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PROGRAMA DE NOÇÕES DE 
CRIMINALÍSTICA
Didatismo e Conhecimento 1
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
6.1. DEFINIÇÃO DE CRIMINALÍSTICA;
A Criminalística é o conjunto de procedimentos científicos de 
que se vale a justiça moderna para averiguar o fato delituoso e 
suas circunstâncias, isto é, o estudo de todos os vestígios do crime, 
por meio de métodos adequados a cada um deles e criminologia 
é um conjunto de conhecimentos que se ocupa do crime, da 
criminalidade e suas causas, da vítima, do controle social do ato 
criminoso, bem como da personalidade do criminoso e da maneira 
de ressocializá-lo.
A criminologia é ciência moderna, sendo um modo específico 
e qualificado de conhecimento e uma sistematização do saber de 
várias disciplinas. A partir da experimentação desse saber multi-
disciplinar surgem teorias (um corpo de conceitos sistematizados 
que permitem conhecer um dado domínio da realidade).Enquanto 
ciência, a criminologia possui objeto próprio e um rigor metodoló-
gico (método) que inclui a necessidade de experimentação, a pos-
sibilidade de refutação de suas teorias e a consciência da transito-
riedade de seus postulados. Ainda que interdisciplinar é também 
ciência autônoma, não se confundindo com nenhuma das áreas que 
contribuem para a sua formação e sem deixar considerar o jogo 
dialético da realidade social como um todo.
Objeto da criminologia é o crime, o criminoso (que é o sujeito 
que se envolve numa situação criminógena de onde deriva o cri-
me), os mecanismos de controle social (formais e informais) que 
atuam sobre o crime; e, a vítima (que às vezes pode ter inclusive 
certa culpa no evento).A relevância da criminologia reside no fato 
de que não existe sociedade sem crime. Ela contribui para o cresci-
mento do conhecimento científico com uma abordagem adequada 
do fenômeno criminal. O fato de ser ciência não significa que ela 
esteja alheia a sua função na sociedade. Muito pelo contrário, ela 
filia-se ao princípio de justiça social.
Os estudos em criminologia têm como finalidade, entre outros 
aspectos, determinar a etiologia do crime, fazer uma análise da 
personalidade e conduta do criminoso para que se possa puni-lo de 
forma justa (que é uma preocupação da criminologia e não doDirei-
to Penal), identificar as causas determinantes do fenômeno crimi-
nógeno, auxiliar na prevenção da criminalidade; e permitir a resso-
cialização do delinquente.Os estudos em criminologia se dividem 
em dois ramos que não são independentes, mas sim interdependen-
tes. Temos de um lado a Criminologia Clínica(bioantropológica), 
esta utiliza-se do método individual, (particular, análise de casos, 
biológico, experimental), que envolve a indução. De outro lado 
vemos a Criminologia Penal(sociológica), esta utiliza-se do mé-
todo estatístico (de grupo, estatístico, sociológico, histórico) que 
enfatiza o procedimento de dedução.
A interdisciplinaridadeé uma perspectiva de abordagem 
científica envolvendo diversos continentes do saber. Ela é uma 
visão importante para qualquer ciência social. Em seus estudos, a 
criminologia se engaja em diálogo tanto com disciplinas das Ciên-
cias Sociaisou humanas quanto das Ciências Físicasou naturais.
Entre as áreas de estudo mais próximas da Criminologia te-
mos:
-Direito Penal: o principal ponto de contato da criminologia 
com o Direito Penal está no fato de que este delimita o campo 
de estudo da criminologia, na medida em que tipifica (define ju-
ridicamente) a conduta delituosa; O direito penal é sancional por 
excelência; Ele caracteriza os delitos e, através de normas rígidas, 
prescreve penas que objetivam levar os indivíduos a evitar essas 
condutas.
- Direito Processual Penal: a Criminologia fornece os ele-
mentos necessários para que se estipule o adequado tratamento do 
réu no âmbito jurisdicional. Também indica qual a personalidade e 
o contexto social do acusado e do crime, auxiliando os juristas para 
que a sentença seja mais justa. A criminologia oferece os critérios 
valorativos da conduta criminosa. Ela pesquisa a eficácia das nor-
mas do Direito Penal, bem como estuda e desenvolve métodos de 
prevenção e ressocialização do criminoso.
