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Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br BIBLIOTECA PARA O CURSO DE ENSINO DE FILOSOFIA Selecionamos para você uma série de artigos, livros e endereços na Internet onde poderão ser realizadas consultas e encontradas as referências necessárias para a realização de seus trabalhos científicos, bem como, uma lista de sugestões de temas para futuras pesquisas na área. Primeiramente, relacionamos sites de primeira ordem, como: www.scielo.br www.anped.org.br www.dominiopublico.gov.br SUGESTÕES DE TEMAS 1. O ENSINO DA FILOSOFIA NO BRASIL: um mapa das condições atuais 2. A FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO: ambiguidades e contradições na LDB. 3. INTERDISCIPLINARIDADE NO ENSINO DE FILOSOFIA 4. FILOSOFIA NO ENSINO DE SEGUNDO GRAU 5. ENSINO DE FILOSOFIA NAS ESCOLAS PÚBLICAS E PRIVADAS 6. FORMAÇÃO FILOSÓFICA E CRÍTICA 7. ADORNO E O ENSINO DE FILOSOFIA EM NÍVEL INTRODUTÓRIO 8. ENSINAR, APRENDER, FAZER FILOSOFIA 9. A VOLTA DA FILOSOFIA E DA SOCIOLOGIA NOS CURRÍCULOS DE ENSINO MÉDIO 10. ELEMENTOS PARA A LEITURA DOS TEXTOS FILOSÓFICOS 11. UM OLHAR SOBRE O ENSINO DE FILOSOFIA 12. A FILOSOFIA E A UNIVERSIDADE 13. A FILOSOFIA E O ENSINO DA FILOSOFIA Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 2 14. POLÍTICA DA FILOSOFIA NO SEGUNDO GRAU 15. FILOSOFIA PARA CRIANÇAS 16. CURRÍCULO E FORMAÇÃO: o ensino de filosofia 17. O ENSINO DE FILOSOFIA E SUAS CONTRADIÇÕES 18. A FILOSOFIA VAI À ESCOLA 19. A FILOSOFIA NA SALA DE AULA 20. IDÉIAS EDUCACIONAIS E FILOSÓFICAS NO BRASIL, DA COLÔNIA À REPÚBLICA 21. O ENSINO DA FILOSOFIA NO BRASIL: um mapa das condições atuais 22. DIDÁTICA DA FILOSOFIA 23. O ENSINO DE FILOSOFIA: suas diretrizes 24. SITUAÇÃO DO ENSINO DE FILOSOFIA NAS ESCOLAS PÚBLICAS DE ENSINO MÉDIO 25. FILOSOFIA E ENSINO EM DEBATE 26. FILOSOFIA E ENSINO: possibilidades e desafios 27. A DITADURA BRASILEIRA E O ENSINO DA FILOSOFIA 28. O LUGAR DA FILOSOFIA NA UNIVERSIDADE 29. OS USOS DA FILOSOFIA 30. FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO E SEU PROFESSOR: algumas reflexões 31. FILOSOFIA E SEU ENSINO 32. CURSO DE FILOSOFIA: A FORMAÇÃO PARA A DOCÊNCIA 33. A SITUAÇÃO DO ENSINO FILOSÓFICO NO BRASIL 34. PANORAMA DA HISTÓRIA DA FILOSOFIA NO BRASIL 35. CRÍTICA DE ALGUNS LUGARES COMUNS AO SE PENSAR A FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO 36. O ENSINO DE FILOSOFIA: suas diretrizes Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 3 37. A IMPORTÂNCIA DA DIDÁTICA PARA (A FORMAÇÃO DE) O PROFESSOR DE FILOSOFIA 38. RELAÇÃO ESCOLA-SOCIEDADE: NOVAS RESPOSTAS PARA UM VELHO PROBLEMA 39. HISTÓRIA DA FILOSOFIA: centro ou referência? 40. O ENSINO DE FILOSOFIA NO ENSINO MÉDIO Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 4 ARTIGOS PARA LEITURA, ANÁLISE E UTILIZAÇÃO COMO FONTE OU REFERENCIA Educação e Pesquisa ISSN 1517-9702 versãoimpressa Educ. Pesqui. v.34 n.1 São Paulo jan./abr. 2008 doi: 10.1590/S1517-97022008000100009 ARTIGOS A IMANÊNCIA COMO "LUGAR" DO ENSINO DE FILOSOFIA* Rodrigo Pelloso Gelamo Universidade Estadual Paulista RESUMO A intenção do presente artigo é pensar a problemática do ensino de filosofia a partir da obra de Deleuze e Guattari. Esses autores criaram uma série de conceitos, em seu fazer filosófico, para entender o que seria fazer filosofia, ou seja, para entender a atividade filosófica que se distanciasse de uma reflexão sobre alguma coisa e se fundasse em um ato de criação filosófica. Segundo os autores, existem quatro conceitos que corroboram para entender esse fazer filosófico, quais sejam: conceito, plano de imanência, personagem conceitual e problema. Tem-se como hipótese que tais conceitos podem contribuir para se pensar o ensino de filosofia na contemporaneidade de modo diferenciado do qual vem sendo tratado. Foi dada especial atenção a um desses conceitos: plano de imanência, engendrado na última obra conjunta desses autores, O que é a filosofia? (1997). Buscou-se, na obra desses autores, a caracterização de imanência e, consecutivamente, de plano de imanência para entender como se pode pensar o ensino de filosofia de forma diferenciada e de modo tal a distanciá-lo de uma adequação conceitual a um transcendente ou a um transcendental, a qual, no entender dos autores trabalhados, levaria o conceito de ensino a um dogmatismo conceitual. A proposta deste artigo é buscar uma saída para o problema, pensando o ensino de filosofia a partir da imanência mesma na qual este se produz. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 5 Palavras-chave: Ensino de Filosofia — Filosofia e educação — Filosofia francesa contemporânea — Imanência. Considerações iniciais No presente artigo, partiu-se de uma hipótese de trabalho: a de que Deleuze e Guattari (1997) podem contribuir para pensar o ensino de filosofia. Essa hipótese fundamenta-se no modo como os referidos autores fazem sua filosofia, ou seja, no modo como eles criaram vários conceitos que mudam o modo de olhar o mundo, melhor dizendo, de experimentar o mundo, de fazer um recorte no mundo para entendê-lo. Existem, na obra deleuzo-guattariana, vários conceitos que poderiam contribuir para se pensar o ensino de filosofia. Desses vários conceitos, foram escolhidos quatro que são apresentados, de forma mais precisa, na obra O que é a filosofia?: plano de imanência, conceito, personagem conceitual e problema. Elementos que, segundo Deleuze e Guattari, constituem o filosofar, ou seja, conceitos que se inter-relacionam e dão consistência ao fazer filosófico. Para Deleuze e Guattari (1997), fazer filosofia é criar conceitos. Talvez essa seja a frase mais repetida de suas obras. No entanto, vale ressaltar que criar conceitos não é uma atitude que é encontrada somente neles, mas como eles mesmos afirmam, toda a filosofia tem essa função. A diferença que trazem esses autores é o lugar de partida para que os conceitos sejam criados. Para eles, a criação de conceitos não poderia estar fundada em um lugar de transcendência, mas sim se dar em uma imanência, melhor dizendo, em um plano traçado pelo filósofo na imanência. Desse modo, o conceito não seria algo que vem de fora da imanência ou que poderia ser aplicado à imanência, mas que pertence a ela. Assim, uma vez criado o conceito no plano de imanência, o conceito e o plano, no qual ele foi criado, não se separariam. Não se teria nenhuma hierarquia entre eles nem mesmo poder-se-ia separar um do outro. Conceito e plano estão imbricados, porque o conceito só funciona no plano em que foi criado, e o plano é que dá condições para que o conceito funcione. Desse modo, os conceitos e o plano de imanência são correlatos, co-existentes e co-insistentes porque são construídos simultaneamente. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 6 Essa é uma característica do fazer filosófico deleuzo-guattariano que precisa ser destacada: o construtivismo. Para eles, não basta ao filósofo ser reflexivo ou comunicativo. Segundo Deleuze (1992), "de fato o que importa é retirar do filósofo o direito à reflexão 'sobre'. O filósofo écriador, ele não é reflexivo" (p. 152). Desse modo, o filósofo precisa se tornar o construtorcriador. Para Deleuze e Guattari (1997), "a filosofia é um construtivismo, e o construtivismo tem dois aspectos complementares, que se diferem em natureza: criar conceitos e traçar um plano" (p. 51). Assim, não bastaria ao filósofo criar conceitos, mas também caberia a ele traçar o plano de imanência no qual o conceito será criado. Desse modo, o filósofo é o construtor-criador. A ele não seria mais dado o ato de simplesmente contemplar a realidade para encontrar um conceito que a expressasse, mas experimentá-la e expressá-la como e pela criação. A partir o exposto, poder-se-ia chegar à conclusão de que ser filósofo é ser criador, e filosofar é criar, traçar planos e criar conceitos? A resposta a essa pergunta seria um tanto quanto paradoxal, já que seria sim e não. Como poderá ser notado a seguir, o filósofo precisa traçar planos para criar conceitos. Não se pode fazer filosofia sem essas prerrogativas, porém a tarefa do filósofo não se limita a isso. Existem outras dimensões que o filosofar requisita no ato de criação e como ato de criação. Esse outro aspecto, ao qual se dá destaque, é a criação do personagem conceitual. Para Deleuze e Guattari (1997), os personagens conceituais são os responsáveis por fazer os conceitos funcionarem. Isso porque os conceitos "[...] têm necessidade de personagens conceituais que contribuam para sua definição" (p. 10). Assim, o filosofar exige um outro ato de criação que é criar personagens conceituais que farão o conceito funcionar no plano. Desse modo, o personagem conceitual é o responsável por dar mobilidade ao conceito no plano de imanência. Personagens conceituais Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 7 Existem inúmeros personagens conceituais na história da filosofia. Deleuze e Guattari (1997) enumeram vários deles: o idiota, Sócrates, Zaratustra, dentre outros. Um desses personagens conceituais, que é singularmente importante e que se faz necessário desenvolver aqui, é o amigo. Este é o personagem conceitual por excelência para o filosofar. Para Deleuze e Guattari (1997), "amigo designaria uma certa intimidade competente, uma espécie de gosto