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GOTA Inflamação com dor intensa no hálux. Era considerada uma doença das classes nobres, dos glutões e dos devassos (devido aos excessos alimentares). Doença associada a hiperuricemia, e causada por depósitos de cristais de monourato de sódio dentro e em volta das articulações. Esses cristais podem se depositar na articulação, causando artrite inflamatória aguda, ou artropatia crônica destrutiva; E pode depositar também em outros órgãos (não articular): precipitação de cristais nos túbulos renais (urolitíase) e formação de tofos. EPIDEMIOLOGIA Prevalência 1 a 5%. Incidência 2,9/1000 hab. Aumento da incidência nos últimos anos: dieta, síndrome metabólica, obesidade, doença renal crônica, uso de fármacos hiperuricemiantes. Houve grande salto no aumento da prevalência (2,7% em 1988-1994 para 3,9% em 2006-2008). Relação H:M de 7:1 a 9:1. Pico entre 30-60 no homem e 55-70 anos na mulher (aumenta depois da menopausa, estrógeno é uricosúrico, ajuda a eliminar ácido úrico). Depois da menopausa a relação vai para 1:1 entre homem e mulher. ELIMINAÇÃO DO ÁCIDO ÚRICO 70% é por eliminação renal. (30% intestinal). Totalmente filtrada pelos glomérulos. 90% é reabsorvido no túbulo contorcido proximal para o sangue. As enzimas que fazem essa reabsorção (URAT1 [o principal], ABCG2, outros). Alguns remédios aumentam esse URAT1, são os medicamentos hiperuricemiantes, como a hidroclorotiazida. Eliminação normal: 300 a 800mg em 24h. ETIOLOGIA Supersaturação de urato nos tecidos. Limite e solubilidade: 7mg/dL (pH 7.4 e Temperatura 37oC). Aumento na produção x diminuição da excreção renal -> hiperuricemia -> passa do limite de solubilidade -> saturação nas articulações -> gota. Diminuição da excreção é o principal mecanismo, presente em algum grau em 90% dos casos. PATOGENIA Interação: cristal <-> macrófagos locais + participação de cofatores (ácidos graxos livres, toll-life receptors 2 -> ativação dos inflamassomas NLRP3 (imunidade inata) -> ativação de caspase 1 -> liberação de IL-1 e outras citocinas e quimiocinas pró-inflamatórias (quimiotaxia para monócitos, mastócitos e neutrófilos) -> inflamação intensa. CLÍNICA Estágios clínicos: - Hiperuricemia assintomática; passa anos nessa fase, por isso é interessante pedir o ácido úrico nos exames de rotina, para descobrir cedo e evitar a gota. - Gota intermitente aguda; as crises podem durar de horas até dias, espaçados por momentos sem dor (período intercrítico). Mas vai chegando um momento em que as crises começam a ficar mais intensas e demoradas e o período intercrítico fica mais curto. Vai para a 3ª fase. - Gota avançada (gota tofácea crônica) Independente de qual fase esteja, pode ter deposição no rim (nefropatia por urato). O tempo de evolução do 1º ao 3º estágio varia dependendo de fatores pessoais e ambientais. 1. Hiperuricemia Assintomática Anormalidade laboratorial comum. Níveis > 6,8 (6 na mulher e 7 no homem) excedem a capacidade de solubilidade -> precipitação; Crianças níveis acima de 2 a 4 são elevados. Adultos: os níveis são baixos até a puberdade, quando passam a elevar significativamente no homem. Na mulher, a elevação é lenta até a menopausa. Incidência de gota aumento com o aumento da hiperuricemia 3% (urato 7 a 8) e 22% (quando chega a 9). A maioria nunca desenvolverá gota, pois está sendo feito mais rastreio, mais exames, descobrindo mais cedo. 2. Gota intermitente aguda O primeiro episódio normalmente procede um longo período de hiperuricemia assintomática (até 10 anos na média). O homem apresenta normalmente na 4ª a 6ª década de vida e a mulher mais tarde, a depender de fatores hormonais e uso de tiazídicos. Essa artrite gotosa é com um rápido desenvolvimento de dor, calor, edema e eritema local, com pico de dor em 8-12h. Normalmente é monoarticular ou oligoarticular (poucas articulações). Normalmente pega a 1ª metatarsofalangeana (podagra). Outras comuns: pés, calcanhares, tornozelos, joelhos. Menos comuns: dedos das mãos, punhos e cotovelos. Pode ter febre (maior que 38oC em aproximadamente 30%), calafrios, mal-estar, eritema cutâneo. Crise não tratada pode variar de leve e curta duração, até intensa e por 1 a 2 semanas de duração. Inicialmente os períodos intercríticos costumam durar anos, mas, se não tratados adequadamente, as crises vão se tornando mais intensas, mais frequentes e longas. 