- Direito Penitenciário: os dados criminológicos são impor-
tantes no Direito Penitenciário para permitir o correto e eficaz 
tratamento e ressocialização do apenado. A criminologia ajuda a 
tornar a pena mais humana, buscando o objetivo de punir sem cas-
tigar.
- Psicologia Criminal: é ciência que demonstra a dimensão 
individual do ato criminoso; estuda a personalidade do criminoso, 
orientando a Criminologia.
- Psiquiatria Criminal: é ramo do saber que identifica as di-
versas patologias que afetam o criminoso e envolve o estudo da 
sanidade mental.
- Antropologia Criminal: abrange o fenômeno criminológico 
em sua dimensão holística, ou seja, biopsicosocial. É o Estudo do 
homem na sua história, em sua totalidade (homem como fator pre-
sente no todo);
- Sociologia Criminal: demonstra que a personalidade crimi-
nosa é resultante de influências psicológicas e do meio social;
- Ciências Biológicas: fornecem os elementos naturais e or-
gânicos que influenciam ou determinam a conduta do criminoso;
- Vitimologia: estuda a vítima e sua relação com o crime e o 
criminoso (estuda a proteção e tratamento da vítima, bem como 
sua possível influência para a ocorrência do crime);
- Criminalística: é o ramo do conhecimento que cuida da di-
nâmica de um crime. Estuda os fatores técnicos de como o crime 
aconteceu. Há um setor especializado da polícia destinado a essa 
área.
- Ciências Econômicas: estuda o crime a partir do intrumental 
analítico racionalista. O crime é visto como um mercado e sua 
oferta é determinada por fatores como o ganho esperado da ativi-
dade criminosa, probabilidade de sucesso e intensidade da punição 
em caso de falha.
No entanto, não só do pensamento sociológico se sustenta a 
Criminologia, que, pelo contrário, possui aparência eminentemen-
te multidisciplinar, sempre se enriquecendo com diferentes ciên-
cias posicionadas à sua volta e áreas do conhecimento afins ou 
afluentes.
A maioria vai listada adiante: primus inter pares, o Direito Pe-
nal, ramo da Dogmática Jurídica que definem quais condutas tipifi-
cam crimes ou contravenções, estabelecendo as respectivas penas; 
a Medicina Legal (aí compreendida a Psiquiatria Forense), aplica-
ção específica das ciências médicas, paramédicas e biológicas ao 
Direito; Psicologia Criminal, cuja matriz é a Psicologia (comum), 
ciência ocupada com a mente humana, seus estados e processos: a 
Antropologia Criminal (Ferri, Lombroso e Garofalo), que assume 
para si a responsabilidade de pesquisar e desenhar supostos perfis 
dos infratores penais, a partir de disposições anatômicas e estig-
Didatismo e Conhecimento 2
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
mas somáticos particulares, hoje um pouco desprovida do crédito 
que foi desfrutado antigamente; a Sociologia Criminal (subdivisão 
da Sociologia, filiada à Sociologia Jurídica), fundada por Enrico 
Ferri, que visualiza o ilícito penal como fenômeno gerado no de-
senvolvimento do convívio, em escala ampla, dos homens, anali-
sando a importância direta ou indireta do ambiente social na for-
mação da personalidade de cada um; a Psicosociologia Criminal, 
subordinada a Psicosociologia, suma psicológica dos fatos sociais; 
a Política Criminal, que rastreia e monitora os meios educativos 
ou intimidativos de que dispõe ou deve dispor o Estado, inclusive 
no terreno da elaboração legislativa, para o melhor desempenho, 
em seu papel de, prevenir e reprimir a criminalidade, procurando 
ela, paralelamente, fornecer fórmulas para se achar a proporção 
ideal entre a gravidade da conduta de um determinado criminoso 
ou contraventor penal e o quantum da sanção a aplicar-lhe, face a 
face com a situação concreta, a Lógica Jurídica, no seu segmen-
to que se dirige para a fenomenologia e a problemática do crime, 
lastreada na Lógica formal, pura (ciência da razão, em si mesma).