material e uma potencialidade, como aquela do marceneiro pela madeira [...]" (p. 11). E complementa: [...] o amigo não designa mais um personagem extrínseco, um exemplo ou uma circunstância empírica, mas uma presença intrínseca ao pensamento, uma categoria viva, um vivido transcendental. (p. 11) O personagem conceitual não tem a função de servir de exemplo, isto é, não exemplifica determinado conceito, mas mais especificamente faz o conceito funcionar nas relações de pensamento, porque é ele quem vive o acontecimento filosófico. Desse modo, o personagem conceitual da filosofia, por excelência, é o próprio filósofo: aquele que é amigo do conceito, aquele que cria e faz o conceito funcionar. É preciso notar a sutileza com a qual Deleuze e Guattari elaboram a definição de amigo. Para eles, o amigo (personagem conceitual) não é alguém que simplesmente habita o plano de imanência ou alguém que é colocado desde fora no plano, mas alguém que é próprio ao plano; alguém que se dobrou a partir do próprio plano. O amigo, assim, é um plano no plano recortado do caos1, uma desaceleração, um plano criador de conceitos. O personagem conceitual, portanto, é aquele que vai dar consistência ao plano. É aquele que vive o plano e cria conceitos no plano. Nesse ponto da discussão, faz-se necessário interpelar Deleuze e Guattari com a seguinte questão: por que o personagem conceitual cria conceitos? Qual a necessidade dessa criação de conceitos? Seria essa uma destinação? Poder-se-ia buscar em uma frase de Deleuze (1992) uma possível resposta a isso: "É filósofo quem se torna filósofo, isto é, quem se interessa por essas criações muito especiais na ordem dos conceitos" (p. 39). No entanto, para que seja possível compreender o fragmento acima, é preciso retornar ao que eles entendem por amigo. O filósofo, Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 8 como já foi dito, é o amigo do conceito, aquele que deseja o conceito e que aspira ao conceito. Vale lembrar, também, que o amigo não é alguém que está fora do plano, mas que está intrínseco ao plano. A aspiração, ou o desejo de criação, não é um dado que vem de fora do plano de imanência, mas é imanente ao plano. Assim, o criador de conceitos tem de ser íntimo do plano para poder expressá-lo, para querer expressá- lo e, assim, para ser problematizado pela imanência e, como resposta às problematizações, criar conceitos. Desse modo, o plano de imanência problematiza o amigo do conceito, ataca o pensamento do personagem conceitual e pede para que ele o expresse. Pede para o filósofo criar condições de resolução para os problemas produzidos no e pelo plano de imanência e, ao mesmo tempo, problematiza o plano no sentido de tensioná-lo e reproblematizá-lo. O conceito, assim, é a resposta aos problemas do plano e a condição de expressividade do plano. Nota-se que o modo deleuzo-guattariano de pensar a filosofia é bastante complexo. Por isso, seria preciso desenvolver cada um dos elementos que compõem o fazer filosófico — plano de imanência, conceito, personagem conceitual e problema — de forma separada. No entanto, dados o limite do presente artigo, será preciso limitar a exposição dos argumentos mais detidamente a apenas um desses elementos — o plano de imanência — e na medida do possível correlacioná-lo aos outros elementos. Recortar É largamente sabido que, para se pesquisar, é necessário fazer recortes. Recortar a realidade e problematizá-la para poder entender quais são os problemas que podem ser tirados dessa realidade para se ter um tema de pesquisa, um campo de pesquisa para se olhar e, assim, pensar. Por isso, há a necessidade de fazer os devidos recortes e traçar planos que dêem condições aos objetivos almejados. Muitas vezes, os recortes funcionam de modo tal a servir como 'lentes' para se olhar a realidade. Funcionam como imagens que se usa como um decalque aplicável à Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 9 realidade para que, assim, o campo de pesquisa se torne visível. Dito de outro modo, buscam-se na literatura os campos de pesquisa, os modos de recortar e, a partir das leituras, cria-se uma imagem daquilo que se deve enxergar na realidade. Juntamente com essa imagem criada, são trazidos os conceitos que nomearão aquilo que a imagem decalcada tornará possível de se enxergar. Tal modo de olhar apresenta problemas, isso porque se se aplicar uma imagem ou conceitos já estabelecidos anteriormente à realidade, não se poderá ter acesso à imanência, uma vez que a imagem e os conceitos não apenas estão, mas também foram produzidos fora da imanência. Pensado assim, ter-se-ia duas dimensões: uma é o lugar onde o olhar focaliza aquilo que se quer enxergar; e a outra, o modo de olhar que determina o foco. Desse modo, se já houver de antemão o modo de olhar a realidade, esta teria de se adequar ao modo de se olhar. A contribuição de Deleuze e Guattari está no modo diferenciado de fazer esse recorte e, o mais importante, na concepção mesma daquilo que se recorta. Esses autores propõem uma outra possibilidade de pensar isso que está sendo chamado de olhar e de lugar. Para eles, não se pode partir de algo que já tenha sido dado antecipadamente, mas sim partir da imanência e permitir que ela crie os problemas e,com a criação de problemas, buscar as condições de resolução. Dito de outro modo, é necessário um desvencilhar-se de qualquer condição a priori, que seja transcendente ou trans-cendental, ou seja, que não esteja fincada na imanência. O único a priori que poderia, portanto, ser aceito seria a imanência. A imanência, assim, seria a matéria-prima (o a priori sem qualquer transcendental) para o pensamento. O conceito de imanência Vale, aqui, desenvolver mais detidamente o conceito de imanência. Quando se pensa nesse conceito, normalmente pensa-se em algo que é imanente a alguma coisa. No entanto, para Deleuze e Guattari, a imanência não pode ser entendida desse modo porque ela não é uma dualidade ou um continente que é receptor de um conteúdo. Deleuze (2006), em A imanência, uma vida..., afirma que [...] a Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 10 imanência absoluta é nela mesma: ela não está em alguma coisa, dentro de alguma coisa, ela não depende de um objeto nem pertence a um sujeito. (s/p) Dessa forma, a imanência não pode ser entendida como uma instância que contém objetos ou como um lugar onde os objetos estejam, bem como tampouco pode ser considerada como algo sobre o qual a consciência de um sujeito se detém para formular seus conhecimentos. A imanência não está nem além nem aquém do sujeito ou do objeto nem mesmo na relação que se pode estabelecer entre esses dois termos. Assim, conforme afirma Deleuze (2006): A imanência não se remete a Alguma coisa como unidade superior a todas as coisas nem a um Sujeito como ato que opera a síntese das coisas: é quando a imanência é imanência apenas a si que se pode falar de um plano de imanência. (s/p) A imanência só pode ser entendida como algo que é nela mesma. Assim, esta seria a totalidade do que existe. No entanto, se a totalidade for concebida como a soma de todas as coisas existentes, não se pode dizer que seja imanência nem mesmo a totalidade de todas as coisas poderá ser considerada imanência. Para se entender o conceito de imanência, teria de se suprimir todo plano de dualidade — céu-terra, imanente-transcendente — assim como interromper o modo de entendimento que age como uma consciência subjetiva a qual pensa um objeto que está fora dela. Isso porque não haveria uma separação entre o sujeito e o objeto nem mesmo entre a imanência e seus habitantes (Deleuze, 2006). Seguindo essa proposição, seria preciso entender a imanência como um caos, pois não se teria mais um sujeito ou uma inteligência superior que desse consistência à matéria primeira que a imanência. Desse modo, a imanência é a própria dimensão caótica: o caos e suas velocidades. Para Deleuze e Guattari (1997): O que caracteriza o caos, com efeito, é menos a ausência de determinações do que a velocidade infinita com a qual elas se esboçam e se apagam: não é um movimento de uma a outra mas, ao contrário, a impossibilidade de uma relação entre duas determinações, já que uma não aparece sem que a outra já tenha desaparecido, e que uma aparece como evanescente quando a outra desaparece como esboço. O Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 11 caos não é um estado inerte e estacionário, não é uma mistura ao acaso. O caos caotiza, e desfaz no infinito toda consciência. (p. 59) Deleuze e Guattari (1988), a exemplo de Nietzsche, querem fazer "[...] do caos um objeto de afirmação" (p. 388). Isso quer dizer que é no caos que os problemas se afirmam e não fora dele, ou seja, não se pode supor a existência de uma consciência que teria como função problematizar o caos e propor soluções desde fora dele. O plano de imanência O problema que pode ser colocado a Deleuze e Guattari (1997) é: como pode o caos ser o lugar de produção conceitual se sua própria característica é ser caótico e inominável? Esse questionamento encontra ressonância na problematização por eles feita em Mil Platôs, onde se lê: "mas como poderemos ainda identificar e nomear as coisas, se elas perderam os estratos que as qualificavam e passaram para uma