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SUMÁRIO 
 
 
INTRODUÇÃO ....................................................................................................................... 1 
1. O PACTO DA GRAÇA NA ANTIGA E NOVA ALIANÇA ............................................ 4 
1.1 Síntase da Teologia do Pacto ........................................................................................... 7 
1.2 Apresentação de outros sistemas de teologia ................................................................ 11 
1.3 Metodologia adotada ..................................................................................................... 14 
2. A LEI NA ANTIGA ALIANÇA ........................................................................................ 15 
2.1 A lei "antes da lei" .......................................................................................................... 15 
2.2 A lei de Moisés ............................................................................................................... 17 
2.3 Aspectos civil e cerimonial da lei ................................................................................... 22 
 2.3.1 Lugar, objetos, pessoas e períodos sagrados ............................................................ 23 
 2.3.2 Sistema sacrificial ..................................................................................................... 25 
 2.3.3 Leis de pureza e impureza ........................................................................................ 26 
3. A LEI NA NOVA ALIANÇA ............................................................................................ 28 
3.1 Cristo e a lei .................................................................................................................... 29 
3.2 Paulo e a lei ..................................................................................................................... 33 
4. OS USOS DA LEI ............................................................................................................... 41 
4.1 Uso civil da lei ................................................................................................................ 42 
4.2 Uso pedagógico da lei ..................................................................................................... 43 
4.3 Uso normativo da lei ....................................................................................................... 44 
CONCLUSÃO ......................................................................................................................... 46 
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................................. 48 
 
 
 
 
1 
 
 
INTRODUÇÃO 
 
 
Entender como a lei de Deus atua na realidade da nova aliança é uma daquelas tarefas 
difíceis que os teólogos se deparam e que não chegam a um consenso. As diversas posições 
encontradas partem de pressupostos hermenêuticos distintos e chegam a conclusões teológicas 
que as vezes são opostas. Esse problema está enraizado na questão de continuidade e 
descontinuidade da lei na antiga e nova aliança. Em outras palavras, busca-se saber se a lei do 
Antigo Testamento é válida para a igreja hoje, quais partes dela continuam aplicáveis e quais 
foram revogadas. 
O tema da continuidade e descontinuidade é muito importante para o entendimento 
correto das Escrituras, pois não somente a lei, mas também assuntos como Israel e Igreja; 
circuncisão e batismo; sábado e domingo; e a própria salvação em si também são 
influenciados por esse debate. Essa questão a primeira vista pode não parecer relevante, mas 
tem valor tanto doutrinário como prático para a vida da igreja. “O assunto da continuidade e 
descontinuidade da Escritura torna-se intensamente prático quando se reconhece que 
discussões contemporâneas sobre assuntos éticos como pena de morte e aborto apelam 
fortemente para textos do AT” (FEINBERG, 2013, p. 8). 
Falando da relevância desse assunto, Virkler (2007, p. 91-92) diz que “a atitude que 
alguém toma para com o problema de continuidade-descontinuidade influencia tanto o ensino 
da escola dominical como a pregação”. Na verdade, quando se trata da lei isso é ainda mais 
evidente. Quantas vezes não se ouviu que o Novo Testamento é o tempo da graça e que o 
Antigo Testamento era o tempo da lei? (MEISTER, 2003). Nesse sentido, a lei é vista como 
um tempo ultrapassado ao qual o cristão não precisa se preocupar. 
Todavia, não parece ser essa a percepção bíblica de Paulo quando afirmou que a lei é 
santa, e o mandamento santo, justo e bom (Rm 7.12). Também não é essa a visão de Jesus 
quando afirma que amar a Deus é obedecer aos seus mandamentos, como descreve João: “Se 
guardardes os meus mandamentos, permanecereis no meu amor” (Jo 10.15a). Sem contar, as 
declarações de amor a lei nos Salmos do Antigo Testamento (Sl 1.1-2; 19.7-10; 119.97). Por 
outro lado tem-se o registro enfático do mesmo Paulo de que o cristão está livre da lei. 
“Agora, porém libertados da lei, estamos mortos para aquilo a que estávamos sujeitos, de 
modo que servimos em novidade de espírito e não na caducidade da letra” (Rm 7.6). 
2 
 
 
Como harmonizar essas passagens? Como entender a relação da lei na antiga e na 
nova aliança? É justamente isso que este trabalho se propõe a fazer, demonstrando que existe 
tanto continuidade como certa descontinuidade em relação a antiga e nova aliança. Para 
justificar isso, o trabalho começa relacionando a lei ao conceito de aliança nas Escrituras, 
entendendo que a aliança é o berço da lei. Essa é propriamente dita uma conclusão da teologia 
do pacto que entende que a Bíblia é compreendida em dois pactos maiores, o Pacto das Obras 
feito com Adão, quebrado pela desobediência do primeiro casal, e o Pacto da graça, feito em 
Cristo com os seus eleitos, os quais obtém do Senhor a salvação da condenação prevista pela 
quebra do primeiro pacto. 
Essa abordagem da teologia do pacto tem o seu foco na continuidade, ou seja, na 
maneira como Deus se relaciona com a humanidade tanto no Antigo como no Novo 
Testamento, pois tanto a antiga como a nova aliança são expressões do Pacto da Graça se 
desenvolvendo para cumprir os propósitos de Deus na história. No fim do capítulo, apresenta-
se uma síntese do sistema dispensacionalista, que implica numa ênfase maior na 
descontinuidade da relação de Deus com a humanidade. A metodologia adotada neste trabalho 
é que segue a Teologia do Pacto, mas o capítulo quer mostrar que esses sistemas teológicos 
influenciam a maneira como a lei é entendia no Novo Testamento e pela igreja hoje. 
Em seguida, faz-se uma relação da lei na antiga aliança, mostrando que já existia uma 
lei antes da promulgação da lei de Moisés no Monte Sinai. A lei é uma expressão do caráter 
de Deus e sempre esteve presente para revelar a vontade de Deus aqueles com quem estavam 
em aliança. Há um esforço para descrever a lei de Moisés, mostrando que existem diferentes 
aspectos dos mandamentos divinos à nação de Israel, podendo ser identificados como morais, 
civis e cerimoniais. Essa é uma divisão tradicional da teologia reformada, mas que sofre duras 
críticas. A discussão sobre isso, poderá ser vista nessa parte do trabalho. 
As leis ditas cerimoniais são investigadas e identificadas com maior rigor porque o 
Novo Testamento as interpretam como sombra da realidade que ainda viria, abrindo a 
discussão para o próximo capítulo. “Ninguém, pois, vos julgue por causa de comida e bebida, 
ou dia de festa, ou lua nova, ou sábados, porque tudo isso tem sido sombra das coisas que 
haviam de vir; porém Cristo é o corpo” (Cl 2.16-17). 
Chega-se em seguida à discussão sobre a lei na nova aliança. Em primeiro lugar nota-
se que a promessa de um novo pacto com a casa de Israel e Judá é na verdade aplicada à 
Igreja e que ela em si não anula a lei, pelo contrário, a confirma, visto que a lei de Deusserá 
impressa nas mentes e inscrita nos corações (Jr 31.33). 
3 
 
 
Continuando o assunto, esse capítulo propõe que por mais continuidade que possa ter, 
a nova aliança também apresenta certa descontinuidade da lei. As mudanças são vistas no 
relacionamento de Jesus com a lei, pois Ele, sua pessoa e obra, é o cumprimento do aspecto 
cerimonial da lei dada na antiga aliança. Para finalizar o capítulo, faz-se uma análise de Paulo 
e a lei em Romanos 7, no qual o apóstolo diz que o crente está libertado da lei, mas que a lei é 
espiritual (Rm 7.14) e que o cristão vive um conflito interno para obedecê-la (7.15-25). Tudo 
isso, mostra a relevância da lei para o crente que vive debaixo da nova aliança. 
O último capítulo deste trabalho consiste em apresentar o conceito reformado dos usos 
da lei, ou seja, as funções da lei moral de Deus tanto para os crentes como para os descrentes. 
Aqui é apresentado três usos da lei, que podem ser resumidos da seguinte maneira: a lei é 
instrumento de Deus para restringir o mal. Este é o uso civil ou político; para revelar o 
pecado, este é o uso pedagógico ou evangélico que leva o pecador a Cristo; e para, pelo poder 
do Espírito, guiar o crente a fazer a vontade de Deus, este é o uso normativo ou didático, que 
apenas os regenerados desfrutam. 
Em tudo isso, vê-se a importância do estudo da lei de Deus hoje, pois a lei contém o 
evangelho e o evangelho contém a lei. Ambos provém de Deus para benefício do seu povo. 
Não há nos registros bíblicos um tempo sem lei. Deus sempre estabelece soberanamente as 
condições para se relacionar com sua criação. 
Portanto, o crente da nova aliança pode orar como o salmista e dizer: “Desvenda os 
meus olhos, para que eu contemple as maravilhas da tua lei” (Sl 119.18). Pode ter prazer na 
lei: “Quanto amo a tua lei! É a minha meditação, todo o dia!” (119.97). Pode também 
encontrar direção para a caminhada cristã: “Lâmpada para os pês é a tua palavra e, luz para os 
meus caminhos” (119.105). 
 Tratar da continuidade e descontinuidade da lei nas Escrituras é uma tarefa complexa 
por causa da gama de conexões teológicas que precisam ser feitas. Todavia, é uma empreitada 
que em algum momento e de maneira informal todo cristão se envolve. Afinal, de maneira 
específica “estamos interessados em entender como podemos ter uma Bíblia com uma 
mensagem unificada, mas com dois Testamentos – e, consequentemente, 66 livros” 
(GOLDSWORTHY, 2013, p. 119). 
 
