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- -1 PROJETO DE ARQUITETURA E URBANISMO I A FORMA NA COMPOSIÇÃO ARQUITETÔNICA Iuri Cesário Araújo - -2 Olá! Você está na unidade . Conheça aqui algumas das maneiras possíveis deA forma na composição arquitetônica se perceber e analisar os aspectos morfológicos na arquitetura e no urbanismo, assim como as relações entre espaços criados e os estímulos que essas concepções podem provocar. Ao final desta unidade, você terá assimilado princípios básicos de estruturação e organização da forma que interferem significativamente no modo como o arquiteto e urbanista determinam o tamanho, a medida, a forma e o volume do seu espaço projetado. Bons estudos! - -3 1 Plástica, proporção, aeração É possível pensar e projetar arquitetura e urbanismo usando inúmeros métodos, seja a partir de um elemento ordenador, por obrigatoriedade imposta, por necessidade etc. Há quem projete “de fora para dentro” ou ainda “de dentro para fora”, ou seja, quem pense que as funções são secundárias à forma ou quem segue a famosa frase do arquiteto norte-americano Louis Sullivan, (a forma segue a função), por entender que aform follows function função é quem designa a volumetria. Não há uma doutrina específica que regule o método de projetar, todavia existe uma série de estudos, além de percepções empíricas que afirmam haver possibilidades de exploração da harmonia do espaço criado, o que podemos chamar de plástica. É natural que todos que tenham visto a palavra “plástica” tenham pensado primeiro em “plástico”, talvez houve aquele que pensou em “plasticidade”, aquilo que se vê em física. Ambas possuem relação direta com o verbete grego plastikós, que significa moldar ou modelar, portanto, não se sinta inferior por isso. Entretanto, o que se põe em discussão por aqui é a questão da plástica enquanto conjunto de fatores objetivos e subjetivos que configuram a forma, tal qual se pensa nas artes visuais, inclusive nas artes plásticas, ou ainda na cirurgia plástica, que remete à questão da estética e do belo, a ser tratada ainda nessa unidade. Figura 1 - Parthenon, Atenas, Grécia Fonte: Arn Alava, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Na foto, mostra as ruínas de um templo grego com colunas da ordem dórica e entablamento com partes ausentes e sem frontão. - -4 Por fim, nesta primeira parte, além de examinar os fatores que conferem equilíbrio ao espaço criado, deve-se ressaltar também a aeração do edifício, que em outras palavras, refere-se às aberturas criadas com o intuito de ligar ambientes internos entre si e com o exterior, permitindo acessos e circulações tanto dos indivíduos quanto de materiais, vento, luz, som etc. Dentre outros muitos aspectos, a observação de fatores como os apresentados aqui possibilita ao arquiteto e urbanista conceber projetos coerentes, funcionais e eficazes. - -5 1.1 Elementos de plástica Falar sobre elementos de plástica – que também são elementos de desenho, uma vez que a plástica tem por objeto a materialidade do espaço – significa abordar as características físicas, sensoriais e expressivas dos materiais, superfícies e espaços que compõem o todo e que podem, ou não, coexistir em equilíbrio. Essa tal harmonia que tanto se fala aqui possui relação direta com o que é, ou não, feio ou belo, trazendo à discussão a questão da estética, um campo vasto da filosofia conhecido pelo seu vasto, porém por vezes inconcluso, estudo da forma bela ideal. Ainda que seja inviável discorrer sobre a estética como um todo a esta altura do curso, convém explicitar para este estudo que ela, quando aplicada a um objeto arquitetônico, mesmo este objeto também sendo encarado com artístico, é vista principalmente sob o paradigma da forma versus função, ou seja, entre o belo e o funcional. Seguramente um fator não exclui o outro, contudo é possível afirmar que além dos fatores estilísticos e na construção de uma determinação subjetiva de estética na arquitetura, por exemplo, a caracterização de um objeto como arquitetônico reside no fato primordial da sua utilização, de maneira que esta é também fator que confere beleza ao edifício. Para comprovar esta afirmação, pense nos monumentos históricos no Brasil, por exemplo, entre aqueles que têm uso contínuo como um palácio de governo e um monumento de apreciação como um busto de um personagem da história. Ressalvadas as suas características materiais, sociais e territoriais, monumentos com usos constantes possuem mais acesso e, portanto, visibilidade, conduzindo essa imagética para um lugar comum da memória coletiva que o normaliza como adequado e, consequentemente, belo. Retomando a materialidade de plástica, serão apresentados a seguir o que Ching interpreta como elementos primários da forma, que são o ponto, a reta, o plano e o volume (1998). Interessa perceber que tanto o ponto, Fique de olho Para saber um pouco mais sobre conceitos da estética e da sua aplicação na arquitetura e no urbanismo, sugiro que leia o trabalho de conclusão do curso de arquitetura e urbanismo, de Agata Harumi Takiya Rodriguez, intitulada “A relação estética/ética na arquitetura, que busca compreender as relações entre tais terminologias, o arquiteto, a arquitetura, e a sociedade (RODRIGUEZ, 2011). Disponível em: <https://repositorio.unesp.br/bitstream/handle/11449 /120846/rodriguez_aht_tcc_bauru.pdf?sequence=1>. - -6 quanto a reta e o plano podem ser perceptíveis no plano bidimensional, mas não no plano tridimensional, ou seja, fazem parte da concepção de projeto, até mesmo como partido arquitetônico, mas somente se corporificam em volumes. Além desses quatro elementos, faz-se necessário abordar também os condicionantes que envolvem o espaço – em suas dimensões propositivas e residuais –, bem como as particularidades próprias do volume e do espaço, como a textura, a cor, a luz e a sombra. O ponto, para a matemática, determina uma posição no espaço, é adimensional, portanto não possui volume, área, comprimento ou direção, mesmo assim ele é capaz de marcar algo, seja como ponto de fuga, para onde as linhas de um desenho se vão; de observação, de onde se vê a paisagem; de partida, marcando o início de um trajeto; ou de referência, como marco de destaque. Tanto na arquitetura quanto no urbanismo o ponto é utilizado para destacar elementos em meio a um todo, como o caso da rosácea (ou óculo), uma espécie de janela em círculo localizado em igrejas, que permite a entrada estratégica de um feixe de luz direcionado para o altar em determinada parte do dia (figura “Mosteiro do Jerônimos. Lisboa, Portugal”); além da disposição de um monumento numa escala diferente do todo com vistas a se comportar como símbolo do território (figura “Vista da Torre Eiffel. Paris, França”). Nesta mesma perspectiva, importa registrar também que mesmo não tendo