desterritorialização absoluta?" (p. 87). Para esses autores, o caos não é uma ausência total de determinações, mas a pura imanência com suas velocidades, que desterritorializam a todo o momento suas configurações. Desse modo, O que caracteriza o caos, com efeito, é menos a ausência de determinações que a velocidade infinita com a qual elas se esboçam e se apagam: não é um movimento de uma a outra, mas, ao contrário, a impossibilidade de uma relação entre duas determinações, já que uma não aparece sem que a outra já tenha desaparecido, e que uma não aparece como evanescente quando a outra desaparece como esboço. (p. 59) Assim, para se pensar a imanência, seria necessário criar planos que funcionassem como desacelerações do caos, que funcionassem como esboços que se configuram momentaneamente. Por isso, é necessário cortar o caos para que se crie consistência e, assim, possa ser pensado. Desse modo, o plano de imanência é um recorte que se faz no caos, ou seja, na imanência fugidia. Vale lembrar aqui que Deleuze e Guattari estão se contrapondo ao modo platônico de entendimento ontológico: os dois mundos de Platão. Segundo Deleuze (1975), para Platão, o mundo material não poderia ser pensado justamente Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 12 por essa característica fugidia. A única coisa pensável seria o mundo das idéias pelo fato de ser imutável. Para Deleuze e Guattari, ao contrário, deve-se pensar justamente isso que, segundo Platão, não poderia ser pensado. A estratégia criada pelos filósofos franceses é a criação de um mapa que se traça sobre o caos para que seja possível se locomover nele e, assim, poder pensá-lo. Desse modo, traçar um plano na imanência é recortar a realidade caótica de tal modo que seja possível pensar. Por isso, esse recorte funciona como um crivo. Segundo Prado Jr. (2000), 'Cortar' só pode significar captar (definir) uma 'fatia', por assim dizer, de um caos que permanece livre (e infinitamente livre) em todas as outras direções ou dimensões. Mas, além de 'corte' no caos, o plano é também um 'crivo' - cortar é selecionar e fixar -, numa palavra, determinar, conter o rio de Heráclito ou o oceanomundo. (p. 314-315). Concorda-se com o modo como Prado Jr. entende o recorte no que diz respeito ao captar uma fatia. No entanto, não se pode concordar que definir seja sinônimo de captar. A discordância pode ser fundamentada a partir da crítica que Deleuze e Guattari elaboram acerca do erro que a filosofia comete ao buscar definições. Segundo eles, a definição 'mataria' o ato de criação conceitual. O conceito tem como função expressar o plano de imanência e não defini-lo, isso porque, se se definir algo, a mobilidade do conceito seria inibida em seu caráter expressivo e estar-se-ia retomando aquilo que eles criticaram: que o conceito não tem como função dar nome à realidade. Se a função do conceito, ou do plano, fosse a de definir, estaria se retornando a antiga busca pelo caráter universal e necessário. "Um conceito não é um universal, mas um conjunto de singularidades" (Deleuze, 1992, p. 183). Do mesmo modo, o plano é algo móvel e que não pode ser definido, mas desacelerado, contido, crivado. Assim, suas forças estariam o tempo todo forçando a reaceleração e buscando escapar de seu continente. Por isso, o conceito e o plano precisam sempre ser repensados em seu movimento de diferenciação e não podem ser definidos, mas apenas pensados2. Desse modo, ao se traçar o plano, o caosestaria sendo delimitado, crivado. Ou seja, para fazer uma referência à citação anterior, recortar é desacelerar as velocidades do rio heracliteano sem jamais conseguir defini-lo. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 13 O importante é não perder as intensidades produzidas no caos, não separar o recortado daquilo que se cortou, mantê-lo em relação de coextensão com a matéria da qual foi cortado. Isso quer dizer que, tanto o plano como o caos são imanentes: não se separa aquilo que foi cortado do que se cortou, apenas se cria uma desaceleração nas correntes de intensidades. A mesma atitude pode ser encontrada nos ribeirinhos amazônicos que constroem redes dentro do rio para a criação dos peixes nativos da região. Essas redes funcionam de tal modo a conter os peixes na imensidão das águas. Esse tipo de cultura pisicícola desacelera o movimento dos peixes sem perder a produtividade do rio, porque mantém os peixes em seu lugar imanente. Desse modo, não são os peixes que são imanentes ao rio, mas o rio, com tudo o que ele é, é que se constitui uma imanência (rio e peixes e algas etc.). Para Deleuze (1992), o "E já não é nem mesmo uma conjunção ou uma relação particular, ele arrasta todas as relações" (p. 60). Para Deleuze (2006), "dir-se-á que a pura imanência é UMA VIDA, nada mais. Ela não é imanência à vida, mas o imanente que não é imanente a nada específico é ele mesmo uma vida. Uma vida é a imanência da imanência, a imanência absoluta: ela é potência e beatitude completas" (s/p). Assim como a vida é imanente à própria Vida, a imanência é imanente a ela mesma, não pode ser separada, não pode ser dividida. Ela é plenitude e não pode haver nada fora dela. Assim, a imanência é a pura intensidade da vida. Para ele, [...] uma vida está por todos os lugares, por todos os momentos que atravessam este ou aquele sujeito vivo e que medem tais objetos vividos: vida imanente trazendo os acontecimentos ou singularidades que apenas se atualizam nos sujeitos e nos objetos. Essa vida indefinida não tem, ela mesma, momentos, por mais próximos que estejam uns dos outros, mas apenas entretempos, entremomentos. (s/p). Pensar a imanência é pensar a vida. No entanto, para pensar a vida, é preciso desacelerá-la, mapeá-la. Assim, a partir de Deleuze e Guattari, pode se entender que o plano de imanência é o mapa do mundo. Mapa que dá condições de locomoção para que o filósofo se singularize e que é o lugar no qual o filósofo problematiza a realidade, fazendo com que ela se subjetive, se dobre, de determinado modo. Segundo Cardoso Jr. (2006), [...] cada um está ao mesmo tempo criando um modo de vida enquanto se constrói a imanência como plano próprio ao Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 14 pensar, porque o 'construtivismo' do pensamento é também um poderoso campo de experimentação. (p. 34) Desse modo, o plano de imanência é o lugar onde se cria um modo de vida, onde o pensamento é atacado, é o não pensado que precisa ser experimentado para ser pensado. Por ser não pensado, o plano de imanência é pré-filosófico e pré-conceitual. Isso porque ele não é pensamento, mas é a matéria na qual o pensamento se dobrará. Desse modo, o plano de imanência está antes da filosofia e antes da criação dos conceitos. Entretanto, é sobre esse plano que o pensamento se produzirá. Segundo Cardoso Jr. (2006), Um pensamento filosófico, porque cria conceitos como seus entes fundamentais, lança-se exatamente na construção da imanência como seu plano próprio. É justamente na imanência que começam tanto a complexidade da filosofia quanto o jogo que os conceitos de cada pensamento joga, tendo em vista sua relação com a não-filosofia. (p. 28). O plano de imanência, assim, é a matéria do pensamento. Matéria prévia na qual o pensamento se deterá para produzir conceitos. Se o plano e o conceito não estiverem, melhor dizendo, se não forem pertencentes à imanência, tanto o plano quanto os conceitos funcionariam de forma dogmática, ou seja, conceitos e plano seriam dados a priori, seriam elaborados fora da imanência. Desse modo, ter-se-ia um BOM plano e um BOM conceito como princípios e a imanência teria de se adequar a esses conceitos e a esse plano. Assim, o recorte do plano e os conceitos seriam apenas adequações da imanência à transcendência. Para Deleuze e Guattari (1997), "não basta mais conduzir a imanência ao transcendente, quer-se que ela remeta a ele e o reproduza, que ela mesma o fabrique" (p. 65). Desse modo, a transcendência seria detentora do modo de cortar o plano e os conceitos e, também, a condição do corte. Pensando desse modo, a imagem do plano e dos conceitos já estaria elaborada sem se relacionar com a imanência ou quando muito, a imanência seria uma reprodução (adequação) da transcendência. Deleuze e Guattari (1997) afirmam que essa confusão pode ser entendida da seguinte maneira: [...] em vez de um plano de imanência, ele mesmo, construir esta matéria do Ser ou esta imagem do pensamento, é a imanência que seria remetida a algo que seria como um 'dativo', Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 15 Matéria ou Espírito. É o que se torna evidente em Platão e seus sucessores. Em vez de um plano de imanência construir o Uno-Todo, a imanência está 'no' Uno, de tal modo que um outro Uno, desta vez transcendente, se superpõe àquele no qual a imanência se estende ou ao qual ela se atribui [...]