Igualmente,conta a Criminologia com complemento de 
ciências auxiliares: a Genética, ciência da hereditariedade; a 
Demografia, levantamento numérico populacional (taxas de 
natalidade e de mortalidade, distribuição de faixas etárias, 
expectativa de vida, migrações etc.); a Etologia, investigação de 
natureza científica do comportamento humano, de acordo com as 
leis gerais da Psicologia, levando em conta às múltiplas influências 
e acomodações que as circunstâncias ambientais exercem, de 
ordinário, sobre o comportamento da pessoa ou da sociedade; 
a Penalogia (ou Penologia) que Francis Lieber, o criador da 
palavra (1834), conceituou como ‘‘o ramo das ciências criminais 
que cuida do castigo do delinquente’’, a Vitimologia, estudo do 
comportamento da vítima, com avaliação das causas e dos efeitos 
da ação delitiva, esquadrinhada sob o prisma e a interação da 
dupla penal criminoso/vítima, a Estatística, conjunto de métodos 
matemáticos, centrada em dados reais, de que se serve para 
construir modelos de probabilidade relativos a indivíduos, grupos 
ou coisas (por exemplo, defasagem quantitativa ou qualitativa na 
oferta de empregos), quando, numa fonte especializada (Estatística 
Criminal) retrate fatores ou indutores de criminalidade. “Toda 
ciência, proclamou Aristóteles, tem por objeto o necessário”.
6.2. LEGISLAÇÃO APLICADA À PERÍCIA 
(ARTIGOS 155 A 184 DO CÓDIGO DE 
PROCESSO PENAL);
TÍTULO VII
DA PROVA
CAPÍTULO I
DISPOSIÇÕES GERAIS
Art. 155. O juiz formará sua convicção pela livre apreciação 
da prova produzida em contraditório judicial, não podendo fun-
damentar sua decisão exclusivamente nos elementos informativos 
colhidos na investigação, ressalvadas as provas cautelares, não re-
petíveis e antecipadas. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
Parágrafo único. Somente quanto ao estado das pessoas serão 
observadas as restrições estabelecidas na lei civil. (Incluído pela 
Lei nº 11.690, de 2008)
Art. 156. A prova da alegação incumbirá a quem a fizer, sen-
do, porém, facultado ao juiz de ofício: (Redação dada pela Lei nº 
11.690, de 2008)
I – ordenar, mesmo antes de iniciada a ação penal, a produção 
antecipada de provas consideradas urgentes e relevantes, obser-
vando a necessidade, adequação e proporcionalidade da medida; 
(Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
II – determinar, no curso da instrução, ou antes de proferir 
sentença, a realização de diligências para dirimir dúvida sobre 
ponto relevante. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
Art. 157. São inadmissíveis, devendo ser desentranhadas do 
processo, as provas ilícitas, assim entendidas as obtidas em viola-
ção a normas constitucionais ou legais. (Redação dada pela Lei nº 
11.690, de 2008)
§ 1o São também inadmissíveis as provas derivadas das ilícitas, 
salvo quando não evidenciado o nexo de causalidade entre umas e 
outras, ou quando as derivadas puderem ser obtidas por uma fonte 
independente das primeiras. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 2o Considera-se fonte independente aquela que por si só, se-
guindo os trâmites típicos e de praxe, próprios da investigação ou 
instrução criminal, seria capaz de conduzir ao fato objeto da prova. 
(Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 3o Preclusa a decisão de desentranhamento da prova declara-
da inadmissível, esta será inutilizada por decisão judicial, faculta-
do às partes acompanhar o incidente. (Incluído pela Lei nº 11.690, 
de 2008)
§ 4o(VETADO) (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
CAPÍTULO II
DO EXAME DO CORPO DE DELITO, E DAS PERÍCIAS EM 
GERAL
Art. 158. Quando a infração deixar vestígios, será indispen-
sável o exame de corpo de delito, direto ou indireto, não podendo 
supri-lo a confissão do acusado.