direção, o ponto tende a direcionar a visão do usuário para qualquer ponto no contexto da paisagem. Figura 2 - Mosteiro do Jerônimos. Lisboa, Portugal Fonte: LifeCollectionPhotography, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto da fachada revestida de pedra calcária do Mosteiro dos Jerônimos, com destaque para a rosácea. - -7 Figura 3 - Vista da Torre Eiffel. Paris, França Fonte: Gibson4, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Na foto, a cidade de Paris com a Torre Eiffel ao fundo. Enquanto na matemática o ponto determina uma posição no espaço, a é a menor distância entre doisreta pontos, o que permite ligar ou ainda romper marcos visuais, além de delimitar planos (dispostos de maneira radial, paralela ou perpendicular), estabelecer direções, alongar ou encurtar panoramas de visão, como o caso do Museu de Arte de São Paulo – MASP (figura “MASP. São Paulo, Brasil”). Neste caso, chamamos a atenção não somente para as retas, como também para as linhas curvas, que mesmo não sendo a menor distância entre dois pontos, balizam e destacam um percurso, como o eixo rodoviário de Brasília (figura “Plano Piloto. Brasília, Brasil”). Com relação ao , alguns postulados podem ser defendidos acerca dasua formação: ele pode ser fruto de,plano no mínimo, três pontos colineares, ou seja, não estando posicionados em uma única linha; pela disposição uma reta e um ponto fora dela; por duas retas concorrentes ou ainda por duas paralelas distintas. Em outras palavras, é possível definir o plano como uma figura geométrica bidimensional, tal qual o ponto e a reta, formada a partir da junção de infinitas retas paralelas e delimitadas por outras retas perpendiculares ou concorrentes. Um plano sozinho não consegue ser perceptível no espaço, pois mesmo havendo largura e comprimento limitados, não tem altura, do contrário seria um volume, entretanto, quando dispostos em coletivo no campo visual, compondo figurativamente os três vetores (altura, largura e comprimento) definem um espaço. Lembrando que o plano não precisa ser necessariamente plano, retilíneo, ele pode ser curvo. Se você pegar uma folha de papel, vai entendê-la como plana, agora se você curvar como quem pretende transformá-la em um cilindro, ainda assim ela vai ser um plano, desconsiderando a espessura do papel. - -8 Figura 4 - MASP. São Paulo, Brasil Fonte: Junior Braz, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto mostra a fachada do MASP, com destaque para o sistema de pilares e vigas em concreto revestido com tinta vermelha e a volumetria do museu com lajes em concreto aparente e vedação em vidro. Figura 5 - Plano Piloto. Brasília, Brasil Fonte: Tish11, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A imagem mostra o mapa do Plano Piloto de Brasília, com linhas brancas e corpo d’água em azul sobre fundo preto. - -9 O sistema trilítico (pilar, viga e laje) na arquitetura acaba por evidenciar a constituição dos planos, principalmente pela necessidade da utilização da laje, o que alguns arquitetos tendem a esconder e outros, como Frank Lloyd Wright, fazem deste elemento o seu partido (figura “ . Chicago, EUA”). Além disso, éRobie House possível perceber o plano não só como um elemento geométrico construído, existente, mas também como o espaço vazio decorrente do delineamento de espaços construídos, a exemplo do urbanismo espanhol (figura “Plaza Mayor. Madri, Espanha”). Figura 6 - Robie House. Chicago, EUA Fonte: Marek Lipka-Kadaj, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto mostra a fachada de uma residência composta por diversos muros, paredes e lajes em tijolo aparente e concreto. Figura 7 - Plaza Mayor. Madri, Espanha - -10 Figura 7 - Plaza Mayor. Madri, Espanha Fonte: Alexandr Medvedkov, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto aérea mostra diversos prédios geminados ao redor de uma praça em formato retilíneo. O volume é o objeto e o objetivo do arquiteto e urbanista. Para Francis Ching, é a “dimensão de um objeto tridimensional ou a extensão do espaço que ele ocupa” (2006, p.133). É quando o elemento possui as três dimensões mensuráveis, altura, largura e comprimento, de onde podem ser percebidos real ou virtualmente pontos, retas e planos, tanto pela concepção de sólidos quanto pelo vazio como resultado da contenção por outros planos. Ainda que a paisagem seja uma espécie de tela, bidimensional, ela é composta por objetos tridimensionais em suas mais infinitas formas, o que significa dizer que a plástica do volume arquitetônico deve ser pensada desde a sua concepção como um objeto integrante do todo, podendo ser vista inclusive como elemento de contraposição da paisagem (figura “Sydney Opera House. Sidney, Austrália”). Para o urbanismo, na área do desenho urbano, é possível verificar com clareza a utilização intencional de pontos, retas e planos; já a volumetria pode ser trabalhada também a partir da utilização do planejamento urbano, que possui estratégias e ferramentas que regulam o uso do solo e que controlam, por exemplo, as alturas das edificações, delimitando a conformação da paisagem (figura “Barcelona, Espanha”). Figura 8 - Sydney Opera House. Sidney, Austrália Fonte: lembi, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto da Ópera de Sydney, com destaque para a volumetria excepcional e a sua posição às margens da baía. - -11 Figura 9 - Barcelona, Espanha Fonte: marchello74, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: foto aérea de Barcelona com os quarteirões com dimensões homogêneas e a catedral da Sagrada Família ao centro. Enquanto vemos a volumetria como objeto materialmente constituído, o espaço que tratamos aqui refere-se justamente ao vazio, seja como ambiente interno na arquitetura, seja como espaços abertos no urbanismo, tais como praças, parques, jardins (figura “Jardins de Versalhes, França”). Infere-se que os espaços supracitados tenham em si a dinâmica de serem projetados para cumprir a função que se determina, e até mesmo o fato de não abrigar nenhuma função aparente pode ser vista como proposital. Entretanto, cabe também assinalar que o grande desafio do arquiteto e urbanista, além de definir espaços de uso e manipular a geometria quando lhe convém, é não apontar espaços não projetados, residuais, em que nada se destina até o momento em que outro indivíduo se encarrega de significar o território, por vezes, de maneira desfavorável para o todo (figura “Roma, Itália”). - -12 Figura 10 - Jardins de Versalhes, França Fonte: Mistervlad, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto com esculturas em ouro no centro de um lago em primeiro plano, com uma esplanada de árvores de grande porte nas laterais e grama no meio. Ao fundo, está o Palácio de Versalhes. Figura 11 - Roma, Itália Fonte: LifeCollectionPhotography, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto com algumas barracas de lona e alguns objetos espalhados em um passeio localizado embaixo de uma ponte em Roma. No âmbito das artes, a textura pode ser conceituada como uma qualidade visual e tátil de uma superfície a se caracterizar por meio do tamanho, forma, organização e proporção das partes. Tudo que é tátil possui textura, mesmo quando se está em estado líquido ou até mesmo o fogo. O desafio do arquiteto e urbanista é utilizar este - -13 recurso com o objetivo a proporcionar conforto para o usuário, seja sob o ponto de vista visual, seja pelo ponto de vista do toque. A história da arquitetura traz muitas nuances desse fator, a exemplo do período clássico, cujas colunas possuíam capitéis de ordem dórica, sem ornamento no capitel; jônica, com o capitel decorado com volutas; e coríntia, com ornamentos bem mais rebuscados (KOCH, 2008). Cada corrente estilística trazia a sua particularidade na textura, de maneira breve é possível pensar essa trajetória observando o período românico, com evoluções mais estruturais que propriamente decorativas; passando pelo gótico, no qual o ornamento era projetado de maneira minuciosa; o renascimento, com estruturas racionais e ornamentos com menor destaque; o barroco, que retoma o uso abundante da ornamentação (figura “Altar do Convento de Santo Antônio. Rio de Janeiro, Brasil”); até o modernismo, onde a beleza está nos elementos construtivos e cujo ornamento é renegado (figura “Igreja de São Francisco de Assis. Belo Horizonte, Brasil”). Figura 12 - Altar do Convento de Santo Antônio. Rio de Janeiro, Brasil Fonte: AlessandraRC, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto exibe o altar do Convento com elementos decorativos banhados à ouro e a imagem de Santo Antônio no centro. - -14 Figura 13 - Igreja de São Francisco de Assis. Belo Horizonte, Brasil Fonte: Maarten Zeehandelaar, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto do interior da igreja, com bancos em primeiro plano, quadros nas paredes retratando a Via Sacra, um altar ao fundo e uma pintura de São Francisco de Assis na parede. Pedrosa, em “Da cor a cor inexistente”, defende que a cor não tem existência material, trata-se apenas da “sensação produzida por certas organizações nervosas sobre a ação da luz – mais precisamente é a sensação provocada pela ação da luz sobre o órgão da visão” (2009, p. 17). De fato, a cor não existe sem a luz nem sem o olho que o vê, portanto, a utilização da cor não se limita a uma preferência ou intensãode percepção, ela deve estar atrelada aos condicionantes naturais ou artificiais da luz que o revelarão. Além do mais, a cor pode ter dois sentidos: ser luz, através da radiação luminosa com comprimento de onda; e ser pigmento, substância material relativa à química e à reflexão da luz. A e a , por sua vez, além de variarem a percepção da cor, contribuem para a qualidade sensorial doluz sombra indivíduo no espaço. Tanto em ambientes abertos ou fechados, o escuro não proporciona boas sensações, pois o Fique de olho Sobre emprego da cor na arquitetura, há um artigo muito interessante escrito por Matheus Pereira, que fala um pouco das sensações que as cores são capazes de causar no usuário. Está disponível em: <https://www.archdaily.com.br/br/894425/o-papel-da-cor-na-arquitetura>. - -15 ser humano tem a necessidade de utilização da visão para sentir-se seguro, ao passo que ambientes excessivamente iluminados comprometem diversas funções que dependem da acuidade visual, como a leitura, a prática de atividades físicas ou ainda as tarefas de cozinha. Logo, espera-se certa estabilidade. A cor, além de também ser característica de determinados estilos artísticos, a exemplo do barroco, com as suas esculturas repletas de movimento e o uso abundante dos tons intermediários das cores entre a luz e a sombra; e o neoclassicismo, marcado pelo retorno dos elementos clássicos adaptado a novos programas arquitetônicos e do uso predominante de tons pastel, também pode ser verificado como marca cultural, como pode ser observado na contraposição entre o urbanismo de cidades europeias como Santorini, na Grécia (figura “Santorini, Grécia”), e as cidades históricas brasileiras, como Olinda (figura “Olinda, Brasil”). Figura 14 - Santorini, Grécia Fonte: Icemanphotos, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto exibe edifícios em áreas de encosta de tamanho e formatos variados, todos pintados de branco em primeiro plano, ao fundo o mar. - -16 Figura 15 - Olinda, Brasil Fonte: Marcio Jose Bastos Silva, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto mostra casas geminadas com estilos semelhantes, portas e janelas grandes e cores vibrantes próximas a uma rua de pedra. - -17 1.2 Composição plástica Assim como os elementos acima configuram a materialidade plástica na arquitetura e no urbanismo, a relação entre elas é de igual importância para a percepção do todo na paisagem. Nessa perspectiva, podemos entender que o volume arquitetônico não é senão uma confluência de modificações através da utilização de pontos, linhas, planos, volumes e espaços, bem como das aplicações de texturas, cores, luzes e sombras em uma base volumétrica, na tentativa de desenvolver um volume outro, adequado às funções nele estabelecidas, bem como esteticamente harmônico em relação ao seu contexto. De maneira específica, entendendo que toda obra arquitetônica é derivada de mutações geométricas; que por mais que se queira produzir formas orgânicas, estas mesmo assim são compostas de partículas geométricas; e ainda pressupondo que não há volume ‘puro’, uma vez que o próprio acesso ao interior significa uma subtração no volume, é possível afirmar que a concepção da plástica arquitetônica envolve tanto adição quanto a subtração de elementos morfológicos. No tocante à adição, percebe-se haver nela três subtipos, uma adição simples, constituída na disposição de volumetrias próximas para a criação de um volume aparentemente único, tal qual o conjunto de edifícios que compõem o Congresso Nacional (figura “Congresso Nacional. Brasília, Brasil”); a adição por sobreposição, na qual há mais de uma figura geométrica, por exemplo, constituindo um único volume, a exemplo do prédio da Bauhaus (figura “Olinda, Brasil”), de autoria do arquiteto alemão Walter Gropius; e ainda a adição por separação, cujo resultado é gerado a partir de uma combinação de partes interligadas. Figura 16 - Congresso Nacional. Brasília, Brasil Fonte: 061 Filmes, Shutterstock, 2020. - -18 #PraCegoVer: Foto aérea da Esplanada dos Ministérios com Congresso Nacional, composto por dois prédios prismáticos centrais e com duas semiesferas, uma delas, menor, voltada para baixo, enquanto a segunda, maior e mais próxima do prédio principal, é voltada para cima. Figura 17 - Olinda, Brasil Fonte: 061 