3. Gota avançada Ou gota tofacea crônica. Geralmente após 10 anos ou mais de GIA. Períodos intercríticos marcados por dor e edema, com piora nas crises. Podem ser detectados por RNM/artroscopia, mas na maioria das vezes é clinicamente evidente. Paciente com artrite e tofo, é patognomônico de gota. Pode ter acometimento poliarticular, difuso e simétrico, inclusive de pequenas articulações das mãos e pés, confundindo com artrite reumatoide. O que ajuda no diagnóstico diferencial são os tofos. Fatores predisponentes para a formação dos tofos: duração e severidade da hiperuricemia; início em idade precoce; longos períodos de gota ativa e não tratada; 4 ou mais crises por ano e tendência de acometimento poliarticular (quando já começa com a artrite muito disseminada). Em pacientes não tratados adequadamente o intervalo médio de início da doença até o desenvolvimento de tofos é de aproximadamente 11,6 anos. Tofos subcutâneos são os mais característicos. Os tofos são pacotes de ácido úrico em que formam um tecido granulomatoso em volta dos cristais. Locais: dedos, punhos, orelhas, joelhos, Bursa, cotovelos, tendão de aquiles. Outros (menos comum): nódulos de Heberden, tecidos conectivos, rins, valvas cardíacas, escleras. Antes do alopurinol e agentes uricosúricos, aproximadamente 50% dos pacientes desenvolviam tofos. FATORES PRECIPITANTES PARA CRISES Rápidas oscilações da uricemia. Inclusive no tratamento não é bom diminuir muito rápido. Trauma – durante o repouso da articulação acometida (crises noturnas). Bebidas alcoólicas – redução da uricosúria à nível tubular / aceleração da degradação de adenosina trifosfato intracelular / quantidade aumentada de guanosina. Principalmente cerveja, que tem muita purina. Medicamentos – tiazídicos, AAS, alopurinol (efeito paradoxal, se diminuir muito rápido, por isso deve-se começar com doses baixas). ASSOCIAÇÕES CLÍNICAS Doença renal: Crônica – deposição de cristais na medula e pirâmide renal devido a hiperuricemia persistentemente elevada; leve albuminúria. Leva a disfunção renal crônica. Aguda – síndrome de lise tumoral, por deposição em túbulos renais; oligoanúrica; relação Acído úrico/Creatinina urina 24h > 1; pode elevar a necrose tubular aguda. Nefrolitíase - mais comum. Formação de cálculos renais de ácido úrico. 10 a 25% dos pacientes. Associada ao nível de ácido úrico, chegando a 50% quando > 13. Hipertensão: presente em 25-50% dos pacientes com gota. 2 a 14% dos acidentes hipertensos tem gota. Obesidade. Dislipidemia: triglicérides aumentados em 80% dos pacientes com gota. Colesterol é controverso. ACHADOS RADIOGRÁFICOS Apenas aumento de partes moles nas fases iniciais. Em fases avançadas: erosões ósseas características pouco afastadas da junta, preservando os espaços articulares, com bordas salientes, sem osteopenia justa-articular. Erosões em “saca-bocado”. DIAGNÓSTICO Por muito tempo a hiperuricemia foi considerada a pedra angular. Presuntivo: monoartrite aguda + hiperuricemia + boa resposta ao tratamento. (provável gota). Pseudogota e tendinite por hidroxiapatita também respondem bem ao tratamento. Diagnóstico definitivo: somente é possível com a observação direta dos cristais de MSU do aspirado sinovial ou do material tofáceoa, à microscopia com luz polarizada. Quando se pede a análise sinovial, também se