 
 
 
 
4 
 
 
 
1. O PACTO DA GRAÇA NA ANTIGA E ALIANÇA 
 
 
O objetivo desse trabalho é tratar da continuidade e descontinuidade da lei na antiga e 
nova aliança. Mas antes disso, é preciso definir o que é e como foram essas alianças de Deus 
com seu povo, bem como estabelecer a relação dessas como expressões do pacto da graça no 
desenvolvimento da história da redenção. 
O tema do pacto é claramente visto nas Escrituras. A palavra “berit” aparece 280 
vezes no Antigo Testamento1 e geralmente é traduzida como pacto, aliança, acordo, concerto 
ou tratado, que pode ser estabelecido entre Deus e os homens, entre nações, entre suseranos e 
vassalos ou ainda entre indivíduos, como no caso de Davi e Jonatas (1 Sm 18.3). 
No AT, quando o pacto era entre Deus e os homens tinha o significado de um “mútuo 
compromisso que, paradoxalmente, reconhecia tanto a iniciativa divina no acordo, quanto 
também insistia na realidade e necessidade da escolha humana” (NDITEAT, 2011, p. 728). 
Essa mutualidade pactual se expressa somente na realização da aliança, já que Deus de forma 
soberana e graciosa é quem estabelece a aliança. Portanto, a “berit” é unilateral em sua 
estipulação e bilateral em sua realização. “Nisso reside a importância de santificação e 
perseverança pessoal. Deus ordena que seu povo guarde a aliança com ele mediante o amor e 
a obediência” (FERGUSON; WRIGHT, 2009, p. 752). 
A forma mais comum de descrever a realização de uma aliança se dá pela expressão 
“karat berit”, quer dizer literalmente cortar uma aliança2. Essa é a expressão em Gênesis 
15.18: “Naquele mesmo dia, fez o SENHOR aliança com Abraão [...]”. A maneira de se fazer 
uma aliança era por meio de sinais e selos que simbolizavam a permanência do compromisso 
de Deus com seu povo. Exemplo disso são o arco-íris, a circuncisão e o sábado 
(ROBERTSON, 2011, p. 16). “Disse Deus: Este é o sinal da minha aliança que faço entre 
mim e vós e entre todos os seres viventes que estão convosco, para perpétuas gerações: porei 
nas nuvens o meu arco; será por sinal da aliança entre mim e a terra” (Gn 9.12-13). 
No Novo Testamento, a palavra usada para aliança, concerto e pacto é diatheke. Ela 
ocorre 33 vezes, sendo que em mais da metade como citações do AT. Os outros casos em 
Hebreus; algumas vezes em Paulo e Atos3. Esse termo é também utilizado 270 vezes pela 
 
1 VINE, 2002, p. 75. 
2 DITAT, 1998, p. 29. 
3 DITNT, 1998, p. 61. 
5 
 
 
Septuaginta (LXX) para traduzir berit. Isso acontece por exemplo com as alianças feitas entre 
Deus e Noé (Gn 6.18), Abraão (2 Rs 13.23) e Davi (Jr 33.21), mostrando que a aliança não é 
um acordo entre iguais, mas Deus estabelece sua aliança de forma unilateral4. 
Importante para o entendimento da palavra é a discussão sobre o seu significado. No 
grego clássico, diatheke aparece como uma decisão irrevogável, isto é algo que não pode ser 
cancelado. A condição para que essa decisão seja alcançada é a morte do testador. “Diatheke é 
um testamento que distribui a propriedade depois da morte de acordo com os desejos do 
possuidor” (VINE, 2002, p. 76). Isso a distingue de syntheke, que quer dizer contrato em que 
as duas partes se dedicam a uma atividade comum. Nesse último sentido, diatheke aparece 
apenas uma vez 5. 
Grande debate há sobre o significado de diatheke como aliança ou testamento no Novo 
Testamento. Murray (...) argumenta que o fato dos tradutores da LXX terem usado diatheke 
para traduzir berit deve mostrar que eles não acreditavam que a aliança fosse um acordo 
mútuo. Para ele, a aliança tanto no AT como no NT é administrada soberanamente e portanto 
é “divina em sua origem, estabelecimento, conformação e realização” (MURRAY, 2001, p. 
28). Isso no entanto, não é acabar com a mutualidade das alianças. Na aliança de Deus com 
Abraão, o patriarca de Israel deveria guardar o pacto, como se vê registrado em Gn 17.1: 
Quando atingiu Abrão a idade de noventa e nove anos, apareceu-lhe o SENHOR e disse-lhe: 
Eu sou Deus Todo-Poderoso; anda na minha presença e sê perfeito”. Um pouco mais adiante 
Deus diz a Abraão: “Guardarás a minha aliança, tu e a tua descendência no decurso das suas 
gerações” (Gn 9.9). Assim é em toda aliança, pois “um pacto que concede sua bênção 
indiscriminadamente não pode ser guardado ou quebrado” (MURRAY, 2001 p. 33). Portanto, 
para Murray (2001) diatheke no Novo Testamento tem a mesma ideia que no AT, mas aquele 
sentido unilateral e não como um acordo bilateral6. 
 Em Mateus 26 na descrição da Ceia é atribuído o conceito de aliança em diatheke. Jesus 
diz: “Bebei dele todos porque isto é o meu sangue, o sangue da [nova] aliança. Derramado em 
favor de muitos, para remissão de pecados”(Mt 26.27b-28). Paulo também enfatiza essa ideia 
quando cita as palavras de Jesus sobre a Ceia: “Este cálice é a nova aliança no meu sangue” (1 
Co 11.25). Citando Vos, Horton (2010, p. 52) diz que a nova diatheke nas palavras de Cristo 
está ligada a morte em sentido de sacrifício da mesma forma que em Êxodo 24 o sangue 
inaugurou a berit do Sinai. “Devemos ver a inauguração da ceia em termos de cumprimento 
 
4 DITNT, 2000, p. 60. 
5 DITNT, 2000, p. 58. 
6 Murray chega a dizer que em Hb 9.16-17 diatheke tem o sentido de testamento, ainda que seja um caso 
excepcional do termo (2001, p.49). 
6 
 
 
(do berit) em vez de uma ideia completamente nova na história daredenção” (HORTON, 
2010, p. 53). 
 Conclui-se a partir da análise bíblica que os autores do Novo Testamento entendiam 
diatheke como berit da mesma forma que os autores do AT, não era um conceito de 
testamento, mas de aliança7. A implicação é de que não há necessidade de modificar o 
conceito de berit no AT. “O conceito de aliança no Antigo Testamento não deve ser 
reinterpretado em termos de um testamento e disposição de última vontade. A perspectiva do 
povo do Antigo Testamento quanto à sua relação com Deus era consistentemente de aliança” 
(ROBERTSON, 2011, p. 20). 
Assim pode-se definir as alianças de Deus com os homens como um relacionamento 
de vida ou morte soberanamente e graciosamente administrado8. Essas alianças podem ser 
vistas nas Escrituras em dois pactos maiores. A antiga aliança é formada por todas as alianças 
de Deus com os homens desde Adão, depois da queda, até Noé, Abraão, Moisés e Davi. Já a 
nova aliança é estabelecida após a obra de Jesus Cristo na cruz. Esse novo pacto não é 
simplesmente uma novidade desconhecida, mas “representa a fusão de todas as antigas 
promessas pactuais em termos de uma expectação futura” (ROBERTSON, 2011, p. 43). 
Entre antiga e nova aliança há tanto unidade como diversidade, há continuidade como 
também certa descontinuidade. Se por um lado, as alianças não se anulam, uma vez que cada 
aliança sucessiva com os descendentes de Abraão leva os propósitos originais de Deus a um 
nível superior de realização, por outro a antiga aliança é caracterizada por promessa, sombra e 
profecia, enquanto a nova tem em si cumprimento, realidade e realização. A vinda de Cristo 
alterou para sempre a maneira de Deus se relacionar com seu povo, de tal forma que não é 
possível mais voltar aos antigos moldes (ROBERTSON, 2011, p. 54-55). 
Depois dessa breve definição, cabe agora estabelecer a relação da antiga e aliança 
dentro de uma estrutura teológica maior, isto é, a Teologia do Pacto. Isso permitirá maior 
compreensão de como a história da redenção se desenvolveu no decorrer das Escrituras, já 
que refletir sobre as alianças é de suma importância para compreender a mensagem bíblica, 
como bem destacou Horton (2010, p. 88): 
 
Fora da estrutura de aliança, é fácil falar sobre a soberania de Deus em termos quase 
fatalistas, como se a criação fosse simplesmente uma marionete inerte que se move 
 
7 Robertson defende o conceito de aliança em Hb 9.16-17…. 
8 Optou-se aqui pelo termo relacionamento em vez de pacto para melhor compreensão do assunto e visto que o 
próprio autor se utiliza dos dois termos (ROBERTSON, 2011). Acrescentou-se a expressão graciosamente 
aproveitando a ideia de Murray que define as alianças de Deus nas Escrituras como “uma administração 
soberana de graça e promessa” (MURRAY, 2001, p. 51). 
7 
 
 
somente quando Deus o decreta especificamente. [...] Deus se relaciona com a 
humanidade por meio de alianças, nas quais não existem apenas atos soberanos de 
Deus, mas, também, atos autenticamente livres da parte do ser humano. 
 
 
1.1 Síntese da Teologia do Pacto 
 
As Escrituras Sagradas mostram que Deus se relaciona com os seres humanos por 
meio de pactos ou alianças, termos sinônimos. Essa foi a maneira estabelecida soberanamente 
para que o homem se relacionasse com seu Criador. A implicação disso é que não existe um 
homem sequer que esteja fora dessa relação pactual, independente de ser crente ou incrédulo, 
ele experimentará as bênçãos ou as maldições do pacto ou de sua relação com Deus. 
A Teologia do Pacto, conhecida como teologia federal é uma das formas de estruturar 
as várias alianças das Escrituras. No entendimento reformado há pelo menos dois pactos 
maiores de Deus com os seres humanos, o pacto da criação ou de obras e o pacto da graça9. 
Estes mostram duas realidades distintas no trato de Deus com a humanidade, uma realidade 
pré-queda e outra pós-queda. O primeiro pacto é conhecido também como pacto das obras e 
foi feito entre Deus e Adão, que representava toda a humanidade. Como descreve a Confissão 
de Fé de Westminster: “O primeiro pacto feito com o homem era um pacto de obras; nesse 
pacto foi a vida prometida a Adão e, nele, à sua posteridade, sob condição de perfeita 
obediência pessoal” (CFW, VII.II). 
Pode-se ver que o pacto das obras tem apoio desde muito cedo na história da igreja, 
como afirma Bavinck (V. 2, p.577): “a doutrina daquilo que, mais tarde, foi chamado “aliança 
de obras” também já ocorre nos pais da igreja”. A ideia do pacto foi desenvolvida na 
Reforma; Zwínglio e Bucer já a utilizavam para defender a unidade do AT e NT contra os 
anabatistas de seu tempo. Além de que é uma doutrina encontrada em grande parte das 
confissões reformadas (BAVINCK, 2012, p. 577). Os chamados puritanos dos séculos XVI e 
XVII também consideravam o relacionamento entre Deus e Adão como uma aliança. Pra eles, 
“a aliança das obras é uma conclusão tanto válida quanto inescapável deduzida das 
Escrituras” (BEEK; JONES, 2016, p. 330). 
 