Art. 159. O exame de corpo de delito e outras perícias serão 
realizados por perito oficial, portador de diploma de curso supe-
rior. (Redação dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 1o Na falta de perito oficial, o exame será realizado por 2 
(duas) pessoas idôneas, portadoras de diploma de curso superior 
preferencialmente na área específica, dentre as que tiverem habi-
litação técnica relacionada com a natureza do exame. (Redação 
dada pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 2o Os peritos não oficiais prestarão o compromisso de bem 
e fielmente desempenhar o encargo. (Redação dada pela Lei nº 
11.690, de 2008)
§ 3o Serão facultadas ao Ministério Público, ao assistente de 
acusação, ao ofendido, ao querelante e ao acusado a formulação 
de quesitos e indicação de assistente técnico. (Incluído pela Lei nº 
11.690, de 2008)
§ 4o O assistente técnico atuará a partir de sua admissão pelo 
juiz e após a conclusão dos exames e elaboração do laudo pelos 
peritos oficiais, sendo as partes intimadas desta decisão. (Incluído 
pela Lei nº 11.690, de 2008)
Didatismo e Conhecimento 3
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
§ 5o Durante o curso do processo judicial, é permitido às par-
tes, quanto à perícia: (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
I – requerer a oitiva dos peritos para esclarecerem a prova ou 
para responderem a quesitos, desde que o mandado de intimação e 
os quesitos ou questões a serem esclarecidas sejam encaminhados 
com antecedência mínima de 10 (dez) dias, podendo apresentar as 
respostas em laudo complementar; (Incluído pela Lei nº 11.690, 
de 2008)
II – indicar assistentes técnicos que poderão apresentar pare-
ceres em prazo a ser fixado pelo juiz ou ser inquiridos em audiên-
cia. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 6o Havendo requerimento das partes, o material probatório 
que serviu de base à perícia será disponibilizado no ambiente do 
órgão oficial, que manterá sempre sua guarda, e na presença de 
perito oficial, para exame pelos assistentes, salvo se for impossível 
a sua conservação. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
§ 7o Tratando-se de perícia complexa que abranja mais de uma 
área de conhecimento especializado, poder-se-á designar a atuação 
de mais de um perito oficial, e a parte indicar mais de um assistente 
técnico. (Incluído pela Lei nº 11.690, de 2008)
Art. 160. Os peritos elaborarão o laudo pericial, onde descre-
verão minuciosamente o que examinarem, e responderão aos que-
sitos formulados. (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
Parágrafo único. O laudo pericial será elaborado no prazo 
máximo de 10 dias, podendo este prazo ser prorrogado, em casos 
excepcionais, a requerimento dos peritos. (Redação dada pela Lei 
nº 8.862, de 28.3.1994)
Art. 161. O exame de corpo de delito poderá ser feito em qual-
quer dia e a qualquer hora.
Art. 162. A autópsia será feita pelo menos seis horas depois 
do óbito, salvo se os peritos, pela evidência dos sinais de morte, 
julgarem que possa ser feita antes daquele prazo, o que declararão 
no auto.
Parágrafo único. Nos casos de morte violenta, bastará o sim-
ples exame externo do cadáver, quando não houver infração penal 
que apurar, ou quando as lesões externas permitirem precisar a 
causa da morte e não houver necessidade de exame interno para a 
verificação de alguma circunstância relevante.
Art. 163. Em caso de exumação para exame cadavérico, a au-
toridade providenciará para que, em dia e hora previamente marca-
dos, se realize a diligência, da qual se lavrará auto circunstanciado.
Parágrafo único. O administrador de cemitério público ou par-
ticular indicará o lugar da sepultura, sob pena de desobediência. 
No caso de recusa ou de falta de quem indique a sepultura, ou 
de encontrar-se o cadáver em lugar não destinado a inumações, a 
autoridade procederá às pesquisas necessárias, o que tudo constará 
do auto.
Art. 164. Os cadáveres serão sempre fotografados na posição 
em que forem encontrados, bem como, na medida do possível, 
todas as lesões externas e vestígios deixados no local do crime. 
(Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
Art. 165. Para representar as lesões encontradas no cadáver, 
os peritos, quando possível, juntarão ao laudo do exame provas 
fotográficas, esquemas ou desenhos, devidamente rubricados.
Art. 166. Havendo dúvida sobre a identidade do cadáverexu-
mado, proceder-se-á ao reconhecimento pelo Instituto de Identifi-
cação e Estatística ou repartição congênere ou pela inquirição de 
testemunhas, lavrando-se auto de reconhecimento e de identidade, 
no qual se descreverá o cadáver, com todos os sinais e indicações.
