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57 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Radiologia Abdominal Os métodos de imagem utilizados para a visualização das estruturas abdominais são: radiografia, ultrassonografia, tomografia computadorizada, ressonância magnética, PET-CT e PET-RM. O raio X é útil para o abdome agudo obstrutivo e o abdome agudo perfurativo, normalmente representando uma análise inicial do paciente. No entanto, a TC é o melhor método para avaliar as estruturas do abdome. O ultrassom, em alguns casos, é o método de escolha como, por exemplo, no estudo da vesícula biliar. A RM pode ser utilizada em casos particulares como para gestantes. O PET é mais usado para pesquisa de linfomas, metástases, doenças fora do pronto-socorro. FASES DA TC ABDOMINAL Primeiro, há a fase sem contraste, em que não injeta contraste e avalia-se as estruturas em uma TC convencional. Depois, a fase arterial, que ocorre de 20 a 40 segundos após a injeção de contraste via venosa e melhora a visualização de estruturas vasculares e do parênquima (realce parenquimatoso) dos órgãos abdominais. A fase portal/venosa ocorre de 60 a 80 segundos após a injeção do contraste, dado o tempo para opacificar a veia porta. Melhora a visualização da veia porta e veias hepáticas, o fígado, o baço. A próxima fase é a fase tardia/de equilíbrio. Ocorre de 120 a 360 segundos após a injeção de contraste, e pode-se visualizar a excreção do contraste já pelo rim, passando pelos ureteres. É importante lembrar que caso se faça imagem em todas essas fases, na prática é como se fossem feitos 4 exames, expondo o paciente a muita radiação. Portanto, é essencial que a indicação do exame seja feita e levada em consideração para que se possa suprimir alguma ou algumas dessas fases. Se há suspeita de apendicite pode-se fazer fase sem contraste e uma portal, mas não é necessário a fase arterial e a de equilíbrio, diminuindo assim a dose de radiação que o paciente receberia, por isso é importante colocar a suspeita clínica na hora de solicitar um exame de imagem. OBS.: Na TC tem-se também a escala de Hounsfield é uma escala quantitativa que descreve a radiodensidade, assim cada tipo de material tem seu valor. Ex.: ROI – Ar -> -1000 UH; ROI – Gordura -> -50 UH. DOENÇAS ABDOMINAIS: ABDOME AGUDO As doenças que serão estudas nessa aula serão as doenças do abdome agudo: abdome agudo inflamatório, abdome agudo obstrutivo, abdome agudo vascular, abdome agudo perfurativo, abdome agudo hemorrágico. O abdome agudo se caracteriza por uma dor abdominal, em geral de início súbito. Costuma se associar a doenças de resolução cirúrgica, necessitando de avaliação médica urgente. A causa conhecida mais comum de abdome agudo é a apendicite (28%), seguida de colecistite (9,7%), obstrução do delgado (4,1%), afecções ginecológicas (4%), pancreatite e cólica renal (2,9% cada), úlcera péptica (2,5%), diverticulite (1,5%). As causas não determinadas chegam a 30% dos casos. 58 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 ABDOME AGUDO INFLAMATÓRIO O abdome agudo inflamatório tem como sinais e sintomas a dor mal caracterizada, a febre, hemograma infeccioso, sinais de infecção/sepse, irritação peritoneal (exame físico). Apendicite---------------------------------------------------------------- A apendicite é uma inflamação do apêndice que é, em geral, uma emergência cirúrgica. A fisiopatologia envolve um apendicolito que obstrui a base do apêndice, que se distende e promove a translocação de bactérias que podem ir para a cavidade abdominal. A história clássica da apendicite tem um paciente homem, jovem, que inicia dor na região epigástrica ou periumbilical que depois irradia para a fossa ilíaca direita, com dor à descompressão (sinal de Bloomberg), podendo apresentar febre e leucocitose. Com essa história, muitas vezes não é nem necessário o exame de imagem para operar esse paciente, mas é difícil hoje em dia um médico operar sem a imagem. Quando a paciente é mulher, aumenta a gama de diagnósticos diferenciais, como um abcesso ovariano, salpingite. Pode também se tratar de uma psoíte ou uma diverticulite. Ao raio x, é difícil avaliar propriamente as estruturas com especificidade, e normalmente ele não confirma o diagnóstico. A TC, a ressonância e o ultrassom são melhores. A ultrassonografia não é muito útil quando o paciente é obeso ou quando o apêndice está atrás do ceco. A TC tem alta sensibilidade no diagnóstico. O apêndice se mostra como uma estrutura tubular em fundo cego em abdome direito. Ao exame de imagem, busca- se um apêndice distendido, de paredes espessadas e com a gordura em redor borrada ou densificada (causada pela chegada de mais sangue ao apêndice que adensifica a gordura). Imagens: Imagem A, TC em mulher de 27 anos e imagem B de homem de 62 anos. Mostram minimamente a distensão do apêndice com o espessamento da parede (setas), e borramento da gordura. A apendicite aguda pode complicar com perfuração (abcesso ou flegmão), com obstrução de alças delgadas e até com trombose venosa mesentérica. Na imagem que segue, é possível observar um paciente com apendicite aguda associada a abcesso periapendicular que contém gás, líquido e um apendicolito calcificado. 