Filmes, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto do edifício da Bauhaus, composto por blocos retangulares de tamanhos diferentes, um deles menor, da cor cinza, o outro mais extenso, da cor branca com grande área de janelas de vidro. Em se tratando de subtração, a volumetria final é decorrente de processos de retirada de elementos geométricos, o que em certos casos não compromete a leitura integral do edifício. O ser humano é capaz de preencher visualmente volumetrias mesmo na ausência delas, isso porque o nosso campo de visão busca regularidade e continuidade nas formas que vemos. Então, mesmo quando uma forma regular tem parte de seu volume incompleto, ela é colocada por nós de maneira abstrata. Um bom exemplo desse exercício de subtração pode ser visto no edifício sede da Petrobrás no Rio de Janeiro (figura “Sede da Petrobrás. Rio de Janeiro, Brasil”). - -19 Figura 18 - Sede da Petrobrás. Rio de Janeiro, Brasil Fonte: Galina Savina, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto do edifício sede da Petrobrás, um volume em forma de cubo revestido por venezianas metálicas e com recuos em formato de cubo em várias partes do prédio. Assista aí https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2 /1e4e8d44625afa7bf2f867dbf2095405 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/1e4e8d44625afa7bf2f867dbf2095405 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/1e4e8d44625afa7bf2f867dbf2095405 - -20 1. 3 Sistemas de proporcionalidade A proporção, que é a relação das partes de um determinado arranjo entre si e das partes com o todo, é também uma das variáveis que compõem o quadro da composição plástica e não deve ser confundida com escala, pois enquanto a proporção é a relação entre partes de um mesmo todo, a escala é a relação entre a parte e um padrão referenciado. Pensar a proporção, tanto ao nível da volumetria quanto a partir da materialidade representa refletir, mesmo que empiricamente, sobre o que é ou não adequado. Imagine a utilização de peças de madeira para a construção de um muro na mesma proporção de um tijolo de concreto. Ou, ainda, pense na hipótese de construir lajes de vidro. Ainda que essas suposições não sejam exequíveis, infere-se não haver qualquer relação harmônica nesse contexto. Agora, imagine a construção de uma residência unifamiliar na qual um banheiro tem dimensões superiores a uma sala? Além de inimaginável e inadequado é completamente sem proporção. A necessidade de se regular o sentimento empírico de harmonia entre essas referências dimensionais permitiu com que fossem criadas ou até mesmo percebidas relações matemáticas entre elementos em comum ou ainda elementos na natureza com vistas a sistematizar este recurso. O primeiro e mais importante sistema matematicamente postulado é a seção ou proporção áurea. A proporção áurea expressa a existência de importantes relações geométricas na natureza e que podem ser expressas graficamente através de diagramas e traçados geométricos. Pode ser definida como a razão entre duas partes de uma reta ou duas partes de um plano, em que a menor delas está para a maior, assim como a maior está para a soma das duas. A expressão algébrica a seguir pode facilitar essa leitura: a/b = b/a+b Não sendo exatamente a mesma ideia, mas aproximando-se muito desta linha de pensamento, o matemático Leonardo Fibonacci apresentou no período da Idade Média, baseado no conhecimento matemático desenvolvido pelos árabes, estudos que mostram séries de números reais positivos, que crescem em proporção contínua, onde cada número é o resultado da adição de seus dois antecedentes (0+1=1, 1+1=2,2+1=3, 3+2=5, 5+3=8, 8+5=13, 13+8=31...), formando a sequência Fibonacci. Cada número é a soma dos dois números precedentes, está sempre em relação proporcional com o número anterior e o seguinte. Quando esses estudos são levados para o campo do desenho geométrico, em que o número resultante da soma supracitada se torna a medida do lado de um quadrado, e quando esses quadrados são dispostos de maneira a circundar o quadrado primeiro, o desenho não é somente surpreendente (figura “Proporção Áurea/ esquema cartográfico da sequência Fibonacci”) como também é uma representação do que pode ser visto na natureza (figura “Nautilus”). - -21 Figura 19 - Proporção Áurea/ esquema cartográfico da sequência Fibonacci Fonte: Mark Rademaker, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Na imagem, temos um esquema gráfico com quadrados dispostos em sequência com vistas a demonstração de um sistema de proporção. Figura 20 - Nautilus Fonte: Danny Iacob, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto apresenta um nautilus, uma concha encontrada no mar com tons claros e escuros das cores azul e bege. A primeira imagem desta unidade foi do Parthenon, o templo grego dedicado à deusa Athena, localizado na acrópole de Atenas, no século V a. C. Muitos são os estudos que analisam a dinâmica de proporção entre a estereóbata (escada de acesso), as colunas, o entablamento (logo acima das colunas) e o frontão, e uma das - -22 explicações relaciona a proporção áurea à fachada do edifício, como pode ser visto pela mesma imagem a seguir (figura “Parthenon. Atenas, Grécia”). Figura 21 - Parthenon. Atenas, Grécia (Adaptado) Fonte: Arn Alava, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto apresenta as ruínas de um templo grego com colunas da ordem dórica e entablamento com partes ausentes e sem frotão. Há um esquema gráfico da proporção áurea sobreposto à foto. Pensando num mecanismo em conformidade com as proporções do corpo humano, Le Corbusier propôs um sistema de medição proporcionada denominado Modulor. Em 1948, Le Corbusier publica a obra “O Modulor: uma medida harmoniosa para a escala humana aplicável universalmente à arquitetura e mecânica” e, mais tarde, em 1954 o “Modulor II” nos quais alega que o sistema desenvolvido por ele satisfaria tanto as exigências , plásticas – por esta ser derivada da proporção áurea –, quanto as exigências funcionais, uma vez que esta se adequa à dimensão humana. Para produzir o Modulor, Le Corbusier, tomou como ponto de partida a estatura média de um ser humano em 1,76m, todavia, pensando a média de altura dos policiais ingleses e considerando um progressivo aumento da humana resolveu adotar 1,829m (figura “O Modulor”). E a partir de então realizou uma série de divisões e subdivisões com o intuito de encontrar razões matemáticas, muito embora as suas conclusões possam ser consideradas questionáveis por idealizar situações sem considerar variações anatômicas individuais, além de certa inadequação na aplicação antropométrica geral. - -23 Figura 22 - Modulor Fonte: Forgemind ArchiMedia. Disponível em: . #PraCegoVer: A imagem apresenta o esboço esquemático do Modulor, uma figura humana com um braço levantado, por