pede a celularidade total e diferencial, cultura para afastar bactéria e análise de cristais com microscopia ótica com luz polarizada. Esses são os exames básicos, se suspeitar de outras doenças pode pedir outras coisas. Os cristais de MSU são em forma de agulha ou bastão. Apresentam forte birrefringência negativa (isso que aparece no exame). O líquido sinovial é inflamatório (por isso se pede a celularidade,pra ver se é inflamatório), com contagem de leucócitos de 5000 a 80.000 cels/mm3 predominantemente neutrofílico. Ácido úrico na urina de 24h somente feito em pacientes candidatos ao uso de medicamentos uricosúricos ou quando a cauas da hiperuricemia persistente está sendo investigada (valores normais: até 800mg/24h no adulto). Avaliar se o paciente já é um hiperexcretor, que aí não faz sentido usar o uricosúrico e a creatinina é para ver a função renal, porque irá aumentar a carga renal. TRATAMENTO Princípios gerais: melhorar qualidade de vida, reduzir os níveis de ácido úrico até o alvo terapêutico, adesão a longo prazo a terapia redutora de ácido úrico. Recomendações: ácido úrico alvo deve ser menor do que 6. Em um paciente com gota grave, deve deixar o ácido úrico menor do que 5. O tratamento profilático deve ser feito nos primeiros 6 meses do tratamento com a terapia hipouricemiante pela desestabilização dos níveis de ácido úrico. 3 Pilares do tratamento: Dieta + mudança de estilo de vida; tratamento da inflamação aguda; redução do nível sérico do ácido úrico. -Manejo da artrite gotosa aguda Alívio rápido da dor e resolução segura de incapacidades funcionais. Para tirar o paciente da crise. São três: AINEs, glicocorticoides e a colchicina. AINEs: alívio em 24h, 1ª linha de tratamento, efeitos gastrointestinais e toxicidade renal. Glicocorticoides: local ou sistêmico, 2ª linha de tratamento, doses anti-inflamatórias, injeção intra-articular em grandes articulações. Colchicina: dose 0,5mg 8/8h ou 6/6h. Pode ser associada com AINE. Também usada para profilaxia das crises. Cuidados: diarreia. -Profilaxia da artrite gotosa aguda Artrite gotosa é comum nos primeiros 6 meses de redução do ácido úrico. Colchicina. A ação anti-inflamatória: modula a adesão de neutrófilos no endotélio. Não deixa os neutrófilos migrarem para o local da inflamação. 0,5mg 12/12h – 6/6h. Não deve ser usada em pacientes com insuficiência renal já dialítica ou com clearence menor do que 30. Em insuficiência renal leve pode ser usada com certa segurança. Toxicidade: renal, neuromiopatia, supressão de medula óssea. -Tratamento hipouricemiante (redução do ácido úrico) Alguns pacientes normalizam os níveis com mudança no estilo de vida: Suspender o consumo de álcool, emagrecimento, dieta com redução calórica e baixo índice de carboidratos (evitar alimentos que contenham muitas purinas como frutos do mar, bebidas alcoólicas e carne gordurosa). Substituir diuréticos tiazídicos porque diminuem a eliminação de ácido úrico. Substituir preferencialmente pela losartana, que ajuda a diminuir o ácido úrico. Medicamentos de uso contínuo que reduzem o ácido úrico: Inibidores da xantina oxidase: (alopurinol, mais usado, disponível no posto de saúde). Uricosúricos (probenecida, que não se encontra. E o benzobromarona). Tem 2 linhas de autores, as que defendem usar os hipouricemiantes após a primeira crise, e os que orientam tentar as medidas de estilo de vida primeiro. Thiago prefere individualizar cada caso. É indicado o tratamento farmacológico também em caso de tofo subcutâneo macroscópico ou ataques frequentes de gotosa (mais de 3 por ano). Postergar a terapia até a resolução completa da crise. Só começa com o hipouricemiante depois que resolver a crise, devido a oscilação do AU. Dosar urina de 24h para ver hiperprodutores x hipoexcretores. O paciente que responde melhor ao uricosúrico é o hipoexcretor, e deve