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Revisão técnica: Luciana Bernadete de Oliveira Graduada em Ciências Políticas e Econômicas Especialista em Administração Financeira Mestre em Desenvolvimento Regional Marcia Paul Waquil Assistente Social Mestre em Educação Doutora em Educação Catalogação na publicação: Karin Lorien Menoncin CRB -10/2147 L732q Lima, Andréia Saraiva. Questão social e serviço social [ recurso eletrônico ] / Andréia Saraiva Lima; [revisão técnica: Luciana Bernadete de Oliveira, Marcia Paul Waquil]. – Porto Alegre: SAGAH, 2018. ISBN 978-85-9502-391-8 1. Serviço social. I. Título. CDU 36 1_Iniciais.indd 2 11/04/2018 09:28:10 Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira Objetivos de aprendizagem Ao final deste texto, você deve apresentar os seguintes aprendizados: � Reconhecer a realidade sócio-histórica em que as medidas neoliberais foram implantadas no país. � Definir a situação econômica do Brasil após a adoção das medidas neoliberais. � Avaliar, de forma crítica, a realidade social brasileira tendo como pano de fundo o neoliberalismo instalado no país. Introdução Neste capítulo, você vai estudar a origem do neoliberalismo, as medidas econômicas do neoliberalismo tomadas pela política governista brasi- leira, verificando os impactos econômicos, sociais e políticos no país. A proposta básica é dotar o profissional do serviço social de uma visão pontual do neoliberalismo no Brasil para que possa atuar de maneira eficaz na realidade social que o espera. O contexto do processo histórico de implantação do neoliberalismo Primeiramente, precisamos compreender o significado do neoliberalismo e sob qual contexto ele foi sendo forjado na história brasileira. Em que pese estarmos economicamente atrelados a economias de grandes potências mun- diais, especialmente, de forma dependente, precisamos entender o que estava ocorrendo no mundo e como o neoliberalismo surgiu no contexto brasileiro. Diante disso, podemos dizer que o neoliberalismo, por se tratar de uma corrente política, ideológica e, principalmente, econômica, baseada no libe- ralismo clássico, preserva muitas de suas características. Foi teorizado nos Estados Unidos por autores como Friedrich A. Hayeck e Milton Friedman. Os autores defendiam, entre outras medidas, a priorização do crescimento econômico, os princípios econômicos do capitalismo, o Estado mínimo, a mí- nima intervenção estatal nos rumos da economia, a privatização de empresas estatais, a livre circulação de capitais internacionais e ênfase na globalização, a abertura da economia para a entrada de multinacionais, a suficiência da lei da oferta e demanda para regular os preços e que a base da economia deve ser formada por empresas privadas. O ideário liberal se desenvolve nos alicerces da acumulação de capitais e reprodução das relações capitalistas de produção. Desde o final do século XVIII o liberalismo foi fortemente influenciado pelas teorias do Iluminismo e pela industrialização, responsável pela expansão econômica. A escola libe- ral defende a teoria de que a economia possui seus próprios mecanismos de autorregulação, os quais operam com eficácia quando o Estado não atrapalha seu funcionamento natural. No Brasil, o tempo que antecede a implantação de políticas neoliberais é marcado pelo período da ditadura militar e de governos populistas. Pre- cisamos lembrar que o Brasil viveu algumas importantes particularidades acerca da implantação de políticas sociais e aquisição de direitos trabalhistas. No mesmo período em que o welfare state era desenvolvido nos países das Europa Ocidental, o Brasil viveu a Era Vargas com a conquista de uma série de direitos sociais, em plena ditadura militar ao mesmo tempo em que sofreu graves restrições de direitos civis e políticos. O welfare state é desenvolvido na Europa Ocidental a partir das ideias de John Maynard Keynes (1883-1946). O Keynesianismo surge na Europa após a Grande Depressão, crise econômica que produziu sérias consequências na economia mundial entre os anos de 1929 a 1932. Tratava-se de uma teoria publicada no livro Teoria Geral do Emprego, do Juro e da Moeda em 1936, na qual o autor defendia a necessidade de uma maior intervenção estatal na economia de modo a reativar a produção e movimentar a economia por meio do consumo. Surge então o welfare state ou Estado-providência em que houve a im- plantação de políticas públicas abrangentes e de acesso universal, baseadas na cidadania e no compromisso governamental com o aumento e a expansão de benefícios sociais, crescimento econômico e pleno emprego (BEHRING; BOSCHETTI, 2006). Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira2 Keynes apostava no investimento do Estado para garantir o pleno emprego e a ampliação da igualdade social por meio da produção de serviços públicos além da produção privada e o aumento da renda e promoção de maior igualdade social por meio da instituição de serviços públicos. É importante assinalar que a política intervencionista do Estado proposta por Keynes gerava muita desconfiança entre correntes liberais. Mesmo assim, foi o período de ouro das políticas sociais, na Europa e EUA, caracterizando-se pela ampliação de serviços sociais, de seguridade social, do serviço nacional de saúde, de educação, de habitação, sem esquecermos das políticas de pleno emprego. Contudo, a política liberal do welfare state começa a dar sinais de enfraque- cimento nos anos 1960. A economia externa passou por importante período de recessão, especialmente os EUA com o término da Guerra do Vietnã e a sua derrota. Para outras correntes liberais o welfare state promovia a dependência e gerava “gastos sociais”. Enquanto isso, no Brasil, na contramão do que acontecia no mundo, vivia-se o milagre brasileiro (1969-1973) que significou o elevado crescimento econômico, a concentração de renda, concomitantemente, a ampliação da desigualdade social. Já o período do milagre econômico ocorreu, no Brasil, juntamente com os anos de chumbo, durante o governo de Emílio Garrastazu Médici, de 1969 a 1974. Foi o período mais repressivo da ditadura militar no Brasil, sendo marcado por violência política, pela luta armada e terrorismo, tanto de esquerda quanto de direita. Havia clara influência do governo na cultura e nos meios de comunicação por meio da censura que pretendia influenciar massivamente a sociedade da época, padronizando comportamentos, espe- cialmente de consumo. Na época o Ministro da Fazenda, Antônio Delfim Netto, afirmava que era preciso “fazer a riqueza crescer para depois dividi-la”. Contudo, a divi- são nunca ocorreu. Foram realizados empréstimos internacionais que foram investidos nas indústrias. Assim, o maior crescimento se deu nas indústrias automobilísticas e de eletrodomésticos. A garantia desse crescimento e da acumulação de capital nacional e interna- cional se deu à custa da exploração da classe trabalhadora que sofria o arrocho salarial, com duras condições de trabalho e a pressão política. Além disso, a dívida externa crescia ainda mais do que a taxa de crescimento, chegando a US$ 100 bilhões em 1984 (COUTO, 2004). Observa-se, aqui, que o Brasil adotava uma política econômica baseada nos princípios capitalistas de acumulação de capital, intervindo, minimamente nas questões sociais produzidas e reproduzidas pelas relações de produção 3Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira instituídas. Portanto, a ideologia liberal estava presente nas ações estatais daquele período histórico. Ocorre, então, a crise do capital ou “crise do petróleo”. Foi um momento de crise no mundo com reflexos na economia brasileira, pois se descobriu que o petróleo não é um recurso natural renovável e ocorreram muitas oscilações em seu preço acarretando desestabilizações econômicas e importantes conflitos internacionais. A realidade é que o Brasil importava 80% do petróleo consumido. E de- vido ao arrocho salarial dos trabalhadores, a maioria da populaçãonão podia comprar os produtos fabricados no próprio país, pois com a elevação do preço do petróleo os demais produtos também encareceram significativamente. “Em apenas cinco meses, entre outubro de 1973 e março de 1974, o preço do petróleo aumentou 400%, causando reflexos poderosos nos Estados Unidos e na Europa e desestabilizando a economia por todo o mundo. É justamente este momento que coincide com o fim do milagre econômico ocorrido na ditadura militar no Brasil” (GASPARETTO JUNIOR, 2017a). Diante disso, o Brasil precisa reestruturar seu planejamento econômico, sua política interna e externa. Vivia-se um período de recessão intensa e de revoltas e manifestações da população que sofria pela crise econômica e pela repressão da ditadura militar. Os dois governos seguintes, foram marcados pela ditadura militar, pela repressão dos direitos civis e políticos, além da crise econômica instaurada. O governo de Ernesto Geisel (1974-1979) e de João Batista Figueiredo (1979- 1985). Geisel buscava enfrentar a crise em meio à ditadura e a repressão civil e política. Lançou o II Plano Nacional de Desenvolvimento (II-PND), com o objetivo de retomar o crescimento econômico e conter a onda inflacionária. Para isso, priorizava o desenvolvimento de bens de capital e investindo nas empresas estatais. Contudo, não obteve êxito. Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira4 “Projetando uma ampliação da representação política dos setores de oposição, o Governo Geisel lançou, em 1977, o chamado pacote de abril. Esse pacote promoveu uma desarticulação política sustentada pelas premissas estabelecidas pelo Ato Ins- titucional nº 5 (AI-5). O Congresso Nacional foi fechado, ao mesmo tempo, o sistema judiciário e a legislação foram alterados. As campanhas eleitorais foram restritas, o mandato presidencial passou para seis anos e as leis seriam aprovadas por maioria simples” (SOUSA, 2017). Figueiredo, último militar eleito indiretamente, foi do partido de situação do governo (Aliança Renovadora Nacional, ARENA). Ao ganhar as eleições o então presidente prometeu dar início ao processo de democratização do país. Foi, então, lançado o III Plano Nacional de Desenvolvimento, sem êxito, pois o mundo também vivia um período de recessão e isso impediu que o Brasil obtivesse novos empréstimos. Além disso, o país já possuía dívidas externas muito altas. Mesmo assim, foram adotadas medidas que impulsionaram nossa economia. Foi implantado o programa de incentivo à agricultura o qual modernizou o sistema agrícola do país e impulsionou a exportação. Além disso, investiu-se em programas habitacionais em larga escala. “Com tais medidas, João Figueiredo conseguiu que o Brasil saísse da recessão em seu último ano de governo e gerasse um crescimento do Produto Interno Bruto (PIB) superior a 7%. A elevação dos índices de exportação e a maior independência do mercado interno, especialmente em relação ao petróleo, fizeram com que a condição externa do Brasil atingisse relativo equilíbrio” (GASPARETTO JUNIOR, 2017b). 5Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira O processo de redemocratização do país já estava em curso, e a população, mesmo sob perseguição política, permaneceu realizando mobilizações e estra- tégias para a retomada da democracia brasileira. O conjunto de acontecimentos que se desenrolavam desde a década de 1970 começou a materializar nos anos 1980, como a queda da ditadura e as eleições, ainda indiretas, de Tancredo Neves para presidente da república e de José Sarney para vice-presidente. Em paralelo a esses acontecimentos, houve uma forte recessão econômica, que trouxe para os brasileiros altos índices de inflação. Além disso, o setor público se endividou e as taxas de crescimento foram muito baixas. Em 1985, com o fim da ditadura e a abertura à redemocratização, a conquista mais significa- tiva desse período foi, sem dúvidas, a promulgação da nova Constituição da República, de 1988. Contudo, logo após a Constituição ter sido promulgada, com a participação maciça da população, sendo, portanto, expressão de demandas e anseios da sociedade há muito relegados, inicia-se um processo de “desfiguração” das amplas conquistas sociais previstas constitucionalmente. A realidade sócio-histórica e as medidas neoliberais no país Você estudou, até aqui, os acontecimentos anteriores à implantação do neo- liberalismo e, principalmente, que o Brasil já vinha implantando medidas de cunho liberal na economia, permanecendo, em diversos períodos históricos, dependente economicamente de potências mundiais. Agora, iremos avançar para o momento em que foram intensificadas medidas liberais e quando foi implantado, de fato, neoliberalismo no país. Após a promulgação da Constituição Federal de 1988, a ala conservadora e neoliberal do Congresso Nacional moveu esforços para enfraquecer as conquistas sociais asseguradas em lei. Entendiam que poderia haver um caos econômico caso os especuladores financeiros falissem, bem como acreditavam que a regulamentação econômica dos mercados representaria o fim da ordem liberal e o início do socialismo (PEREIRA, 2012). Outro fator explica a “recusa neoliberal de assistir os pobres”. Trata-se da concepção ideológica da pobreza aliada a questão de fracasso moral do ser humano. A lógica neoliberal concebe a ética da autorresponsabilização dos indivíduos pobres, que os obriga a autossatisfazer suas necessidades sociais ou ainda, entende que os indivíduos devem dar sua contrapartida, ou fazerem por merecer os benefícios sociais recebidos (PEREIRA, 2012). Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira6 Os anos 1980 do século XX ficaram conhecidos como “a década perdida” do ponto de vista econômico e do desenvolvimento. Estávamos endividados e enfrentávamos dificuldades para pagamento da dívida externa. O Fundo Monetário Internacional (FMI), para continuar emprestando dinheiro ao Brasil, exigia que o país adotasse medidas ortodoxas nas quais deveriam ocorrer o corte de custos do governo e o aumento da arrecadação. Contudo, Sarney fez o contrário, implantando políticas econômicas contrárias as exigências do FMI. Foi mantido o modelo de substituição de importações e houve grande participação do Estado na administração da economia nacional. O governo investiu na alimentação da inflação, ou seja, criava o dinheiro inflacionário, visando ter recursos para pagar a dívida externa. Mas, buscava- -se a estabilização da moeda, pois a hiperinflação gerava outros agravos econômicos e sociais. Assim, foram lançados vários planos econômicos (Plano Cruzado, Plano Bresser e Plano Verão) que não tiveram o êxito esperado. O próximo governante do país, Fernando Collor de Melo (1989/1992), foi escolhido pelo povo a partir do voto direto após 30 anos de eleições indiretas. Entretanto, o povo brasileiro, mais uma vez, sofreu. Durante o Governo Collor foram introduzidas medidas, reconhecidamente, neoliberais, sendo realizadas as primeiras experiências de privatizações no país. Foi lançado o plano Collor I, que visava à contenção da inflação, à moder- nização administrativa e à revitalização da economia. O governo retomou o Cruzeiro como moeda nacional, congelou preços e salários, bloqueou contas correntes e poupanças no prazo de 18 meses, reduziu o número de servidores públicos e órgãos estatais. Além de confiscar as contas bancárias de trabalhadores e empresários o governo Collor também reduziu as tarifas alfandegárias, favorecendo a entrada de produtos importados no país. Dessa forma, a indústria nacional enfrentou dificuldades para concorrer com produtos importados mais baratos, gerando a modernização e redução de mão de obra. A indústria nacional precisou se modernizar implantando importantes transformações na área da tecnologia e da comunicação. Mas, além disso, ocorreram mudanças na produção e no consumo, rompendo barreiras geo- gráficas. A globalização da economia aprofundou ainda mais oenraizamento dos ideários neoliberais no Brasil dos anos 1990. O resultado foi o aumento do desemprego e da desigualdade social e a insatisfação popular crescente, culminando em manifestações da sociedade exigindo o impeachment do então presidente. Diante desse quadro, o neoli- beralismo desenvolveu características compatíveis com a sua época na qual as evoluções tecnológicas e de comunicação compõem a lógica veloz da 7Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira economia global. Quando falamos em globalização da economia, atualmente, estamos tratando de relações econômicas, mas também sociais, tecnológicas e cientificas entre países do mundo contemporâneo. Além de ser compreendido como corrente econômica, o neoliberalismo atua, inclusive, como um padrão social de comportamento, valorizando o individualismo e o empreendedorismo. Nesse contexto, as políticas públicas são compreendidas como gastos sociais. Por isso, a título de exemplo das ações da política neoliberal, a Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS) demorou tanto a ser aprovada. Lembremos que, após o impeachment de Collor, assume a presidência seu vice, Itamar Franco. Na época, Fernando Henrique Cardoso (FHC), como Ministro da Fazenda, lança o Plano Real e obtém a aprovação política e social, sendo eleito o próximo Presidente da República (1994-2002). Durante os dois governos de FHC, foram ampliadas, ainda mais, as medidas neoliberais com a diminuição gradativa do Estado (Estado mínimo), a ampliação das privati- zações e a abertura econômica do Brasil ao capital internacional. Ao final do seu segundo