Parágrafo único. Em qualquer caso, serão arrecadados e au-
tenticados todos os objetos encontrados, que possam ser úteis para 
a identificação do cadáver.
Art. 167. Não sendo possível o exame de corpo de delito, por 
haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá 
suprir-lhe a falta.
Art. 168. Em caso de lesões corporais, se o primeiro exame 
pericial tiver sido incompleto, proceder-se-á a exame complemen-
tar por determinação da autoridade policial ou judiciária, de ofício, 
ou a requerimento do Ministério Público, do ofendido ou do acu-
sado, ou de seu defensor.
§ 1o No exame complementar, os peritos terão presente o auto 
de corpo de delito, a fim de suprir-lhe a deficiência ou retificá-lo.
§ 2o Se o exame tiver por fim precisar a classificação do delito 
no art. 129, § 1o, I, do Código Penal, deverá ser feito logo que de-
corra o prazo de 30 dias, contado da data do crime.
§ 3o A falta de exame complementar poderá ser suprida pela 
prova testemunhal.
Art. 169. Para o efeito de exame do local onde houver sido 
praticada a infração, a autoridade providenciará imediatamente 
para que não se altere o estado das coisas até a chegada dos peri-
tos, que poderão instruir seus laudos com fotografias, desenhos ou 
esquemas elucidativos. (Vide Lei nº 5.970, de 1973)
Parágrafo único. Os peritos registrarão, no laudo, as altera-
ções do estado das coisas e discutirão, no relatório, as consequên-
cias dessas alterações na dinâmica dos fatos. (Incluído pela Lei nº 
8.862, de 28.3.1994)
Art. 170. Nas perícias de laboratório, os peritos guardarão ma-
terial suficiente para a eventualidade de nova perícia. Sempre que 
conveniente, os laudos serão ilustrados com provas fotográficas, 
ou microfotográficas, desenhos ou esquemas.
Art. 171. Nos crimes cometidos com destruição ou rompimen-
to de obstáculo a subtração da coisa, ou por meio de escalada, os 
peritos, além de descrever os vestígios, indicarão com que instru-
mentos, por que meios e em que época presumem ter sido o fato 
praticado.
Art. 172. Proceder-se-á, quando necessário, à avaliação de 
coisas destruídas, deterioradas ou que constituam produto do cri-
me.
Parágrafo único. Se impossível a avaliação direta, os peritos 
procederão à avaliação por meio dos elementos existentes nos au-
tos e dos que resultarem de diligências.
Art. 173. No caso de incêndio, os peritos verificarão a causa e 
o lugar em que houver começado, o perigo que dele tiver resultado 
para a vida ou para o patrimônio alheio, a extensão do dano e o 
seu valor e as demais circunstâncias que interessarem à elucidação 
do fato.
Didatismo e Conhecimento 4
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Art. 174. No exame para o reconhecimento de escritos, por 
comparação de letra, observar-se-á o seguinte:
I - a pessoa a quem se atribua ou se possa atribuir o escrito 
será intimada para o ato, se for encontrada;
II - para a comparação, poderão servir quaisquer documentos 
que a dita pessoa reconhecer ou já tiverem sido judicialmente re-
conhecidos como de seu punho, ou sobre cuja autenticidade não 
houver dúvida;
III - a autoridade, quando necessário, requisitará, para o exa-
me, os documentos que existirem em arquivos ou estabelecimen-
tos públicos, ou nestes realizará a diligência, se daí não puderem 
ser retirados;
IV - quando não houver escritos para a comparação ou forem 
insuficientes os exibidos, a autoridade mandará que a pessoa escre-
va o que Ihe for ditado. Se estiver ausente a pessoa, mas em lugar 
certo, esta última diligência poderá ser feita por precatória, em que 
se consignarão as palavras que a pessoa será intimada a escrever.
Art. 175. Serão sujeitos a exame os instrumentos empregados 
para a prática da infração, a fim de se Ihes verificar a natureza e a 
eficiência.
Art. 176. A autoridade e as partes poderão formular quesitos 
até o ato da diligência.