. (p. 62). A única coisa que poderia ser realizada, assim, é a interpretação: interpretar-se-ia a imanência com planos dados e com conceitos dados. Segundo Deleuze (1992), "quando se invoca uma transcendência, interrompe-se o movimento, para introduzir uma interpretação em vez de experimentar" (p. 182). Desse modo, a imanência estaria sendo submetida à interpretação daquele que a pensa, e pensar seria apenas um exercício de adequação. Para esses autores, [...] cada vez que se interpreta a imanência como 'a' algo, produz-se uma confusão do plano com o conceito, de modo que o conceito se torna um universal transcendente, e o plano, um atributo do conceito. Assim mal entendido, o plano de imanência relança o transcendente. (Deleuze; Guattari, 1997, p. 62) Cardoso Jr. (2006a), comentando essa problemática em Deleuze, afirma: O que caracteriza, genericamente, a imagem dogmática do pensamento, segundo Deleuze, são as técnicas interpretativas que invertem a polaridade produtiva do pensar, transformando o efeito ou sintoma, em causa. Por exemplo, isso acontece quando a representação é destacada do plano do pensamento como seu fator constitutivo. Toda vez que tal transferência acontece o pensamento é aviltado e submetido a um pólo que ganha o direito de falar em nome do pensar como um todo. (s/p) Desse modo, para Deleuze e Guattari (1997), o recorte não pode ser feito a partir de um tema ou de uma questão que esteja fora da imanência nem poderia ser dado antecipadamente, mas se deve fazer esse recorte na imanência, ou seja, deve-se traçar um plano na imanência caótica. O caos deve ser entendido, segundo esses autores, não como com uma mera ausência de determinações, mas como um lugar em que o pensamento vai se dobrar. Por ser o ainda não dobrado (a desdobra absoluta), ele "caotiza, e desfaz no infinito toda consistência" (p. 59). Por isso, é necessário criar um plano que dê consistência a esse caos para que ele possa ser pensado. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br16 Fazer filosofia, assim, é pensar o-com-o plano de imanência. Só é possível filosofar se se estiver no plano de imanência, se se experimentar o plano de imanência. Isso porque, segundo Deleuze e Guattari (1997), O plano de imanência é pré-filosófico, e já não opera com conceitos, ele implica uma espécie de experimentação tateante, e seu traçado recorre a meios pouco confessáveis, pouco racionais e razoáveis. São meios da ordem do sonho, dos processos patológicos, das experiências esotéricas, da embriaguez ou do excesso. (p. 59) Desse modo, pode-se dizer, juntamente com Zorabichvili (2005), que, para Deleuze e Guattari, [...] a filosofia é, pois, propriamente filosófica enquanto pensamento da experiência ou, o que vem a dar no mesmo, enquanto pensamento da imanência. (s/p) Planos arbóreos ou rizomáticos Ao se aproximar a problemática deleuzo-guattariana acerca da imanência do problema do ensino de filosofia, é possível entender que o plano de imanência do ensino de filosofia são as questões e os problemas decorrentes da experiência, da experimentação da imanência, do modo de recortar a imanência, que é a experiência dos problemas que o ensinar e aprender a filosofia produzem. Por esse motivo, é necessário entender o ensino de filosofia como uma imanência, ou seja, experimentar o ensino como uma imanência. Não pensar o ensino como algo que seja imanente à educação, mas imanente a ele mesmo. Desse modo, o ensino seria retirado de uma relação hierárquica e arbórea que fora colocada pela educação como uma ciência que tem, em uma de suas áreas de investigação, o ensino e o ensinar. O esquema hierárquico, denominado por Deleuze e Guattari (1997a) de arbóreo, funciona como o decalque que foi enunciado anteriormente. A árvore é uma estrutura pivotante que mantém a unidade e a centralidade daquilo que está conectado a ela. Para eles, Toda lógica da árvore é uma lógica do decalque e da reprodução. [...] Ela consiste em decalcar algo que se dá já feito, a partir de uma estrutura que sobrecodifica ou de um eixo que suporta. A árvore articula e hierarquia os decalques, os decalques são como folhas da árvore. (p. 21) Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 17 Deleuze e Guattari propõem como alternativa para a relação hierárquica, nos quais os saberes se estabelecem: o rizoma. Uma planta rizomática, ao contrário da árvore, tem um sistema radicular complexo, com tantas conexões que não se sabe em que lugar começa e em que lugar termina o sistema radicular. Suas raízes se entreconectam por bulbos e radículas. As plantas rizomáticas têm raízes e caules tanto subterrâneos (escondidos, obscuros) quanto aéreos (que aparecem ao olhar). Tudo (caules aéreos e subterrâneos, raízes aéreas e subterrâneas) está conectado com tudo, formando, assim, um emaranhado de caminhos, de sentidos. Uma relação não mais hierárquica, mas em rede. Assim, o funcionamento rizomático, em vez de decalcar, cria um mapa. Isso porque, no rizoma, não há uma estrutura ou mesmo hierarquia entre os elementos. Ele funciona com suas conexões múltiplas. Por esse motivo, não há como estabelecer previamente as relações entre os elementos da rede. Plano de imanência e ensino de filosofia Pensando com Deleuze e Guattari, pode-se pensar o ensino de filosofia como o plano imanente a si mesmo, como um recorte no caos, que funciona como um plano de imanência, um mapa que torna possível criar um campo de visibilidade, pois essa é a função do corte: criar visibilidades. Criar um campo problemático que ataque o pensamento e que mova o pensar. Conforme foi dito anteriormente, os problemas não podem ser exteriores ao plano de imanência, ou seja, o problema é uma problematização do próprio plano de imanência. Deleuze e Guattari (1997) auxiliam a recuperar a imanência da problematização, mostrando que é preciso traçar um plano de imanência para pensar nosso presente. Esse plano deve ser apresentado de modo a criar uma consistência problemática que dê suporte à criação de conceitos, uma vez que [...] o plano de imanência não é um conceito pensado nem pensável, mas a imagem do pensamento, a imagem que ele se dá do que significa pensar, fazer uso do pensamento, se orientar no pensamento [...]. (p. 53). Por esse motivo, ao pensar o ensino de filosofia, é necessário traçar o mapa do plano para criar os conceitos que o povoarão. Mapear o lugar em que serão produzidos os conceitos, o lugar onde os conceitos filosóficos vão funcionar/habitar. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 18 Nesse sentido, é preciso fazer um mapa do problema. É no plano de imanência que os conceitos serão enrolados e desenrolados, esse é o lugar em que os conceitos podem funcionar (Deleuze; Guattari, 1997). Desse modo, é necessário, antes de tudo, pensar o ensino de filosofia como uma imanência para que se possa mapeá-lo. Isso quer dizer que é preciso partir dos problemas do ensino de filosofia, problematizar a própria imanência. Só então se poderá penetrar em outros problemas que são concernentes ao ensino de filosofia. REFERÊNCIAS CARDOSO Jr., H. R. Pragmática menor: Deleuze, imanência e empirismo. 2006. 570f. Tese (Livre Docência) - Universidade Estadual Paulista – Unesp - Campus de Assis. 2006. [ Links ] ______. Espinosa e Nietzsche: elos onto-práticos para uma ética da imanência. In: SEMINÁRIO DE FILOSOFIA CONTEMPORÂNEA: Nietzsche e o pensamento francês. WEBER, J. F.; NALLI, M. A. G. (Coord.). 1. Anais... Londrina: UEL, 2006a [CD-ROM]; ISBN 85-98196-39-8. [ Links ] DELEUZE, G. Conversações. Rio de Janeiro: Editora 34, 1992. [ Links ] ______. A imanência, uma vida... Disponível em <http://www.letras.ufrj.br/ciencialit/terceiramargemonline/numero11/xiii.html>. Acesso em 21 set. 2006. [ Links ] ______. Diferença e repetição. Rio de Janeiro: Graal, 1988. [ Links ] ______. Lógica do sentido. São Paulo: Perspectiva, 1975. [ Links ] DELEUZE, G.; GUATTARI, F. O que é a filosofia? 2 ed. Rio de Janeiro: Editora 34, 1997. [ Links ] ______. Mil Platôs: capitalismo e esquizofrenia. Rio de Janeiro: Editora 34, 1997a. (v. 4). [ Links ] PRADO JR., B. A idéia de "plano de imanência". In: ALLIEZ, E. (Org.). Gilles Deleuze: uma vida filosófica. São Paulo: Editora 34, 2000. p. 307-322. [ Links ] ZOURABICHVILI, F. Deleuze e a questão da literalidade. Educação e Sociedade, Campinas, v. 26, n. 93, 2005. Disponível em <http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101- 73302005000400012&lng=en&nrm=iso>. Acesso em 02 out. 2006. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 19 Educação & Sociedade ISSN 0101-7330 versãoimpressa Educ. Soc. v.28 n.98 Campinas jan./abr. 2007 doi: 10.1590/S0101-73302007000100012 ARTIGOS ENSINO DE FILOSOFIA PARA NÃO-FILÓSOFOS. FILOSOFIA DE OFÍCIO OU OFÍCIO DE PROFESSOR: os limites do filosofar Rodrigo Pelloso Gelamo Mestre em Filosofia e doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Estadual Paulista (UNESP), de Marília. E-mail: RESUMO O presente artigo é o resultado de um pensamento filosófico acerca do ensino de filosofia. O principal objetivo de nossa pesquisa foi entender o que faz o filósofo quando seu ofício é ser professor de filosofia. Para tal, utilizamos como referencial teórico-metodológico o pensamento de Foucault para pensar o filósofo-professor de filosofia em seu lócus – ensino de filosofia – enquanto uma ontologia do presente, e o pensamento de Deleuze e Guattari para indicar uma possível maneira de entender esse ofício de professorque acreditamos se dar em um fazer artístico, filosófico e científico. Palavras-chave: Ensino de filosofia. Ontologia do presente. Filosofia francesa contemporânea. Educação. Eu jamais penso exatamente o mesmo pela razão de que meus livros são, para mim, experiências. Uma experiência é algo do qual a própria pessoa sai transformada. Se eu devesse escrever um livro para comunicar o que já penso, antes de haver começado a escrever, não teria jamais coragem de empreendê-lo. (Foucault, 1994, p. 41) Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 20 O E, "e... e... e...", é exatamente a gagueira criadora, o uso estrangeiro da língua, em oposição a seu uso conforme e dominante fundado sobre o verbo ser. Certamente, o E é a diversidade, a multiplicidade, a destruição das identidades. (Deleuze, 1992, p. 60) Palavras iniciais Fomos motivados a pensar. Quando nos deparamos com uma disciplina estranha ao nosso modo de produzir pensamento, iniciamos uma problematização que resultou no texto ora apresentado. Vale deixar claro que estranho, aqui, refere-se a algo que não fazia parte de nosso rol de conhecimento filosófico. Este saber que chamamos de estranho, ou estrangeiro, é o ensino de filosofia. Melhor dizendo, uma tentativa de ensinar filosofia para estudantes de cursos que não pretendiam formar filósofos ou professores de filosofia. Assim, o limite que se colocava ao ensino de filosofia era o filosofar. Este foi o problema que nos afetou de modo tal que nos fez sentir estrangeiros em nosso próprio país: era como se falássemos nossa língua materna e não fôssemos compreendidos. Problematizar esses afetos foi o que nos mobilizou, que nos desestabilizou, enfim, que nos fez pensar o problema do ensino de filosofia, do "ser" um filósofo/professor que problematiza seu processo de ensino. Entendemos que este não seja um problema só nosso, mas de toda uma comunidade de pensadores que se dedicam à compreensão do ensino de filosofia. Esse tema vem sendo debatido amplamente pela comunidade filosófica na busca de entender o problema e propor encaminhamentos para o ensino desse saber (Arantes, 1996). A ressonância desse estudo pode ser encontrada principalmente no Fórum Sul de Ensino de Filosofia, já em sua sexta edição,1 cujo resultado implicou uma coleção de livros sob o título Filosofia e ensino, publicada pela Editora unijuí. No volume de 2004 (número 6), Pagni afirma que Falar sobre o ensino de Filosofia não é uma tarefa tão simples, especialmente para aqueles que, como eu, por dever de ofício e por interesse em refletir sobre a própria atividade docente, há pouco tempo vêm pensando sobre o assunto (...). Com a recente reaproximação das discussões em Filosofia da Educação, desenvolvidas no Brasil, de temas e do pensamento filosófico, sobretudo do pensamento contemporâneo e da História da Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 21 Filosofia, o ensino dessa disciplina nos cursos superiores ganhou uma dimensão mais filosófica que pedagógica, sendo também interrogado pelas mesmas questões que afligem o ensino de Filosofia. (Pagni, 2004, p. 217-218) Acreditamos que pensar essa problemática se justifique não apenas por se tratar de um tema presente, conforme acentuou Pagni (2004), mas também pelo tratamento que vamos dar a ela por meio da base teórica deleuzo-guattariana e pelo modo de olhar o problema. Com base nesse referencial, acreditamos poder produzir um modo diferenciado de entender nossa "prática filosófica" (ensino de filosofia), pensar nossa experiência educadora para entender como ela vem se constituindo e entender como o filósofo- professor de filosofia pode produzir pensamento, isto é, produzir filosofia, no processo educacional. Para tanto, este artigo está dividido em três partes. A primeira delas tem a intenção de apresentar o problema que encontramos na sala de aula e mostrar como ele nos afetou. A segunda parte busca localizar nosso problema em um tipo de fazer filosófico nomeado por Foucault (1984) de ontologia do presente. Na última parte, visamos encontrar indicativos de caminhos na obra de Deleuze e Guattari para pensar o ensino de filosofia como filosofia, não se limitando a um saber técnico, mas se constituindo como um exercício do filosofar. A problemática do ensino de filosofia As questões acerca do ensino – e especialmente do ensino de filosofia – surgiram com base em nossa experiência educadora em cursos de graduação, tanto de licenciaturas quanto de bacharelados, bem como da produção dos colegas de profissão, materializada nas ementas das disciplinas e no sentido que elas traziam. Nosso olhar foi marcado pela proposta de Pagni (2004), para quem "o professor dessa disciplina [filosofia] deveria refletir acerca de sua própria formação e dos limites de seu ofício" (p. 220). Desde 2001, vimos trabalhando com o ensino de filosofia nos mais diversos campos do saber: Introdução à Filosofia, para os cursos de Jornalismo, Desenho Industrial, Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 22 Licenciatura em Matemática, Pedagogia, Serviço Social e Análise de Sistemas; Filosofia e Ética Profissional, para os cursos de Administração, Ciências Contábeis e Informática; e Filosofia da Educação, para os cursos de Pedagogia e Licenciatura em Matemática. Nos cursos de Bacharelado e de Licenciatura em Filosofia, trabalhamos com as disciplinas de Ética e História da Filosofia. Nossa experiência docente tornou-se cheia de contrastes. Cabe-nos desenvolver de que modo tais contrastes produziram as questões que se tornaram problemas de nossa pesquisa. Nos cursos de filosofia, não tivemos problema quanto ao desejo dos alunos de aprender os conteúdos que eram próprios das respectivas disciplinas. Tivemos, entretanto, dificuldades no que se refere à adequação dos saberes adquiridos nos cursos de Prática de Ensino, durante nossa graduação, às necessidades que foram surgindo na experiência viva da sala de aula, ou seja, no ensino da filosofia. No que concerne ao ensino de filosofia para os cursos que não visavam formar filósofos, a dificuldade apareceu de modo mais veemente. Os alunos, logo de início e de modo geral, não tinham o desejo de aprender os saberes ditos "filosóficos". Alguns, por experiências não muito agradáveis com outros professores de filosofia; outros, por mero descaso ou preconceito; outros, ainda, por influência dos primeiros. O que se tornava unânime era a questão: "o que isso (a filosofia) tem a ver com o curso que eu faço?". Dito de outro modo, qual a relação existente entre a filosofia e os campos de saberes específicos para os quais cada um dos alunos estava sendo formado? Essa foi a primeira questão que nos atacou, mas não foi a questão mais contundente. Outra dificuldade encontrada se deu com relação ao conteúdo apresentado nas ementas das disciplinas citadas. Todas elas nos direcionavam para um tipo de curso em que os alunos deveriam saber, ao seu término, um "resumo" da história do saber filosófico. Observamos aí um agravante: todas, com exceção da Filosofia da Educação, se constituíam como disciplinas que não dialogavam com os saberes que circulavam em outras disciplinas na formação dos alunos. Ante o desprezo pela disciplina filosofia, que enxergávamos na maioria dos alunos, a ementa que materializava a proposta do curso permanecia intocada, inexorável e Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br23 tecnicamente distante. Desse modo, o ponto de apoio para a resolução da questão anterior, ao invés de solucioná-la, criou uma outra: como propor uma discussão que fosse filosófica e mais próxima dos saberes para os quais os alunos estavam sendo formados se a ementa do curso não possibilitava realizar tal intento? No caso da Filosofia da Educação, encontramos problemas parecidos, mas talvez outro plano estivesse se constituindo: a ementa poderia ser chamada de história de como os filósofos se referiram à educação. Não encontramos a possibilidade, sem que para isso tivéssemos que traí-la, de desenvolver o problema conceitual da educação, da filosofia, ou ainda, problematizar juntamente com os alunos os problemas educacionais sob o olhar da Filosofia.2 A questão mais uma vez foi colocada pelos alunos: qual a finalidade de saber história da filosofia da educação se eu vou ser um professor de matemática ou de educação infantil? Será que os saberes filosóficos podem contribuir apenas como um entendimento de como a história dos saberes filosóficos auxiliou a produção de cada saber específico e de como os filósofos pensaram este saber, neste caso, a educação? A amplitude que a ementa alcançava era muito maior do que se poderia fazer em tão pouco tempo para desenvolver os conteúdos necessários para se entender o encadeamento das idéias filosófico-educacionais, fato que dificultava a assimilação pelos alunos, que nunca, ou muito pouco, haviam tido acesso ao saber filosófico. Pensamos que os problemas não estejam localizados nos indícios aparentes, conforme apresentamos acima. Indícios da falta de preparo daqueles que formulam as ementas, daqueles que pensam as disposições das disciplinas nas grades curriculares e, principalmente, daqueles que se aventuram a dar aula de filosofia, ou seja, na concepção de e no ensino de filosofia. Pode ser que o problema esteja na ordem mais geral, na concepção mesma de ensino de filosofia. Lugar onde se deveria pensar qual o objetivo de uma disciplina estranha (no sentido que empregamos anteriormente) a determinado campo do saber (no caso do ensino de filosofia para nãofilósofos) e se entender qual seria a função do professor de filosofia (tanto para os cursos regulares de filosofia como para os de não-filósofos). Que tipo de saber o professor deveria possuir e produzir? Que tipo de subjetividade ele auxilia a produzir/formar enquanto filósofo/professor? Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 24 O problema, então, poderia ser colocado do seguinte modo: o que se espera do filósofo quando o assunto é ensino de filosofia? Em meio a esses problemas – que poderiam ser entendidos como estando na ordem da empiricidade ou da técnica – fomos atacados por um problema que entendemos ser filosófico: o que faz o filósofo quando seu ofício é o ensino de filosofia? Este problema/experiência-de-pensamento mobiliza a contingência mesma do filósofo, vergando-o a pensar o próprio presente que se apresenta como problema. Problema que produziu, e produz em nós o desejo de pensar o que estamos fazendo de nós mesmos como educadores-filósofos. Problema que está localizado na ordem do acontecimento. Problema recorrente, insistente, na história do pensamento filosófico/educacional, que pode ser sintetizado no modo como Pagni (2004, p. 227) apresenta essa problemática: "(...) como os professores de filosofia poderiam filosofar para que o aprendiz também fosse despertado para tal, diante de uma situação em que a determinação da cultura só ampliou a deformação profissional daqueles e apenas auxiliou a sufocar a disposição destes para aprender a pensar criticamente o tempo presente?". Vamos, na seção seguinte, buscar elementos que nos auxiliem a localizar nosso problema dentro das duas tradições filosóficas descritas por Foucault (1984), a analítica da verdade e a ontologia do presente. Questão de método: a ontologia do presente Para pensarmos criticamente o tempo presente, ao qual se refere Pagni (2004), e no qual situamos nossa problemática, poderíamos buscar na literatura específica respostas acerca do ensino de filosofia. Contudo, queremos nos distanciar do modo "tradicional" do fazer filosófico e do saber filosófico/educacional. Queremos dar um tratamento novo ao problema. Novo aqui não deve ser entendido como novidade. Entendemos com Deleuze (1988, p. 225) que "O que estabelece o novo não é precisamente o novo, pois o próprio do novo, isto é, a diferença, é provocar no pensamento forças que não são as da recognição, nem hoje, nem amanhã, potências de um modelo totalmente distinto, numa terra incógnita nunca reconhecida, nem reconhecível". Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 25 Por isso, optamos por não mais pensar o que é o ensino ou o que é o ensino de filosofia, mas por colocar a questão na ordem do acontecimento: o que faz o filósofo quando seu ofício é ensinar filosofia? Isso porque, conforme acentua Deleuze, "A filosofia está entulhada de discussões sobre o juízo das atribuições (o céu é azul) e o juízo de existência (Deus é), suas reduções possíveis [o ensino de filosofia é ...] ou sua irredutibilidade [o ensino de filosofia não pode ser reduzido a ...]. Mas trata-se sempre do verbo ser" (1992, p. 59-60). Não queremos, assim, buscar apenas elementos que concorram para explicar esses problemas que surgem de nossa experiência docente com base em outras experiências ou outras filosofias, mas buscar elementos conceituais que nos possibilitem pensar conceitualmente o problema. Esse modo novo de diagnosticar esses problemas encontramos nas obras de Foucault e Deleuze, especialmente na proposta de uma ontologia do presente foucaultiana e na crítica deleuziana acerca da imagem do pensamento. Foucault, em sua vasta obra sobre a história e sobre o problema da subjetividade, dedicou-se, também, ao estudo de Kant. Nosso interesse específico nesse estudo de Foucault está em um artigo, O que é o iluminismo? (1984), no qual o autor analisa a obra Was ist Aufklärung? (1784) de Kant. Nesse artigo, Foucault indica que Kant foi o grande marco da modernidade. Segundo o autor, Kant parece (...) ter fundado as duas grandes tradições críticas entre as quais está a filosofia moderna. Diríamos que em sua grande obra crítica Kant colocou, fundou, esta tradição da filosofia que coloca a questão das condições sob as quais um conhecimento verdadeiro é possível e, a partir daí, pode-se dizer que toda uma parte da filosofia moderna desde o século XIX se apresentou, se desenvolveu como uma analítica da verdade. (Foucault, 1984, p. 111- 112) A segunda tradição à qual se refere Foucault é a ontologia do presente, ou analítica do presente. "A questão tem por objetivo o que é este presente, ela tem por objetivo inicial a determinação de um certo elemento do presente que se trata de reconhecer, de distinguir, de decifrar entre de todos os outros. O que é que, no presente, faz sentido para uma reflexão filosófica" (Foucault, 1984, p. 104). Vamos apresentar, a seguir, essas duas tradições que surgiram com base em Kant. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 26 Com base na proposta metodológica kantiana,3 desenvolveu-se de maneira particular grande parte da pesquisa filosófica desde o século XIX.4 Foucault nomeia essa tradição de analítica da verdade por trazer, como principal preocupação, a determinação das condições do conhecimento para que este seja verdadeiro e se estabeleça como conhecimento científico. Esse traço metodológico é encontradoprincipalmente na filosofia analítica, em sua vertente formalista, e, de modo mais amplo, nas ciências neopositivistas, ambas cunhadas no paradigma cientificista fundado por Augusto Comte. Nas palavras de Kastrup (1999, p. 30-31), "O traço que os liga ao Kant da Crítica da razão pura é a preocupação em discutir e estabelecer as condições do conhecimento verdadeiro, por eles entendido como sinônimo de conhecimento científico. Comte trabalha com base na idéia de que só a ciência produz conhecimentos verdadeiros. Essa é, de resto, uma idéia kantiana (...)". Trazendo esta discussão para o âmbito das relações entre a filosofia e a educação, a busca por verdades educacionais e por modelos que pudessem assegurar o verdadeiro ensino fez com que se criassem, nas pesquisas educacionais, inúmeros manuais para servir de modelo àqueles que se propusessem a pensar a educação, tendo como parâmetro os resultados esperados pela sociedade científico-filosófica de modo geral, e os critérios ortodoxos aos quais as pesquisas são submetidas. Segundo Bárcena (2005, p. 66), "a educação é entendida como um objeto de estudo ou conhecimento cietífico-tecnológico, um tipo de discurso que faz abstração do oral, do particular, do local e do temporal, para encaminhar-se à escritura científica, ao universal, ao geral e ao atemporal". Esse modo de análise também foi utilizado para se pensar a educação que se pautou durante largo tempo, ainda que com exceções, na busca de critérios universais para encontrar aquilo que seria "verdadeiro" e "necessário" para produzir um caráter "científico" no pensamento educacional. Exemplos disso encontramos na seguinte passagem de Ghiraldelli Jr (2005, p. 10): "O tema da verdade é decisivo na filosofia da educação pela simples razão de que a noção de verdade está embutida, como pressuposto, em todo o universo do discurso educativo, pedagógico ou metapedagógico"; ou ainda, na passagem de Mazzotti (2000, p. 187), na qual critica Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 27 o caráter universalizante da filosofia da educação em seu âmbito filosófico-racional "(...) o caráter da argumentação filosófica é apresentar-se como universalidade. Pode se dizer que a filosofia da educação só pode ser apresentada como tal caso se aceite alguma filosofia racional, a qual historicamente se apresenta no longo debate centrado no estabelecimento da universalidade". Esses critérios científico-filosóficos da pesquisa educacional concordam com aquilo que Kastrup (1999, p. 33) entende como analítica da verdade: "A analítica da verdade estuda as representações e suas condições, encontradas no domínio do sujeito, do método ou da linguagem. Para sustentar a representação, essas condições devem ser invariantes, universais e necessárias, à maneira da ciência". A busca incessante pela verdade das/nas coisas e, principalmente pelos postulados feitos com base na obra de Kant, pela verdade analítica que se pode encontrar por meio de um método, fez com que o pensamento se dogmatizasse na tentativa de conhecer a verdade e descobrir a enunciação verdadeira das coisas. Desse modo, a vertente da analítica da verdade tem como princípio de reflexão o fato de que a verdade é algo que pode ser encontrado. Para Deleuze (1988, p. 218), "Esse elemento consiste somente na posição do pensamento como exercício natural de uma faculdade, no pressuposto de um pensamento como exercício natural, dotado para o verdadeiro, em afinidade com o verdadeiro, sob o duplo aspecto de uma boa vontade do pensador e de uma natureza reta do pensamento". Deleuze criticou este modo de procedimento nomeado por ele, em Diferença e repetição, de Imagem do pensamento. Para ele a imagem do pensamento são os pressupostos encontrados tanto no senso comum quanto no pensamento filosófico. Deleuze aponta que o pensamento fundado na imagem do pensamento é problemático, uma vez que ela pode nos conduzir a pseudoproblemas. Para