ter o clearance acima de 60ml/min. Na prática, por questão de acesso, usa-se o alopurinol. Comodidade posológica + eficácia previsível. Dose inicial: 100mg/dia. Efeitos colaterais: prurido e dermatite 2%. Síndrome de hipersensibilidade (muito rara): dermatite severa + vasculite, febre, eosinofilia, disfunção hepática e renal (mortalidade de 20%). Benzobromarona (narcaricina): não tem no posto de saúde e é mais cara. 100mg ao dia (máximo de 200mg ao dia). Outros agentes uricosúricos (não usa-se no tratamento com gota, mas da preferencia para tratar pacientes gotosos com comorbidades): ex: paciente com gota e quer tratar dislipidemia, usa-se atorvastatina. Paciente gotoso com hipertrigliceridemia, usa-se fenofibrato; Paciente gotoso com HAS, usa losartana. SEMPRE LEMBRAR: paciente com gota precisa associar o tratamento medicamentoso ao controle alimentar. DIAGNÓSTICO DIFERENCIAL O principal é: -Doença associada à deposição de cristais de pirosfato de cálcio di-hidratado-. DPPC. Pode fazer um quadro muito parecido com a gota: pseudogota (25%). Muito parecido com a osteoartrite: forma osteoartrítica, ou pseudoosteoartrite (50%). Pode levar a osteoartrite. Muito parecido com a artrite reumatoide: forma reumatoide (5%). Tem também a forma assintomática, que só é detectada na radiografia. Na radiografia se detecta condrocalcinose (depósitos de cálcio). PATOGÊNESE Etiologia desconhecida. Associada a questões genéticas. Mutações do ANKH – cromossomo 5p -> condrocalcinose familiar. Principal fator de risco: envelhecimento. Outros fatores de risco: traumas ortopédicos, distúrbios metabólicos e endócrinos (hiperparatireoidismo, hemocromatose, hipotireoidismo, amiloidose, hipomagnesemia, acromegalia, hipofosfatemia). CLÍNICA Depende da forma que ela simula. Pseudogota se manifesta com: artrite inflamatória aguda, súbita e auto-limitada. A principal articulação acometida é o joelho, em 50% das vezes. Pseudo-artrite reumatoide: inflamação mais branda do que a AR, poliarticular, simétrico, pode ter títulos baixos de fator reumatoide. Pseudo-OA: Artropatia degenerativa progressiva, deformidades e contraturas em flexão de várias articulações, episódios intermitentens de artrite ativa, síndrome femoro-patelar. Diferencia da OA na radiografia. Pode evoluir com deformidades articulares semelhantes as articulações de charcot (incomun). EXAMES Padrão-ouro: visualização direta dos cristais através de microscopia óptica com luz polarizada. Tem fraca birrefringência positiva. Pode ter no sangue periférico: leucocitose periférica, VHS e PCR elevados. Celularidade do líquido varia conforme o perfil clínico da doença. Avaliar sempre a presença de distúrbios endócrino-metabólicos: pedir cálcio, fósforo, magnésio, FAL, TSH, ferritina, PTH. TRATAMENTO Em caso de crises agudas de pseudogota -> igual a gota. Pseudo-oa: igual a osteoartrite. Não existem medicamentos modificadores de doença, ou que reduzam/reabsorvam a deposição dos cristais de pirofosfato de cálcio. Tratar condições endócrino-metabólicas de base. LÍQUIDO SINOVIAL Avaliar aspecto. Solicitar sempre: citometria total e contagem diferencial. Gram, cultura, análise por MO com luz polarizada. Outros exames conforme a suspeita clínica: citologia oncótica, ADA, BAAR, culutra para micobactérias e fungos, etc. Análise do líquido sinovial: TIPO APARÊNCIA CELULARIDADE %PMN Normal Claro, viscoso leve, amarelo citrino 0 a 200 <10% Não-inflamatório Claro a levemente turvo 200 a 2000 <20% Inflamatório Levemente turvo a turvo 2000 a 50000 20 a 75% Pioartrose (infectado) Muito turvo a purulento >50000 a 100000 >75% Análise por microscopia com luz polarizada GOTA DPPC CRISTAL Urato monossódico Pirofosfato de cálcio FORMATO Agulha Rombóide ou retangular BIRREFRIGÊNCIA Negativa Positiva COLORAÇÂO Amarelo Azul
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