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Bagoas - revista de estudos gays 7

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7ALÍPIO DE SOUSA FILHOEDITOR
Gênero e SexualidadesESTUDOS GAYS
Proposta Editorial
Publicação semestral de estudos teóricos, pesquisas empíricas, ensaios e 
resenhas sobre as temáticas de gênero e sexualidade, com destaque para os 
estudos gays, lésbicos e queer sobre homossexualidades, lesbianidades, 
transexualidades. A revista publica igualmente trabalhos de teoria social, 
direitos humanos, cultura e política que dialoguem com a temática central.
 
 Bagoas : revista de estudos gays / Universidade Federal do Rio Grande 
 do Norte, Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes. - V. 1, n. 1 
 jul./dez. 2007)- . - Natal : EDUFRN, 2007- . 
 v. ; 23 cm. 
 Semestral.
 Início: jul./dez. 2007.
 Editor: Alípio de Sousa Filho. 
 Descrição baseada em: v. 1, n.1, jul./dez. 2007. 
 ISSN 1982-0518
 
 1. Ciências Humanas e Sociais - Periódico. 2. Sexualidades - Periódico. 
 3. Ética sexual - Periódico. 4. Ética moral - Periódico. 5. Homossexualidades 
 - Periódico. I. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. II. Centro de 
 Ciências Humanas, Letras e Artes. III. Título. 
 RN/BSE-CCHLA CDU 168.522:3(05)
A revista tem registo no Sociological Abstracts
Catalogação da Publicação na Fonte. Universidade Federal do Rio Grande do Norte. 
Biblioteca Setorial Especializada do Centro de Ciências Humanas, Letras e Artes (CCHLA).
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE DO NORTE
Reitora: Ângela Maria Paiva Cruz
Vice-Reitora: Maria de Fátima Freire de Melo Ximenes
CENTRO DE CIÊNCIAS HUMANAS LETRAS E ARTES
Diretor: Herculano Ricardo Campos
Vice-Diretora: Maria das Graças Soares Rodrigues
 
EDITOR
Alípio de Sousa Filho
 
EDITORES ADJUNTOS
Antonio Eduardo de Oliveira
Durval Muniz Albuquerque Junior
SECRETÁRIO EXECUTIVO
José Eider Madeiros
BOLSISTA DE APOIO TÉCNICO
Glauber Vinícius
ASSESSORIA DE COMUNICAÇÃO
Laurisa Alves
 
COMISSÃO EDITORIAL
Anne Christine Damásio – UFRN
Carlos Guilherme Valle – UFRN 
Cinara Nahra – UFRN 
Eduardo Anibal Pellejero – UFRN
Elisete Schwade – UFRN 
Makarios Maia – UFRN 
Márcio de Lima Dantas – UFRN 
Maria das Graças Pinto Coelho – UFRN
Rozeli Maria Porto – UFRN
 
CONSULTORIA EDITORIAL
Adriana Piscitelli – UNICAMP
Adriana Resende Barretto Vianna – UFRJ 
Alessandro Soares da Silva – USP
Alexandre Câmara Vale – UFC
Daniel Welzer-Lang – Univerité Toulouse 2 – França
David Foster – Arizon University – EUA
Denílson Lopes – UFRJ 
Edrisi Fernandes – UFRN 
Emerson da Cruz Inácio – USP
Eugênia Correia Krutzen – UFPB
Fabiano Gontijo – UFPI
Fernando Bessa Ribeiro – UTAD – Portugal
Fernando Villamil – Universidad Complutense de Madri – Espanha
Francisco Oliveira Barros Junior – UFPI
Horácio Costa – USP
James Noyle Green - University of Brown – EUA
Joel Birman – UFRJ
Júlio Simões – USP
Laura Moutinho – USP
Leandro Colling – UFBA
Luiz Fernando Dias Duarte – UFRJ
Luiz Mello de Almeida Neto – UFG
Luiz Mott – UFBA
Luiz Paulo Moita Lopes – UFRJ
Lourdes Bandeira – UNB
Marcos Antônio Costa – UFRN
Márcia Aran – UERJ
Maria Helena Braga – UFRN
Maria Luiza Heilborn – UERJ
Michel Maffesoli – Sorbonne – França
Miguel Vale de Almeida – ISCTE – Portugal
Miriam Grossi – UFSC
Peter Fry – UFRJ
Ricardo Barrocas – UFC
Paulo Roberto Ceccarelli – PUC-BH
Regina Facchini – UNICAMP
Robert Howes – University of London – Inglaterra
Rogério Diniz Junqueira – INEP
Sérgio Carrara – UERJ
Sonia Correa – ABIA
Steven Butterman – University of Miami – EUA
Severino João Albuquerque - University of Wisconsin – EUA
Tânia Navarro-Swain – UNB
Toni Reis – ABGLT
Wilton Garcia Sobrinho – UBC
REVISÃO
Júlia Ribeiro Fagundes 
Oscar Maurício Gómez Gómez (para o Espanhol)
 
PROJETO GRÁFICO
Janilson Torres 
CAPA
Janilson Torres (a partir da obra anônima "Master of the jardin de vertueuse 
consolation” - 1470-1475 d.c. - , na qual Bagoas é retratado, intercedendo 
por Nabarzanes, diante de Alexandre Magno. Visualize o original).
EDITORIAL
ARTIGOS
A inversão sexual entre os Azande
E. E. Evans-Pritchard
Ser Queer
Paul Goodman
A homossexualidade perante a lei na França: 
do pós-guerra à “liberação gay”
Geoffroy Huard de La Marre
Identidades, cuerpos y educación sexual: 
una lectura queer
Germán S. M. Torres
Para uma análise sobre a incorporação de disposições 
normativas de prescrição dos corpos 
na contemporaneidade
Juliana Perucchi
Sexual inversion among the Azande
Being Queer
The homosexuality in front of the law in France: 
from postwar to “Gay Liberation”
Identities, bodies and sex education: 
a queer approach
Towards an analysis of the incorporation 
of body-regulating dispositions 
in contemporary times.
13
sumário
15
31
43
63
81
9
99
123
173
199
147
Para além de um kit anti-homofobia: políticas públicas 
de educação para a população LGBT no Brasil
Luiz Mello
Fátima Freitas
Cláudio Pedrosa
Walderes Brito
O caso Geisy Arruda: representações midiáticas 
brasileiras sobre violências contra mulheres
Rayani Mariano dos Santos
Patrícia Rosalba Salvador Moura Costa
Giovanna Lícia Rocha Triñanes
Miriam Pillar Grossi
Para se pensar sobre a experiência transexual na escola: 
algumas cenas
Dayana Brunetto Carlin dos Santos
Da finada à europeia: experiências de ser, 
não permanecer e estar travesti na adolescência
Tiago Duque
A construção da homossexualidade no curso da vida a 
partir da lembrança de gays velhos
Murilo Peixoto da Mota
Beyond an anti-homofobic kit: public policies on 
education for the LGBT population in Brazil
The Geisy Arruda case: Brazilian media representations 
of violence against women
To think about the transsexual experience in education: 
some scenes
From the deceased to the "Europeans": experiences of 
being, not continuing, and temporarily becoming a 
transvestite in adolescence
The construction of homosexuality during life 
time before recollections of old gay men
223
253
281
309
351
331
Sexualidade e política: 
uma abordagem a partir do mercado e do consumo
Isadora Lins França
A homossexualidade no Brasil no século XIX
Adailson Moreira
De vigilias y sueños: 
los dibujos eróticos de Helga Montalván
Francisco Zaragoza Zaldívar
Uma cultura dos contatos: sexualidades 
e erotismo em duas obras de Gilberto Freyre
Thiago Barcelos Soliva
Rompendo com a binaridade masculino e 
feminino nas canções buarqueanas: 
um estudo de Folhetim e Tango de Nancy
Roberto Gabriel Guilherme de Lima
RESENHA
CONFIANÇA E MEDO NA CIDADE
ZYGMUNT BAUMAN
Por Daniel Gonçalves de Menezes
NORMAS
Sexuality and politics: 
an approach related to market and consumption
Homosexuality in the Nineteenth Century
Vigils and dreams: 
the erotic drawings of Helga Montalván
A culture of contacts: sexualities and 
eroticism in two works of Gilberto Freyre
Breaking with the binarism masculine/feminine in 
the Chico Buarque's songs: 
a study of the “Folhetim” and “Tango de Nancy”
357
349
QUANTOS ARTISTAS PERDEREMOS MAIS?
Este ano, a mídia noticiou caso de menino de 12 anos que se 
matou, em Vitória, vítima de bullying homofóbico na escola. Descrito 
como criança “alegre e sonhadora”, Roliver de Jesus teria sido 
continuamente vítima de agressões nas quais era chamado de “bicha”, 
“gay” etc. Véspera de carnaval, escreveu carta anunciando seu 
suicídio e enforca-se. Uma colega de Roliver declarou: “ele dizia que 
queria ser um grande artista”.
Fatos assim não são raros no Brasil e em outros países. Para 
muitas crianças e jovens, a escola tem sido o lugar para o aprendizado 
do olhar do preconceito, do estigma e da injúria, seja para praticá-los 
contra outros, seja para suportar a violência de que se é vítima. Esse 
aprendizado muitas vezes ocorre simultaneamente com a 
aprendizagem da própria língua. Aprende-se muito cedo que se pode 
maltratar alguém com palavras e outros aprendem a carregarpor 
muito tempo (ou para sempre) as sequelas de insultos que funcionam 
como espécie de interdito à existência. Designados logo cedo por 
palavras como “bicha”, “veado”, “mulherzinha”, “sapatão”, meninos e 
meninas, confusos com os sentidos desses termos, vão tendo seus 
destinos sociais traçados, quando ainda eles pouco ou nada sabem de 
si. Destinos que podem variar muito: sorte quando são belos! Outros 
destinos atam alguns sobreviventes ao signo de sua vulnerabilidade 
psicológica e social produzida pelo estigma. 
A pergunta que cabe fazer é: por que razão o governo federal 
brasileiro deixou de implantar o programa Escola sem Homofobia, 
sendo o bullying homofóbico na escola tão corriqueiro e de efeitos tão 
perversos? Pergunta especial caberia à Presidente da República, 
Dilma Rousseff, que vetou o kit educativo contra a homofobia proposto 
pelo MEC: quantas crianças como Roliver de Jesus, com sonhos de 
serem artistas, poetas, escritores, filósofos, cientistas, médicos, 
arquitetos, juízes etc., perderemos mais, por suicídio ou assassinato, 
sem que nossos governantes promovam políticas educativas de 
combate à homofobia? O que mais governantes e gestores públicos 
esperam para se decidirem por corajosas políticas de enfrentamento às 
crueldades praticadas contras gays, lésbicas e transexuais na 
sociedade brasileira?
