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Metabolismo do potássio A primeira coisa mais importante que temos que saber do potássio é que é um íon que quase não está no extracelular (10%). O potássio é praticamente do intracelular (90%). A membrana celular é fisiologi- camente impermeável ao sódio e ao potássio graças à bomba de Na+/K+-ATPase. 90-95% do potássio é excretado pela urina e 5- 10% pelas fezes. [K+] = 140-150 mEq/L (dentro da célula). No plasma: 5 mEq/L. A calemia deve ser sempre mantida na faixa de 3,5- 5 mEq/L para evitar distúrbios neuromusculares. A célula aceita muito a entrada de potássio. Pode-se ingerir o dobro necessário da dose diária de potássio sem alterar o VIC. Um indivíduo hígido pos- sui mecanismos fisiológicos muito eficazes em man- ter a calemia dentro da faixa adequada: a ingesta aguda de uma carga alta de potássio produz um au- mento transitório da calemia. A hipercalemia e a hipocalemia podem alterar perigosamente a eletrofisiologia cardíaca ao modifi- carem o potencial de repouso. O potássio entra rapidamente nas células graças a ação da insulina e da adrenalina (receptores beta- 2). Depois de algumas horas, começa a ser elimina- dos pelos rins por ação da aldosterona, produzida na zona glomerulosa da suprarrenal e estimulada pelo aumento da calemia: aumenta a retenção de só- dio em troca da excreção de potássio. CONTROLE HORMONAL DO POTÁSSIO: insulina (leva potássio para a célula), adrenalina (receptores β-2-adrenérgicos estimulam entrada de potássio na célula) e aldosterona (aumenta a secreção de potás- sio no néfron distal). • Betabloqueadores podem causar hipercalemia. • Na cetoacidose diabética, quando for administrar insulina, pode ser necessário corrigir antes o po- tássio, para evitar hipocalemia. O paciente em cetoacidose perde muito potássio pela poliúria. DISTÚRBIOS DO POTÁSSIO Por ingesta alterada. Por eliminação alterada: 90% urina, 10% fezes. Por alteração na troca de potássio transcelular (a relação de potássio entre o intra e o extra tem que ser mantida sempre). MANEJO RENAL DO POTÁSSIO A excreção renal de potássio depende de 3 fato- res: TFG (quase não se altera), reabsorção nos túbu- los e secreção para os túbulos. A maior parte do po- tássio excretado resulta da secreção no néfron dis- tal. • Todo o potássio é filtrado no glomérulo. • 60-70% é reabsorvido no TCP. • 20-30% é reabsorvido no ramo ascendente es- pesso da alça de Henle. • 5% é reabsorvido no TCD. • Néfron distal (parte final do TCD + parte inicial do ducto coletor): reabsorção e secreção de po- tássio. Quanto mais sódio chegar ao néfron distal, mais potássio e H+ serão secretados = o aporte de sódio ao néfron distal é um fator determinante na excre- ção de potássio. A regulação final do potássio é feita pela con- centração plasmática de potássio (se hipercalemia, secreta mais potássio) e pela aldosterona. ALDOSTERONA: aumenta o número de canais de sódio e estimula a bomba de Na+/K+-ATPase, au- mentando a reabsorção de sódio e a secreção de po- tássio (troca um sódio por um potássio). • Espironolactona (antagonista da aldosterona): pode fazer hipercalemia, porque diminui a secre- ção de potássio no néfron distal. Fator Potássio plasmático Insulina ↓↓ Glucagon ↑ β-adrenérgico ↓ ɑ-adrenérgico ↑ Aldosterona ↓ Exercício físico ↑ Acidose metabólica ↑ Alcalose ↓ HIPOCALEMIA Toda vez que a pessoa tem hipocalemia, temos que ver se é por diminuição da ingesta ou aumento das perdas (renal ou extra-renal). É difícil descobrir se é por desvio transcelular na anamnese e no exame físico. Na maioria das vezes, é multifatorial, tanto por ingesta diminuída quanto por perda na urina ou nas fezes. Ingesta normal = 3-7 g/dia de KCl . Tipo de hipocalemia Mecanismo Perda de potássio Perda no TGI: vômitos, diarreia, laxantes, fístulas digestivas, ileostomia. K+ urinário < 20 mEq/dia. Perda urinária: poliúria, diuréticos (tiazídicos, furosemida), alcalose me- tabólica, hiperaldosteronismo, hipomagnesemia, síndromes tubulares (Bartter, Gitelman, Liddle – raras), drogas (anfotericina B, aminoglicosí- deos, penicilina, hidrocortisona). K+ urinário ≥ 20 mEq/dia. Entrada de potássio na célula Mais comuns: reposição de insulina, estresse (adrenalina), uso de beta- 2-agonista (LABA/SABA). Intoxicação por sulfato de bário, cloroquina. Tratamento da anemia megaloblástica. Paralisia periódica hipocalêmica. Dosar potássio na urina para saber se é renal ou ex- tra-renal (não é muito fidedigna): • Renal: K+ urinário ≥ 20 mEq/L. • Extra-renal: K+ urinário < 20 mEq/L. Diante de uma acidose, pode ocorrer hipocale- mia, mas não é comum. Isso poderia ser por uma di- arreia intensa, sepse (acidose láctica) e na IRA cau- sada por aminoglicosídeos e anfotericina B. PSEUDO-HIPOCALEMIA: quando a dosagem plas- mática é baixa, mas a quantidade é normal. Ocorre nos casos de policitemia severa, em que as hemá- cias estão com muito potássio, reduzindo o valor plasmático. Não há sintoma de hipocalemia. Manifestações clínicas da hipocalemia Geralmente ocorrem quando o potássio ficar < 3 mEq/L. Os principais sintomas são fraqueza mus- cular, fadiga, intolerância ao exercício e cãibras musculares. CARDIOVASCULAR: arritmia (mais comum é ex- trassístole), hipertensão. Alteração chave no ECG é a onda U patológica. NEUROMUSCULAR: • Músculo liso: constipação, íleo paralítico, disfun- ção vesical. • Músculo esquelético: fraqueza, tetania, paralisia, mialgias, rabdomiólise. Comentado [MEA1]: DM, manitol e diuréticos. Comentado [MEA2]: Hipertensão, hipocalemia e alca- lose metabólica. RENAL • Diminuição da taxa de FG. • Diminuição do fluxo sanguíneo renal. • Aumento da produção de amônia. • Fosfatúria, hipercalciúria. Cronicamente, a hipocalemia pode levar a diabetes insipidus nefrogênico = nefropatia hipocalêmica. Mais tarde, o indivíduos evolui com insuficiência re- nal crônica. ALTERAÇÕES NO ECG • Primeiras alterações: achatamento da onda T, in- fradesnível do sST e aumento da amplitude da onda U. • Alterações graves: aumento do iPR e alargamento do QRS. Onda U patológica: U > T (onda T achatada ou inver- tida). A hipocalemia crônica predispõe à alcalose meta- bólica = produz uma acidose intracelular pela troca de K+ por H+. Isso faz com que as células tubulares renais, em acidose, produzam mais amônia = alca- lose metabólica. Também pode desencadear ence- falopatia hepática em cirróticos, pela maior produ- ção de amônia. Diagnóstico Descartar pseudohipocalemia (policitemia). Uso de insulina, beta-agonista, alcalose (mandam para dentro da célula). Dosagem de K+ plasmático (normal: 3,5-5 mEq/L). Definir perda renal ou extra-renal: dosagem de K+ urinário de 24h. • < 20 mEq/L: perda TGI. • ≥ 20 mEq/L: perda renal. Perda renal: definir se é por poliúria, hiperaldoste- ronismo (principal causa é aldosteronoma – sín- drome de Conn) ou síndrome tubular (as raras). Para isso, colhe-se gasometria arterial e se calcula o gra- diente transtubular de potássio (mostra a secreção de potássio no néfron distal). GTTK < 2 = perda renal por aporte de sal aumentado no ducto coletor (diuréticos, poliúria). GTTK > 4 = hipersecreção de potássio (hiperaldo, síndromes tubulares, anfotericina B). Hipocalemia renal: solicitar dosagem de HCO3, que auxilia na diferenciação dos distúrbios ácido-bási- cos. Tratamento da hipocalemia Feito se K < 3 e/ou sintomatologia e/ou alterações no ECG. Elevar o potássio (> 3) o mais rápido possí- vel. ETAPA RÁPIDA 10-20 mEq em 100-150 mL SF EV em bomba de infu- são para correr 1h (se for 10) ou 2h (se for 20). • Máximo por litro de soro: 60 mEq/L. • Dose: 2 ampolas de KCl 10% EV em 500 mL de SF. Por que tem que ser SF? Se for SG, a glicose, quando entra na veia, estimula a secreção de insulina, e aí entra potássio para a célula e aí vai atrasar o trata- mento da hipocalemia.1 ampola de KCl a 10% contém 1g de KCl (13 mEq). O potássio causa flebite!! Arde muito. Às vezes, é ne- cessário pegar uma veia profunda. ETAPA DE MANUTENÇÃO Após estabilizar em K > 3. Deve-se repor 40-80 mEq/dia de KCl VO, além