onde são traçadas medidas em diversas partes do corpo. Mesmo este trabalho tendo ganhado muito destaque e sendo relevante até o momento presente, quanto aos estudos acerca inclusive do que viria a se chamar posteriormente de desenho universal, não há significativa produção arquitetônica e urbanística que tenha utilizado diretamente as medidas estabelecidas por Le Corbusier. A principal obra com esta referência foi a “Unidade de habitação de Marselha”, na França, de autoria do próprio Le Corbusier. Ela utiliza 15 medidas do Modulor, a fim de trazer a escala humana para o edifício com 140m de comprimento, 24m de largura e 70m de altura (CHING, 1998, p. 304). - -24 1.4 Aeração Uma vez compreendidos os elementos de desenho, como a combinação deles é capaz de gerar volumetrias, tanto pela concepção de sólidos quando de espaços vazios e que a materialidade plástica não se resume somente à sua massa, mas também as texturas, cores, luzes e sombras a ela aplicadas, importa para o estudo da plástica também considerar as aberturas necessárias para o cumprimento das funções estabelecidas para o projeto, inferindo que uma obra de cunho arquitetônico e urbanístico, a depender das suas atribuições, carece da fruição do indivíduo a partir da sua experiência no interior e no exterior da área criada. As aberturas em uma edificação têm a missão de promover a continuidade ou a ruptura visual ou espacial entre os ambientes ou ainda com o exterior. Para elucidar um pouco mais este entendimento, tomamos por exemplo dois projetos do arquiteto Oscar Niemeyer: a Catedral Metropolitana Nossa Senhora Aparecida, ou a Catedral de Brasília, e o Museu de Arte Contemporânea de Niterói, o MAC. Na Catedral, Niemeyer projeta um edifício cuja fachada contém apenas os 16 pilares de concreto e um extenso pano de vidro criado pela artista plástica Marianne Peretti. Entretanto, para que o usuário possa alcançar a área interna, ele deve passar por um corredor abaixo da superfície do prédio com revestimentos escuros e pouquíssima iluminação, cujo intuito era causar ao indivíduo uma sensação aproximada da morte (figura “Entrada principal da Catedral de Brasília, Brasil”), para que em seguida, já dentro da Catedral, possa chegar mais perto dos céus através da sensação gerada pela luz que transpassa o pano de vidro e chega ao interior (figura “Altar da Catedral de Brasília, Brasil”). Figura 23 - Entrada principal da Catedral de Brasília, Brasil Fonte: Marcelo Moryan, Shutterstock, 2020. - -25 #PraCegoVer: A foto mostra o acesso à Catedral, com paredes em revestimento de cor escura e pouca iluminação. Área externa ao fundo. Figura 24 - Altar da Catedral de Brasília, Brasil Fonte: Nick Photoworld, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A foto mostra a área interna da Catedral, com bancos em mármore, revestidos de tecido vermelho em primeiro plano, piso e mobiliário fixo em mármore, panos de vidro de cores variadas entre o transparente e o azul e anjos suspensos por cabos de aço ao fundo. Já no Museu de Arte Contemporânea o arquiteto, entendendo que o horizonte carioca se comportaria como obra de arte tanto quanto as composições ali expostas, integrou a paisagem ao projeto (figura “Museu de Arte Contemporânea de Niterói, Brasil”), dispondo de uma faixa de vidro em toda a circunferência do Museu (figura “ Sala de exposições do MAC. Niterói, Brasil”). - -26 Figura 25 - Museu de Arte Contemporânea de Niterói, Brasil Fonte: Rodrigo S Coelho, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Na foto temos o prédio do Museu de Arte Contemporânea em formato circular com paredes de vedação inclinadas e uma faixa de vidro por toda a circunferência, localizado às margens da Baía de Guanabara. Figura 26 - Sala de exposições do MAC. Niterói, Brasil Fonte: Diego Grandi, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto da parte interna do Museu, mostrando as janelas e a paisagem com vegetação e praia ao fundo. Além da vista, as aberturas em uma edificação podem permitir a troca e o controle do fluxo de ar, luz e som, e talvez esse seja um dos fatores determinantes pelos quais não é recomendável reproduzir um projeto em ambientes distintos. Em lugares frios, como em grande parte na Europa, onde qualquer feixe de luz do sol se faz - -27 indispensável em detrimento do estímulo à produção de vitamina D e pela qualidade de vida, grandes fachadas envidraçadas são utilizadas com a finalidade de permitir a maior quantidade de luz natural possível, porém, essa ferramenta projetual seria impossível de ser replicada no nordeste brasileiro, visto o calor por vezes excessivo e evitado. Assista aí https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2 /86d4f3a92d54cd700ff61ebcab6ab100 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/86d4f3a92d54cd700ff61ebcab6ab100https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/86d4f3a92d54cd700ff61ebcab6ab100 - -28 2 Modulação e a funcionalidade do espaço criado A industrialização na construção surgiu como consequência da Revolução Industrial e, por meio desta nova prática, foi possível viabilizar elementos construtivos em fábricas, os chamados pré-fabricados, e não mais somente como se executava anteriormente. Sobre os benefícios dos elementos construtivos vindos dain loco, indústria, Bonvicini registra que “a pré-fabricação, que tem como vertente racionalizar a construção, tornando-o capaz de ser intercambiável e de qualidade, traz consigo uma produção em massa de componentes acessíveis e econômicos” (2017, p. 21). Em outras palavras, a pré-fabricação trouxe extensos benefícios para o campo da construção como a diminuição dos prazos e dos desperdícios para a obra, diante da confecção dos elementos em grandes quantidades; da possibilidade de aplicação das estruturas pré-fabricadas em diversos ambientes, ressalvadas as questões geográficas e culturais; e ainda da redução de custos, o que faz dessa prática uma boa solução para construções de interesse social. As estruturas pré-fabricadas compõem o quadro da modulação na arquitetura, reconhecida pelos fatores supracitados, bem como por toda a praticidade a ele atribuída. - -29 2.1 Arquitetura modular A arquitetura modular representa o universo de projeto e de obra possível através da disposição de elementos construtivos em dimensões já definidas, dado que a qualidade do projeto arquitetônico e urbanístico depende diretamente do bom uso desses módulos. Podemos inferir, ainda, que "coordenar modularmente é organizar ou arranjar peças e componentes, de forma a atenderem a uma medida de base padronizada” (TAUIL e NESE, 2010, p. 24)". A utilização dos elementos pré-fabricados pode ser compreendida como uma maneira de modular ambientes, por exemplo, assim como o bloco de tijolo cerâmico ou de concreto celular, tão comuns na indústria da