mandato (2002), somando oito anos no poder, FHC conseguiu controlar a inflação brasileira. Entretanto, durante o seu governo, a distribuição de renda no Brasil continuou desigual: a renda dos 20% da população rica continuou cerca de 30 vezes maior que a dos 20% da população mais pobre. O Brasil ficou em excessiva dependência do Fundo Monetário Internacional (FMI). O governo FHC foi responsável pela efetiva inserção do Brasil na política neoliberal (CARVALHO, 2017). Consequências do neoliberalismo nas políticas públicas brasileiras Em relação à política neoliberal avançar e aprofundar raízes, as políticas públicas sofreram grandes cortes de verbas, de servidores e de condições de funcionamento qualificado. E foi enfrentando muitas barreiras que a Lei Or- gânica da Assistência Social (LOAS), nº 8.742, foi sancionada em dezembro de 1993, mas foi efetivada somente em 1995. Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira8 Vivia-se um momento político econômico e social no qual as conquistas de direitos de cidadania e sociais foram sendo gradativamente sequestrados da sociedade. O processo de aprovação da LOAS foi árduo e envolveu órgãos representativos da categoria dos assistentes sociais, como o Conselho Federal de Serviço Social (CFESS) e a Associação Brasileira de Ensino e Pesquisa em Serviço Social (ABEPSS). Segundo Sposati (2004), em 1990 o então presidente da República, Fer- nando Collor de Mello vetou a promulgação da LOAS. Mas em 1991 e 1992, com advento da instauração do processo de impeachment do Presidente da República, e de sua renúncia antes mesmo da conclusão do processo, assume a presidência o vice-presidente Itamar Franco, que enviou, em 25 de agosto de 1993, em regime de urgência, projeto de lei para a Câmara Federal, onde recebe o número 100/93. Foram intensos os movimentos da categoria dos assistentes sociais por meio do CEFESS e da ABEPSS para pressionar pela aprovação na Lei, sendo aprovada em 7 de dezembro de 1993. Foi o resultado de muitos debates no interior da categoria dos assistentes sociais, bem como junto aos representantes legislativos para a aprovação da LOAS. Significava extrair a assistência social do lugar de caridade, assisten- cialismo, de políticas residuais e clientelistas para uma nova concepção de política pública de direito do cidadão e dever do Estado, tal qual está posto na Constituição de 1988. A Constituição Federal coloca a política de assistência social juntamente à política de saúde e de previdência social, compondo o tripé da seguridade social brasileira. Entretanto, as políticas na área da assistência social permaneciam residuais, fragmentadas e insuficientes, pois o processo de responsabilização do Estado sobre as demandas sociais andava na contramão da política imple- mentada naquele momento histórico. “Vivemos na década de 1990, e principalmente após a instituição do Plano Real, em 1994, algo bastante diferente desse crescimento mal dividido do tão criticado desen- volvimentismo. Houve o desmonte (Lesbaupin, 1999) e a destruição (Tavares, 1999), numa espécie de reformatação do Estado brasileiro para a adaptação passiva à lógica do capital. Revelou-se, sem surpresas, a natureza pragmática, imediatista, submissa e antipopular das classes dominantes brasileiras” (BEHRING; BOSCHETTI, 2006, p. 151). 9Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira Houve a entrega de grande parte do patrimônio brasileiro às empresas estrangeiras, que, por sua vez, ao se instalarem no país não precisavam ad- quirir sua matéria-prima do Brasil. Isso gerou o desmonte das indústrias brasileiras, o desemprego e o desequilíbrio da balança comercial (BEHRING; BOSCHETTI, 2006). Para além da política de assistência social, as demais políticas públicas como, por exemplo, a saúde, a educação e a previdência social foram suma- riamente atingidas. Isso se deve à concepção de que o Estado deve ser enxuto e reduzir “gastos” com as políticas sociais. As políticas neoliberais no Brasil produziram efeitos ainda sentidos na con- temporaneidade. A privatização, a terceirização, o desemprego e o subemprego, a falta de investimentos nas áreas na educação, na saúde, na assistência social e na previdência social, especialmente, caracterizam a lógica da acumulação e desenvolvimento econômicos em detrimento do desenvolvimento humano e social. Algumas considerações Compreender