semestre - Medicina Evitar a deglutição de ar, ou aerofagia, durante a respiração (tônus do EES) Evitar que o alimento retorne do estômago (tônus do EEI). A maioria dos distúrbios do esôfago se deve à interferência nessas funções, frequentemente resultando nos sinais e sintomas descritos abaixo: A “dificuldade de engolir alimentos” (disfagia) pode ocorrer no início da deglutição, ou seja, na transferência do alimento da boca para o esôfago (fase orofaríngea) ou na condução do bolo alimentar até o estômago (fase esofágica). Existem dois tipos básicos de disfagia, de acordo com o mecanismo: disfagia mecânica, quando existe um estreitamento anatômico do conduto (oral, faríngeo ou esofágico) ou um volume de bolo alimentar desproporcionalmente grande; e disfagia motora, quando o problema está na coordenação da motilidade do conduto (orofaríngeo ou esofágico). Ainda, de acordo com a sede do processo, classificamos as disfagias mecânicas e motoras em dois grandes grupos: (1) Disfagia Orofaríngea (ou de transferência) Na disfagia orofaríngea, o paciente tem dificuldade em iniciar a deglutição, não conseguindo fazer com que o alimento passe da boca para o esôfago. O paciente se engasga ao tentar deglutir, experimentando regurgitação nasal e aspiração traqueal, seguida de tosse. Pode haver uma sensação de desconforto na garganta (“disfagia cervical”). Ocorre tanto para sólidos quanto para líquidos, e os distúrbios que podem originá-la são aqueles que afetam os músculos esqueléticos ou a porção do sistema nervoso necessária para o controle voluntário (fase oral) e involuntário (reflexo) da deglutição. Outros sintomas comuns são a sialorreia (pela dificuldade de engolir a própria saliva) e disfonia (pelo comprometimento concomitante do aparelho fonador). A etiologia da disfagia orofaríngea é dividida em três subgrupos: anatômica, neurológica e muscular. Causas Anatômicas: fendas labiais, palatinas e laríngeas (causas congênitas), estenoses cicatriciais após procedimentos, lesões inflamatórias (herpes-simplex, abscesso peritonsilar e retrofaríngeo), lesões cáusticas, pós-radioterapia, compressão intrínseca (tumores, “teias esofágicas altas” da síndrome de Plummer- Vinson) e extrínseca (divertículo de Zenker, aumento de tireoide, osteófitos em coluna vertebral). Causas Neurológicas: esclerose múltipla, doença cerebrovascular, esclerose lateral amiotrófica, parkinsonismo. Como a inervação piramidal dos núcleos bulbares (IX, X e XII pares) é bilateral, a lesão de um único feixe piramidal corticobulbar não causa disfagia. Por isso, os acidentes vasculares de tronco são os principais responsáveis por graus avançados de disfagia de transferência, como no caso da síndrome de Wallenberg (isquemia da porção dorsolateral do bulbo). Para que um acidente vascular cerebral leve à disfagia grave, é necessário que seja bilateral, causando a chamada “síndrome pseudobulbar”. A esclerose múltipla pode comprometer os dois feixes corticobulbares, e a Esclerose Lateral Amiotrófica (ELA) envolve os neurônios motores inferiores (2º neurônio motor). No caso da doença de Parkinson, o problema está na inicialização voluntária da deglutição. Causas Musculares: miastenia gravis, dermatopolimiosite. A fraqueza dos músculos esqueléticos é típica destas entidades, determinando uma síndrome composta por disfagia de transferência, regurgitação nasal e disfonia. O melhor exame para avaliar a disfagia de transferência é a videofluoroscopia baritada (videoesofagografia), testando a deglutição de “bolos” de variadas consistências. Disfunção Cricofaríngea Este é um tipo especial de disfagia orofaríngea. A dificuldade desses pacientes é de impelir o alimento da faringe para o corpo esofágico, devido a uma constricção do EES, pela contratura do músculo constrictor inferior da faringe (cricofaríngeo). A “disfagia cervical” (sensação de bolo ou “entalamento” na garganta), associada à disfonia intermitente é o Stephane D’arc 5º semestre - Medicina quadro clínico mais comum. O músculo cricofaríngeo auxilia o aparelho fonador, ao distender as cordas vocais... Os sintomas do refluxo gastroesofágico estão presentes em 30-90% dos indivíduos com esta entidade. A esofagografia baritada pode ser normal, ou revelar anormalidades tais como uma “barra cricofaríngea posterior” ou o divertículo de Zenker. O tratamento geralmente é cirúrgico: indica-se um procedimento chamado Esofagomiotomia Cervical. Realiza-se uma incisão oblíqua cervical de 5-8 cm, a partir da cartilagem cricoide, acompanhando a borda anterior do esternoclidomastoideo. Após ser colocada uma oliva de 20 F no esôfago, procede-se à miotomia lateral, por uma extensão de 7-10 cm. O resultado clínico costuma ser bom: a disfagia é aliviada em 65- 85% dos pacientes, e o divertículo de Zenker, em algunscasos, pode regredir. (2) Disfagia Esofagiana (ou de condução) Na disfagia de condução, a dificuldade está no transporte dos alimentos pelo esôfago até o estômago e, sendo assim, geralmente é relata da como uma sensação de interrupção e estagnação do bolo alimentar no tórax – o paciente se sente “entalado”. “É uma forma de disfagia que pode ser observada tanto para sólidos quanto para sólidos e líquidos, e pode ser intermitente ou progressiva”. Se houver disfagia para sólidos e líquidos, devemos pensar em uma obstrução mecânica muito severa, ou então, mais comumente, se trata de em um distúrbio motor do esôfago (seja neurológico ou muscular), como acalásia, espasmo esofagiano difuso, esclerodermia etc. Por outro lado, se houver disfagia APENAS para sólidos, provavelmente se trata de um distúrbio exclusivamente mecânico, em geral uma lesão anatômica obstrutiva (câncer, estenose péptica, cáustica, compressão extrínseca etc.). Disfagia para sólidos progressivamente mais intensa (semanas a meses) é um sinal muito sugestivo de câncer de esôfago! Disfagia para sólidos intermitente (meses a anos, intercalando-se períodos assintomáticos) sugere a presença de membranas e anéis esofágicos... (3) Pseudodisfagia (“Globus Histericus”) É uma sensação de “bolo na garganta”, bastante comum na população. Está relacionada ao estresse emocional e ocorre, pelo menos uma vez na vida, em cerca de 45% das pessoas (53% das mulheres e 35% dos homens). O Globus pode ser diferenciado da disfagia verdadeira por duas características: (1) a sensação está presente entre as refeições; (2) quando o paciente engole algum alimento, não sente seu “entalamento”.] Os exames complementares (videofluoroscopia, esofagografia, manometria etc.) são todos normais. O tratamento consiste em tranquilizar o paciente e indicar psicoterapia quando necessário.
Compartilhar