59 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Diverticulite-------------------------------------------------------------- A diverticulite é uma inflamação que acomete um divertículo, normalmente devido a um fecalito que o obstrui, fazendo com que ele distenda e inflame, causando um espessamento da parede e densificação da gordura. Os divertículos se formam, por sua vez, em decorrência aumento da pressão intraluminal do intestino associada a fraqueza da parede, levando a formação dessas estruturas (falsos divertículos). A história clássica da diverticulite tem um paciente com 60 anos ou mais, com febre, leucocitose e dor na fosse ilíaca esquerda. Pode também ser do lado direto, mas não é o clássico. Classicamente, os divertículos do lado direito sangram e os do lado esquerdo inflamam. É importante lembrar que mais de 65% dos pacientes com mais de 65 anos têm divertículos, localizados principalmente no sigmoide. 25% desses pacientes tem diverticulite. Na TC, busca-se confirmar o diagnóstico, detectar complicações e determinar possíveis diagnósticos diferenciais. O achado tomográfico abrange: densificação dos planos gordurosos adjacentes aos divertículos, espessamento parietal concêntrica acima de 4mm no divertículo, pequenas coleções líquidas peridiverticulares, ar extra-luminal. Imagens: As imagens 3A e 3B são de um paciente de 60 anos em que a TC mostra espessamento da parede do sigmoide associado com diverticulite, alterações inflamatórias e bolhas de gás na gordura subperitoneal do mesocolon do sigmoide (seta em imagem B). A imagem 4 é de um paciente masculino de 42 anos com dor em flanco esquerdo e suspeita de cálculo renal. TC mostra divertículo inflamado hiperatenuante (seta). Notar inflamação em torno da gordura e espessamento da parede. Os achados são repetitivos. A diverticulite pode complicar com a formação de abcessos, obstrução intestinal, perfuração e com a formação de fístulas. As imagens abaixo mostram uma complicação com abcesso. 60 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Apendagite--------------------------------------------------------------- A apendagite é uma inflamação dos apêndices epiploicos (evaginações normais do peritônio, repletas de gordura, que se originam da borda antimesentérica do cólon), que geralmente torcem, infartam e inflamam, causando dor abdominal baixa. Se for do lado direito, o diagnóstico difentencial é com apendicite, e do esquerdo com diverticulite. Na TC, busca-se um nódulo paracólico com atenuação de gordura com inflamação ao redor, saindo da superfície serosa do intestino.Pode apresentar um ponto central hiperatenuante (trombose vascular. Imagens: na primeira imagem é possível ver uma “bola” de gordura com densificação da gordura peritoneal em volta. Na imagem da direita, TC revelou duas áreas focais de densificação dos planos adiposos intra-abdominais da região antimesentérica do cólon sigmoide da fossa ilíaca esquerda, com conteúdo central gorduroso, de aspecto tubuliforme, “dedo de luva”, sugerindo um processo inflamatório local. 61 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Adenite Mesentérica--------------------------------------------------- A adenite mesentérica é uma inflamação benigna de linfonodos na região ileocecal, simulando uma apendicite. Ela cursa com aumento de linfonodos, o apêndice está normal, podendo haver alterações na gordura mesentérica local. Os sintomas geralmente são dor abdominal intensa e febre, podendo também cursar com vômitos e diarreia. A história típica é de um paciente que teve infecções a distância (nas vias respiratórias ou nos seios da face, por exemplo) e 2 semanas depois aparece com dor em fossa ilíaca direita (região ileocecal). Pede-se TC desconfiando de apendicite, e observa-se que o apêndice está normal, mas vê-se linfonodos aumentados. Normalmente é uma lesão autolimitada tratada com anti-inflamatório. É mais frequente em jovens. Imagem: na imagem da direita a cabeça de seta mostra o apêndice normal, enquanto a seta da imagem da esquerda aponta para “pontos brancos” que são linfonodos agrupados. Colite Pseudomembranosa------------------------------------------- A colite pseudomembranosa é uma inflamação mucosa com formação de pseudomembranas (muco + debris inflamatórios). Pode acompanhar quadro de ascite e alterações pericolônicas. A história típica é de um paciente que normalmente está internado ou simplesmente em algum tipo de tratamento com antibióticos potentes (múltiplos) que acabam alterando a regulação das bactérias intestinais, permitindo o supercrescimento da Clostridium difficile. No exame de imagem, é possível ver espessamento da parede intestinal, principalmente do reto e do sigmoide. OBS.: é importante sempre lembrar que nessas últimas doenças os achados são muito inespecíficos, e, portanto, a correlação clínica é muito importante. 62 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Colecistite Aguda------------------------------------------------------- A colecistite aguda é uma inflamação da vesícula biliar que normalmente decorre de um cálculo que obstrui a vesícula, que, por sua vez, distende e inflama. A parede espessa e pode inclusive perfurar e formar abcesso. O exame de escolha é a ultrassonografia. A história típica é de uma paciente mulher, com sobrepeso, meia idade, que gosta de comer comidas gordurosas e começa com dor quando come esses alimentos, depois passa. Depois, em determinado momento a dor em hipocôndrio não passa mais. A imagem abaixo mostra uma colecistite enfisematosa. Normalmente mais grave, ocorre geralmente em homens, diabéticos, que não sentem muita dor devido à neuropatia diabética. Nesse caso, a ida ao hospital geralmente é retardada, e o paciente chega mais grave. A bactéria inflamatória produz gás que enche a vesícula de ar. Pancreatite Aguda------------------------------------------------------ A colecistite aguda é uma inflamação pancreática causada principalmente por cálculo (que migrou da vesícula biliar e dá uma obstrução intermitente do ducto colédoco ou até pancreático) ou por alcoolismo. Geralmente cursa com dor em quadrante superior em barra, que vai para o lado esquerdo e irradia para o dorso. 63 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 O diagnóstico de pancreatite é essencialmente feito a nível clínico e laboratorial, preenchendo-se pelo menos 2 dos seguintes critérios: dor na região pancreática (abdome superior), laboratório para pâncreas alterado (amilase e/ou lipase alteradas), imagem com alteração pancreática. O pâncreas, portanto, pode estar normal à imagem. Abaixo está a classificação de Balthazar para a imagem pancreática e um exame com Balthazar C. Imagem: TC mostra moderada quantidade de exsudato inflamatório (seta) em torno do pâncreas (p) alargado. A atenuação do pâncreas é normal na imagem. ABDOME AGUDO OBSTRUTIVO O abdome agudo obstrutivo é a segunda causa mais comum de abdome agudo. O quadro clínico abrange dor em cólica progressiva, inicialmente um aumento da atividade motora intestinal, vômitos e parada de eliminação de gases e fezes. O abdome agudo obstrutivo pode ser simples (só há um ponto de obstrução) ou em alça fechada (em que há 2 pontos de oclusão da alça em seu trajeto -> maior risco de sofrimento vascular com chance de rotura ou perfuração da alça, o que exige tratamento cirúrgico). Nesse cenário, a rotina de abdome agudo ajuda bastante na radiografia, em que faz-se a radiografia com o paciente de pé e deitado, procurando os sinais de obstrução. Na radiografia, é possível observar o sinal das “moedas empilhadas” (imagem à esquerda), causado pelas haustrações da alça intestinal, em que as linhas formadas parecem moedas empilhadas. Outro sinal de obstrução é o nível hidroaéreo (imagem à direita), em que é possível ver nível de líquido e gás nas alças intestinais. Mais um sinal é a ausência de gás no reto, sugestivo de obstrução acima. 