9
editorial
10
Como produto de uma educação social generalizada nas 
famílias e reforçada nas escolas e pelas mídias, a homofobia somente 
pode ser combatida por meio de uma contraeducação à educação 
homofóbica. Contraeducação crítica à ideologia da heterossexualidade 
como única via normal da sexualidade, estigmatizante da 
homossexualidade como anormalidade, disfunção sexual, desvio 
moral. Essa contraeducação não pretende ser “propaganda da 
homossexualidade” (como equivocadamente a Presidente da 
República falou à nação), mas crítica ao preconceito homofóbico e 
relativização de instituições históricas como a cultura da 
heterossexualidade, que, negando-se como invenção histórica, impõe-
se como um fato natural. Aliás, se o assunto for propaganda, que dizer 
da heterossexualização da esfera pública por meio de outdoors, 
novelas, publicidades, canções, como uma espécie de reiteração 
social obsessiva da heterossexualidade como norma? 
Para aqueles que vivem o massacre do preconceito e da 
discriminação, decisões são esperadas dos governantes, em todos os 
níveis, que sejam portadoras da esperança que teremos uma 
sociedade sem homofobia amanhã. De governos que se apresentam 
como comprometidos com transformações, não se pode aceitar que 
permitam a chantagem política, de natureza religiosa ou outra, em 
nome da governabilidade, admitindo que atrocidades continuem a 
acontecer contra aqueles que o preconceito pretende isolar como uma 
maldita espécie sexual à parte. O Brasil não necessita apenas de 
desenvolvimento econômico, mas também de desenvolvimento 
cultural, intelectual, moral. Não o terá se continuar conservador e 
homofóbico.
_______________________________
Na organização deste número, por colaboração dos autores 
que nos enviaram seus artigos e pelo trabalho de nossos consultores, 
conseguimos conjugar reflexões teóricas e metodológicas sobre as 
questões da homossexualidade, travestilidade e gênero nas suas 
diversas interfaces com outras questões sociais. Reunindo na mesma 
edição textos clássicos e textos que tratam de questões da atualidade 
brasileira e mundial, oferecemos às leitoras e aos leitores reflexões 
críticas sobre temas que constituem o foco da revista. 
Menção especial cabe fazer às traduções de Evans-Pritchard e 
Paul Goodman: a primeira, realizada por Felipe Bruno Martins 
11
Fernandes e Dennis Wayne Werner, oferece a leitura em português de 
texto do antropólogo britânico que está entre os principais expoentes 
da fundação e desenvolvimento da antropologia; seu texto sobre a 
homossexualidade entre os Azande, como esclarecem os tradutores, 
“é citado como fundador de um subcampo da etnologia comprometido 
com os estudos de sociedades não homofóbicas”. A tradução 
publicada nesta edição tem a permissão da American Anthropological 
Association. O segundo, a tradução de Paul Goodman, é colaboração 
entusiasmada do tradutor Chico Guedes, que fez chegar a Bagoas texto 
do escritor estadunidense, um ensaio de 1969, pioneiro no uso 
político do termo queer antes que se convertesse, em resposta à 
homofobia, numa categoria acadêmica e do ativismo.
A partir desta edição, a Bagoas estará disponível também no 
Portal de Periódicos da UFRN http://www.periodicos.ufrn.br/ojs, em 
continuidade ao princípio de ampliação do acesso ao conhecimento 
produzido nas universidades. Continuamos com o site 
http://www.cchla.ufrn.br/bagoas e com a versão impressa da revista, 
disponível à venda em livrarias e pelo nosso site. 
Que nossa alegria com a edição de mais um número da 
Bagoas seja também a alegria de nossas leitoras e leitores!
Alípio de Sousa Filho
Editor
12
Artigos
1
2E. E. Evans-Pritchard
Antropólogo, Universidade de Oxford
Tradução: Felipe Bruno Martins Fernandes
Bolsista da Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal 
de Nível Superior e do Comitê Francês de Avaliação da Cooperação 
Universitária e Científica com o Brasil (CAPES/COFECUB)
EHESS/Toulouse)
complex.lipe@gmail.com
Revisão: Dennis Wayne Werner
Professor da Universidade Federal de Santa Catarina (UFSC)
Doutor em Antropologia pela City University de Nova York (CUNY)
dennisww@redel.com.br
École des Hautes Études en Sciences Sociales (
1Inversão sexual entre os Azande
Sexual inversion among the Azande
16
Resumo
A relação homossexual masculina e feminina parece ter sido comum entre os Azande em 
tempos passados. Entre homens, essa relação era aprovada nas companhias militares 
de homens solteiros. Entre mulheres, a relação era descrita como frequente nas práticas 
em casas poligâmicas, apesar de altamente desaprovada.
Palavras-chave: Sudão – região sul. Azande. Inversão sexual. 
Abstract
Male and female homosexual relationship seems to have been common among the 
Azande in past times. Between males it was approved of in the bachelor military 
companies. Between females it is said to have been a frequent, though highly 
disapproved of, practice in polygamous homes.
Keywords: Sudan – southern. Azande. Sexual inversion.
1 Publicação original: EVANS-PRITCHARD, E. E. Sexual Inversion among the Azande. American Anthropologist, 
New Series, v. 72, n. 6, p. 1428-1434, dec. 1970. Texto reproduzido com a permissão da American 
Anthropological Association (AAA).
2 Sir Edward Evan (E. E.) Evans-Pritchard nasceu na cidade de Crowborough/Inglaterra, em 21 de setembro de 
1902, e morreu no mesmo país em 11 de setembro de 1973, na cidade de Oxford, poucos anos após ter recebido 
a honraria de cavaleiro, em 1971 (para conhecer este ritual britânico, veja LEACH, Edmund. Once a knight is 
quite enouch: como nasce um cavaleiro britânico. Mana, Rio de Janeiro, v. 6, n. 1, apr. 2000). Foi professor de 
Antropologia Social na Universidade de Oxford. Dessa geração de antropólogos, foi um dos primeiros a dar 
centralidade ao papel da experiência do pesquisador na pesquisa de campo antropológica, sendo reconhecido até 
os dias de hoje pelo racionalismo com o qual analisava sua entrada em campo. Um dos principais representantes 
da escola antropológica estrutural-funcionalista britânica, esse autor começou seu trabalho de campo dentre o 
povo Zande em 1926, defendendo sua tese de doutorado em 1927. Esse trabalho resultou no clássico Bruxaria, 
Oráculos e Magia entre os Azande (publicado em 1937). O texto que se segue é uma nota do autor sobre o 
trabalho com esse povo africano. Entretanto, essa nota foi publicada quase quarenta anos após sua escrita 
(1970) e em outro país, os Estados Unidos, no ano da primeira marcha gay em Nova York (celebrando a Rebelião 
de Stonewall, ocorrida em 1969), e quandoo tema das homossexualidades tinha finalmente sido liberado nas 
discussões acadêmicas naquele país. A tradução desse artigo surge da análise realizada por Walter L. Williams no 
verbete “Antropologia”, do Dictionnaire de l'Homophobie (TIN, Louis George. Presses Universitaires de France, 
2003). No referido verbete, Evans-Pritchard é citado como fundador de um subcampo da etnologia 
comprometido com os estudos de sociedades não homofóbicas. O texto que se segue é visto por Walter L. 
Williams como uma grande contribuição para esse empreendimento. Evans-Pritchard é também autor de 
inúmeras outras obras, dentre elas a clássica monografia intitulada “The Nuer: A Description of the Modes of 
Livelihood and Political Institutions of a Nilotic People”, publicada originalmente pela Clarendon Press/Oxford em 
1940 e traduzida para o português.
É inquestionável que a homossexualidade masculina, ou melhor, a 
relação sexual entre jovens guerreiros e rapazes, era comum em tempos pré-
europeus entre os Azande e, como assinalou Czekanowski (1924, p. 56), 
citando Junker (1892, p. 3-4), não há quaisquer razões para supor que a 
3homossexualidade foi introduzida pelos Árabes , como alguns já pensaram. 
Todos os Azande que conheci bem o bastante para discutir esses assuntos 
afirmaram que a homossexualidade feminina (lesbianismo) também era 
praticada em casas poligâmicas em tempos passados e ainda o é no presente 
(1930). Este ensaio reúne informações sobre ambas as práticas e apresenta 
traduções de alguns textos sobre o assunto, coletados entre os Azande do 
4Sudão há quarenta anos .
Antes da imposição da regra do governo europeu, havia muitas 
disputas entre os diferentes reinos (EVANS-PRITCHARD, 1957b, 1957c). 
Parte da população masculina adulta de cada reino era organizada em 
companhias militares de abakumba, “homens casados”, e aparanga, “homens 
solteiros”. Essas mesmas companhias, para além das funções militares, 
serviam na corte de várias formas, inclusive os homens das companhias eram 
chamados para trabalhar nas lavouras dos reis e dos príncipes (EVANS-
PRITCHARD, 1957a). No presente relato, não nos referiremos outra vez às 
companhias de homens casados. Fazia parte do costume das companhias de 
homens solteiros, alguns dos quais viviam em tempo integral nas cabanas do 
reino, tomarem rapazes-esposas. Isso era, sem dúvida, produzido pela 
escassez de mulheres disponíveis para o casamento nos tempos em que os 
mais ricos mantinham grandes haréns, o que só era possível para eles porque 
eram necessários muitos recursos para se obter uma esposa e esses homens 
tinham mais facilidade do que homens pobres para consegui-los. A maioria dos 
homens jovens, consequentemente, casava-se tarde, quando tinha em torno de 
trinta anos – e isso se devia ao fato de as meninas ficarem noivas (em um 
sentido legal, já casadas) bastante novas, muitas vezes, desde o nascimento. 
Dessa forma, a única maneira pela qual os jovens podiam obter satisfação com 
uma mulher era por meio do adultério. Entretanto, o adultério era uma solução 
muito perigosa para resolver o problema do jovem, em função da multa muito 
17E. E. Evans-Pritchard
n. 07 | 2012 | p. 15-30
3 N.T.: Evans-Pritchard refere-se às problemáticas dadas pelo nascente movimento homossexual na Europa, 
particularmente no final do século XIX e início do século XX, em um sentido muito semelhante àquele proposto por 
Borrillo (2010) com relação às ideias difundidas por inúmeras ideologias (nazismo, comunismo etc.), sempre se 
referindo à homossexualidade como uma prática do “outro”, remetendo assim a uma possível causa externa 
dessas práticas. Fonte: BORRILLO, Daniel. Homofobia: história e crítica de um preconceito. Belo Horizonte: 
Autêntica, 2010.