 
9 O entendimento reformado geral é que existem três pactos que se sobrepõem e agrupam as outras alianças 
descritas na Bíblia. O pacto da redenção, pacto da criação ou das obras e pacto da graça. Aliança da criação foi 
feita com Adão representado a humanidade, a aliança da graça foi feita com os crentes e seus filhos em Cristo e a 
aliança da redenção foi feita entre as pessoas da trindade (HORTON, 2010, p. 61). No entanto, alguns teólogos 
reformados questionam a aliança da redenção e discordam da nomenclatura adotada para pacto das obras 
(ROBERTSON, 2011, p. 51-52). 
8 
 
 
Embora tenha apoio nas Escrituras e na história, o pacto das obras é contestado vez 
por outra. Uma das razões para isso é que o termo hebraico para aliança, berit10, não apareçe 
na narrativa de Gênesis 1-3. A resposta a essa questão é que o conceito de aliança se faz real 
no contexto e pode ser visto pelos elementos contidos no texto, mesmo sem a descrição literal 
do termo aliança. 
A narrativa nos três primeiros capítulos de Gênesis demonstra que havia um 
relacionamento de Deus com a humanidade. Ao que tudo indica, havia um encontro de Deus 
com o homem no final do dia (Gn 3.8). As palavras de Deus ao primeiro casal já revelam o 
que se esperava deles: “Sede fecundos, multiplicai-vos, enchei a terra e sujeitai-a; dominai 
sobre os peixes do mar, sobre as aves do céus e sobre todo animal que rasteja sobre a terra” 
(Gn 1.28). Todos os verbos desse versículo estão no imperativo, mostrando que as exigências 
de Deus eram mais abrangentes do que simplesmente comer ou não comer da árvore do 
conhecimento do bem e do mal. Havia, portanto, exigências de Deus para que o homem 
cumprisse a fim de continuar em sua presença, a maior delas na ordem de não comer da 
árvore do conhecimento do bem e do mal (Gn2.16-17). “Se todos os ingredientes essenciais 
ao estabelecimento de um pacto estavam presentes antes de Noé, o relacionamento de Deus 
com o homem antes dele pode ser designado como aliança” (ROBERTSON, 2011, p. 24). 
Quais são os elementos de uma aliança? O teólogo puritano Patrick Gillespie (1617-
1675) já desde cedo propõe que há seis elementos que aparecem em todas as alianças bíblicas 
entre o Criador e o ser humano criado: uma aliança tem duas partes; tem acordos para ambos; 
terceiro, tem condições para ambos; condições obrigatórias para ambos; tem estipulações que 
são satisfatórias para ambos; e em sexto, as estipulações têm que ser invioláveis, ou seja, sua 
quebra representa uma violação da lei de Deus (BEEK; JONES; 2016, p. 331). 
Berkhof (1990) analisando o pacto das obras propõe cinco elementos principais: partes 
contratantes, Deus e Adão; promessa, isto é, a vida em comunhão com Deus; terceiro, 
condição, que era a obediência perfeita; castigo anunciado, que era a morte como punição a 
uma possível transgressão;e o sacramento da aliança, que pode ser visto na árvore da vida no 
Éden11. 
Considerando isso, a ausência do termo “aliança” não é fator determinante para se 
negar o pacto das obras. Há também em favor desse ponto alguns precedentes escriturísticos 
 
10 A primeira ocorrência desse termo está registrada em Gn 6.18: “Estabelecerei a minha aliança”. 
11 Berkhof )2016, p. 217) entende que as palavras de Gm 3.22 devem ser entendidas sacramentalmente, mas 
admite que há grande variedade de opinions sobre os sacramentos ou selos do pacto das obras. “Uns falam de 
quarto [sacramentos]: a árvore da vida, a árvore do conhecimento do bem e do mal, o paraíso e o santo repouso 
seminal (o sabbath)” 
9 
 
 
que justificam a ausência do termo. Essa mesma situação ocorre em 2 Sm 7.1-17 e em 1 Cr 
17, quando Deus estabelece aliança com Davi, embora também não apareça o termo berit em 
nenhum lugar dessas narrativas. No primeiro desses dois textos, Yahweh diz a Davi que dará 
descanso de todos os inimigos (7.9-12) e estabelecerá o reino de Davi através do seu 
descendente (v.12) e este descendente edificará uma casa ao nome do Senhor (v.13). “Mas a 
minha misericórdia se não apartará dele, como a retirei de Saul, a quem tirei de diante de ti. 
Porém a tua casa e o teu reino serão firmados para sempre diante de ti; teu trono será 
estabelecido para sempre” (2 Sm 7.16). No segundo texto, em 1 Cr 17.1-15, também 
aparecem as mesmas palavras a respeito do descendente de Davi: “Esse me edificará casa; e 
eu estabelecerei o seu trono para sempre” (1.Cr 17.12). Em nenhum dos casos aparece o 
termo berit, contudo é evidente a declaração de uma aliança de Deus com Davi, prometendo 
que seu reino permanecerá para sempre. 
O pacto das obras é também acusado de ser um caminho de salvação por obras, 
contrariando assim a doutrina da salvação somente pela graça. O que se pode dizer é que 
quando Paulo trata disso em Efésios 2.8: “Porque pela graça sois salvos, mediante a fé”. O 
apóstolo está tratando da realidade pós-queda, ou seja, o pacto das obras já violado não pode 
voltar mais a produzir vida, apenas a morte como punição da quebra da aliança. 
Surpreendentemente, pode-se dizer ainda que embora seja tido como um relacionamento 
baseado na obediência perfeita, o pacto das obras não dispensa o favor de Deus. “O homem 
não merece recompensa prometida, mesmo com obediência perfeita. Portanto, sob a aliança, 
suas obras só têm valor em virtude do acordo. Em si mesmas elas não têm qualquer valor 
meritório intrínseco” (WOOLSEY, 2012, p. 50). 
Beek e Jones (2016, p. 354) resumem bem a importância do pacto das obras para a 
teologia reformada, mostrando várias doutrinas importantes confirmadas e entrelaçadas ao 
conceito do primeiro pacto nas Escrituras. 
 
A doutrina [pactos das obras] ressalta vários e importantes conceitos da teologia 
reformada: o aspecto relacional da teologia e o uso do conceito de aliança para 
descrever as relações de Deus com suas criaturas; a ideia de que é possível deduzir 
doutrinas bíblicas normativas por meio de conclusão válida e inescapável das 
Escrituras; as implicações da criação do homem à imagem de Deus; a graça e a 
bondade de Deus ao estabelecer aliança com Adão e ao lhe oferecer “vida”, qualquer 
que seja o sentido de “vida”; o relacionamento federativo entre Adão e sua 
descendência; e a necessidade de outro Adão para “endireitar” o que o primeiro 
Adão “estragou”. 
 
 
 
10 
 
 
Como se sabe, essa primeira aliança foi quebrada por Adão e toda a humanidade se 
tornou incapaz de se relacionar adequadamente com Deus. Por sua vez, Deus apresentou uma 
nova forma de relação, não mais pelo pacto da criação, mas pelo pacto da graça. Este segundo 
pacto descreve “o relacionamento de Deus com o seu povo depois da queda do homem no 
pecado” (ROBERTSON, 2011, p. 52). 
 
Tendo-se o homem tornado, pela sua queda, incapaz de ter vida por meio deste pacto 
[o pacto da criação feito com Adão], o Senhor dignou-se a fazer um segundo pacto, 
geralmente chamado pacto da graça; neste pacto da graça ele livremente oferece aos 
pecadores a vida e a salvação por meio de Jesus Cristo, exigindo deles a fé, para que 
sejam salvos, e prometendo o seu Santo Espírito a todos os que estão ordenados para 
a vida, a fim de dispô-los e habilitá-los a crer (CFW. VII.III12). 
 
 
É sobre essa estrutura maior do pacto divino administrado soberanamente por Deus 
que se encontram as alianças descritas no Antigo e no Novo Testamento. Depois da queda 
existe apenas uma história de redenção, na qual Deus quer estabelecer um povo para si, como 
expressa em diversos lugares da Escritura: “Andarei entre vós e serei o vosso Deus, e vós 
sereis o meu povo” (Lv 26.12). Veja também Êx 6.7; Ez 37.27. Apocalipse 21.3 apresenta a 
mesma ideia já na realidade de Novo Céu e Nova Terra: “Então, ouvi grande voz vinda do 
trono, dizendo: Eis o tabernáculo de Deus com os homens. Deus habitará com eles. Eles serão 
povos de Deus, e Deus mesmo estará com eles”. Assim, tanto a antiga como a nova aliança 
são percebidas como parte de um único pacto que se estende desde a queda de Adão até a 
nova criação, tendo seu ápice na vinda de Cristo. Estas duas administrações são diferentes, 
embora estejam unidas por um só caminho de salvação, isto é, pela graça (VANGEMEREN, 
2013, p. 46). 
É assim que todas alianças de Deus com o homem, depois da queda, têm uma unidade 
básica no plano redentor de Deus13. A sucessão de alianças mostra o desenvolvimento e 
cumprimento do plano redentivo de Deus, sendo que as diferenças entre as alianças consistem 
em diferentes graus de plenitude e abundância da graça. “Os avanços nas épocas do 
desdobramento da revelação redentiva são ao mesmo tempo avanços na revelação das 
riquezas do pacto da graça” (MURRAY, 2001, p. 51). Isso fica claro quando se observa a 
aliança mosaica e sua relação com as promessas a Abraão. Em Êx 3, já no chamado de Moisés 
Deus se revela no contexto da aliança: “EU SOU o Deus de teu pai, o Deus de Abraão, o Deus 
 
12 Confissão de Fé de Westminster (1646) 
13 Aliança com Adão, Noé, Abraão, Israel, Davi e a nova aliança em Cristo. 
11 
 
 
de Isaque e o Deus de Jacó” (3.6a). De fato, Yahweh retira Israel do Egito por causa da 
aliança e da promessa que fez aos patriarcas. 
 
Falou mais Deus a Moisés e lhe disse: Eu sou o SENHOR. Apareci a Abraão, a 
Isaque e a Jacó como Deus-Todo-Poderoso; mas pelo meu nome, O SENHOR, não 
lhes fui conhecido. Também estabeleci a minha aliança com eles, para dar-lhes a 
terra de Canaã, a terra em que habitaram como peregrinos. Ainda ouvi os gemidos 
dos filhos de Israel, os quais os egípcios escravizam, e me lembrei da minha aliança 
(Êx 6.2-5) 
 
Portanto, pode-se afirmar que a salvação daqueles que viviam na antiga aliança foi tão 
somente pela graça como foi para os que vivem na nova aliança. É assim que o apóstolo Paulo 
argumenta em Romanos 4, usando os exemplos de Abraão e Davi para dizer que ambos foram 
justificados pela fé e não por obras: “Pois que diz a Escritura? Abraão creu em Deus, e isso 
lhe foi imputado para justiça” (Rm 4.3). 
Afirmando isso, não se quer desconsiderar as diferentes administrações do pacto da 
graça no Antigo e do Novo Testamento. De fato, existe também descontinuidade na 
perspectiva da teologia do pacto. 
 