Deleuze, a maneira como os pseudoproblemas são formulados já é uma tentativa de formulação-problema relacionada a uma resposta já elaborada e sabida, que, por sua vez, está ligada a uma imagem do pensamento. Os pseudoproblemas, assim, são concebidos segundo uma imagem do pensamento ligada a uma busca de valor de verdade em suas respostas. Em outras palavras, os pseudoproblemas são postulados que funcionam de tal forma a adequar os significados a significantes Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 28 universais, a respostas já conhecidas. Este tipo de produção de conhecimento tenta encontrar nos significados e significantes convencionados uma maneira de representar um problema, de achar a representação de um problema que remeta aos significantes universais. Desse modo, os pseudoproblemas servem de pressuposto para o pensar. Nesse sentido, o pensamento conceitual filosófico tem como pressuposto implícito uma imagem do pensamento, pré-filosófica e natural, tirada do elemento puro do senso comum. Segundo esta imagem, o pensamento está em afinidade com o verdadeiro, possui fortemente o verdadeiro e quer materialmente o verdadeiro. (Deleuze, 1988, p. 218-219) Para escapar dos pseudoproblemas colocados pela analítica da verdade/imagem dogmática do pensamento, faz-se necessário inventar um problema que problematize a contingência mesma do problematizador, no sentido de não buscar simplesmente um problema que já fora anteriormente colocado à moda dos pseudoproblemas, mas que corresponda ao movimento de produção de realidade imanente. Para Foucault, este tipo de fazer filosófico, essa atitude filosófica, seria decorrente da segunda vertente que surge a partir do pensamento kantiano: a Ontologia do Presente. Segundo Foucault, a ontologia do presente trata de "mostrar em que e como o que fala enquanto pensador, enquanto sábio, enquanto filósofo faz parte, ele mesmo, desse processo e (mais que isso) como ele tem um certo papel a desempenhar neste processo, onde ele então se encontra então ao mesmo tempo como elemento e ator" (1984, p. 104). Foucault (1984) afirma que esse modo de tratamento filosófico, esse método de análise, foi desenvolvido paralelamente ao da analítica da verdade por outros autores desde "Hegel à Escola de Frankfurt, passando por Nietzsche e Max Weber". Foucault assume que seu próprio método de trabalho e o que fundamenta sua obra é justamente a ontologia do presente, como ele mesmo afirma nas últimas palavras de seu artigo: essa é "uma forma de reflexão na qual tentei trabalhar" (1984, p. 112). Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 29 Esse método filosófico já está presente na obra de Foucault desde os anos 1960. Isso pode ser notado na resposta ao questionamento feito por P. Caruso sobre como ele classificaria sua obra. Foucault afirma que É muito possível que meu trabalho tenha algo a ver com filosofia: sobretudo porque à filosofia – pelo menos desde Nietzsche – compete a tarefa do diagnosticar e não mais a de buscar dizer uma verdade que seja válida para todos e para todos os tempos. Eu procuro justamente diagnosticar: diagnosticar o presente. Eu procuro dizer aquilo que nós somos hoje e o que é que agora significa aquilo que nós dizemos. Este escavar sob os próprios pés caracteriza, desde Nietzsche, o moderno pensar e nesse sentido eu posso me designar como filósofo. (Foucault, 1994, p. 606, v.1) Parece-nos que o que Foucault quer entender é: "O que é precisamente este presente ao qual pertenço?" (1984), dito de outro modo, que tipo de filosofa estoufazendo e qual método estou utilizando para fazê-la? Esse modo de tratamento aos problemas se funda como um método, não porque está vinculado a um método no qual seu fundamento esteja na verdade sobre o que deve ser pensado e sobre o como determinada coisa deve ser pensada, mas a um presente que se apresenta como problema e que pede para ser pensado. Como um problema que pede uma solução. A ontologia do presente se fundamenta, assim, em problemas muito precisos que "remetem diretamente a massa documental ou são perguntas que ele faz para seu próprio tempo, pois um problema somente é verdadeiro se formulado em função de uma clausura de condicionamento imanente que não vai além da experiência real" (Cardoso Junior, 2000, p. 89). O movimento de produção da ontologia do presente instala problemas na realidade e faz da realidade o seu problema. Desse modo, "(...) a ontologia do presente tem como condição de possibilidade uma diferença: detectar no presente, não a parte do ser, mas do devir, a parte inatual da realidade atual, a parte predominantemente importante" (Martins, 2000, p. 160). Este modo de tratamento aos problemas filosóficos pode ser encontrado também em Nietzsche. Segundo Veiga-Neto (2003, p. 46), A ontologia do presente é uma ontologia crítica de nós mesmos; ela desloca a questão (kantiana) para uma outra questão, também já presente em Kant, porém enfatizada por Nietzsche (...). Essa Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 30 nova pergunta põe em relevo o sentido e o valor das coisas que acontecem conosco no nosso presente, não mais perguntando sobre a verdade das coisas – até porque a verdade para Nietzsche é histórica (...). Assim, a questão kantiana – que se pretendia transcendental – subordina-se à questão nietzscheana – que é contingente. Nietzsche apresenta claramente seu projeto de crítica à modernidade, de crítica ao seu tempo, na obra Além do bem e do mal (2005). No parágrafo 58, encontramos uma crítica contundente à indiferença dos filósofos em relação ao seu tempo e aos problemas que afetam o seu tempo (a falta de uma ontologia do presente). Para Nietzsche, seu presente é marcado por um modo de fazer filosofia que busca "verdades objetivas" para se acreditar e tornar a vida mais fácil de ser vivida. Essa crítica pode ser encontrada principalmente no parágrafo 24 de Além do bem e do mal, onde se lê: O sancta simplicitas! Em que curiosa simplificação vive o homem! Impossível se maravilhar o bastante, quando se abrem os olhos para esse prodígio! Como tornamos tudo claro, livre, leve e simples à nossa volta! Como soubemos dar a nossos sentimentos um passe livre para tudo que é superficial, e a nosso pensamento um divino desejo de saltos caprichosos e pseudoconclusões!. Este é o problema do presente de Nietzsche que ressoa em nosso presente: a santa simplificação das verdades, pseudoconclusões, enunciadas e assimiladas por todos de forma a tornar tudo claro, livre, leve e simples. Esta é a vontade de saber do homem contemporâneo: saber o que fazer para tornar sua vida simples. Dito de outro modo, saber como pode encontrar a verdade acerca das coisas para que possa seguir sem cometer erros e saber que está sendo correto em seu agir. Nietzsche quer desestabilizar o pensamento acerca da Verdade e da possibilidade de se encontrar a essência das coisas. Uma das críticas a essa busca é feita com relação à possibilidade de se encontrar a verdade acerca da verdade sobre os valores de moralidade. Nietzsche, no parágrafo 108, afirma que "Não existem Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 31 fenômenos morais, mas apenas uma interpretação moral dos fenômenos". Acreditamos que essa crítica possa ser potencializada e atribuída a toda a busca da verdade acerca do pensamento e da moralidade no que respeita à possibilidade de se dizer algo de verdadeiro, no sentido de ser universal e necessário, acerca das coisas que compreendem tanto o pensamento quanto a moralidade. A pergunta que devemos nos fazer nesse momento é: como podemos escapar da analítica da verdade como método de fazer ciência e, particularmente em nosso caso, de fazer filosofia ou filosofia da educação? Parece-nos que nossa pergunta ressoa na de Foucault, na crítica de Nietzsche e, de modo mais remoto, em Kant, especificamente na maneira de colocar o problema de Was ist Aufklärung?, momento em que funda um modo diferenciado de fazer filosofia. Para Foucault (1984, p. 112), (...) há na filosofia moderna e contemporânea um outro tipo de questão, um outro modo de interrogação crítica: é aquela que se vê nascer justamente na questão da Aufkärung ou no texto sobre a revolução; esta outra tradição crítica coloca a questão: o que é nossa atualidade? Qual é o campo atual das experiências possíveis?'