de repor os níveis de H/HCO3. Tratar a causa de base. HIPERCALEMIA Existem duas formas de fazer hipercalemia: por retenção de potássio (não secreta no néfron distal) ou por saída de potássio da célula. Pseudo-hipercalemia: é mais comum que a pseudo- hipocalemia. A dosagem plasmática está alta mas não há sintomas. Ocorre quando há aumento celular (leucocitose, trombocitose) e por erro na técnica (garrote prolongado, hemólise). • Suspeita: dosar potássio no plasma, não no soro. Tipo de hipercalemia Mecanismo Retenção de potássio Insuficiência renal: é a principal causa, mas, para causar hipercalemia, a TFG precisa ser bem baixa. TFG < 10-15 mL/min Hipoaldosteronismo: pensar quando houver hipercalemia persis- tente/inexplicada com função renal preservada. • Doença de Addison (insuficiência adrenal primária = OBS: a secundá- ria não causa hipoaldosteronismo porque a secreção de aldosterona não é regulada pelo ACTH). • Hipoaldosteronismo hiporreninêmico (deficiência de renina, geral- mente na DM). • Doenças tubulares renais: nefropatia falciforme e nefropatia por anal- gésicos. • Inibição da AII: IECA, inibidor de renina. • Uso de heparina. TFG > 20 mL/min Tríade clássica do hipoaldosteronismo: hipotensão (perde muito sódio) + hipercalemia + acidose metabólica. Saída de potássio da célula Principais: hiperosmolaridade (cetoacidose diabética, hipernatremia), acidose metabólica e uso de betabloqueadores. Outras: sepse, rabdomiólise, intoxicação digitálica, uso de succinilcolina. Betabloqueador: não deixa potássio entrar. Cetoacidose diabética: tem hipocalemia porque tem muita poliúria, mesmo que tem pouca insulina. Por isso tem que corrigir potássio antes de administrar insulina. Manifestações clínicas CARDÍACAS: alteração do ECG (onda T apiculada), arritmias. NEUROMUSCULAR: parestesia, fraqueza, paralisia. RENAL: natriurese, diminuição da produção de NH4+. ENDÓCRINA: aumento da secreção de aldosterona e de insulina. Alterações no ECG: costumam aparecer com níveis de potássio acima de 6 mEq/L. • Primeira fase: onda T apiculada e simétrica (onda T em tenda). • Segunda fase: alargamento do iPR e redução da amplitude da onda P até desaparecer. • Terceira fase: alargamento do QRS e redução de sua amplitude. • Última fase: ritmo sinusoidal. O nível sérico de potássio não tem relação com o pa- drão do ECG. Diagnóstico Passo 1: descartar pseudo-hipercalemia e saída de potássio das células (acidose, betabloqueadores, hi- perosmolaridade). Passo 2: se for por retenção de potássio, diferenciar se é por insuficiência renal ou por hipoaldostero- nismo. Faz-se o GTTK na gasometria arterial. GTTK > 8 = insuficiência renal. GTTK < 5 = uso de fármacos, insuficiência adrenal. TFG < 10-15 = insuficiência renal. TFG > 20 mL/min = sugere hipoaldosteronismo. Tratamento Antagonizar a ação do potássio na membrana celu- lar: isso se faz com o cálcio. É a primeira coisa a se fazer, mas não baixa o potássio. Gluconato de cálcio 10%: 10 mL EV (1 amp) lenta- mente (2 a 3 min). Repetir em 5 minutos se o ECG continuar alterado, depois para. Nunca pode ser dado em bolus na veia, rapidamente, porque mata. Se PCR: tem que ser cloreto de cálcio. A contraindicação mais importante para a adminis- tração de cálcio na hipercalemia é a intoxicação digitálica. O cálcio aumenta a toxicidade cardíaca dos digitálicos. Desviar o potássio do extra para o intra: insulina, beta-2-adrenérgico. Diminui a calemia. Insulina R 10 U EV em 100 mL SF para correr em 30 min + 50g glicose (100 mL SG, evitar hipoglicemia). Agonista B2: salbutamol 10 a 20 mg em 4 mL de so- lução salina - inalação por 10 min ou 0,5 mg EV. Cui- dado no doente coronariopata (taquicardia). Bicarbonato de sódio: indicado quando houver aci- dose metabólica. Remover potássio do organismo: furosemida, resina de troca iônica, diálise peritoneal ou hemodiálise (se o paciente já faz diálise). Diurese com furosemida: 40 a 80 mg EV em bolus. Corre o risco de fazer diminuição do VCE. Resina: 15 a 30 g VO ou IR sorcal ou kayexalate.