construção civil brasileira. Ainda assim, o trabalho com módulos na arquitetura vem de muito antes da Revolução Industrial, quando analisamos a arquitetura clássica. O Parthenon, aquela primeira imagem da sessão anterior, visto que tem as suas colunas todas iguais e equidistantes, justifica essa assertiva. O processo de composição da forma arquitetônica a partir da modulação envolve, necessariamente, a delimitação de dimensões múltiplas e submúltiplas dos módulos, definidos assim para garantir a geração de todas as escalas da edificação, o que exige uma coordenação integral da construção, ou seja, projeta-se um ambiente delimitando não só a função, mas também o revestimento, que deve ser estimado para que haja menor volume de perda; as aberturas, compatível proporcionalmente com as dimensões; e o sistema construtivo equalizado com as vedações, por exemplo. Contudo, a arquitetura modular não se resume a padronização de medidas ou organização paramétrica dos sistemas construtivos convencionais. Hoje em dia há vasto repertório sobre a confecção de projetos inteiros passíveis de replicação feitos com materiais flexíveis, leves, duráveis e reaproveitados. A atual, mais utilizada e sustentável tendência no momento presente é a transformação de contêineres em construções, devido à rapidez e a facilidade da montagem, pela limpeza do canteiro de obras, além das diversas soluções projetuais proporcionadas por este equipamento, como pode ser visto em Seri Kembangan, na Malásia, (figura “Residência feita com contêineres. Seri Kembangan, Malásia”). Refletindo sobre a modulação e a coordenação modular na construção civil, nota-se que como prática comum neste panorama a repetição de determinado elemento construtivo, entretanto convém destacar que uma construção pode ter repetição de elementos mesmo não havendo qualquer coordenação modular, assim como é possível haver coordenação sem a repetição de elementos construtivos. Da mesma maneira, não se pode pensá- la como ferramenta isolada, isso implica na dependência do projeto ao fabricante, pois, segundo Mello, “a coordenação modular facilita a união entre a pré-fabricação e técnicas construtivas tradicionais” (2010, p.32). - -30 Figura 27 - Residência feita com contêineres. Seri Kembangan, Malásia Fonte: Aisyaqilumaranas, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto de um conjunto de contêineres de cores variadas servindo de residência, com um jardim florido na frente. - -31 Planejamento na arquitetura de interiores Se a volumetria pode ser organizada em módulos, o mesmo se aplica ao interior das edificações. Nesse sentido, a modularidade pode ser encarada como uma estratégia para organização funcional de mobiliário com vistas à qualidade de vida e otimização de recursos. Isto posto, o produto costuma ser desenvolvido para atender às necessidades de cada cliente através do desenvolvimento de módulos flexíveis e reguláveis que permitem a adição de complementos ou substituições. Folz, em “Mobiliário na habitação popular: discussões de alternativas para melhoria da habitabilidade” (2003), quando discute as características essenciais para o móvel popular registra que: Os móveis modulados podem também ser flexíveis quando, por exemplo, são também reguláveis. Partes moduladas deste móvel podem estar em diferentes alturas, além de poderem ser conjugadas nele diferentes partes, como módulo de gaveteiro, de guarda-roupa, de prateleiras e pequenos armários. Este móvel pode ser expandido em dimensões que permitem até mesmo ser usado como uma divisão de ambientes, podendo ser mais ou menos vazado, e ser composto conforme as exigências destes ambientes, como dormitório ou sala (2003, p.141). Por estas razões, são inúmeras as opções de mobiliário modulado no mercado hoje em dia, além disso é viável afirmar que esta variabilidade acompanha as transformações do espaço e da sociedade, a exemplo das estantes que, por volta da década de 90, eram desenvolvidas com um espaço pequeno para um televisor de, no máximo 29 polegadas, hoje se reduzem a painéis capazes de suportar o peso de televisores de tela plana com poucos centímetros de profundidade e 70 polegadas. O mesmo acontece com os móveis da cozinha, que precisam se adequar as mudanças culturais quanto às dimensões de equipamentos como forno micro-ondas, etcairfryer (figura “Móvel modulado para sala de estar”). - -32 Figura 28 - Móvel modulado para sala de estar Fonte: JRP Studio, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto com destaque para um painel de madeira que suporta uma TV grande, móvel baixo preto, caixas de som e jarros com flores. Assim como na construção civil, o mobiliário modulado, , é benéfico para o fabricante, pois ostandard desenvolvimento de uma padronização na fabricação propicia precisão na produção do produto, facilitando também a produção em larga escala e otimizando o processo construtivo, além de não desperdiçar matéria- prima. Para o cliente, teoricamente, há o benefício da compra de um móvel que possivelmente atenderá suas necessidades específicas e que melhor se adequará ao seu ambiente, entretanto, quando um ambiente não possui a metragem adequada ao abrigo desse mobiliário modulado – e que é possível interpretar como a maior parte das habitações populares, ao menos no Brasil –, sobram ou faltam espaços, de maneira que não se faz conveniente esse tipo de solução, muito embora ela tenha predileção entre os moradores de habitações populares, visto o preço do investimento. Para estes casos em que o móvel modulado não é adequado, cabe então optar pelo mobiliário planejado, que vai na contramão da indústria de móveis genéricos, por ser determinado caso a caso. - -33 3 Pré-dimensionamento Conforme já foi mencionado nesta unidade, é possível conceber um projeto de arquitetura tendo como prioridade a forma ou a função, porém, independente da ordem da preferência, estes dois elementos são imprescindíveis. O pré-dimensionamentonos projetos de arquitetura e urbanismo é a delimitação preliminar de cada área e possui relação direta com a funcionalidade do espaço criado pois, é a partir das necessidades impostas pelo espaço e pelo usuário que cada ambiente é idealizado, sendo o todo uma consequência. Chamamos esta fase de pré-dimensionamento, pois o dimensionamento real é aquele da obra pronta, com todas as particularidades que por vezes aparecem, superadas, inclusive, acerca da estrutura. Uma planta que registra o dimensionamento real de uma edificação após a sua construção se chama (como construído).as built O pré-dimensionamento não é uma tarefa simples, pois todo tipo de informação sobre o usuário e o espaço se faz necessária. Veja um exemplo: você vai fazer o projeto de uma residência unifamiliar para uma família com mãe e dois filhos; as informações que você tem até o momento são