. Não se trata da analítica da verdade, trata-se do que se poderia chamar uma ontologia do presente, uma ontologia de nós mesmos (...). Parece-nos que a proposta de Foucault, fundada em Kant e Nietzsche, é a de se fazer uma ontologia do presente. Procedimento este que consiste em pensar o próprio tempo com elementos contingentes, ou seja, não utilizar elementos de transcendência, sejam eles valorativos ou conceituais, para entender o que se passa com nós mesmos. Este é o lugar em que situamos nossos problemas, enunciados na seção anterior. Fazer ontologia do presente é problematizar nossa contingência como elemento e como ator na relação cotidiana com o ensino de filosofia. Olhar além do aparente. Talvez esta intenção, a insistência neste ponto, possa problematizar o fechamento da discussão sobre formação de professores. Entrar na lógica do sentido e não da formalidade na qual os discursos majoritários são desenvolvidos e funcionam para produzir o conceito tradicional de sistema Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 32 educacional como único caminho de formação. Lógica fluida e imanente, encarregada de dar sustentação à transmissão da cultura legítima como herança. Para isso, temos que colocar o problema na ordem do acontecimento, fazer uma ontologia do presente. Não nos restringindo à ordem do dever ser reificado na estrutura de uma teleologia educacional, que tem como fim a Verdade. Entrar na espessura da realidade. (Gelamo & Lima, 2006) Seguindo a esteira enunciada por Foucault, esse problema somente poderia ser formulado da seguinte maneira: o que faz o filósofo quando seu ofício é ser professor de filosofia? Vale notar que nosso problema não é qual deve ser o conteúdo a ser ensinado?; o que é o professor de filosofia?; ou ainda, o que é o ensino de filosofia? Essas questões nos levariam a pseudoproblemas e teríamos que propor pseudoconclusões, acreditando produzir verdades sobre isso. Ensino de filosofia como processo filosófico Uma vez colocado o problema e tendo-o situado na ordem filosófica da ontologia do presente, cabe-nos, se não resolver, ensaiar uma resposta. O caminho que encontramos para nos auxiliar nesse processo de pensamento foi o método filosófico desenvolvido por Deleuze e Guattari em O que é a filosofia? (1997). Na presente seção, partimos das seguintes hipóteses: (1) a de que o filósofo pode filosofar no exercício da docência; (2) pensamos que o ofício do professor de filosofia consista em filosofar, mas não se limite a isso; (3) ele deve produzir-se a si mesmo e criar condições para que o ensino se efetive como um processo de subjetivação; (4) somente assim o ensino de filosofia pode se dar como um processo filosófico e produzirpensamento para alcançar as premissas que o saber filosófico impõe àqueles que querem fazer filosofia, ou seja, filosofar. Para responder a isso, fundamentamo-nos em Deleuze e Guattari, especialmente na obra O que é a filosofia? (1997). Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 33 Entendemos que o filósofo-professor de filosofia precisa produzir seu plano de imanência para que possa entender o campo problemático que afeta seu presente. Este plano deve ser apresentado, a princípio, de modo intuitivo, como não poderia deixar de ser, e de modo consistente para que dê suporte à criação de seus conceitos. "O plano de imanência não é um conceito pensado nem pensável, mas a imagem do pensamento, a imagem que ele se dá do que significa pensar, fazer uso do pensamento, se orientar no pensamento (...)" (Deleuze & Guattari, 1997, p. 53). Desse modo, o plano de imanência funciona como um mapa para que os conceitos filosóficos possam ser pensados no processo educacional. Para Deleuze e Guattari (1997), "O plano [de imanência] é como um deserto que os conceitos povoam sem partilhar. São os conceitos mesmos que são as únicas regiões do plano, mas é o plano que é o único suporte do conceito" (p. 52). Por este motivo, o filósofo-professor tem antes que traçar o mapa do plano para criar os conceitos que o povoarão. É no plano de imanência que os conceitos serão enrolados e desenrolados, este é o lugar em que os conceitos podem funcionar (p. 51). O plano de imanência é produzido pelas experiências de mundo formuladas com base nos modos de acesso à realidade. Assim, é o lugar no qual o filósofo problematiza e é problematizado pela realidade, fazendo com que ela se subjetive, se dobre, de determinado modo; lugar onde o pensamento é atacado, é o impensável não pensado. "O plano de imanência é como um recorte do caos e age como um crivo" (p. 59). Por esse motivo, segundo Deleuze e Guattari, ele é pré- filosófico, pré-conceitual. O plano de imanência é a matéria do pensamento. Matéria prévia na qual o pensamento se dobrará para produzir conceitos. Para Deleuze e Guattari (idem, p. 59), "O plano de imanência é pré-filosófico, e já não opera com conceitos, ele implica uma espécie de experimentação tateante, e seu traçado recorre a meios pouco confessáveis, pouco racionais e razoáveis. São meios da ordem do sonho, dos processos patológicos, das experiências esotéricas, da embriaguez ou do excesso". Nosso plano de imanência foi produzido com base na problematização de nossas experiências tateantes: fomos problematizados pela nossa experiência docente, ou Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 34 seja, pela contingência mesma do exercício filosófico do ensino de filosofia. Podemos indicar um caminho a seguir, pois, segundo Deleuze e Guattari, traçar um plano de imanência é traçar um recorte no caos. Assim, o problema ensino de filosofia penetra todas as outras questões filosóficas em sala de aula e dá consistência para se pensar conceitualmente (1997, p. 60). Partindo do plano de imanência, colocamos o problema que tensionou o plano. Inventamos um problema. Uma vez que não se deve simplesmente buscar um problema que já fora anteriormente colocado à moda dos pseudoproblemas, os quais não corresponderiam ao movimento de produção de realidade/plano de imanência, colocamos o problema na ordem do acontecimento: o que faz o filósofo quando seu ofício é ser professor de filosofia? Ao instalar o problema na ordem do acontecimento, na ordem do presente, entendemos que o movimento de produção de realidade problematiza o plano de saberes que constituem a "aula" e, assim, exige solução. Para Deleuze e Guattari (1992, p. 27), a solução para os problemas em filosofia se dá por meio da criação de conceitos, por isso, "Todo conceito remete a um problema, a problemas sem os quais não teria sentido (...)". O conceito deve ser pensado como um momento de criação de sentido, um momento de produção de sentido, que foi exigido pelo movimento de produção, que constituiu seu plano de imanência problemático. Desse modo, é possível encontrar indícios que nos mostram o caminho para conceituar. Nesse sentido, podemos criar conceitos que expressem os problemas do acontecimento da/na aula e testá-los para saber se esses são bons conceitos para fazer funcionar as intensidades problemáticas produtoras de vida educacional filosófica. Dito de outro modo, podemos problematizar os saberes que habitam o plano de imanência e entender como eles estão funcionando para expressar as produções do ensino de filosofia e de outros problemas que se constituem durante a atividade educacional. Desse modo, o educador filósofo pode agir e fazer o ensino de filosofia funcionar como produção de subjetividade, produzindo subjetivações e fazendo com que o ensino de filosofia se torne um acontecimento filosófico, ou seja, uma criação de conceitos. Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 35 Este modo de pensar está em oposição ao modo da analítica da verdade de entender o sujeito do conhecimento, fundado na representação. Isso porque, se entendermos o sujeito como centro do processo, não poderemos pensar a criação de conceitos, uma vez que a representação se faz com base numa adequação do pensamento aos significantes representacionais. A criação supõe a reinvenção de signos e não a adequação do fluxo de pensamento aos significantes e significados estabelecidos. Por isso, precisamos pensar o ensino de filosofia como produção de subjetividade, com base em agenciamentos educacionais, como um processo de criação. Se entendermos a aula como acontecimento filosófico, possibilitaremos que o processo educacional seja uma produção de subjetividade educacional filosófica que se dá como processo de subjetivação. Um processo de subjetivação, isto é, uma produção de modo de existência, não pode se confundir com um sujeito, a menos que se destitua este de toda interioridade e mesmo de toda identidade. A subjetivação sequer tem a ver com a "pessoa": é uma individuação, particular ou coletiva, que caracteriza um acontecimento (uma hora do dia, um rio, um vento, uma vida...). É um modo intensivo e não um sujeito pessoal. É uma dimensão específica sem a qual não se poderia ultrapassar o saber nem resistir ao poder. (Deleuze, 1992, p. 123-124) A idéia de Processo de Subjetivação foi pensada por Deleuze e Guattari em oposição aos conceitos tradicionais de sujeito e subjetividade, que, segundo nossos autores, não são bons conceitos para a compreensão do processo humano e de suas atividades cotidianas. Para esses autores, e neste caso incluiríamos também Foucault, "A subjetivação é a produção dos modos de existência ou estilos de vida" (Deleuze, 1992, p. 142); e não de um sujeito individual. Esses autores entendem que a produção de um modo de existência não pode ser pensada como resultado da atividade cognitiva de um sujeito universal do cogito, entendido como uma individualidade que representa o mundo e que o sujeita à representação subjetiva de um indivíduo que tem primazia em relação a um objeto. Essa maneira de entender o sujeito é relativa a um Eu, a um Você, a uma Rua Dr. Moacir Birro, 663 – Centro – Cel. Fabriciano – MG CEP: 35.170-002 Site: www.ucamprominas.com.br e-mail: diretoria@institutoprominas.com.br 36 subjetividade individual ou individualizante do conhecimento, na busca de uma identificação do objeto conhecido como algo já dado, uma re-apresentação ao sujeito de uma imagem e,
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