4 N.T.: Levando-se em conta que a publicação original desse texto aconteceu no ano de 1970.
alta que seu pai teria que pagar caso fosse descoberto – vinte lanças e uma 
mulher, o que significava, concretamente, o pagamento de duas mulheres ao 
marido. Algumas vezes, o marido ficava tão enfurecido que recusava a 
compensação e escolhia, em vez desta, a mutilação do ofensor, cortando suas 
orelhas, lábio superior, genitália e mãos. Assim, com o risco sendo tão alto, era 
comum aos solteiros cautelosos das companhias militares que viviam na corte, 
caso não se satisfizessem com a masturbação – prática que não era 
considerada vergonhosa, embora nenhum jovem a fizesse em público –, 
casarem-se com rapazes para, dessa forma, “satisfazerem” com eles suas 
necessidades sexuais. Um jovem de boa posição em sua companhia talvez 
pudesse ter mais de um rapaz (kumba gude). Para esses rapazes, seus 
companheiros guerreiros eram badiya ngbanga, “amantes da corte”.
Acredito que o desaparecimento total dessa instituição em tempos 
pós-europeus mostra que o reconhecimento dessa união temporária entre um 
jovem e um rapaz era decorrente das dificuldades no passado de estes se 
satisfazerem com relações heterossexuais. É verdade que as companhias 
militares também desapareceram, mas os Azande atribuem (corretamente, ao 
que acredito) o abandono do costume ao fato de o casamento para jovens ter se 
tornado mais acessível e ao desarranjo geral da moral, incluindo a supressão 
das punições habituais nos casos de adultério e fornicação. O casamento entre 
rapazes era devido, como dizem os Azande, à zanga ade, “carência de 
mulheres”. Como pontuou um homem: “qual homem preferiria um rapaz ao 
invés de uma mulher? Ele seria um tolo. O amor por rapazes surgiu pela 
carência de mulheres”. Dessa forma, os Azande falavam do casamento entre 
rapazes como um kuru pai, “costume antigo”, ainda que eu não tenha escutado 
nenhum homem falar sobre dormir com um rapaz com desagrado – na pior das 
hipóteses, consideravam o costume como algo engraçado. Mesmo na minha 
época, os Azande falavam de um homem que antes foi o rapaz-esposa de 
algum guerreiro da mesma forma como nós, na Inglaterra, falamos de alguém 
5que tinha sido o fag de alguma celebridade. Também é necessário esclarecer 
que, como na Grécia antiga, até onde podemos julgar, quando os rapazes-
esposas cresciam e quando eles e seus maridos posteriormente se casavam 
com mulheres, passavam a ter uma vida normal de casados, como qualquer 
6outro casal. Não havia os urnings que existem no sentido europeu moderno.
18
5 N.T.: Termo específico da época de publicação do artigo usado para referenciar uma espécie de “escravo” de um 
colega mais velho nas escolas particulares inglesas.
6 N.T.: Termo específico da época de publicação do artigo usado por Kraft-Ebing para homossexuais passivos 
convictos.
O costume do casamento entre rapazes desapareceu antes de minha 
primeira visita ao território Zande, o que impossibilitou a observação direta. 
Dependo, dessa forma, apenas dos relatos sobre o passado, os quais eram 
unânimes entre os homens mais velhos. Tenho usado propositadamente os 
termos “esposa”, “marido” e “casamento” porque, como os textos a seguir 
deixarão claro, se tratavam de uniões legais nos modelos de um casamento 
normal (pelo menos enquanto durassem). O guerreiro pagava o preço da noiva 
(por volta de cinco lanças ou mais) para os pais do rapaz e realizava serviços 
para eles da mesma forma que faria se tivesse casado com uma das suas filhas. 
Caso ele provasse que era um bom marido, os pais então substituiriam o filho 
por uma filha. Também, se outro homem tivesse relações com o rapaz, ele 
poderia, como me contaram, processá-lo no tribunal por adultério.
Os rapazes eram “mulheres”: “Ade nga ami”, eles diriam, “nós somos 
mulheres”. Um rapaz era chamado por seu amante como diare, “minha 
esposa”, e o rapaz o chamaria de kumbami, “meu marido”. O rapaz comeria 
fora da vista dos guerreiros da mesma forma que as mulheres não comem na 
presença de seus maridos. Os rapazes realizavam muitos dos serviços menores 
que uma mulher cumpria diariamente para seu marido, tais como a coleta de 
folhas para sualimpeza sanitária, a coleta de folhas para sua cama, a coleta de 
água, o corte de lenha, a ajuda no roçado das lavouras do pai de seu esposo e o 
fornecimento de mensagens e mantimentos cozidos de sua casa para a corte 
para complementar aqueles dados pelo príncipe, mas não cozinharia mingau 
para ele. No que diz respeito a esses serviços, o que devemos manter em mente 
é que um rapaz na corte não tinha a mãe ou as irmãs para cuidarem dele. 
Também o rapaz-esposa carregaria o escudo de seu marido quando a 
companhia estivesse em viagem. Deve ser entendido que ele realizava esses 
serviços a fim de que a relação não fosse pensada como inteiramente de 
natureza sexual, uma vez que deveria ser entendida como tendo um lado 
educacional. No que diz respeito ao lado sexual, à noite, o rapaz dormiria com 
seu amante, que manteria com ele, por entre as coxas, relações sexuais (os 
Azande demonstravam aversão à possibilidade de penetração anal). Os 
rapazes conseguiam o máximo de prazer que podiam ao friccionar seus órgãos 
na barriga ou na virilha do marido. De qualquer maneira, embora existisse esse 
lado da relação, era claro nos relatos dos Zande que também havia o conforto 
em compartilhar uma noite na cama em companhia.
A palavra “rapaz” (kumba gude) aparentemente deve ser traduzida 
livremente, pois, a partir do que escutei, os mancebos deveriam ter entre doze e 
vinte anos. Quando deixassem de ser rapazes, eles adeririam às companhias de 
19E. E. Evans-Pritchard
n. 07 | 2012 | p. 15-30
guerreiros de seus ex maridos e tomariam por sua vez rapazes como esposas; 
dessa forma, o período de casamento era também um período de aprendizado. 
Não posso apresentar números de casamentos com rapazes, entretanto, posso 
afirmar que a prática era aceita e comum. Obtive listas com séries de tais 
casamentos de vários homens mais velhos, mas seria de pouco proveito tentar 
documentar tais séries com nomes, uma vez que já se passou muito tempo (65 
anos após a morte do rei Gbudwe).
Antes de apresentar os textos, há que se declarar ainda que alguns 
membros da nobreza reinante se envolviam em relações sexuais homossexuais. 
Normalmente, eram os filhos jovens de príncipes que permaneciam na corte 
até seus pais entenderem que era a hora de dar-lhes uma esposa e distritos para 
sua administração. Eles se mantinham distantes do harém de seus pais e 
tomavam rapazes plebeus como serviçais e para seu prazer sexual. Parece que 
o príncipe, por maior número de esposas que pudesse ter, também dormia 
eventualmente com um rapaz, em vez de ficar sozinho na noite anterior de uma 
consulta ao oráculo, uma vez que a relação sexual com uma mulher era um 
7tabu nessas ocasiões . Era dito que “kumba gude na gberesa nga benge te”: 
“um rapaz não arruína o oráculo de veneno”. Fora isso, soube apenas de um 
príncipe sênior – deposto pela administração – que, apesar de ter muitas 
esposas, ainda dormia habitualmente com rapazes. Por essa e outras razões, 
ele era considerado pelos Azande como levemente louco. Ninguém deve tirar 
conclusões precipitadas, como Czekanowski fez sobre os registros de Junker a 
propósito dos rapazes que acompanhavam o príncipe Zande onde quer que ele 
fosse, pois todos os reis e príncipes são acompanhados por pajens, que eram 
tratados por seus mestres com notável indulgência, em contraste com o 
distanciamento severo com o qual seus superiores eram usualmente tratados.
Texto coletado com Kuagbiaru (EVANS-PRITCHARD, 1963a, p. 277-
280), um homem muito conhecedor da vida da corte nos tempos passados, 
que foi um rapaz-esposa e, como chefe de uma companhia de guerreiros na 
corte de Príncipe Gangura, muitas vezes foi marido de rapazes:
Antigamente os homens costumavam ter relações sexuais 
com rapazes da mesma forma que eles tinham com 
esposas. Um homem pagaria uma multa para outro caso 
20
7 N.T.: Em sua monografia clássica sobre o povo Zande, Evans-Pritchard (1978) se refere a algumas interdições 
rituais para a consulta do oráculo de veneno, entre elas, a impossibilidade de o homem adentrar a consulta após 
ter mantido relações sexuais com mulheres (p. 179), porém, não faz referência à existência de práticas sexuais 
entre homens. Já no que tange às relações sexuais entre mulheres, o autor realiza algumas discussões e salienta 
que essas práticas são comuns nos haréns dos príncipes. Fonte: EVANS-PRITCHARD, E. E. Bruxaria, oráculos e 
magia entre os Azande. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
ele tivesse tido relação sexual com seu rapaz. As pessoas 
pediam a mão de um rapaz com uma lança, da mesma 
8forma que pediam a mão de uma menina a seus pais . 
Todos os jovens guerreiros que estavam na corte, todos 
tinham seus rapazes. As cabanas dos homens jovens que 
ficavam ao redor da corte, todos os rapazes-amantes 
ficavam nestas cabanas. Eles construíam suas cabanas 
grandes e compridas e havia vários jovens em cada cabana, 
cada um em seu próprio lugar, juntamente com seu capitão. 
Seus rapazes-amantes também dormiam nas cabanas. 
Quando chegava a noite, eles acendiam o fogo em frente à 
cama dos maridos, cada um acendia um fogo em frente à 
cama do seu amante. Quando os jovens guerreiros 
começavam a ficar com muita fome na corte eles 
mandavam seus rapazes-amantes para a casa de seus pais 
[do rapaz] para buscar comida para eles. Os rapazes-
amantes iriam à casa dos pais e retornariam com 
montantes agradáveis de mingau e galinha cozida, além de 
cerveja. Os parentes do rapaz o escoltariam [quando ele era 
casado] da mesma forma que eles escoltavam uma noiva 
[no seu casamento] para seu marido com muita comida 
boa. Entretanto, os rapazes não cozinhavam eles mesmos o 
mingau para seus maridos, eles cozinhavam mandioca e 
batata-doce para seus amantes. Eram as mães [dos 
rapazes] que cozinhavam mingau em suas casas, e ótimas 
carnes. Alguns cozinhavam galinhas. Eles juntavam toda 
essa quantidade de comida e levavam para onde estavam 
seus maridos. Todos esses jovens e seus amantes; não 
havia esquecimento dos rapazes de sua tarefa de prover 
comida para seus maridos. Mas o mingau que eles serviam 
a eles, eles escondiam parte da carne no meio do mingau 
para dar aos seus maridos, porque eles eram como 
9esposas . Seus amantes não aprovavam que eles rissem 
alto como homens, eles desejavam que eles falassem 
suavemente, como falavam as mulheres.