Art. 177. No exame por precatória, a nomeação dos peritos 
far-se-á no juízo deprecado. Havendo, porém, no caso de ação pri-
vada, acordo das partes, essa nomeação poderá ser feita pelo juiz 
deprecante.
Parágrafo único. Os quesitos do juiz e das partes serão trans-
critos na precatória.
Art. 178. No caso do art. 159, o exame será requisitado pela 
autoridade ao diretor da repartição, juntando-se ao processo o lau-
do assinado pelos peritos.
Art. 179. No caso do § 1o do art. 159, o escrivão lavrará o auto 
respectivo, que será assinado pelos peritos e, se presente ao exame, 
também pela autoridade.
Parágrafo único. No caso do art. 160, parágrafo único, o lau-
do, que poderá ser datilografado, será subscrito e rubricado em 
suas folhas por todos os peritos.
Art. 180. Se houver divergência entre os peritos, serão con-
signadas no auto do exame as declarações e respostas de um e de 
outro, ou cada um redigirá separadamente o seu laudo, e a autori-
dade nomeará um terceiro; se este divergir de ambos, a autoridade 
poderá mandar proceder a novo exame por outros peritos.
Art. 181. No caso de inobservância de formalidades, ou no 
caso de omissões, obscuridades ou contradições, a autoridade judi-
ciária mandará suprir a formalidade, complementar ou esclarecer o 
laudo. (Redação dada pela Lei nº 8.862, de 28.3.1994)
Parágrafo único. A autoridade poderá também ordenar que se 
proceda a novo exame, por outros peritos, se julgar conveniente.
Art. 182. O juiz não ficará adstrito ao laudo, podendo aceitá-lo 
ou rejeitá-lo, no todo ou em parte.
Art. 183. Nos crimes em que não couber ação pública, obser-
var-se-á o disposto no art. 19.
Art. 184. Salvo o caso de exame de corpo de delito, o juiz ou a 
autoridade policial negará a perícia requerida pelas partes, quando 
não for necessária ao esclarecimento da verdade.
6.3. LEVANTAMENTOS PERICIAIS EM 
LOCAIS DE CRIME (CONCEITUAÇÃO, 
CLASSIFICAÇÃO, ISOLAMENTO E 
PRESERVAÇÃO); 
O crimepode ser considerado como uma manifestação da 
tendência anti-social, derivando datransgressão das normas 
jurídico-legais estabelecidas para uma determinada sociedade e 
numadeterminada época. Marques-Teixeira refere, no entanto, 
que algumas teorias de cunhoambientalista têm assumido 
uma perspectiva mais abrangente, identificando o crime como 
algoarbitrariamente desenhado, quer pelas forças populares 
(normas e costumes) quer pelas forçaseconômicas.
Mas, ao falarmos de crime, falamos, antes de mais, na 
percepção de determinado comportamentocomo crime por uma 
dada sociedade e que resulta, necessariamente, do enquadramento 
que lheé dado pelo Direito Penal. Este conjunto de normas traduz 
uma série de opções de políticacriminal relativas à definição e 
hierarquização dos valores sociais fundamentais da sociedade 
edas vias instrumentais para os proteger, definindo o conjunto de 
pressupostos de que depende averificação de uma consequência ou 
de um efeito jurídicos e estabelecendo as reações ousanções que ao 
crime se encontram juridicamente ligadas.
O Direito Penal constitui, pois, do ponto de vista formal 
(como emanação do exercício da funçãolegislativa do Estado) e 
institucional (como conjunto de normas cuja aplicação se impõe 
àsinstituições do poder judicial), a linha da frente da reação social 
ao crime, cujo estudo éfundamental para a justificação e legitimação 
das respostas que a sociedade escolhe dar aoscomportamentos 
criminosos.
Assim, definido pela lei processual penal como “o conjunto de 
pressupostos de que dependeaaplicação ao agente de uma pena ou 
medida de segurança” (cfr. art. 1º, alínea a do CPP), crime é todo 
o fato voluntário declarado punível pela lei penal, excluindo-se os 
atos reflexos e oscometidos no estado de inconsciência, bem como 
os levados a cabo com carência total devontade.