O pacto da graça foi administrado no Antigo Testamento por promessas, profecias, 
sacrifícios, pela circuncisão, pela páscoa e por outros símbolos e ordenanças, todos 
os quais tipificaram o Cristo que havia de vir e eram naquele tempo suficientes para 
edificar os eleitos na fé do Messias prometido, por que tiveram, ainda nesse tempo, a 
plena remissão do pecado e a salvação eterna (Breve Catecismo, Resposta à 
pergunta 34). 
 
No Nova Aliança, depois do advento de Cristo, o pacto da graça é administrado pela 
“pregaçãoda Palavra e na celebração dos sacramentos do Batismo e da Ceia do Senhor; e, 
assim, a graça e a salvação são manifestadas em maior plenitude, evidência e eficácia a todas 
as nações” (Breve Catecismo, Resposta à pergunta 35). 
Toda essa abordagem na teologia do pacto irá refletir na maneira como se enxerga o 
relacionamento do cristão com a lei, pois a aliança é o berço da lei. Entender a lei fora desse 
contexto gracioso de aliança traz grandes prejuízos. 
 
1.2 Apresentação de outros sistemas de teologia 
 
Esse conceito de graça por trás das alianças de Deus é bem estruturado na teologia do 
pacto, que é o sistema teológico que coloca ênfase na continuidade do propósito divino em 
redimir a sua criação desde a queda no Éden até a segunda vinda de Cristo. No entanto, 
12 
 
 
existem sistemas teológicos que organizam os dados bíblicos de forma diferente. Virkler 
(2007) apresenta cinco propostas diferentes de entender como Deus se relaciona com o 
homem. Em sua maioria os sistemas enxergam tanto continuidade como descontinuidade, 
todavia diferem na ênfase que dão a continuidade ou a descontinuidade, como demonstra a 
tabela abaixo: 
 
 
 
Um sistema teológico, ainda que nunca deva se impor sobre o texto sagrado, é 
importante para organizar os dados bíblicos. Ele é “um componente essencial e um 
componente válido no arcabouço hermenêutico. Sem um sistema básico de pensamento, um 
leitor não pode compreender qualquer texto [...]”. (OSBORNE, 2009, p. 350). 
Nesse sentido, a teologia da aliança contrasta com o dispensacionalismo, modelo que 
enfatiza mais a descontinuidade (VIRKLER, 2007, p.92, 99). Há também o sistema 
epigenético14, de unidade orgânica ou que está entre o conceito reformado/dispensacionalista 
e tenta não enfatizar nenhum dos lados (VIRKLER, 2007, p. 102). 
Sobre o dispensacionalismo pode-se dizer que há muita confusão, talvez por causa da 
diversidade entre os próprios dispensacionalistas15. Todavia, o dispensacionalismo está 
fundamentado em pelo menos três questões principais16. Primeiramente, entende que os 
termos “judeu” e “descendência de Abraão” têm os sentidos biológico, político, espiritual e 
 
14 Um dos principais proponentes desse modelo é Walter Kaiser Jr. Ele denomina o sistema com o termo 
epangélico e identifica a promessa como sendo o princípio unificador das Escrituras (KAISER, 2007, p. 23). 
15 Pode-se ver isso, na diferença entre o dispensacionalismo de Charles Ryrie e John Feinberg (2013, p. 74). 
16 Feinberg coloca seis questões principais: sentidos do termo “judeu”; hermenêutica literal; promessas da 
aliança a Israel; futuro diferente para o Israel étnico; a igreja como um organismo distinto; e a filosofia da 
história (2013, p.80). No entanto, apresenta-se aqui apenas três princípios considerados mais relevantes. 
13 
 
 
tipológico17 em ambos os Testamentos, sendo que “nenhum sentido (especialmente o 
espiritual) é mais importante do que qualquer outro, e que nenhum sentido elimina o efeito do 
significado e das implicações de outros sentidos” (FEINBERG, 2013, p. 82). 
O segundo ponto central para o dispensacionalismo é a sua hermenêutica literal. 
Muitos dispensacionalistas criticam os sistemas reformados afirmando que há uma 
incoerência no método de interpretação das Escrituras. Segundo Ryrie (2004, p. 124) muitos 
evangélicos usam o método alegórico “na área da profecia, enquanto preferem utilizar a 
hermenêutica literal ou normal em outras áreas da interpretação”. 
Mais comedido, Feinberg (2013, p.84) não acusa a hermenêutica reformada de não-
literal ou alegórica. Para ele o problema está nos “diferentes entendimentos do que constitui a 
hermenêutica literal”. A grande diferença é que o sistema reformado coloca prioridade no NT 
como normativo para a compreensão do AT (FEINBERG, 2013). 
O terceiro fundamento do dispensacionalismo que o difere dos outros sistemas é a sua 
filosofia da história, ou seja, o elemento ou a meta da história que une os eventos bíblicos que 
ocorrem em épocas e lugares diferentes. Para Feinberg (2013, p. 98), esse é ponto crucial que 
distingue os sistemas de continuidade e descontinuidade: 
 
Quanto mais se enfatiza a história da redenção em contraposição às outras de Deus no 
mundo, mais o sistema se torna de continuidade, porque todos os lados concordam que 
soteriologicamente estão acontecendo as mesmas coisas básicas de um Testamento a outro. 
Por outro lado, quanto mais se enfatiza os aspectos multifacetados do agir de Deus na 
história, mais o sistema se torna descontínuo, porque Deus nem sempre opera com e através 
das mesmas pessoas, nem tem o mesmo programa social e político para cada grupo. 
 
Para o dispensacionalista, o propósito da história é a implementação gradual do reino 
de Deus18. “Uma parte importante dessa implementação envolve salvar pessoas, mas os 
elementos soteriológicos e espirituais não são os únicos aspectos do reino” (FEINBERG, 
2013, p. 98). Enquanto que para a maioria dos aliancistas, o ponto central está na história da 
redenção, ou seja, Deus agindo para chamar um povo para si mesmo19. 
 
17 Sentido politico se refere a nação de Israel. Já o espiritual se aplica a qualquer indivíduo independente de ser 
judeu de nascimento. No sentido tipológico, entende-se que o termo Israel, “embora sendo Israel, pode também 
funcionar como um tipo de igreja” (FEINBERG, 2013 p. 81). 
18 Ryrie propõe que o objetivo da história é escatológico e tem a ver com a implantação do reino de Deus no 
milênio, no qual Deus será glofificado (Dispensacionalismo Hoy, p. 11). 
19 Há todavia alguns teólogos que trabalham com a perspectiva reformada de reino como centro unificador das 
Escrituras. Dentre eles pode-se citar Bruce Waltke e Riderbos. 
14 
 
 
Toda essa diferença em termos de continuidade e descontinuidade irá influenciar a 
maneira como o dispensacionalista trabalha a relação do cristão e a lei, especialmente a lei no 
Antigo Testamento20. 
 
1.3 Metodologia adotada 
 
Os sistemas teológicos apresentados têm aspectos comuns e embora divirjam em 
várias partes, concordam que a revelação é progressiva, que houve mudança expressiva da 
antiga para a nova aliança e que Deus age na história para cumprir os seus planos. Apesar 
disso, a estrutura teológica do pacto se destaca por sua compreensão bíblica e amparo 
histórico. Vale destacar que a ênfase dada à continuidade na teologia do pacto acontece por 
causa da história da redenção, mas não exclui a descontinuidade. Assim falando, a teologia da 
aliança é a base para discutir a relação entre continuidade e descontinuidade da lei na antiga e 
nova aliança21. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
20 Veja uma discussão maior sobre isso no capítulo 3 no tópico Cristo e a Lei. 
21 Escolher um sistema teológico para a leitura das Escrituras não é impor uma estrutura pronta sobre a Bíblia, 
mas é organizer os dados que a própria revelação oferece. De todo modo, esse é um perigo que todo interprete 
deve encarar (VIRKLER, 2007, p. 90). 
15 
 
 
2. A LEI NA ALIANÇA 
 
2.1 A lei “antes da lei” 
 
A lei de Deus é um dos elementos existentes no pacto da criação e no pacto da graça. 
A lei está presente tanto no Antigo como no Novo Testamento, contrariando o conceito 
popular de que uma parte das Escrituras corresponde a lei e outra a graça. É preciso, portanto, 
considerar a relação entre lei e pacto, como afirma Meister (2003, p. 27): “É impossível 
compreender corretamente o que a lei representa dentro da teologia e na prática da vida cristã 
sem compreender como Deus se relaciona pactualmente com seu povo [...]”. 
Já no pacto da criação a lei foi dada a Adão. Entende-se lei como “norma da vida que 
Deus dá ao seu povo [...]” (CHAMBLIN, 2013, p. 220). Essa definição se encaixa bem ao 
contextode Gênesis 2.16-17, onde as primeiras palavras de Deus a humanidade são expressas 
em forma de mandamento. “E o Senhor Deus lhe deu essa ordem: de toda árvore do jardim 
comerás livremente, mas da árvore do conhecimento do bem e do mal não comerás”. Aqui 
fica evidente que a lei estava ligada ao pacto em si, a obediência traria vida (Gn 3.22) e a 
desobediência resultaria em morte (Gn 2.17). Meister (2003) diz que o pacto é o berço da lei e 
a lei é o elo relacional a todos aqueles que participam do pacto. 
A lei não é um evento pós-queda, pelo contrário foi dada desde a criação e não apenas 
o mandamento positivo de não comer da árvore do conhecimento do bem e do mal. Ordens 
como se multiplicar, sujeitar a terra (Gn 1.28), guardar e cuidar do jardim (Gn 2.15) mostram 
o que Deus exigia que Adão e sua posteridade tivessem “uma obediência pessoal, inteira, 
exata e perpétua [...]” (CFW XIX.I). A lei como expressão da vontade de Deus existe antes de 
seu registro no Sinai, nesse sentido já havia lei “antes da lei”. 
 Além de externar a sua vontade, Deus também colocou a lei no coração do homem, 
como uma lei natural, conforme pode ser visto em Rm 2.15. Nesse texto, o apóstolo Paulo 
está trabalhando com dois grupos. De um lado os judeus, que tinham a lei revelada nas 
Escrituras e de outro os gentios, que não tiveram acesso a lei escrita. Todavia, tiveram a lei 
gravada no seu coração e tinham algum tipo de consciência de certo e errado. Paulo deixa 
claro que judeus e gentios têm acesso à lei de Deus “que se aplica a eles mediante um método 
diferente de revelação” (MURRAY, 2003, p. 103). A conclusão nesse trecho é que cada um 
será julgado de acordo com a revelação que recebeu. 
16 
 
 
 A lei natural foi concedida a Adão, que recebeu também a capacidade para cumpri-la 
(CFW IV. II). A conclusão é que Adão já sabia a diferença entre o certo e o errado antes de 
pecar. Contudo, depois da queda toda humanidade ficou com sua consciência cauterizada, 
sendo necessário que Deus lhe desse a lei escrita para revelar o pecado e conduzir a Cristo. 
 