Quando todos os jovens guerreiros iam roçar as lavouras do 
príncipe cada um levava seu amor. Quando chegassem ao 
cultivo, eles construiriam uma grande cabana para seu 
8 Um homem daria uma lança no momento de pedir a mão da menina em casamento como a primeira prestação 
do dote. No caso dos rapazes, a admissão da lança igualmente constituía um casamento legal.
9 No preparo de uma refeição para convidados, uma esposa Zande frequentemente guardava parte nos fundos 
para que seu marido pudesse, secretamente, ter uma segunda refeição quando os convidados fossem embora.
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n. 07 | 2012 | p. 15-30
capitão e colocariam uma cerca ao redor. Nesse campo, 
cheio de rapazes, sendo de outra maneira o capitão ficaria 
sozinho. Então os jovens começariam a construir pequenos 
abrigos adjacentes à cabana do capitão, o acampamento ia 
longe, atravessando riachos. Mas todos os rapazes ficavam 
no cercamento que eles haviam erguido para o capitão. 
Quando anoitecia, os rapazes se dispersavam, cada um 
para a cabana do seu amante e acendiam ali um fogo para 
ele. Cada um ia acender o fogo na cabana de seu amante. 
Na manhã seguinte eles se encontrariam no cercamento do 
capitão. Nenhum jovem poderia entrar ali sem permissão. 
O capitão dava a eles a refeição atrás do cercamento. 
Apenas se o capitão estivesse bem disposto acerca de 
algum jovem guerreiro que ele o convidaria para entrar no 
cercamento e compartilhar a refeição com ele. Todos os 
outros nunca entrariam no cercamento; eles veriam seus 
amores à noite. Os jovens roçariam a lavoura até oanoitecer e então eles retornariam para o local de dormir. 
Os amores já teriam preparado a cama dos maridos e 
acendido o fogo para eles na cabana. 
Texto coletado com Ganga (EVANS-PRITCHARD, 1962, p. 16-17), 
um dos capitães das companhias de guerreiros do rei Gbudwe: 
Isso é sobre como homens se casavam com rapazes 
quando o rei Gbudwe era senhor de seus domínios. 
Naqueles dias, se um homem tivesse relações com a 
esposa de outro homem, o marido mataria ele ou cortaria 
suas mãos e genitais. Então por essa razão um homem 
costumava casar com um rapaz para ter orgasmo entre 
suas coxas, o que acalmaria seu desejo por mulheres. Se 
um rapaz era uma boa esposa para seu marido, cinco 
lanças seriam pagas por ele, e por outro, até dez lanças. 
Um marido que fosse generoso com seus sogros, eles lhe 
dariam depois uma mulher; dizendo que se ele era bom 
para um rapaz, seria melhor ainda para uma mulher. Se ele 
se casasse com uma mulher seus sogros se beneficiariam 
muito. Este seu menino, ele não toleraria ver outro homem 
perto; eles brigariam, e se levassem o caso diante do [rei] 
Gbudwe, Gbudwe disse ao homem que foi atrás do rapaz 
do outro que ele deveria pagar ao homem lanças [em 
compensação], uma vez que ele tinha ido atrás do rapaz do 
outro. Também existiam homens que, apesar de terem 
[mulheres] esposas, ainda assim se casavam com rapazes. 
22
Quando a guerra eclodiu, eles levaram seus rapazes com 
10eles , mas eles não levavam seus rapazes para o lugar da 
batalha; os rapazes ficavam atrás no campo, porque eles 
eram mulheres; e eles coletavam lenha para o marido e 
depenavam as folhas nzawa [para limpeza sanitária] e 
cozinhavam as refeições para quando seus maridos 
retornavam da batalha. Eles faziam para os maridos tudo o 
que uma esposa faz para seu marido. Eles buscavam água 
e a apresentavam para o marido de joelhos e eles pegavam 
a comida e levavam para eles, e o marido então lavaria as 
mãos e comeria a refeição e contaria para seu rapaz-esposa 
o que acontecera no campo de batalha.
Até agora alguma coisa já foi dita sobre a homossexualidade masculina. 
E sobre o lesbianismo? Este também deve ser considerado como um produto, 
assim como a homossexualidade masculina, da poligamia em larga escala. Se a 
poligamia em larga escala excluía jovens homens do sexo normal, aquela 
condição de casas poligâmicas também impedia que as esposas, ou algumas 
delas, recebessem a quantidade de atenção sexual que elas desejavam de seu 
marido comum, que poderia muito bem ser um homem velho sem o vigor sexual 
da sua juventude. Apesar de os homens terem hábitos ligeiramente diferentes, 
pode-se dizer comumente que uma mulher que é uma de três esposas não 
dormiria com seu marido mais do que dez noites por mês, uma de seis esposas 
não dormiria com seu marido mais do que cinco noites por mês e assim por 
diante. Uma de muitas esposas de um príncipe ou de um plebeu importante no 
passado talvez não compartilhe a cama do marido com ele há mais de um mês 
ou dois. No caso de uma das dúzias, às vezes centenas, de esposas de um rei, 
ela poderia ficar totalmente privada de uma vida sexual normal para uma mulher 
de um lar comum. Relações sexuais adúlteras eram muito difíceis para as 
esposas de tais famílias poligâmicas tão extensas, pois estas eram mantidas em 
reclusão e cuidadosamente vigiadas; a morte na descoberta, ou até mesmo na 
suspeita, seria a pena para ambos, a esposa e seu amante.
Era nessas famílias poligâmicas, como dizem os Azande, que o 
lesbianismo era praticado. Obviamente, não tive a possibilidade de saber disso 
através da observação, dessa forma somente posso dizer o que me foi contado 
(exclusivamente por homens, embora as mulheres admitissem que algumas 
praticavam o lesbianismo). As esposas esculpiriam uma batata-doce ou raiz de 
mandioca no formato de um órgão masculino, ou usariam uma banana para o 
10 Relações sexuais com mulheres eram um tabu para os guerreiros em momentos de batalha.
23E. E. Evans-Pritchard
n. 07 | 2012 | p. 15-30
propósito. Duas delas iriam então se trancar em uma cabana e uma delas se 
deitaria na cama e assumiria o papel feminino, ao mesmo tempo em que a 
outra, com o órgão artificial amarrado ao redor de sua abdômen, assumiria o 
papel masculino; então, elas inverteriam os papéis.
As mulheres eram certamente desprivilegiadas na antiga sociedade 
Zande e uma indicação adicional da dominação masculina é que o que era 
encorajado aos homens era condenado entre as mulheres. Homens Zande, 
especialmente os príncipes, têm horror ao lesbianismo e o considera como 
altamente perigoso, sendo mais ou menos equivalente ao adandara, um tipo de 
11parto em que as mulheres dão à luz gatos , como se acredita (EVANS-
PRITCHARD, 1937, p. 51-56). Seria fatal se um homem visse uma dessas 
mulheres amamentando seus gatos. Escutei falar que alguns dos mais notáveis 
reis do passado – Bazingbi, Gbduwe, Wando e outros – morreram por causa das 
práticas lésbicas entre suas esposas. É inclusive alegado que na casa de 
Gbduwe uma de suas esposas mais antigas, Nanduru, uma velha senhora 
grisalha nos meus dias, executou muitas de suas coesposas devido a essa 
ofensa. Alguns Azande me disseram que o lesbianismo era muito praticado 
pelas filhas e irmãs da nobreza reinante, em cujas casas elas viviam relações 
incestuosas. O nobre reinante pode dar uma menina escrava a uma de suas 
filhas, que a ungiria e pintaria para que a escrava se tornasse atrativa e então se 
deitaria com ela. Além disso, os Azande falam que uma vez uma mulher 
comece a ter relações sexuais homossexuais ela provavelmente continua a 
mantê-las, porque ela então passa a ser senhora de si e pode buscar 
gratificação quando quer, e não apenas quando um homem resolve lhe 
gratificar, podendo a gratificação durar o tempo que ela desejar.
Pareceria, se as afirmações Zande estão corretas, que a relação lésbica 
é produzida em primeira instância por um ritual simples. Quando duas 
mulheres são muito amigas, elas podem solicitar a formalização da amizade 
24
11 N.T.: No apêndice III, intitulado “Outros agentes nefastos associados à bruxaria” (p. 293-298), Evans-Pritchard 
(1978) descreve outros agentes que podem ser considerados bruxos ou detentores das ações de bruxaria, entre 
eles alguns animais. Andandara, uma espécie de gato selvagem, é a mais temível das criaturas malignas 
classificadas como bruxas. Até mesmo sua possível aparição é temida pelos Azande, já que apenas olhar para 
esse gato pode causar a morte. Dessa forma, o gato macho tem relações sexuais com humanas que, a partir disso, 
ficam grávidas de outros gatos. Após a relação sexual com o gato, a mulher mantém relações com seu marido e 
fica grávida de crianças e gatos. No dia anterior ao parto, ela vai ao mato, com uma especialista, dá à luz o gato 
(que fica guardado em sua casa) e, no dia seguinte, a criança, sendo que ninguém fica sabendo do primeiro parto. 
Os Azande, segundo o autor, se referem ao lesbianismo como andandara, pois ambas são ações femininas que 
podem causar a morte de qualquer homem que testemunhe. Assim, o lesbianismo é considerado agourento pelo 
povo Zande e suas consequências são nefastas, não o ato. Evans-Prithcard (1978) relaciona esse mal provocado 
por andandara (lesbianismo e gato) com os malefícios das funções sexuais femininas. Fonte: EVANS-
PRITCHARD, E. E. Bruxaria, oráculos e magia entre os Azande. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
através de uma cerimônia intitulada bagbaru, tendo conseguido a permissão de 
seus maridos para fazê-la. Um marido sente dificuldade de negar o 
consentimento, uma vez que essa formalização, normalmente, não significa o 
envolvimento de um elemento sexual. Uma das mulheres faz um pequeno 
presente para a outra, a outra então faz um presente de retorno. Elas então 
dividem um sabugo de milho e cada uma planta as sementes da sua parte do 
12sabugo em seu jardim . Algum tempo depois, as mulheresexecutam várias 
tarefas mútuas e vão, de tempos em tempos, trocar alguns presentes. 