poucas, apenas que a mãe é chef de cozinha, gosta muito de viajar e que os filhos já são adolescentes, possuem muitas tarefas extracurriculares e quase nunca estão em casa; a área do terreno não é tão grande, nem o orçamento, de maneira que os ambientes devem ser pré- dimensionados sem exageros; há móveis já adquiridos. Por mais escassas que sejam as informações, algumas possíveis interpretações se fazem essenciais para a concepção do projeto: se os filhos quase nunca estão em casa e a mãe trabalha por muito tempo, a residência precisa ser confortável e, acima de tudo, prática, para atender o pouco tempo de permanência dos moradores; se a mãe é chef de cozinha, naturalmente que seja a cozinha o ambiente de destaque, inferindo a necessidade de um pré-dimensionamento que atenda necessidades superiores àquelas de uma cozinha comum, como a integração da cozinha ou ainda uma área de estar nela; quem viaja muito tem o costume de trazer muitos souvenirs (lembranças), que podem estar expostos nas áreas comuns; por fim, já existe mobiliário, de forma que este deve ser incorporado às soluções determinadas por você. Após as informações e as interpretações, para desenvolver o projeto o arquiteto e urbanista precisa elaborar um Programa de Necessidades, capaz de registrar tudo aquilo dado pelo cliente e pelas circunstâncias que influenciam o propósito. Para esta fase, pensando o projeto acima, um exemplo de procedimento possível seria dimensionar os móveis existentes, planejar a presença do mobiliário necessário, dispor tudo isso em um espaço onde também se considera a circulação e o acesso a este mobiliário e estimar a área possível de ocupação da - -34 função; o passo seguinte seria repetir este processo em todos os ambientes. O produto esperado para o Programa de Necessidades é uma lista com os ambientes, as suas particularidades, restrições e a área possível de ocupação. Tudo isso foi um exemplo genérico de como se pré-dimensiona os ambientes na arquitetura e no urbanismo. Os subtópicos a seguir especificarão a maneira como esta atividade pode ser desenvolvida a partir do corpo humano e nos sistemas construtivos. - -35 3.1 Antropometria A antropometria, ou o estudo das técnicas de mensuração do tamanho e das proporções do corpo humano, para nós pode servir como a base metodológica para o pré-dimensionamento em várias escalas, desde o mobiliário usual até o desenho da cidade. Neste contexto, há a obra de referência que certamente todo estudante de arquitetura e urbanismo, assim como todo profissional deve conhecer, chama-se “Arte de projetar em arquitetura”, foi escrito por Ernst Neufert e editado pela primeira vez em 1936. Hoje em dia, a obra parece estar em sua 18º edição e, ainda assim, sustenta o aperfeiçoamento de quem queira projetar a partir da figura do ser humano. Sobre a relação entre a arquitetura e a antropometria, Neufert (1973) assinala que: Todos os que pretendem dominar a construção devem adquirir a noção de escala e proporções do que tenham que projetar: móveis, salas, edifícios etc.; e só obtemos uma ideia mais correta da escala de qualquer coisa quando vemos junto dela um homem, ou uma imagem que represente as suas dimensões (NEUFERT, 1973, p.18). A Antropometria surgiu dos estudos antropológicos e da antropologia física, lá pelo século XI, quando Marco Polo, viajando o mundo, percebeu haver diferentes povos com dimensões corporais diferentes. Entretanto, os estudos sobre as medidas do corpo surgiram da antiguidade com a Seção Áurea (que já falamos) e de Vitruvius, arquiteto romano do século I a.C. que, apoiado na média dos dados coletados pelo exército romano, percebeu que o pé media por volta de 1/6 da altura do indivíduo e que o antebraço media ¼, assim como o peito. Dessa mesma investigação, surge também o uso do pé, da polegada, e da milha para medir distâncias, por exemplo, antes da unificação pelo metro. Inspirado em Vitruvius, Leonardo da Vinci, no período do Renascimento na Itália, desenha a figura humana tal qual se é vista até hoje (figura “O Homem Vitruviano. Leonardo da Vinci”), e já no século XX vem Le Corbusier com “O Modulor” (que já vimos nesta unidade). - -36 Figura 29 - Homem Vitruviano. Leonardo da Vinci Fonte: Hal_P, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: A imagem mostra o desenho de um homem com dois braços estirados e dois braços, atrás, erguidos; duas pernas eretas e outras duas pernas, atrás, abertas; um quadrado e um círculo circunscritos. Jorge Boueri Filho, na obra “Antropometria aplicada à arquitetura, urbanismo e desenho industrial” (2008), além de descrever toda a trajetória do desenvolvimento dos estudos ligados à antropometria, assim como a arquitetura e os fatores étnicos e culturais que influenciam o projeto, estabelece padrões antropométricos para projeto de habitação e que podem também ser aplicados em outras tipologias edilícias. E, através desses estudos, podemos correlacionar a algumas soluções arquitetônicas. O quadro a seguir revela alguns dos dados encontrados pelo autor, seguidos de soluções arquitetônicas decorrentes dessas medidas. As medidas corporais dispostas a seguir refletem as dimensões de 95% da população masculina investigada no estudo. - -37 Tabela 1 - Medidas corporais e suas implicações para a arquitetura Fonte: Elaborado pelo autor, 2020. #PraCegoVer: A tabela apresenta dados referentes a medidas corporais e suas implicações para a arquitetura. Contudo, salienta-se que essas medidas refletem as dimensões da maioria dos indivíduos, mas não para todos. A fim de contemplar o acesso e a utilização de todos os espaços para pessoas com todo tipo de capacidade, o melhor método de pré-dimensionamento na arquitetura e no urbanismo deve considerar as questões ligadas ao Desenho Universal que compreende a utilização de quaisquer objetos, equipamentos e estruturas do meio físico por todas as pessoas, independentemente de suas características pessoais, idade, habilidades, estatura, força física, condição de mobilidade etc., e assim simplificar a vida de todos. Dessa maneira, todo produto ou projeto em conformidade com o Desenho Universal contemplará todas as preferências e habilidades possíveis para o indivíduo, assim como para a coletividade (figura “Exemplo de banheiro acessível”). - -38 Figura 30 - Exemplo de banheiro acessível Fonte: Ji xiaoping, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto de banheiro com pia e sanitário branco, barras de aço nas laterais, espelho e demais equipamentos de auxílio às pessoas com deficiência. Segundo Gabrilli, senadora, autora da publicação intitulada “Desenho Universal - um conceito para todos” (2013) defende, com base nos princípios criados por arquitetos como Ron Mace, que o desenho universal deve ser , – o mesmo uso para pessoas com diferentes capacidades; – flexível, com