Por isso, porquanto era necessário tanto ao nosso embotamento, quanto à nossa 
contumácia, proveu-nos o Senhor a Lei Escrita, que não só atestasse com certeza 
maior o que era demasiado obscuro na lei natural, mas também, sacudido o torpor, a 
mente e a memória nos ferisse com mais intensa vividez (CALVINO, As Institutas, 
II. 8.1). 
 
 Na relação da lei com o pacto da graça é importante destacar que tanto na antiga como 
na nova aliança a lei de Deus continua sendo “uma perfeita regra de justiça” (CFW XIX.II). 
Entretanto, o que mudou no novo pacto foi a relação que se tem com ela. Por causa da 
desobediência, a humanidade inteira ficou debaixo da maldição do pacto da criação e incapaz 
de obedecer a lei, recebendo apenas condenação. No entanto, o “pacto da graça é a 
manifestação graciosa e misericordiosa de Deus aplicando a maldição do pacto de obras na 
pessoa de seu Filho, Jesus Cristo [..]” (MEISTER, 2003, p. 31). No pacto da graça a lei não 
traz maldição ou condenação, ela funciona como meio de graça para a santificação e piedade 
do crente (KEVEN, 2000, p. 7). 
No período da antiga aliança que é aquela administração do pacto da graça anterior a 
obra de Jesus Cristo, várias palavras se referem à lei, sendo que a mais conhecida delas é 
“torah”, que tem o sentido de instrução, lei, padrão divino de conduta (NITEAT, 2011). Os 
termos como “mitsva” e “huq” também são usados e trazem o sentido de mandamento, 
princípios e instrução. De todo modo, “torah” também é usado com vários sentidos, 
mostrando que a lei de Deus não é apenas um conjunto de normas que devem ser seguidas, 
mas é a própria instrução divina para o bem do homem. 
Pode-se dizer que em todas as alianças no período veterotestamentário houve algum 
tipo de instrução de Deus. Houve assim “lei antes da lei” porque sempre que EU SOU se 
relaciona com o homem em termos de aliança há soberanamente o estabelecimento da forma 
como o homem deve se comportar (MURRAY, 2001). Primeiro com Adão e Eva, como já foi 
analisado, Deus havia dado vários mandamentos no Éden que são conhecidos como mandatos 
cultural e social da criação. 
Esses mandatos continuaram depois da queda, pois Deus, na aliança com Noé, repete 
os mesmos termos do início, mostrando a validade de sua instrução para todos os homens de 
todas as eras. Deus estabelece aliança com Adão e com Noé, ambos possuindo a Imago Dei 
17 
 
 
(Gn 1.26; 9.6)22. Os paralelos entre as narrativas são encontrados em relação a ser fecundo e 
multiplicar sobre a terra (Gn.1.28; 9.1), também a sujeitar e dominar a terra (1.28; 9.2). 
Até mesmo a aliança com Abraão é estabelecida com algumas leis de Deus, revelando 
a vontade de Yahweh aqueles que se relacionam com Ele. Desde a chamada de Abrão em 
Gênesis 12 pode ser visto o Senhor mostrando as condições da sua aliança, que no caso era 
sair de casa do meio de seus parentes e ir para uma terra a qual ele não conhecia. A eleição 
soberana sobre o patriarca exigia dele o abandono das cultos estranhos que eram praticados 
em sua terra natal por seus familiares. “A fé demanda um abandono irrestrito do passado. 
Abraão tem de deixar para bem atrás a consolação de familiares e tradição”. (WALTKE, 
2015, p. 252). 
O capítulo 17 de Gênesis também é ponto fundamental para identificar as ordens que 
Abraão recebeu do Senhor e concluir que a aliança Abraâmica, assim como as outras alianças, 
também tinha suas exigências que deveriam ser obedecidas. A ordem de Deus foi para que o 
patriarca andasse na presença de Deus Todo-Poderoso e fosse perfeito (Gn 17.1). Além do 
estabelecimento da circuncisão com a ordem: “Guardarás a minha aliança tu e a tua 
descendência” (Gn 17.9). 
 
2.2 A lei de Moisés 
 
Depois da aliança com Abraão, as Escrituras revelam a Aliança no Sinai e o 
estabelecimento da lei de Moisés. Provavelmente foi a primeira vez que a vontade de Deus foi 
expressa de maneira escrita, primeiro com as dez palavras ou mandamentos, depois com o 
restante da lei registrada no Pentateuco23. 
A lei de Moisés é bem abrangente, podendo se referir a todo Pentateuco como 
também, em outras ocasiões, aos dez mandamentos. No geral, é composta pelo conjunto de 
leis e instruções dadas ao povo de Israel durante a peregrinação pelo deserto e antes da 
entrada na terra prometida. Apesar da definição como “lei de Moisés”, ela é a expressão da 
vontade de Deus. Foi o próprio Yahweh quem deu a lei ao povo. A lei pertence a Ele, a lei é 
de Deus. Os mandamentos, estatutos dados primeiramente a Israel expressam o cuidado de 
 
22 A imagem e semelhança não foi perdido com a queda. Ela se desfigurou, é uma imagem limitada por causa do 
pecado, mas o homem tem seu valor único porque foi criado à imagem e semelhança de Deus, nenhuma outra 
criatura tem esse privilégio. 
23 Há a chamada fórmula Toledoth, que pode dar a entender fontes pré-mosaícas no livro de Gênesis, sendo 
assim, Moisés teria sido o editor do livro. Veja mais dessa discussão em DILLARD; LONGMAN III, 2006, p. 
38-48. 
18 
 
 
Deus e têm o propósito de ensinar o povo da aliança a se relacionar com Deus e consigo 
mesmo (VANGEREMEREN, 2003, p. 30). 
Ao estabelecer a lei de Moisés, Yahweh estava dando continuidade ao plano de 
redenção e não criando dois tipos de promessa diferentes24. Portanto, a lei sempre deve ser 
analisada nesse ambiente de graça, libertação e redenção. “Está de acordo com isso o fato de 
que a Lei é representada no Antigo Testamento não como um fardo e um julgo que mais tarde 
vieram a ser a experiência religiosa dos judeus, mas como uma das maiores bênçãos e 
distinções que Yahweh havia conferido ao seu povo [Dt 4.7,8; Sl 147.19-20; cf. Mesmo em 
Paulo, Rm 9.4-5]” (VOS, 2010, p. 161). 
Por isso, dentre as partes mais importantes do Pentateuco, está o chamado Livroda 
Aliança (Êx 19-24) que contém os preparativos para a aliança (19.1-25); as leis da aliança 
(21.1-23.33); e a conclusão ou ratificação da aliança (24.1-18). (WALTKE, 2013)25. 
No livro da aliança encontram-se os dez mandamentos ou dez palavras, consideradas o 
resumo da lei moral de Deus. Elas são a constituição básica de Israel em três sentidos. 
Primeiro, como um lembrete constante da redenção, depois como deve ser o relacionamento 
com Deus e com o próximo e em terceiro lugar, o Decálogo é a base para todos os outros 
códigos legais (VANGEMEREN, 2003, p. 31). 
Os dez mandamentos se diferenciam das outras leis pois além da forma no imperativo, 
são classificadas como apodícticas, ou seja, “determinações permanentes, proibições ou 
ordens. Em contraste com isso, leis casuísticas (leis criadas por precedência) fazem aplicações 
específicas da lei sob circunstâncias restritas” (VANGEMEREN, 2003, p. 31). É também a 
partir dessa estrutura que a teologia reformada em geral identifica a lei em três aspectos no 
AT: cerimonial, civil e moral26. 
 
Além dessa lei, geralmente chamada lei moral, quis Deus dar ao seu povo Israel, 
considerado uma igreja sobre sua tutela, leis cerimoniais que contém diversas 
ordenanças típicas. Essas leis – que em parte se referem ao culto e prefiguram 
Cristo, suas graças, seus atos, seus sofrimentos e seus benefícios, e em parte 
representam várias instruções de deveres morais – estão todas abolidas sob o Novo 
Testamento (CFW XIX.III). 
 
 
24 Existem os que entendem que há dois tipos de aliança no AT, uma incondicional com Abraão e outra 
condicional com Israel. Contudo vê-se que a aliança com a nação é a continuação da promessa a Abraão. 
25 Alguns autores limitam o “Livro da Aliança” a parte das leis causuísticas (Êx 20.23-23.19). Ver KRUSE, 
p.910; DILLARD; LONGMAN III. p.68; Contudo a estrutura literária em Êxodo demonstra que “as leis 
casuísticas são apenas uma parte do todo e estão integralmente relacionadas ao que é registrado antes e depois 
que Deus Yahweh deu verbalmente a Moisés as leis aplicadas (Êx 20.22; 21.1; 24.3)” (GRONINGEN, p.380). 
26 A tradição reformada segue Calvino (As Institutas, IV. 20.14-15). 
19 
 
 
A esse mesmo povo, considerado como um corpo político, Deus concedeu diversas 
leis judiciais que deixaram de vigorar quando o país daquele povo também deixou 
de existir, e que agora não obrigam a ninguém além do que exige a sua equidade 
geral (CFW XIX.IV). 
 