Entretanto, mesmo que um esposo consinta com a amizade, ele o faz 
geralmente com relutância, porque os homens Zande pensam que essa ligação 
de amizade entre mulheres pode claramente se configurar como um disfarce 
para intimidades homossexuais.
Texto coletado com Kuagbiaru (EVANS-PRITCHARD, 1963b, p. 13-14):
Entre os Azande muitas mulheres fazem o mesmo que 
homens. Muitas delas têm relações sexuais entre elas da 
mesma forma que um esposo faria. O lesbianismo começou 
com um milho cujo nome é kaima, um milho cuja espiga é 
vermelha como o sangue. Elas pegam essa espiga e 
proferem um feitiço sobre ela, da mesma forma que os 
homens proferem um feitiço sobre o sangue ao fazerem a 
13irmandade de sangue , e quando isso é feito uma delas 
[dentre as duas mulheres] tem que segurar no topo da 
espiga e a outra segura na base da espiga que é sua parte e 
elas então quebram a espiga entre elas. Depois disso, elas 
não devem chamar uma a outra pelo seus nomes próprios, 
mas sim chamar uma a outra de bagburu. Aquela que é a 
esposa deve cozinhar o mingau e um frango e levá-los para 
aquela que é o esposo. Elas fazem isso entre elas várias 
vezes. Elas têm relações sexuais entre elas com batatas-
doces esculpidas no formato de um pênis circuncidado e 
também o fazem com mandiocas esculpidas e também 
com bananas. No topo é como se fosse um órgão 
masculino. O esposo não gosta que sua mulher fique de 
conversa com outras mulheres. Ela bate em sua esposa da 
mesma forma que um esposo bate em uma esposa no caso 
12 O ritual corresponde à troca de sangue entre homens. Sugiro que o ritual feminino é uma cópia do uso do sabugo 
de milho vermelho-sangue (EVANS-PRITCHARD, 1933).
13 N.T.: Segundo Evans-Pritchard (1978), irmãos de sangue são indivíduos não aparentados que estabelecem 
uma aliança especial por um pacto em que o sangue é o símbolo. Opõe-se em inúmeros aspectos à relação entre 
irmãos consanguíneos. Fonte: EVANS-PRITCHARD, E. E. Bruxaria, oráculos e magia entre os Azande. Rio de 
Janeiro: Zahar, 1978.
25E. E. Evans-Pritchard
n. 07 | 2012 | p. 15-30
de mau comportamento, como no caso de sair com um 
homem. Entretanto, quando Gdbuwe era vivo, ele era 
muito contrário a qualquer coisa que tivesse a ver com 
lesbianismo.
Texto coletado com Kisanga (EVANS-PRITCHARD), um homem com 
amplo conhecimento dos costumes Zande:
As mulheres se encontram e uma diz para a outra, “Oh, 
minha amiga, você, por que não gosta de mim, amor!”. A 
outra responde, “Oh, Senhora, minha amante, por que eu 
deveria te querer mal?”. A primeira fala, “Senhora, venha 
depois de amanhã que eu tenho uma pequena coisa pra lhe 
dizer”. Ela replica, “oh, Senhora, o que é isto que você não 
me fala agora? A menos que você me diga agora não 
poderei sobreviver a noite esperando para saber!”. Então 
uma fala para a outra, “Senhora, estou profundamente 
apaixonada por você. Oh senhora, como deveremos 
gerenciar esse horrível esposo?” 
“Hm! Oh, Senhora, será que eles mantêm essa guarda toda 
sobre uma mulher!”. 
“Ahe, Senhora, vamos bolar uma artimanha. Você vem 
depois do meu esposo e nós faremos um pacto de amizade 
amorosa (bagburu) entre nós e ele pensará que é só uma 
amizade entre mulheres, e assim Senhora você poderá me 
dar prazer”. Ela acrescenta, “Amanhã cedo você venha com 
um pequeno presente para ele”.
Na manhã, bem cedinho, ela pega um presente, como uma 
lança, e vem visitar o esposo em sua casa. Ela fala para o 
esposo:
“Então, você escutará com atenção o que eu venho lhe 
dizer?”.
“Senhora, diga o que a Senhora veio fazer em minha casa”.
“Eh, Senhor, é sobre minha amiga, mestre. Eu disse a mim 
mesma, Senhor, que eu viria perguntar ao príncipe sobre 
ela. Eu não sou um homem que poderia lhe enganar com 
uma mulher”.
Ele então diz, “Eh, Senhora, pode ser que eu consinta”.
“Oh, Senhor, por sua cabeça! Oh, Senhor, por sua cabeça! 
Permita que eu tenha a mulher, Senhor. Eu vou moer 
farinha para ela, e se ela estiver doente eu vou apanhar 
lenha para ela”.
26
14“Primeiro eu preciso consultar os oráculos, Senhora . 
Penso que devo primeiro consultar os oráculos”.
“Eh, Senhor, está recusando a sua mulher? Será que ela é 
um homem?”.
“Tudo bem, Senhora, você deixa a lança e vai para sua casa 
que eu pensarei no assunto”.
Ela esfrega o solo diante dele [agradece a ele] dizendo, “Oh, 
meu mestre, eu vou sozinha entre as pessoas, Senhor!”. 
Então ela vai para casa. Ela dorme duas noites e então ela 
mói farinha e ela retorna com farinha e mingau. Quando ela 
aparece no caminho sua amante corre ao seu encontro:
“Oh, meu amor, Oh, minha amiga, Oh, Senhora você não 
veio hoje?”. Ela coloca a farinha e o mingau ao lado no 
terreiro. Ela pega um banquinho e coloca para ela se sentar. 
O esposo fala amuado:
“Você veio, minha amiga?”.
“Sim, Senhor”.
“Senhora, me deixe em paz estou sentindo frio hoje”.
Elas pegam a comida dele e a trazem. Ele está embaraçado. 
“Menina, derrame água sobre minhas mãos”. Sua esposa 
pega água e derrama sobre suas mãos. Ele diz, “Senhora, 
isso é bom, senhora, isso é bom”. Ele tira um monte de 
mingau. Ele se emburra e continua emburrado, dizendo 
para suas filhas, “agora então peguem e levem para as 
crianças”.
“Ahe, Senhor! Uma pessoa traz sua comida e um homem 
não está bem – essa comida não deve ser dada para 
outrem, não deveria esta comida ser guardada para que ele 
a coma em outro momento?”.
“Hm! Eh, mulher, como uma pessoa pode argumentar com 
um pai dessa maneira!”. Elas o enganam. “Oh não, Senhor, 
eu não estou discordando nada, Senhor”.
14 N.T.: Evans-Pritchard (1978) argumenta que a explicação dos infortúnios entre os Azande se dá em torno da 
noção de bruxaria, que se transforma em uma causa indireta para relatar determinadas dificuldades cotidianas. 
Dessa forma, a consulta a oráculos é uma ação rotineira na cultura Azande, sendo o oráculo de veneno um dos 
principais e mais certeiros, responsável pelas acusações de bruxaria. São os oráculos que fornecem elementos 
para a interpretação dos indivíduos quanto aos possíveis malfeitores (bruxos) de seus infortúnios. Evans-
Pritchard (1978) coloca ainda que os oráculos são meios para impor comportamentos (p. 76), bem como que a 
função de bruxaria envolve juízos morais (p. 88). Fonte: EVANS-PRITCHARD, E. E. Bruxaria, oráculos e magia 
entre os Azande. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
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28
“Senhora, eu não estou me sentindo bem hoje, hoje não é 
um bom dia para mim. Devo retirar-me”. 
“Ele! Espia só, que esposo desagradável esse meu, 
Senhora, que personagem antipático!”. 
A esposa coloca água diante de sua amante da mesma 
forma que ela faria se fosse seu [homem] marido. Ela tem 
seu pênis em sua bolsa – ela leva o pênis com ela onde quer 
que ela vá. Elas esculpem uma batata-doce na forma de um 
pênis circuncidado. A mulher-esposo faz um furo ao longo 
da batata-doce e então amarra a batata-doce com corda em 
seu lombo para que ela fique como um homem. Ela se lava 
com água e unge a si mesma com óleo.
Enquanto isso o esposo está comendo sua refeição na 
cabana de sua esposa mais velha. Ele diz a ela, “Oh, 
Senhora, como você já está comigo há tanto tempo e você 
nunca me fez sofrer. Minha esposa, isto que eu estou 
vendo, você vê também?”.
“Não, Senhor, mas tenho uma ideia sobre isso. Não estou 
certa das coisas, Senhor! Eh, Senhor, como você é um 
homem, em um caso como este, porque você não escuta o 
que ela tem a dizer para satisfazer a sua mente?”.
Ele tosse: “tudo bem, essa minha morte de que elas estão 
falando, vou até o fim”.
As duas mulheres se levantam para se deitarem no chão, 
porque na cama seus movimentos fazem muito barulho. A 
esposa do homem diz: “Aquele meu esposo desagradável, é 
capaz de ele tentar armar uma cilada para pegar as pessoas 
na cabana!”.
“Se ele o fizer elevai morrer se ele vir isso. Madame, não se 
fatigue pensando sobre assuntos de mulher, você verá o 
que acontece”.
“Deixe-nos fazer o que estamos prestes a fazer. Somente 
pare de falar do meu esposo”. Ela faz com que ela fique 
quieta ao apertar sua cabeça sobre ela enquanto ela obtém 
o prazer de seu amor. O esposo chega e se inclina sobre o 
alpendre e ele escuta os sons delas dentro da cabana, ele 
escuta o movimento dentro da cabana, como dizem “Oh, 
meu irmão, Oh, minha querida, Oh, meu esposo, Oh, 
Senhora”. Ele entra na cabana e quando elas o veem elas se 
levantam do chão. Ele agarra sua esposa e fala (para a 
outra mulher):
“Oh, minha amiga, você me matou. Pensei que você tivesse 
vindo em minha casa com boas intenções, mas pelo que 
vejo é minha morte que você traz”.
Então ele chama sua esposa mais velha:
“Amante, venha ver o mal que me atingiu – esta mulher, eu 
a peguei junto com sua companheira...”.
“Heyo! Meu esposo! Você me chama para ver uma relação 
de mulheres – suas esposas podem ser muito maliciosas, 
Senhor”.
“Eh, mulher, nós dividimos uma casa com você em 
conversa-dupla (sanza). Então vocês estão todas 
mobilizadas pelo desejo de minha morte!”.
“Opa! Sai fora e não fale comigo – é a minha culpa que você 
tenha caminhado e entrado na cabana?”.