leque amplo deigualitário adaptável preferências e habilidades; – simples, intuitivo, fácil de entender; – informação perceptível, deóbvio conhecido fácil comunicação; – que diminui riscos de ações involuntárias; – com pouca exigência deseguro sem esforço esforço físico; e – que pensao tamanho e o espaço para o acesso e o uso.abrangente - -39 3.2 Sistemas construtivos Após definir os ambientes que constituirão a edificação, além do propósito de volumetria resultante, chega o momento de pensar a estrutura, ou seja, as peças necessárias que integram o todo e que se responsabilizam por transferir cargas resultantes de um lugar para o outro sem atingir um estado limite último e de utilização. O pré- dimensionamento do sistema construtivo em uma edificação é o lançamento inicial das dimensões estruturais após concepção, cálculo e verificação. Figura 31 - Laje, Viga e Pilar Fonte: Aisyaqilumaranas, Shutterstock, 2020. #PraCegoVer: Foto de uma obra em construção com destaque para o sistema trilítico composto por laje, viga e pilar, ambos em concreto. Há um funcionário na escada em construção no centro da imagem. Assista aí https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2 /f9c4cc4d9a5ea0ea2aa1012dbe0913e0 Retomemos o exemplo da residência para a mãe e os dois filhos. Após definir o programa de necessidades – com todas as áreas desejáveis – e desenvolver um arranjo que combine todos os ambientes de maneira eficaz, faz-se necessário proceder com o pré-dimensionamento do sistema construtivo, que pode ser por meio do uso de elementos de madeira, aço, concreto (figura “Laje, Viga e Pilar”), entre outros, ou da combinação destes. Além https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/f9c4cc4d9a5ea0ea2aa1012dbe0913e0 https://fast.player.liquidplatform.com/pApiv2/embed/746b3e163a5a5f89a10a96408c5d22c2/f9c4cc4d9a5ea0ea2aa1012dbe0913e0 - -40 disso, é preciso definir a geometria, o posicionamento e a interligação destes elementos estruturais, que podem ser aparentes e compor a volumetria, ou se confundir ao sistema de vedação, por exemplo. De maneira geral, em um sistema trilítico convencional, considera-se em primeiro plano para a laje o vão a vencer e as condições de apoio, enquanto a viga é planejada conforme o tipo de carga e o pilar de acordo com a sua seção transversal. Uma vez definida preliminarmente a disposição desses elementos, chega o momento de calcular o fluxo das cargas, ou seja, o que cada elemento estrutural terá de suportar e, para isso, é comum que arquitetos e engenheiros utilizem para esta fase cálculos e ábacos de fácil utilização. Um exemplo é o cálculo da laje, que Yopanan Rebello (2007) sugere ser h= 2%L+l/2 , onde é a espessura da laje, é o comprimento do maior ladoh L e o comprimento do menor lado, muito embora o cálculo de laje mais trivial entre os projetistas é h=L/40l , em que é a espessura e é o menor vão.h L A última fase do pré-dimensionamento do sistema construtivo são os cálculos de segurança que verificam, segundo as normas, os estados limites últimos, para proteger o elemento de possíveis rupturas, e utilização, que conjecturam estados de deformação excessiva, rachaduras etc. é isso Aí! Nesta unidade, você teve a oportunidade de: • perceber que toda composição arquitetônica envolve a utilização de elementos geométricos e visuais e que a relevância plástica na arquitetura e no urbanismo consiste no emprego e na combinação harmônica destes; • considerar que a proporção e os sistemas de proporcionalidade são esquemas de dimensionamento diferentes da escala, têm por base a relação entre natureza e matemática e que se apresentam como fatores capazes de contribuir para o equilíbrio plástico; • compreender que a utilização das aberturas na volumetria vai além das questões acerca dos acessos e Fique de olho Para saber mais sobre o pré-dimensionamento de estruturas de edificações como uma ferramenta de apoio à concepção de projetos arquitetônicos, projetar e estudar o comportamento dos elementos estruturais mais comuns, além do pré-dimensionamento através de fórmulas analíticas/ empíricas para facilitar o trabalho do arquiteto, leia a dissertação de Paula Rodrigues de Melo (2012), intitulada “Pré-dimensionamento de estruturas de madeira, aço e concreto para auxílio à concepção de projetos arquitetônicos”. Disponível em: <https://repositorio.ufu.br/bitstream/123456789/14186/1/Paula% 20Rodrigues.pdf>. • • • - -41 fatores capazes de contribuir para o equilíbrio plástico; • compreender que a utilização das aberturas na volumetria vai além das questões acerca dos acessos e circulações e que, quando bem utilizadas, causam percepções além do que a própria plasticidade ocasiona, além da integração entre interior e exterior; • conhecer a arquitetura modular, tão presente e popular nos sistemas construtivos, assim como no mobiliário brasileiro, mas também ponderar que a modulação deve ser integrada, da estrutura ao mobiliário; • estruturar um projeto de arquitetura a partir do pré-dimensionamento dos ambientes por meio do programa de necessidades, das medidas do corpo humano (não somente da maior parte dos seres humanos, mas de todos) e dos sistemas construtivos. Referências BONVICINI, J. G. .Trabalho de Conclusão do Curso de Arquitetura eArquitetura modular para habitação Urbanismo. São Paulo: Centro Universitário SENAC, 2017. BOUERI FILHO, J. J. . São Paulo:Antropometria aplicada à arquitetura, urbanismo e desenho industrial Estação das Letras e Cores, 2008. CHING, F. D. K. : forma, espaço e ordem. São Paulo: Martins Fontes, 1998.Arquitetura ______. . São Paulo: Martins Fontes, 2006.Dicionário visual de arquitetura FOLZ, R. R. : discussões de alternativas para melhoria da habitabilidade. SãoMobiliário na habitação popular Carlos: Rima, 2003. GABRILLI, M. um conceito para todos Publicação digital disponível em: < Desenho Universal: . https://www. maragabrilli.com.br/wp-content/uploads/2016/01/universal_web-1.pdf > . Acesso em: 20 fev. 2020. KOCH, W. . São Paulo: Martins Fontes, 2008.Dicionário dos estilos arquitetônicos MELLO. V. F. L. 2010. Monografia do Curso deUma visão geral sobre modulação na construção civil. Especialização em Construção Civil. Escola de Engenharia da Universidade Federal de Minas Gerais. Belo Horizonte, 2010. MELO. P. R. 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M. . São Paulo: Pini, 2010.Alvenaria estrutural Olá! 1 Plástica, proporção, aeração 1.1 Elementos de plástica 1.2 Composição plástica Assista aí 1. 3 Sistemas de proporcionalidade 1.4 Aeração Assista aí 2 Modulação e a funcionalidade do espaço criado 2.1 Arquitetura modular Planejamento na arquitetura de interiores 3 Pré-dimensionamento 3.1 Antropometria 3.2 Sistemas construtivos Assista aí é isso Aí! Referências
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