Uma das críticas que esta classificação recebe é o fato que a Escritura não faz essa 
separação e que isso é forçar os textos bíblicos (KAISER, 2003). Entretanto, isso não quer 
dizer necessariamente que a diferenciação não exista. Uma série de termos cunhados pela 
teologia sistemática também não aparecem nas Escrituras, contudo fazem jus ao ensino 
bíblico. Exemplo disso é a Trindade (KAISER, 2003, p. 204). A pergunta necessária é se essa 
categorização da lei é correta ou não? Ela demonstra a realidade dos textos bíblicos? É uma 
categoria imposta pela teologia sistemática ou tem apoio da teologia bíblica? 
Essa estrutura que entende a lei em suas dimensões é fundamental no conceito 
reformado, mas outros grupos de teólogos discordam27, afirmando que a lei não pode ser 
dividida dessa maneira. De fato, não é fácil separar a lei em categorias, visto que o aspecto 
moral da lei está entrelaçado às leis civis e cerimoniais (VANGEMEREN, 2003 p. 32). 
Teólogos reformados como confessam que essa distinção em aspectos “pode ser 
desorientadora porque tanto o AT como o NT normalmente usam o termo “lei” para falar da 
lei mosaica como um todo em vez de um aspecto particular [...]” (CHAMBLIN, 2013, p. 
221). 
Um dos erros comuns ao se lidar com a lei é tratá-la como uma unidade indivisível. A 
implicação disso é que “se alguém concorda que Cristo colocou de lado a lei cerimonial por 
meio de sua morte e ressureição substitutivas, então consequentemente os cristãos são 
desculpados de toda a lei, visto que ela é uma unidade indivisível” (KAISER, 2003, p. 203). 
O que se diz é que “o cristão não está mais obrigado à lei mosaica; Cristo realizou seu 
cumprimento. Mas o cristão está obrigado à “lei de Deus” [...]. “Lei de Deus” não é, 
entretanto, a lei mosaica, mas a lei de Cristo”. (MOO, 2013, p. 265). 
O pressuposto desse argumento de descontinuidade é que não se pode separar os 
aspectos moral, cerimonial e civil da lei mosaica. Sendo assim, toda lei mosaica foi cumprida 
em Cristo, que estabelece uma nova lei. Contudo, deve-se rejeitar esse pressuposto porque 
apesar da lei ser vista como um todo em ambos os Testamentos, é possível identificar os 
diferentes aspectos e, com base na própria análise de Jesus sobre a lei, destacar a importância 
do aspecto moral em relação ao que é cerimonial e civil. 
 
27 Ver perspectivas diferentes em FEINBERG, John S. Continuidade e Descontinuidade. São Paulo: Hagnos, 
2013. Kaiser (…) estudioso do AT também entende que a lei pode ser vista em aspectos morais, cerimoniais e 
civis. 
20 
 
 
Jesus fez uma diferenciação quanto a isso em Mt 23.23. No texto Jesus destaca que 
existem “preceitos mais importantes”. O contexto mostra os escribas e fariseus se 
empenhando para cumprir a lei dos dízimos, indo até mesmo além do que era exigido na lei 
de Deus em Lv 27.30-33, mas deixando de cumprir a justiça, a misericórdia e a fidelidade, 
expressões de amor ao próximo (HENDRIKSEN, 2001, p. 463). O importante na passagem é 
que Jesus considerou que havia preceitos mais importantes dentro da lei (Mt 23.23). 
Outra passagem pertinente se encontra em Marcos capítulo 7. Jesus condenou os 
escribas e fariseus porque negligenciaram o mandamento de Deus e seguindo a tradição dos 
homens (7.8). No verso 19, Jesus considerou todos os alimentos puros, fazendo uma alteração 
na lei mosaica em relação aos alimentos, descrita por exemplo, em Levítico 11. Ao analisar o 
comentário de Jesus à luz do texto do Pentateuco, pode-se ver o aspecto moral junto com o 
civil se sobressair, já que a “distinção entre animais “puros” e “impuros” lembrava Israel que 
Deus o havia separado de outras nações para ser sua nação santa” (CHAMBLIN, 2013, p. 
236). 
 
Somente os membros normais de cada esfera da criação, p.ex., peixes com 
barbatanas, eram considerados puros. Essa definição, que identificou os membros 
“perfeitos” do reino animal com pureza, serviu para lembrar que Deus buscava 
perfeição moral em seu povo. Pássaros comedores de carniça e animais carnívoros 
eram impuros porque também tipificavam os instintos pecaminosos, destrutivos e 
assassinos do homem (apud:WENHAM, Leviticus, p. 184). 
 
Na nova ordem que Jesus veio estabelecer, não há mais a necessidade de diferenciação 
pelos alimentos, pois o que contamina o homem é o que está dentro dele (Mc 7.20-21). O 
povo de Deus continua tendo que viver de maneira santa (aspecto moral), mostrando que a 
diferença para os que não obedecem ao Senhor está primeiramente em um coração 
transformado. 
Tendo em vista que Jesus fez algum tipo de distinção entre os preceitos mais 
importantes, isto é, o que é moral e o que era restrito à nação de Israel no período da antiga 
aliança valida a distinção comum na teologia reformada quanto as dimensões civil, cerimonial 
e moral da lei mosaica. 
 
A argumentação a favor de uma lei monolítica que refuta o reconhecimento da 
classificação dada por Jesus à lei moral, colocando-a acima de todas as outras leis 
como a lei que tinha maior peso, significado e importância, precisa agora ser 
descartada. Aliás, a afirmação de que a lei do Senhor, em todas as suas partes, 
cessou de ser válida agora em virtude do cumprimento perfeito realizado por Cristo 
da parte cerimonial da lei (do que curiosamente é chamado de lei indivisível) 
também precisa ser abandonada em vista do ensino de Moisés, Jesus e Paulo 
(KAISER, 2003,p.214). 
21 
 
 
Evidências textuais mostram portanto que é possível analisar a lei em seus sentidos 
morais, civis e cerimoniais. É o caso dos Dez Mandamentos que são considerados o resumo 
da lei moral de Deus (MEISTER, 2003, p. 42). Apresenta-se aqui, mas não de forma 
exaustiva, pelo menos três razões para isso. A primeira é que o Decálogo assume significativa 
importância por ser revelado no contexto pactual do Monte Sinai (WALTKE, 2015, p. 465). 
A segunda se dá porque os Dez Mandamentos contém uma forma de lei apodítica (Êx 20.1-
17), ou seja, as que são absolutamente necessários. Apresentação posterior em 20.18-23.33 é 
apenas uma aplicação das Dez Palavras a diversas situações da vida (WALTKE, 2015)28. E 
por último, eles são especiais porque foram dadas diretamente por Deus, Ele mesmo escreveu 
(Êx 32.16; 34.1), enquanto todos os outros mandamentos foram entregues por mediação de 
Moisés (WALTKE, 2015, p. 465-466). 
As Dez Palavras, mesmo tendo sido dadas a Israel, contém princípios teológicos 
anteriores à revelação no Sinai, bem como princípios aplicados em várias partes do Novo 
Testamento. Essa percepção faz com que seja possível afirmar que o Decálogo seja o resumo 
da lei moral de Deus e pode ser aplicado a pessoas de todas as épocas, culturas e lugares 
diferentes, sem perder de vista o fator progressivo da revelação. Köstenberger e Patterson 
(2015, p. 163) fornecem um auxílio valioso na tabela abaixo: 
 
3.1. OS DEZ MANDAMENTOS E OS PRINCÍPIOS A ELES SUBJACENTES 
MANDAMENTOS PRINCÍPIOS 
ÊXODO DEUTERONÔMIO PRÉ-SINAI NOVO TESTAMENTO 
Êx 20.2-6 Dt 5.7 Gn 17.1; Êx 3.14 At 14.10-15; 1 Co 8.4 
Êx 20.4-6 Dt 8-10 Gn 35.3-4 2 Co 6.16; 1 Jo 5.20-21 
Êx 20.7 Dt 5.11 Gn 24.3 Mt 6.5-13 
Êx 20.8-11 Dt 5.12-13 Gn 2.2-3 1 Co 16.2 
Êx 20.12 Dt 5.16 Gn 46.29; 50.1-5 Mt 19.18; Ef 6.1-3 
Êx 20.13 Dt 5.17 Gn 4.6-12, 15; 9.5,6 Mt 19.19; Rm 13.9 
Êx 20.14 Dt 5.18 Gn 39.9 Mt 19.18; Rm 13.9 
Êx 20.15 Dt 5.19 Gn 27.36; 31.7 Mt 19.18; Rm 13.9; Ef 4.28 
Êx 20.16 Dt 5.20 Gn 39.16-18 Mt 19.18; Rm 13.9; Tg 4.11-12 
Êx 20.17 Dt 5.21 Gn 26.10 Rm 7.7; 13.9,10 
 
28 Concordando com isso, Kaiser (2003, p. 213) afirma: “Os aspectos restantes das leis de Moisés sejam civis ou 
cerimoniais, não são nada mais do que ilustrações, aplicações ou implementações voltadas para situações 
específicas daquela mesma lei moral e permanente”. 
22 
 
 
A aplicação do aspecto moral da lei para todas épocas e pessoas diferentes tem sua 
raiz na origem da lei como expressão da vontade eterna e imutável de Deus. Calvino (IV. 
20.15) explica que o resumo da lei, a regra da justiça que Deus requer, é que Ele seja cultuado 
por todos os homens e que os homens amem uns aos outros. Corretamente isso reflete a fala 
de Jesus em Mateus 22.36-40. 
 
2.3 Aspectos civil e cerimonial da lei 
 
 Para uma análise mais concreta, deve-se entender os aspectos civil e cerimonial da lei 
primeiro na administração do pacto da graça e depois na Nova Aliança. Como já foi dito, a lei 
deve ser vista como um todo, considerando que ela é uma unidade, mesmo que seja possível 
identificar vários aspectos do todo. 
 
 
O sistema legal que Israel recebeu do Senhor é bem variado, abrangendo não apenas o 
culto e sacrifícios, mas também costumes do dia a dia, regras sociais de convivência e punição 
a quem não obedecesse. De modo que Israel deveria refletir a santidade do seu Deus, como de 
fato registrou Moisés: “Santos sereis, porque eu, o Senhor, vosso Deus, sou santo” (Lv 19.2). 
Essas leis estão diretamente relacionadas à teocracia implantada por Deus na nação de Israel. 
Isso pode ser exemplificado no chamado Livro da Aliança em Êxodo 20-23. Após os 
Dez Mandamentos tem-se leis acerca dos altares (20.22-26), leis sobre o relacionamento de 
escravos e senhores (21.1-11), leis de convívio geral na sociedade, envolvendo casos de 
violência, propriedade, vingança, relacionamentos sexuais ilícitos e respeito a autoridade do 
príncipe (21.1- 22.28). Misturadas a elas, estavam obrigações religiosas (22.29-31). Esses 
textos e outros são mais do que suficientes para mostrar que a religião no AT estava 
23 
 
 
plenamente ligada a conduta social que Yahweh exigia e não apenas nas obrigações 
cerimoniais de culto e sacrifício. 
Além das leis civis ligadas à santidade do povo, Deus instituiu as leis cerimoniais e 
civis da antiga aliança que regiam como seria o relacionamento entre o povo e Yahweh. Em 
geral, essas leis se desenvolvem em três linhas principais: lugar, pessoas, objetos e ocasiões 
sagradas; sistema sacrificial; e leis relacionadas a pureza e impureza29. 
 