Talvez deva incluir na conclusão desta nota que não estou sugerindo de 
forma alguma que a pederastia e o tribadismo são explicados pelas condições 
sociais, como essas obtidas com os Azande. Evidentemente, não o são. O que é 
certamente explicado, dada a plasticidade libidinosa, são as formas 
institucionais prevalentes na sociedade Zande e as atitudes (masculinas) 
direcionadas a elas.
29E. E. Evans-Pritchard
n. 07 | 2012 | p. 15-30
30
Referências
BORRILLO, Daniel. Homofobia: história e crítica de um preconceito. Belo Horizonte: 
Autêntica, 2010.
CZEKANOWSKI, Jan. Forschungen im Nil-Kongo Zwischengebiet. Leipzig: Klinkhardt & 
Biermann, 1924. v. 2.
EVANS-PRITCHARD, E. E. Some Zande texts. Kush, 11, 1963a.
______. The Zande royal court. Zaire, v. 5, p. 495-511, 1957a.
______. Vernacuar text: manuscript. Oxford: Institute of Social Anthropology, [s.d.]. 
(Zande text collection).
______. Witchcraft, oracles and magic among the Azande. Oxford: Clarendon Press, 
1937. 
______. Bruxaria, oráculos e magia entre os Azande. Rio de Janeiro: Zahar, 1978.
______. Zande blood-brotherhood. Africa, v. 6, p. 369-401, 1933.
______. Zande border raids. Africa, v. 28, p. 217-232, 1957b.
______. Zande texts: part 1. Oxford: Oxonian Press, 1962.
______. Zande texts: part 3. [s.l.]: [s.n.], 1963b. p. 1-43.
______. Zande warfare. Anthropos, v. 52, p. 239-262, 1957c.
JUNKER, Wilhelm. Travels in Africa. London: Chapman and Hall, 1892.
2
1Ser queer
Being queer
 Paul Goodman
2 Sociólogo, poeta e escritor estadunidense
Tradução: Chico Moreira Guedes
Bacharel em Letras pela UFRJ, professor de inglês, 
estudioso de idiomas e tradutor
fdguedes@gmail.com
32
Resumo
Paul Goodman faz um balanço de como a homossexualidade afetou a sua vida pessoal e 
profissional e as suas relações com o mundo acadêmico, intelectual e literário da sua 
época. Reflete também sobre as implicações políticas, sociais e afetivas de uma 
atividade homossexual intensa e promíscua, ou da sua repressão, nos Estados Unidos 
da metade do século XX.
Palavras-chave: Queer. Nigger. Homossexualidade. Liberdade. Preconceito. Repressão. 
Universidade. Literature. Pacifismo. 
Abstract 
Paul Goodman gives an account of how homosexuality affected his personal and 
professional life and his relationship with the academic, intellectual and literary world of 
his time. He also reflects on the political, social and emotional implications of an 
thintensive and promiscuous homosexual life in mid-20 Century USA.
Key-words: Queer. Nigger. Homosexuality. Freedom. Prejudice. Repression. University. 
Literature. Pacifism.
1 Escrito e publicado pela primeira vez em 1969, três anos antes da morte do autor, por encomenda da revista 
WIN, órgão de imprensa da organização pacifista War Resisters League, para uma edição dedicada ao tema da 
homossexualidade. A tradução aqui publicada foi fruto de uma solicitação feita a Chico Guedes por Jonathan Lee, 
produtor e diretor do documentário Paul Goodman Changed My Life, lançado nos EUA em outubro de 2011.
2 Paul Goodman nasceu na Cidade de Nova York em 09 de setembro de 1911 e morreu em 02 de agosto de 1972 
em uma propriedade rural no estado de New Hampshire. Sociólogo, poeta, escritor, crítico literário, e intelectual 
militante, Goodman é principalmente lembrado como o autor de Growing Up Absurd, best-seller sobre educação 
e delinquência juvenil, publicado em 1960, e como ativista pacifista, líder da nova esquerda norte-americana na 
década de 1960. Inspirador do movimento de jovens contra a Guerra do Vietnã, Goodman escreveu também 
sobre planejamento urbano e modelos para vida em comunidade, além de ter sido cofundador da Terapia Gestalt 
nas décadas de 1940 e 1950. A liberdade e naturalidade com que Goodman, que era casado e pai de três filhos, 
tratava publicamente – em escritos e nas suas falas públicas – da sua vida homossexual intensa tornou-se um dos 
mais importantes pontos de partida para a emergência do movimento de liberação gay nos anos 1970. 
Em maneiras essenciais, minhas necessidades homossexuais me 
3tornaram um nigger . No sentido mais óbvio, tenho sido submetido, é claro, à 
brutalidade arbitrária de cidadãos e da polícia; mas, fora ter sido derrubado 
uma vez ou outra, me livrei sem grandes problemas nesses casos. Tenho um 
bom faro para confusão incipiente e costumava ter pés ligeiros. O que me torna 
um nigger é que não se pressupõe que meu impulso para abordar alguém seja 
um direito meu. Então fico com a sensação de que essa não é minha rua.
Não reclamo de minhas cantadas não serem aceitas; ninguém pode 
reivindicar ser amado (exceto crianças pequenas). Contudo, eu sou 
menosprezado pelo fato em si de dar cantadas, por ser eu mesmo. Ninguém 
gosta de ser rejeitado, mas há uma maneira de rejeitar uma pessoa que lhe 
concede o direito de existir, que só fica abaixo de sermos aceitos. Eu raramente 
desfrutei desse tratamento.
Allen Ginsberg e eu uma vez chamamos a atenção de Stokely 
Charmichael para o fato de sermos niggers, mas ele nos desconsiderou sem 
pestanejar, dizendo que nós poderíamos sempre esconder nossa disposição e 
passar despercebidos. Ou seja, ele nos concedeu a mesma falta de imaginação 
que normalmente se concede aos negros; para ele, nós não existíamos 
verdadeiramente. É interessante que esse diálogo tenha se passado na TV 
nacional britânica, esse bastião do sigilo. Mais recentemente, desde a 
formação do Gay Liberation Front, Huey Newton, dos Black Panthers, deu 
boas-vindas aos homossexuais à revolução, por serem igualmente oprimidos.
4Em geral, na América, ser um nigger queer não é econômica e 
profissionalmente uma desvantagem tão grande quanto ser um nigger negro, a 
não ser em algumas áreas como o serviço público, em que há medo e 
dissimulação consideráveis (em regimes mais puritanos, como a Cuba de hoje, 
ser queer é um mau negócio profissional e civilmente. Regimes totalitários, 
sejam comunistas, sejam fascistas, parecem ser intrinsecamente puritanos). 
Porém, minha experiência pessoal tem sido bem mista. Já fui despedido três 
vezes por causa do meu comportamento queer ou por reivindicar meu direito a 
33Paul Goodman
n. 07 | 2012 | p. 32-41
3 N.T.: A decisão de manter nigger do original em inglês decorre da impossibilidade de traduzir fielmente a carga 
fortemente pejorativa e racista que o termo carrega historicamente na cultura estadunidense. Nego, negão, 
crioulo ou termos assemelhados, aparentes soluções, não dão conta da força negativa que nigger adquiriu no 
contexto do racismo nos Estados Unidos. 
4 N.T.: A decisão de manter o termo queer reflete a opção que tem sido feita universalmentenos textos dos estudos 
gays traduzidos em várias línguas nos quais ele aparece no original. O termo queer, tradicionalmente usado com o 
sentido de estranho, anormal, aquilo ou aquele que não está de acordo com uma presumida normalidade, foi 
apropriado por vários autores, preocupados com as questões da sexualidade, sobretudo antes de o termo gay se 
tornar corrente, como foi o caso do autor. 
ele, foram as únicas vezes em que fui despedido. Fui mandado embora da 
Universidade de Chicago nos primeiros anos de Robert Hutchins; da Escola 
Manumit, afiliada ao Brookwood Labor College, de A. J. Muste; e do Black 
Mountain College. Essas eram instituições altamente liberais e progressistas e 
duas delas se orgulhavam de se considerarem comunidades – francamente, 
minha experiência com comunidades radicais é que elas não toleram minha 
liberdade. Apesar disso, sou totalmente a favor de comunidade, porque é uma 
coisa humana, só que parece que eu estou fadado a ser excluído delas. 
Por outro lado, até onde eu sei, meus atos homossexuais e minha 
reivindicação explícita a eles nunca criaram desvantagem para mim em 
instituições mais caretas. Ensinei em meia dúzia de universidades estaduais. 
Sou constantemente convidado, muitas vezes como principal palestrante, para 
convenções de superintendentes de escolas secundárias, conselhos de 
diretores, conselheiros pedagógicos, forças-tarefa sobre delinquência juvenil e 
assim por diante. Falo o que acho que é verdade – com frequência trata-se de 
temas sexuais –, dou cantadas, se aparece oportunidade, e continuam a me 
convidar. Até transei algumas vezes, o que é mais do que eu posso dizer de 
conferências/convenções dos SDS (Students for a Democratic Society) ou da 
5Resistência . Talvez as pessoas sejam tão caretas que não acreditam ou se 
atrevem a notar o meu comportamento; ou, mais provavelmente, esse pessoal 
profissionalmente mais careta é mais vivido (nossa palavra antiquada para 
cool) e não dá a mínima para o que você fizer desde que eles não tenham que 
encarar pais ansiosos e a imprensa sensacionalista.
Quando a gente vai envelhecendo, os desejos homossexuais nos 
deixam mais alertas em relação a adolescentes e jovens, mais do que os 
desejos heterossexuais, especialmente porque nossa sociedade desaprova 
fortemente os casos entre homens mais velhos e meninas e mulheres mais 
velhas e meninos. De qualquer forma, no homem, a parte homossexual da 
personalidade é uma sobrevivência da adolescência. Porém, nem é preciso 
dizer que há um limite para essa ponte sobre o abismo entre gerações. 
Inexoravelmente, eu, como outros homens que frequentam campi 
universitários, nos damos conta de que as sucessivas levas de calouros 
parecem cada vez mais imaturas e incomunicáveis, e acabamos parando de 
tentar assaltar o berçário. A música deles não me anima. Depois de um tempo, 
meu melhor contato com os jovens passou a ser com os amigos dos meus 
filhos, como conselheiro na sua política, e não por desejos sexuais meus (a 
morte do meu filho me afastou totalmente do mundo jovem).