64 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Mais um sinal importante é o sinal da maçã mordida. Na imagem abaixo, em uma radiografia com contraste por via retal. Nesse caso, a obstrução está no ceco, provavelmente causado por um adenocarcinoma intestinal. As causas do abdome agudo obstrutivo variam. No cólon, a maior causa são tumores. No intestino delgado, pode ser causado por bridas/aderências, hérnias, tumor ou intussucepção. Na TC, procura-se a transição do local entre uma alça dilatada e outra sem dilatação. Se não for identificado nódulo ou massa, hérnia, intussucepção, abcesso ou espessamento inflamatório, é importante pensar em aderências. Níveis hidroaéreos no intestino, alças cheias de líquido e alças de delgado dilatadas proporcionalmente ao grau de dilatação do cólon não são indicadores de obstrução intestinal mecânica. Quando a alça começa a sofrer, é possível ver espessamento parietal da alça sem contraste (ou contraste na fase tardia), gás na parede da alça (pneumatose intestinal), densificação da gordura mesentérica e vasos engurgitados. Adenocarcinoma-------------------------------------------------------- A obstrução pode ser mecânica por adenocarcinoma. Intussuscepção---------------------------------------------------------- Na intussucepção, ocorre que uma alça intestinal invagina dentro de si própria, levando a um quadro obstrutivo. Nas crianças, normalmente não tem causa e é autolimitada. Nos adultos, normalmente tem uma causa subjacente com linfoma, lipoma ou algum tipo de nodulação. 65 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Hérnia inguinal---------------------------------------------------------- A hérnia inguinal pode insinuar uma alça intestinal para dentro, causando abdome agudo obstrutivo. Na imagem abaixo podemos ver alças dilatas e nível hidroaéreo. À direita, a hérnia inguinal marcada pela seta. Ileobiliar------------------------------------------------------------------ A tipo iliobiliar é causado por uma pedra na vesícula que irrita a parede da vesícula biliar até que forma uma fístula que a comunica com o intestino. Ela chega até a válvula ileocecal, não consegue passar e obstrui. 66 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃOVITOR FALEIROS - 103 Bridas--------------------------------------------------------------------- Nesse caso, aparecem alças distendias e não se acha nada (nenhuma obstrução, cálculo, tumor), com o paciente tendo geralmente uma história de cirurgia prévia. Assim, a causa a se pensar são as bridas, aderências da parede intestinal. ABDOME AGUDO VASCULAR O abdome agudo vascular normalmente é causado por uma doença isquêmica intestinal. No tipo crônico, o protótipo é de um paciente que come e sente dor, levando-o a parar de comer ou comer menos, normalmente emagrecendo. A forma aguda geralmente decorre de um descolamento de um trombo de algum lugar ou o paciente tem um choque hipovolêmico, levando a redução de fluxo para o intestino, o que leva a um infarto de uma região intestinal. A doença isquêmica intestinal pode ser segmentar ou difusa e superficial ou transmural. A doença mesentérica não oclusiva representa de 20 a 30% dos casos (hipofluxo: hipovolemia, hipotensão, sepse, pós-diálise, drogas). Já a doença mesentérica oclusiva pode ser por trombose venosa (5 a 10% dos casos: apresenta tríade de Virchow, com estase, alteração da coagulação e lesão endotelial) ou por oclusão da artéria mesentérica superior (60 a 70% dos casos: e ocorre por aterosclerose ou embolia arterial/arritmia). Os achados tomográficos estão listados abaixo e são parecidos com várias outros as doenças aqui descritas. 67 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 Imagens: À esquerda, colite isquêmica mostrando paredes espessadas e gordura densificada. À direita, a imagem mais superior mostra pneumatose (ar na parede) que é um sinal de gravidade. ABDOME AGUDO PERFURATIVO O abdome agudo perfurativo tem quadro clínico descrito com irritação peritoneal generalizada, abdome em tábua, dor em facada e percussão dolorosa com ausência de macicez hepática (sinal de Jobert). É possível no raio x o gás no abdome (pneumoperitônio). Causas estão listadas abaixo. Antigamente a úlcera péptica era a principal causa, mas com o avanço e difusão dos medicamentos gastrointestinais, não é mais. A imagem que segue mostra um exame com contraste que mostra com facilidade o local contrastado (nem sempre mostra com facilidade). Outro sinal importante é o Sinal de Rigler, descrito ao lado. É possível ver ar dentro da alça e pneumoperitônio, delimitando a parede da alça. 68 RESUMO DE RADIOLOGIA JOÃO VITOR FALEIROS - 103 ABDOME AGUDO HEMORRÁGICO O abdome agudo hemorrágico tem quadro clínico descrito com dor pouco intensa e predomínio de alterações hemodinâmicas como hipovolemia, hipotensão, taquicardia, anemia e sudorese fria. Causas incluem: gestação ectópica, aneurisma de aorta roto, hematoma de alças e hemorragia tumoral. É imperativo lembrar sempre da importância da HISTÓRIA CLÍNICA. A maioria dos achados servem para muitos diagnósticos, e a correlação é essencial para dar sentidos a eles.
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