2.3.1 Lugar, objetos, pessoas e períodos sagrados 
 
O lugar onde Deus está é considerado santo. Moisés teve essa experiência quando o 
EU SOU se revelou a ele no monte Sinai. “Deus continuou: Não te chegues para cá; tira as 
sandálias dos pés, porque o lugar em que estás é terra santa” (Êx 3.5). Após o êxodo no Egito 
Moisés subia ao cume do monte para encontrar-se com Deus, mas com a chegada da lei, Deus 
anunciou que Ele mesmo desceria para habitar permanentemente com o povo que escolhera 
(Êx 25.8). O próprio nome em si demonstra essa ideia. A palavra hebraica é mishkan significa 
tenda, lugar de habitação30. “O tabernáculo, então, representava não meramente de maneira 
simbólica a habitação de Deus em Israel; mas, na verdade, ele a continha” (VOS, 2010, p. 
190). 
O livro de Êxodo 25-40 apresenta as normas e tudo quanto Deus exigiu para o 
tabernáculo. Mais tarde, o templo também foi construído seguindo a instrução divina. Davi 
entregou a Salomão “as plantas de tudo o que o Espírito havia posto em seu coração acerca 
dos pátios do templo do Senhor e de todas as salas ao redor, acerca dos depósitos dos tesouros 
do templo de Deus e dos depósitos das dádivas sagradas” (1 Cr 28.12). 
 Além do lugar sagrado, havia as pessoas sagradas. Esse grupo era composto por 
levitas e principalmente sacerdotes, que tinham o papel de mediadores entre Deus e o povo. 
Os sacerdotes tinham duas funções principais, eram tanto os mestres que ensinavam a lei de 
Deus ao povo da aliança (Lv 10.10-11), como a equipe sagrada responsável pela liturgia, 
pelos sacrifícios e pelo tabernáculo em si. Eles precisavam estar sempre consagrados a Deus, 
seguindo exigências específicas (Êx 30.17-21; Lv 21). 
 
O tabernáculo tornou-se um lugar sagrado, uma extensão do céu na terra e seus 
oficiantes eram seus servos especiais, os representados do Senhor que tornavam 
 
29 Com algumas adaptações, esta estrutura é proposta por Vos em Teologia Bíblica (2010). Ver ainda MERRILL 
(2009) e WALTKE (2015) que trabalham com ideias parecidas. 
30 VOS, 2010, p. 184. 
24 
 
 
possível o contato fundamental e vivo entre o Deus santo e seu povo que ia oferecer 
adoração e louvor a ele em seu lugar sagrado (MERRILL, 2009, p. 355). 
 
Dentro do tabernáculo todos os objetos eram consagrados a Deus com óleo aromático. 
Cada utensílio tinha um valor simbólico “exemplificando grandes realidades teológicas cuja 
total relevância não podia ser entendida na época [...]” (MERRIL, 2009, p. 345). Dentre as 
principais peças estão: a arca da aliança que ficava no santo dos santos. Separado por um véu, 
no lugar santo havia a mesa dos pães, o candelabro e o altar de incenso. No pátio externo do 
tabernáculo, havia o altar de oferta queimada e a bacia de bronze usada na purificação dos 
sacerdotes. 
A lei também previa tempos e períodos sagrados pois apesar que Deus sempre estava 
presente com Israel, primeiro no tabernáculo e depois no templo, em ocasiões especiais 
Yahweh se encontrava com seu povo de maneira distinta (WALTKE, 2015, p. 519). Nota-se 
isso nas festas especiais (Êx 34.23; Dt 31.11) e em outras ocasiões específicas que que Deus 
descia em forma de nuvem para se encontrar com o povo (Nm 11.17, 25; 12.5). 
 Na antigaaliança, as principais ocasiões sagradas podem ser identificadas em festas, 
dias e anos. O material relacionado às festas no Pentateuco é vasto e variado e algumas festas 
podem estar interligadas ou ter o mesmo nome, como parece ser o caso da Páscoa e a Festa 
dos Pães Asmos (Dt 16.1, 16). 
Seguindo a lista de Deuteronômio, sem ser exaustivo, pode-se identificar três festas 
principais: Páscoa (Dt 16.1-8), Festa das Semanas (16.9-12) e Festa dos Tabernáculos (16.13-
15). O objetivo dessas festas era ajudar a “comunidade da aliança a se lembrar dos grandes 
acontecimentos do passado e, além disso, de uma forma difícil de descrever, reproduzem 
esses acontecimentos ou fazem com que mais uma vez se tornem reais para as gerações 
posteriores (WALTKE, 2015, p. 520). 
Sobre dias, além do sábado que será tratado separadamente31, merece destaque o Dia 
da Expiação. Esse era um dia de sábado especial que ocorria uma vez por ano para expiação 
dos pecados dos sacerdotes e do povo, a cerimônia também servirá de purificação do 
santuário, da tenda da congregação e do altar (Lv 16.33). Era um dia de santa convocação 
(Nm 29.7) marcado por aflição da alma com punição de morte para quem não participasse (Lv 
23.29). 
Para encerrar essa análise sobre os períodos sagrados tem-se ainda o ano sabático, 
celebrado uma vez a cada sete anos. Nesse ano o povo deveria dar descanso a terra e em vez 
 
31 Veja Capítulo IV. 
25 
 
 
de plantar, deveria confiar que Yahweh o supriria, abençoando para que a colheita do sexto 
ano dê fruto por três anos (Lv 25.21-22). Havia também o ano do jubileu, que acontecia a 
cada cinquenta anos. Nesse ano especial da mesma forma como o Senhor perdoa o pecado do 
povo no Dia da Expiação, o povo, principalmente os ricos, deveria perdoar aqueles que eram 
escravos para pagar as suas dívidas (Lv 25.10). O ano do Jubileu mostra que a terra pertence 
a Deus “e o povo é apenas forasteiro e arrendatário que vive temporariamente na terra e a 
cultiva em nome dele” (MERRILL, 2009, p. 364). 
 
2.3.2 Sistema sacrificial 
 
A segunda linha geral das leis cerimoniais podem ser vistas nos sacrifícios e ofertas. 
As ofertas podem ser agrupadas em voluntárias e obrigatórias. No primeiro grupo estão 
holocaustos, manjares ou ofertas vegetais e ofertas pacíficas. Sacrifícios pelo pecado e de 
culpa eram obrigatórios. (SANTOS, p. 64). 
O que distingue o sacrifício de qualquer outro ato sagrado é que a substancia é 
colocada em parte ou toda ela sobre o altar. Sem o altar não há sacrifício, pois este é a 
habitação de Deus. Isto é, Yahweh consome o sacrifício. “A Lei expressa, em linguagem 
antropomórfica, o princípio de assimilação do sacrifício por Yahweh, quando ela fala disso 
como “alimento para Yahweh” ou como concedendo “uma [oferta] queimada de aroma 
agradável a Yahweh” (VOS, 2010, p. 195). 
Portanto, o sacrifício é considerado uma dádiva para Yahweh e por isso deve ser puro, 
no entanto, nem tudo que é puro é permitido no sacrifício. Dentre os animais, apenas bois, 
ovelhas, bodes e pombas eram permitidos e dentre os vegetais, apenas milho, vinho e óleo 
eram aceitos. “O princípio expresso nesse seleção é duplo. O sacrifício deve ser trazido 
daquilo que constitui o sustento da vida do ofertante, e daquilo que forma o produto de sua 
vida [...], eles caracterizam sacrifício como dádiva da vida a Deus” (VOS, 2010, p. 196). 
 Um cuidado e preciso quando se diz que o sacrifício é uma dádiva da vida a Deus. 
Não se tem em mente os sacrifícios pagãos em que presentes são oferecidos às divindades 
como uma transferência de valor, um presente cuja divindade não tem, mas no sentido de que 
o ofertante entrega “de volta para Deus aquilo que Deus primeiramente dera para ele como 
um meio de graça” (VOS, 2010, p. 196). Deus exige sacrifício de coisas essenciais para a vida 
de uma sociedade agrícola, contudo são coisas que Ele mesmo concede ao povo. 
26 
 
 
 Ao longo do Pentateuco, principalmente em Levítico tem-se as principais instruções 
quanto ao que Deus espera do povo em relação as ofertas. Waltke (2015, p. 521) traz a 
informação de que no hebraico existem 11 palavras diferentes para o que é comumente 
traduzido como “oferta”, “sacrifício” e “holocausto”. 
 Os sete primeiros capítulos de levítico mostram os cinco principais tipos de sacrifícios 
do culto no Tabernáculo. São eles: holocaustos, manjares, sacrifícios pacíficos, sacrifícios 
pelo pecado, sacrifícios pela culpa (SANTOS, p. 64). Com alguma diferença, pode-se 
classificar: ofertas pelo pecado; pelas transgressão; ofertas queimada; ofertas pacifica, que 
podem ser ofertas de louvor e gratidão, ofertas por voto e ofertas voluntárias; por fim, ofertas 
de vegetais, com a ideia de consagração.32 
 Esse complexo manual de sacrifícios tinha o propósito de ser o meio pelo qual o povo 
poderia continuar a ter comunhão com Deus. Por isso, o sentido principal dos “sacrifícios, 
ofertas e, na verdade, toda atividade religiosa não tinham valor redentor nem restaurador se 
fossem apenas pro forma. Esses atos para ter eficácia deviam brotar de um espírito 
verdadeiramente arrependido e da pura devoção” (MERRILL, 2009, p. 379). 
 