34
5 N.T.: ao alistamento obrigatório.
Embora eu tenha sido extremamente pobre até doze anos atrás – criei 
minha família com a renda igual à de um meeiro –, no geral eu não atribuo isso 
ao fato de ser queer, mas à minha total inaptidão, truculência e má sorte. Em 
1945, até o exército me rejeitou como “Material Não Militar” (eles tinham esse 
carimbo), não porque eu fosse queer, mas porque durante o exame enchi o 
saco de todos com meu ativismo pacifista e também porque eu tinha a vista 
ruim e hemorroidas.
Curiosamente, no entanto, escutei de Harold Rosenberg e do finado 
Willie Poster que meu comportamento sexual me causava danos precisamente 
no universo literário de Nova York. Por causa dele, eu deixava de ser convidado 
para festas vantajosas nas quais poderia fazer contatos e conseguir publicação. 
Só posso acreditar em Harold e Willlie porque eles eram observadores sem 
preconceitos. O que eu próprio notei é que eu era excluído dos lucrativos 
círculos literários dominados por marxistas nos anos trinta e por ex-marxistas 
nos anos quarenta, porque eu era anarquista. Por exemplo, eu nunca era 
convidado pelo PEN Club ou pelo Committee for Cultural Freedom. Quando o 
CCF finalmente me procurou no final dos anos cinquenta, eu tive de recusar o 
convite porque eles já eram patentemente uma ferramenta da C.I.A. (escrevi 
isso em 1961, mas eles se safaram com mentiras).
Para continuar moralmente vivo, um nigger usa vários tipos de malícia, 
que é a vitalidade dos sem-poder. Ele pode ser aleatoriamente destrutivo, já que 
sente que não tem nenhum mundo a perder, e talvez consiga impedir os outros 
de desfrutar o mundo deles, ou ele pode se tornar um grupista fanático, 
achando que só os seus pares são autênticos e têm alma. Há queers e negros 
pertencentes a ambas categorias. Queers são “artísticos”, negros têm “alma” 
(esse é o tipo da teoria, sinto dizer, que se nega a si própria; quanto mais você 
acredita nela, mais estúpido se torna; é como tentar provar que você tem senso 
de humor).
No meu caso particular, entretanto, ser um nigger parece me inspirar a 
querer uma humanidade mais elementar, mais selvagem, menos estruturada, 
mais variegada e em que as pessoas prestem atenção umas às outras. Ou seja, 
minhas dificuldades deram energia ao meu anarquismo, utopianismo e 
gandhismo. Há negros nesse grupo também.
A minha posição política real é fruto de uma reação consciente ao fato 
de ser um nigger. Eu ajo baseado em que “a sociedade na qual eu vivo é minha”, 
esse é o título de um dos meus livros. Considero o Presidente como meu servidor 
público, a quem eu pago, e o repreendo como um péssimo empregado. Sou mais 
constitucional do que a Corte Suprema. Diante da grosseira ilegitimidade do 
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Governo – com sua guerra do Vietnam, sua facção industrial-militar e a C.I.A. –, 
eu me apresento como um patriota antiquado, nem tão submisso nem mais 
revolucionário do que o necessário para os meus modestos objetivos. Isso é uma 
posição quixotesca. Às vezes eu me pareço com Cícero. 
Quando estão no grupismo Gay Society, os homossexuais podem se 
tornar fantasticamente esnobes e apolíticos ou reacionários. Essa é uma ego-defesa 
compreensível: “Você precisa ser melhor do que alguém”, mas seu benefício é 
muito limitado. Quando eu faço palestras na Mattachine Society, meu sermão 
invariável é que eles devem se alinhar com todos os outros grupos libertários e 
movimentos de libertação, já que a liberdade é indivisível. O que precisamos não é 
de orgulho desafiador e autoconsciência, mas de espaço social para viver e respirar. 
O pessoal do Gay Liberation finalmente entendeu a mensagem da liberdade 
indivisível, mas eles têm o fanatismo usual do movimento. 
No entanto, há um lado positivo. Pela minha observação e experiência, 
a vida queer tem notáveis valores políticos. Pode ser profundamente 
democratizante, juntando todas as classes e grupos, mais do que a 
heterossexualidade consegue. Sua promiscuidade pode ser uma coisa linda 
(mas que seja prudente em relação a doenças venéreas). 
Eu já cacei ricos, pobres, classe média e pequenos burgueses; pretos, 
brancos, amarelos e marrons; acadêmicos, esportistas amadores, 
universitários medíocres filhos-de-papai e vagabundos; homens do campo, 
pescadores, ferroviários, trabalhadores das indústrias pesada e leve, das 
comunicações, dos negócios e das finanças; civis, soldados e marinheiros e, 
uma ou duas vezes, policiais (mas provavelmente por motivos edipianos tenho 
a tendência a ser sexualmente antissemita, o que é um saco). Há algum tipo de 
significado político, creio, no fato de existirem tantos seres humanos atraentes; 
mas o que é mais significativo é que as muitas funções que eu exerço 
profissional e economicamente não estão exatamente definidas, retêm certa 
animação e sensualidade. O HEW,em Washington, e a Escola 201, no Harlem, 
não são uma perda de tempo total, embora eu fale para as paredes em ambos 
os lugares. Tenho com que me ocupar nos trens, ônibus e durante as esperas 
cada vez mais longas nos aeroportos. Em resorts de férias, onde as pessoas 
ficam idiotas porque estão de férias, tenho um motivo para frequentar garçons e 
camareiros, que estão trabalhando para ganhar a vida. Tenho alguma coisa 
para fazer em protestos pela paz – música de guitarra não me anima –, embora, 
sem dúvida, os arquivos da TV e o FBI tenham fotos de mim passando a mão 
em alguém. 
 
36
As características humanas que afinal têm importância para mim e 
podem ganhar minha amizade duradoura são bem simples: saúde, 
honestidade, não ser cruel ou ressentido, disponibilidade e doçura de 
personalidade ou de feições. Refletindo sobre isso agora, só a estupidez óbvia, a 
limpeza obsessiva, o preconceito racial, a insanidade e a bebedeira ou o uso 
habitual de drogas realmente me causam rejeição. 
Na maioria das sociedades humanas, é claro que a sexualidade 
sempre foi uma área a mais na qual as pessoas podem ser injustas, ricos 
comprando pobres, machos abusando das fêmeas, sahibs usando os niggers, 
adultos explorando os jovens, mas acho que isso é neurótico e não traz a maior 
satisfação. São Tomás, que foi um grande filósofo moral, embora ruim na 
metafísica, diz que a principal utilidade do sexo – tomado separadamente da lei 
natural da procriação – é permitir conhecer outras pessoas intimamente. Essa 
tem sido minha experiência.
Uma crítica comum da promiscuidade sexual tem sido, é claro, a de 
que em vez de democracia ela envolve uma superficialidade terrível da conduta 
humana, sendo um arquétipo da idiotice da vida urbana massificada. Tenho 
minhas dúvidas de que esse seja realmente o caso, embora eu não saiba; como 
no caso do pessoal que frequenta galerias de arte, não sei a quem a arte diz 
alguma coisa e quem fica ainda mais confuso – mas ao menos alguns estão 
procurando alguma coisa. Um homem ou mulher jovem fica se preocupando: 
“Ele está realmente interessado em mim, ou só no meu corpo? Se eu fizer sexo 
com ele, ele vai me considerar como um nada”. Eu considero essa distinção 
sem sentido e desastrosa; na verdade eu sempre me comportei de maneira 
exatamente oposta e muitas das minhas lealdades pessoais de vida inteira 
tiveram início com sexo. Porém, isso é a regra ou a exceção? Considerando a 
frieza e fragmentação usual da vida comunitária atual, meu palpite é de que a 
promiscuidade sexual enriquece mais vidas do que as torna insensíveis. Não é 
preciso dizer que se tivéssemos melhor comunidade, teríamos também uma 
vida sexual melhor.
Não posso dizer que minha própria promiscuidade (ou tentativas de) 
tenha evitado que eu ficasse possessivamente enciumado de alguns dos meus 
amantes – mais de mulheres do que de homens, mas de ambos. Minha 
experiência não tem demonstrado o que Freud e Ferenczi parecem prometer: 
que a homossexualidade diminui essa paixão voraz, cujas causas eu não 
compreendo. Contudo, o ridículo da inconsistência e da injustiça da minha 
atitude tem me ajudado a rir de mim mesmo e me impedido de exagerar.
37Paul Goodman
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Às vezes é a caçada sexual que me leva a um lugar onde conheço 
alguém – por exemplo, eu costumava rondar bares perto do cais –, às vezes 
estou em um lugar por outro motivo e caço por acaso – por exemplo, vou para o 
estúdio de TV e dou uma cantada no câmera –, às vezes as duas coisas vêm 
juntas – por exemplo, gosto de jogar handebol e tenho interesse sexual em 
parceiros de handebol. Mas no final é tudo a mesma coisa, porque em todas as 
situações eu costumo pensar, falar e agir da mesma forma. Fora ajustes 
corteses comuns de vocabulário – mas não de sintaxe, que altera o caráter –, eu 
falo das mesmas coisas e não uso máscaras diferentes, ou me vejo de repente 
com uma personalidade diferente. Talvez haja duas razões opostas pelas quais 
eu consigo manter minha integridade: por um lado, tenho um intelecto forte o 
suficiente para perceber como as pessoas são de verdade neste nosso único 
mundo e para conseguir fazer contato com elas independentemente de 
diferenças de formação; por outro lado, é provável que eu esteja tão fechado 
nas minhas pressuposições que nem noto obstáculos óbvios impedindo a 
comunicação.
O jeito como eu realmente abordo não tem feito grande sucesso. Como 
eu não uso meus dons para manipular a situação, eu raramente consigo o que 
quero dela. Como não traio meus próprios valores, não me insinuo para 
agradar. Meu igualitarismo aristocrático afasta as pessoas, a não ser que elas 
sejam seguras de si mesmas o suficiente para também serem 
aristocraticamente igualitárias. Ainda assim, o fato de eu não ser falso ou 
manipulador também tem impedido pessoas de desgostarem ou se ressentirem 
de mim e normalmente eu tenho a consciência limpa, não há muita mentira ou 
papo-furado para varrer fora. 
Ter-me tornado uma celebridade nesses últimos anos, no entanto, me 
prejudicou sexualmente mais do que ajudou. Por exemplo, universitários jovens 
e íntegros que poderiam gostar de mim e que costumavam me procurar agora 
mantêm uma distância respeitosa do homem ilustre. Talvez achem agora que 
eu só posso estar interessado no corpo deles, e não neles mesmos. Outros, que 
me procuram somente porque eu sou muito conhecido, parecem entrar em 
pânico quando fica claro que eu não dou a mínima para isso e me porto como eu 
mesmo. Claro que uma explicação mais simples para a piora da minha sorte é 
que eu estou mais velho a cada dia, provavelmente mais feio, e certamente 
cansado demais para tentar com afinco. 