as políticas econômicas neoliberais implica aprofundar o co- nhecimento de suas origens e seu desenvolvimento do contexto histórico no qual se fundou. Diante disso, vimos algumas das principais características do neoliberalismo, sua base advinda do liberalismo clássico e passamos para o entendimento do processo de mudança do modelo de Estado liberal clássico para o Estado-providência ou welfare state, proposto por Keynes, como forma de enfrentamento da crise econômica de 1929. Em que pese a nem todos os novos liberais aceitarem, plenamente, a inter- venção do Estado na economia e nas questões sociais, o enfraquecimento do welfare state proposto contribuiu para um expressivo retrocesso dos direitos sociais nos países europeus e nos Estados Unidos. Esse fato nos diz sobre a lógica liberal que via nas polícias sociais gastos desnecessários e geradores de dependência dos beneficiários. Estudamos como o Brasil veio a adotar as medidas neoliberais dos anos 1990. Tratou-se de um processo de alargamento da dependência econômica pela importação de petróleo, pelos empréstimos junto ao FMI, o qual fazia exigências no sentido de implantação de medidas neoliberais no mercado e na economia brasileira. O cenário político favorável desde a era Collor, as crises econômicas anteriores e também o período do milagre econômico impulsionaram o Brasil para a intensificação das desigualdades sociais, da globalização e, por fim, da implantação do neoliberalismo. Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira10 No entanto, vimos que o Brasil andou em compasso diferente do restante do mundo em relação às políticas de bem-estar social. Por vivermos em uma ditadura militar por um período tão longo, e termos implantado governos populistas e desenvolvimentistas, aliado a restrições de direitos políticos e civis, enfrentamos instabilidades econômicas e políticas recorrentes. A população enfrentou barreiras fortemente enraizadas para eleger seusgovernantes e, no entanto, em que isso se tornou possível, esbarrou em governos cada vez mais alinhados à ideologia neoliberal, na qual o crescimento econômico vem antes dos direitos sociais, da dignidade e da igualdade entre os homens. Nem mesmo a Constituição Federal de 1988 – a Constituição Cidadã – pôde garantir, de forma linear e ascendente, a materialização dos direitos nela previstos. BEHRING, E. R.; BOSCHETTI, I. Política social: fundamentos e história. São Paulo: Cortez, 2006. (Coleção Biblioteca Básica/Serviço Social). CARVALHO, L. Governo Fernando Henrique Cardoso. Brasil Escola, 2017. Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/historiab/governo-fernando-henrique-cardoso. htm>. Acesso em: 25 jul. 2017. COUTO, B. R. O direito social na sociedade brasileira: uma equação possível? São Paulo: Cortez, 2004. GASPARETTO JUNIOR, A. Crise do petróleo. InfoEscola, 2017a. Disponível em: <http:// www.infoescola.com/economia/crise-do-petroleo/>. Acesso em: 22 jul. 2017. GASPARETTO JUNIOR, A. Governo de João Figueiredo. InfoEscola, 2017. Disponível em: <http://www.infoescola.com/historia-do-brasil/governo-de-joao-figueiredo/>. Acesso em: 20 jul. 2017. PEREIRA, P. A. P. Utopias desenvolvimentistas e política social no Brasil. Serviço Social & Sociedade, São Paulo, n. 112, p. 729-753, out./dez. 2012. SOUSA, R. G. Ernesto Geisel. Brasil Escola, 2017. Disponível em: <http://brasilescola. uol.com.br/historiab/ernesto-geisel.htm>. Acesso em: 25 jul. 2017. SPOSATI, A. A menina LOAS: um processo de construção da Assistência Social. São Paulo: Cortez, 2004. Leitura recomendada RIBEIRO, P. S. Os anos 80 no Brasil: aspectos políticos e econômicos. Brasil Escola, 2017. Disponível em: <http://brasilescola.uol.com.br/sociologia/os-anos-80-no-brasil- -aspectos-politicos-economicos.htm>. Acesso em: 25 jul. 2017. 11Políticas econômicas neoliberais e a realidade brasileira http://brasilescola.uol.com.br/historiab/governo-fernando-henrique-cardoso. http://www.infoescola.com/economia/crise-do-petroleo/ http://www.infoescola.com/historia-do-brasil/governo-de-joao-figueiredo/ http://uol.com.br/historiab/ernesto-geisel.htm http://brasilescola.uol.com.br/sociologia/os-anos-80-no-brasil- Encerra aqui o trecho do livro disponibilizado para esta Unidade de Aprendizagem. Na Biblioteca Virtual da Instituição, você encontra a obra na íntegra.
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