2.3.3 Leis de pureza e impureza 
 
O princípio por trás de todas as leis relacionadas a pureza e impureza é que Israel era 
uma sociedade teocrática. Sendo governada por Deus, a nação deveria expressar os padrões 
do reino de Deus na terra, ainda que de modo simbólico nas leis referentes a animais e atos 
que eram considerados impuros. 
Pode-se encontrar a descrição dessas leis em Levítico 11-15 e em algumas partes de 
Deuteronômio, especialmente no segundo discurso de Moisés no capítulo 14. É importante 
entender que a “palavra hebraica tahor (tradicionalmente traduzida por “limpo”) indica pureza 
ritual. Puro/”limpo” não se refere a higiene, mas indica o oposto do que é misturado ou 
mestiço” WALTKE, 2015, p. 526). 
 Desse modo, é incorreto inferir que estas leis tinham um propósito de higiene (VOS, 
2010, p. 213). A regulação com o que é puro e impuro tem a ver com a santidade exigida da 
 
32 Oferta pelo pecado e oferta de culpa são basicamente consideradas a mesma oferta. Oferta de manjares é o 
mesmo que ofertas vegetais. A única diferença mesmo está em relação as ofertas pela transgressão, que envolve 
o pagamento não apenas do pecado, mas o pagamento pela obediência não dada a Deus. Esta oferta tem especial 
importância com o sacrifício de Cristo (VOS, 2010). 
27 
 
 
comunidade teocrática e da distância com que o povo se relaciona com Deus. Assim, como se 
expressa Waltke na tabela abaixo:33 
 
 
Menos santo 
 
Mais santo 
 
Santíssimo 
 
Território 
 
Jerusalém 
 
Lugar Santíssimo 
 
Gentios Israel 
 
Sacerdote 
 
Todos os animais Animais puros Melhores animais 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
33 WALTKE, 2015, p. 527. 
28 
 
 
3. A LEI NA NOVA ALIANÇA 
 
Entende-se a Nova Aliança como aquela administração do pacto da graça depois da 
vinda de Cristo, instituída pelo próprio Senhor. No final de seu ministério Jesus reuniu os 
discípulos e celebrou a ceia, mandando que os discípulos bebessem o cálice, pois este é “o 
meu sangue, o sangue da nova aliança, derramado em favor de muitos, para remissão de 
pecados” (Mt 26.28). 
Com sua vida e obra Jesus interliga a história da redenção no Antigo e no Novo 
Testamento, antiga e nova aliança, judeus e gentios. “Cristo, portanto, é o ponto decisivo dos 
tempos, a cruz é o ponto focal da história do mundo. Primeiro, tudo foi conduzido na direção 
da cruz; subsequentemente, tudo foi inferido da cruz” (BAVINCK, 2012, p. 229). 
O advento do Messias fez com que a relação de Deus com seu povo fosse alterada para 
um estágio superior em relação a antiga administração. O pacto da graça progrediupara uma 
administração mais elevada, mais graciosa e mais exaltada. Isso não quer dizer que o tempo 
no Antigo Testamento foi ruim e não serviu aos propósitos de Deus. “Nada no Antigo 
Testamento foi perdido no Novo, mas tudo é cumprido, amadurecido, alcança seu pleno 
desenvolvimento e, agora, fora da casca temporária, produz o miolo eterno” (BAVINCK, 
2012, p. 230). 
A lei nesse novo estágio deve ser vista a partir da constatação de que a encarnação de 
Cristo alteraria para sempre a relação de Deus com seu povo. Mas o que isso quer dizer? Há 
uma nova lei na nova aliança? A lei foi abolida por Cristo ou Ele apenas a alterou em forma? 
Como os apóstolos aplicaram a lei à igreja? A primeira questão pode ser respondida no texto 
de Jeremias 31.31-34. Já as outras duas, serão tratadas mais adiante com uma análise na 
relação de Cristo e de Paulo com a lei. 
No texto de Jeremias 31.31-34 a nova aliança é firmada com a casa de Israel e Judá34 
em que Yahweh diz abertamente: “Na mente, lhes imprimirei as minhas leis, também no 
 
34 Entende-se aqui uma visão de Israel e Judá não apenas como descendentes carnais, embora não os exclua, mas 
como uma “representação tipológica do povo eleito de Deus” (ROBERTSON, 2011, p.230). Waltke também 
afirma que apesar do profeta Jeremias ter em mente os descendentes físicos de Abraão, “os apóstolos 
reinterpretaram Israel como igreja, a qual, mediante o batismo em Cristo, a verdadeira semente de Abraão, inclui 
judeus e gentios (Ef 2.11-22; Gl 3.29; 6.15; 1Pe 2.9, 10 [Cf. com Êx 19.6; Dt 7.6])” (WALTKE, 2015, p. 494). A 
abordagem dispensacionalista é diferente, entende Israel e Judá como os descendentes físicos da promessa a 
Abraão, ainda que não neguem que Jesus inaugurou a nova aliança também para os gentios. Ver também: Merrill 
(2009, p. 512-513). 
 
29 
 
 
coração lhas inscreverei”. O paralelismo hebraico é claro nesse trecho e pode ser visto do 
seguinte modo: 
 
1A - Na mente, lhes imprimirei as minhas leis 
1B - também no coração lhas [as minhas leis] inscreverei 
 
O que pode-se entender por “minhas leis”? Primeiramente, que a nova aliança não será 
sem lei. Deus continuará a instruir seu povo por meio da lei. Esse já é um ponto não 
observado por adeptos ao antinomismo. O novo pacto não é indiferente à lei. “Seu contraste 
com o velho não é porque o velho tinha lei e o novo não. A superioridade do novo não 
consiste na ab-rogação da lei, mas que ela vem a ter uma relação mais íntima conosco e um 
cumprimento mais efetivo em nós” (MURRAY, 2001 p. 47-48). 
Essa relação mais íntima se dá porque enquanto na antiga aliança a lei foi escrita em 
tábuas de pedra (Êx 32.16; 34.1), na nova, será escrita no coração do povo (Jr 31.33). Essa 
diferenciação entre uma realidade externa e interna deve ser cautelosa, pois outrora também 
era esperada uma mudança no coração do povo da aliança, inclusive a lei deveria estar 
guardada internamente (Dt 6.6; 10.12, 16; 11.18; 30.6, 14). “Entretanto, somente na nova 
aliança torna-se assegurada a inscrição da lei, pelo próprio Deus, no coração” (ROBERTSON, 
2011, p. 233). 
 Até agora percebe-se uma mudança no aspecto interior, mas não em essência, pois o 
conteúdo é o mesmo de antes. O que é inscrito no coração na nova aliança é a mesma lei de 
Deus, são os mandamentos morais que encontram-se representados nos Dez Mandamentos. 
Tanto é assim, que Jeremias parece fazer relação com a ocasião da entrega da lei no Sinai. 
Portanto, pode-se resumir que o novo concerto como descrita em Jeremias 31.31-34 
“implicará não em nova lei, mas em nova e mais pessoal administração da antiga lei 
(mosaica)” (CHAMBLIN, 2013, p. 226). 
 
3.1 Cristo e a lei 
 
 Algumas atitudes e declarações de Jesus parecem ser contraditórias na sua relação com 
a lei. Se por um lado, afirmou que não veio para revogar a lei ou os profetas (Mt 5.17), por 
outro parece ter abolido a lei de alimentos puros e impuros (Mc 7.19). Como Jesus se 
relacionou com a lei? 
30 
 
 
Não há unanimidade a respeito disso, visto que algumas tradições acreditam que Jesus 
cumpriu a lei, abolindo-a para os crentes. Já outra tradição afirma que o cumprimento da lei 
por Cristo significou a libertação da maldição da lei, mas não a anulação da mesma tendo em 
vista a vida de justiça que o crente deve ter (HOLWERDA, 2006). 
Certamente uma análise nos textos bíblicos mostra que a chegada da nova aliança com 
o ministério de Cristo alterou consideravelmente a relação da lei com o crente. Chamblin 
(2013, p.221) argumenta que a vinda de Cristo alterou a lei em sua forma ou modelo, mas não 
em essência. Existe certa descontinuidade ocasionada pela vinda de Cristo, contudo isso 
ocorre em uma estrutura de continuidade. A análise de Jeremias 31.31-34 apoia esse fato, pois 
a lei continua sendo a mesma lei de Deus, agora em uma nova aliança. 
Primeiramente, Jesus enfatizou que o Antigo Testamento era Palavra de Deus, 
considerando a lei como regra de vida à qual ele mesmo se sujeitou. Nota-se que Jesus foi 
circuncidado ao oitavo dia como previa a lei (Gn 17.11-12; Lv 12.3). Em seguida, depois de 
Maria cumprir os trinta e três dias de purificação (Lv 12.4), levou Jesus para ser consagrado 
no templo em Jerusalém. O evangelho de Lucas é o único a registrar esse fato, fazendo 
questão de ressaltar que tudo ali ocorreu “conforme o que está escrito na lei do Senhor” (Lc 
2.23-24). 
Outra evidência de que Jesus se sujeitou à lei são as participações nas festas da Páscoa. 
Por mais de uma vez, é relatado Jesus indo para Jerusalém participar desse evento religioso de 
Israel. Lucas relata o episódio em que Jesus fica no templo conversando com os doutores da 
lei justamente no período da Páscoa. Lucas é enfático: “Ora, anualmente iam seus pais a 
Jerusalém, para a Festa da Páscoa” (Lc 2.41). Durante seu ministério, Jesus participou de 
várias festas religiosas. Dentre elas, a Páscoa, mais de uma vez (Jo 2.13-22; 13.1), uma festa 
dos judeus (Jo 5.1) e a Festa dos Tabernáculos (Jo 7.2, 8, 10) (KOSTENBERGER; 
PATTERSON, 2015, p. 106). 
Jesus não veio para revogar a lei, veio para a cumprir. O que isso quer dizer? O texto 
chave é Mateus 5.17: “Não penseis que vim revogar a Lei ou os Profetas; não vim para 
revogar, vim para cumprir”. A palavra original traduzida para revogar é “καταλῦσαι”. Ela 
significa demolir, eliminar, abolir35, sendo utilizada cinco vezes no evangelho de Mateus, 
duas em 5.17 e três vezes relacionado a destruição de prédios (24.2; 26.61; 27.40)36. 
 
35 SIEBENTHAL, Heinrich Von; HAUBECK, Wilfrid, 2009, p. 64. 
36 Concordância Fiel do Novo Testamento, p. 427. 
31 
 
 
Portanto, Jesus afirmou que não veio abolir, mas cumprir. Essa palavra é “πληρῶσαι”, 
que só em Mateus é utilizada cerca de dezesseis vezes37 e geralmente se refere a “dar 
cumprimento”, no sentido de realizar algo planejado ou anunciado. Por exemplo, o termo 
aparece em Mt 1.22 na ideia de cumprimento às palavras das Escrituras de que a virgem daria 
luz e o menino seria chamado pelo nome de Emanuel (Mt 1.23; Is 7.14). Esse também é o uso 
em textos como Mt 2.15,17,23; 4.14, 8.17; 12.17; 21.4. A ênfase é “isto aconteceu para que se 
cumprisse”. Jesus não revoga a lei, mas cumpre no sentido de ser a realidade de todo AT, 
tanto da lei como dos profetas. A melhor interpretação desses versículos difíceis é que Jesus 
cumpre a Lei e os Profetas pelo fato que estes apontam para Ele (CARSON, 2010, p. 179). 
Conclui-se que em Mateus 5.17, Jesus confirma que o AT era permanente e válido. 
Todavia, o novo pacto indica uma nova definição no papel e importância da lei. A lei serviu 
como condução às promessas, mas a nova aliança mudou a forma de relacionamento de Deus 
com o seu povo. Nessa fase, a relação com Deus é mediada pelo próprio Messias, pelo próprio 
Deus encarnado. Esse é o sentido que os evangelhos

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