Como regra, eu não acredito em pobreza e sofrimento como uma 
maneira de aprender nada, mas, no meu caso, as dificuldades e a carência da 
minha inepta vida queer tiveram a utilidade de simplificar minhas noções do 
38
que é uma boa sociedade. Como no caso de qualquer viciado que não consegue 
sua dose facilmente, essas coisas têm me mantido em contato direto com a 
fome material. Assim, eu não consigo levar o Produto Interno Bruto muito a 
sério, nem status, nem credenciais, nem soluções tecnológicas grandiosas, 
nem política ideológica, incluindo movimentos de libertação ideológicos. Para 
uma pessoa esfomeada, o mundo tem que se apresentar na forma de gêneros 
alimentícios. Mas não é o que acontece. Eu aprendi a ser modesto nas minhas 
metas para a sociedade e para mim mesmo: coisas como ar limpo, grama 
verde, crianças com brilho nos olhos, não ser empurrado pra lá e pra cá, 
trabalho útil que se adapta às nossas habilidades, comida simples e gostosa e 
uma fugidinha ocasional satisfatória.
Uma feliz propriedade dos atos sexuais e talvez, especialmente, de 
atos homossexuais é que eles são sujos, como a vida: como Agostinho disse, 
Inter urinas e feces nascimur, nascemos no meio de mijo e merda. Numa 
sociedade tão classe-média, ordeira e tecnológica como a nossa, é bom romper 
o enojamento, que é um fator importante no que é chamado racismo, bem 
como na crueldade com crianças e no isolamento de doentes e moribundos. A 
natureza ilegal e o pegue-o-que-der-pra-pegar de grande parte da vida 
homossexual atual rompe outras atitudes convencionais. Embora eu desejasse 
ter feito minhas festas com menos apreensão e menos pressa, foi uma 
vantagem aprender que fins de cais, traseiras de caminhões, becos dos fundos, 
atrás das escadarias, cabines de praias abandonadas e banheiros de trens são 
amostras adequadas de todo espaço que há. Para bem e para mal, a vida 
homossexual retém algo do alarme e excitação da sexualidade infantil.
É danoso para as sociedades reprimir qualquer vitalidade espontânea. 
Às vezes, é necessário, mas só raramente; e certamente não no caso dos atos 
homossexuais, que, até onde eu ouvi falar, nunca fizeram mal a ninguém. Parte 
da hostilidade, paranoia e competitividadeautomática da nossa sociedade 
resulta da inibição de contato físico. Contudo, de uma maneira muito 
específica, a proibição da homossexualidade causa dano e despersonaliza o 
sistema educacional. A relação professor-aluno é quase sempre erótica. As 
únicas outras motivações psicológicas saudáveis são a mãe-protetora, 
relevante no caso de crianças pequenas, e o profissional que precisa de 
aprendizes, relevante para as escolas de graduação. Se houver medo e 
preocupação de que os sentimentos eróticos podem se converter em sexo, 
abertamente, a relação professor-aluno falha, ou pior, torna-se fria e cruel. 
Nossa cultura se ressente enormemente da falta de amizades pedagógicas 
sexuais, homossexuais, heterossexuais e lésbicas, que foram proeminentes em 
outras culturas. Sem dúvida, uma sexualidade funcional é provavelmente 
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incompatível com nosso sistema educacional massificado. Essa é uma entre 
muitas razões por que ele deveria ser desmantelado.
Lembro-me que quando Growing Up Absurd tinha recebido várias 
críticas fulgurantes, finalmente um crítico irritado, Alfred Kazin, sugeriu 
sombriamente que eu havia escrito sobre meus delinquentes porto-riquenhos 
(e chamei-os de “mancebos”) porque eu tinha atração sexual por eles. Que 
novidade. Como eu poderia escrever um livro perceptivo se eu não prestasse 
atenção? E por que eu iria prestar atenção em alguma coisa a não ser que por 
algum motivo ela me interessasse? A motivação da maior parte da sociologia, 
seja ela qual for, tende a produzir livros piores. Duvido que alguém diga que 
minha observação de adolescentes delinquentes ou dos universitários do 
movimento estudantil foi prejudicada pelas minhas paixões. Mas quero bem a 
eles, sim – claro, eles poderiam até dizer: “com um amigo desses, quem precisa 
de inimigos?”
Porém, é verdade que um lado ruim das dificuldades e perigos da vida 
queer na nossa sociedade, como em qualquer situação de escassez e fome, é 
que nos tornamos obsessivos e fixados em relação a ela. Eu certamente gastei 
um número excessivo de horas ansiosas da minha vida caçando, que poderia 
ter gasto passeando com outros propósitos ou com nenhum, cultivando meu 
espírito. Contudo, acredito que tive a energia, ou a teimosia, de não deixar 
minha obsessão turvar minha honestidade. Até onde sei, nunca elogiei um mau 
poema de um rapaz por ele ser atraente, mas é claro que fico especialmente 
contente se o poema for bom e eu puder dizer isso. Melhor ainda, é claro, se ele 
for meu amante e me mostrar algo que me deixe orgulhoso e que eu possa 
empurrar para um editor. Sim, já que eu comecei essas reflexões com uma nota 
amarga, deixe terminá-las com um poema feliz de que eu gosto, do meu livro 
Hawkweed.
We have a crazy love affair
It is wanting each other to be happy.
Since nobody else cares for that
we try to see to it ourselves
Since everybody knows that sex
Is part of love, we make love.
 
40
When that's over , we return
to shrewdly plotting the other's advantage.
Today you gazed at me, that spell
is why I choose to live on.
God bless you who remind me simply
of the earth and sky and Adam.
I think of such things more than most
but you remind me simply. Man,
you make me proud to be a workman
6of the Six Days, practical .
Pesando tudo, não sei se minha escolha, ou compulsão, de uma vida 
bissexual me tornou especialmente infeliz ou apenas medianamente infeliz. É 
óbvio que toda maneira de viver tem seus problemas, ter ou não ter pai, ser 
casado ou solteiro, ser fortemente sexuado ou mais assexuado e assim por 
diante, mas é difícil julgar a experiência dos outros, fazer uma comparação. Senti 
persistentemente que o mundo não foi feito para mim, mas tive bons momentos. 
Trabalhei um bocado, criei filhos lindos e cheguei aos 58 anos de idade.
6 Tradução literal: Nós temos um louco caso de amor / e queremos a felicidade um do outro./ Como ninguém mais 
se importa com isso / nós tentamos resolver isso sozinhos. / Como todos sabem que o sexo / faz parte do amor, 
fazemos amor./ Quando isso termina, voltamos / a conspirar a vantagem um do outro. / Hoje você ficou me 
olhando, aquela magia / é o motivo por que escolho continuar vivendo. / Deus bendiga você que me lembra 
simplesmente / da terra, céu e de Adão. / Eu penso nessas coisas mais do que a maioria / mas você me lembra 
simplesmente. Homem, / você me faz orgulhoso de ser um trabalhador / dos Seis Dias, prático.
41Paul Goodman
n. 07 | 2012 | p. 32-41
42
3
The homosexuality in front of the law in France: 
from postwar to “Gay Liberation”
Geoffroy Huard de la Marre
Doutorando na Universidad de Cádiz/Université de Picardie – Jules Verne
geoffroy.huarddelamarre@gmail.com
Tradução: Marcos Tindo
Professor de Língua Francesa na Fundação de Apoio à Educação e ao 
Desenvolvimento Tecnológico do Rio Grande do Norte (FUNCERN)
Mestrando em Linguística Aplicada pela 
Universidade Federal do Rio Grande do Norte (UFRN)
A homossexualidade perante a lei na França: 
1do pós-guerra à “liberação gay”
44
Resumo
Este artigo trata-se do estudo das diferentes leis que foram implementadas desde o pós-
guerra até metade dos anos 1970, as quais condenavam as relações homossexuais em 
público, percebendo quais precauções os homossexuais deveriam tomar para evitarem 
a condenação. Mostra que é falsa a ideia de que a repressão jurídica da 
homossexualidade na França aparece de novo com o regime de Pétain e atinge o seu 
apogeu com a subemenda Mirguet em 1960. Com efeito, se o termo contre-nature 
(antinatural) reaparece nos textos legais dessa época, o qual já não aparecia desde a 
Revolução Francesa, os atos homossexuais em público sempre foram punidos por 
diversas leis que utilizavam outras terminologias.
Palavras-chave: Homossexualidade. França. Lei. Contre-nature. Pudor. Moralidade.
Abstract
I want to study in this article – from the post-war until the mid 1970's – the various laws 
which condemned the homosexuals's reports in public places, then to see what 
precautions were taken by homosexuals to avoid conviction. I would like to show that the 
idea that the legal repression of homosexuality in France appears again with the Petain's 
regime and culminates in the sub-amendment Mirguet in 1960 is false. Indeed, if the 
term “against nature” reappears in the legislation at that time when it had no longer 
appeared since the French Revolution, the public homosexual acts were always 
punished by several laws that used other terminologies.
Key-words: Homosexuality. France. Law. Against nature. Decency. Morality.
1 Este artigo constitui uma parte das pesquisas da minha tese de doutorado, a qual preparo atualmente, sobre a 
história da homossexualidade na França e na Espanha (1945-1975), na Université de Picardie – Jules Verne e na 
Universidad de Cádiz, sob a orientação conjunta dos senhores professores Didier Eribon e Francisco Vázquez García.
Introdução
A subemenda Mirguet, de 18 de julho de 1960, que classificava a 
homossexualidade como “flagelo social”, foi o texto jurídico repressivo mais 
discutido na história contemporânea dos homossexuais, desde que foi o alvo 
das críticas do Front Homosexuel d'Action Révolutionnaire (Frente 
Homossexual de Ação Revolucionária, FHAR, 1971-1974). Não obstante, 
quase uma dezena de outras leis repressivas afetou diretamente os 
homossexuais no pós-guerra, mesmo que o termo contre-nature (antinatural) 
tenha reaparecido explicitamente somente em um texto de lei do regime do 
Vichy – já que o crime de sodomia desaparecera desde 1791. Além do mais, 
essas leis repressivas foram acompanhadas por medidas produtivas da ordem 
sexual dominante: heterossexualidade, casamento de homens com mulheres, 
procriação, natalidade, virilidade para os homens, privatização da sexualidade 
(a sexualidade é privada, o espaço público é assexual).
O ato antinatural, com um menor, punido com prisão: 1942-1982
“Não há, na França, delito nem

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