Para se falar em crime tem que se falar no conjunto de normas 
jurídicas que fixam ospressupostosde aplicação de determinadas 
reações legais: as reações criminais, queenglobam as penas e as 
medidas de segurança. A Constituição da República Portuguesa 
defineos parâmetros constitucionais, e os limites materiais e 
formais da criminalização, estabelecendoos limites ao arbítrio da 
definição de comportamentos que hão de ser crime ou não (cfr. 
art. 18º daCRP). Podem constituir crimes condutas que ofendam o 
conjunto de valores que sãoindispensáveis à pessoa humana para 
a sua subsistência e a sua afirmação com autonomia edignidade, 
ou os valores indispensáveis ao funcionamento da legalidade 
democrática dasinstituições democráticas.
Didatismo e Conhecimento 5
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
É em obediência aos parâmetros atrás enunciados que o 
legislador penal pode classificardeterminado comportamento 
como crime (cfr. art. 10º do CP).
Os elementos do conceito de crime comuns a todo o fato 
punível são a tipicidade, a ilicitude (aantijuricidade) e a culpa. 
Por isso se diz do comportamento criminal que ele é típico, 
ilícito eculposo. Mas, antes de mais, o crime é constituído por um 
comportamento humano que se traduznum ato material,nullumcri
mensineactione, (não ocorrem crimes que tenham umaexistência 
meramente espiritual), mas é ainda necessário que o fato material 
praticado sejalesivo dos interesses protegidos,nullumcrimensine 
injurie, e que tenha sido praticado comculpa,nullumcrimensine 
culpa. A consideração de que o comportamento humano é o ponto 
departida da construção do conceito de crime coloca a questão da 
causalidade da relaçãodaquele com este, por forma a que se possa 
atribuir ou imputar a existência do fato ao comportamento. A ação é 
equiparada à omissão, nos termos do nº 2 do art.10º, consagrando-
seuma verdadeira extensão da punibilidade, como consequência 
das exigências resultantes doprincípio nullumcrimensine lege.
Para se afirmar a ilicitude de uma conduta (art. 31º do CP), 
não basta a sua subsunção formal aum tipo legal: importa, ainda, 
que ela não seja enquadrável num tipo de causa (de justificação) 
docomportamento humano que exclua a ilicitude da conduta. São 
causas de justificação: a legítimadefesa (art. 32º CP), o exercício de 
um direito (art. 31º CP), o cumprimento de um dever impostopor 
ordem legítima da autoridade (art. 31º CP), o consentimento do 
ofendido (art. 38º CP), odireito de necessidade (art. 34º), o conflito 
de deveres (art. 36º), o consentimento presumido (art.39º) e outras 
causas justificativas que eventualmente resultem da ponderação 
dos valores emconflito na situação concreta.
A existência de culpa (a formulação de um juizo de censura 
ética) pelo comportamento écondição indispensável da aplicação de 
uma pena, constituindo uma exigência jurídicoconstitucional(cfr. a 
aplicação conjugada dos art.s 1º, 13º e 25º do CP). O princípio 
nullumpoenasine culpa vem plasmado no art. 13º do CP: só é 
punível o fato praticado com dolo, ou, noscasos especialmente 
previstos na lei, com negligência.
A culpabilidade pode manifestar-se como culpabilidade pelo 
fato individual, na qual se consideram os fatores da atitude interna 
juridicamente censurável que se manifestam de forma imediata na 
ação típica, ou como culpabilidade na condução da vida (a culpa 
na formação dapersonalidade, na construção teórica de Eduardo 
Correia), em que o juízo de culpabilidade seamplia a toda a 
personalidade do autor e ao seu desenvolvimento. A nossa lei penal 
pareceacolher a união de ambas as concepções, ao mandar atender, 
na determinação da medida dapena (art. 62º, nº 2, alínea f) do CP) 
à “gravidade da falta da preparação para manter umaconduta lícita 
manifestada no fato, quando essa falta deva ser censurada através 
da aplicaçãoda pena”. O conceito dogmático de culpa integra três 
noções fundamentais: 
- a imputabilidade (fatores endógenos): existência de 
qualidades pessoais que possibilitam o juízo de censura aoagente; 
constitui o primeiro elemento que repousa sobre o juízo de culpa); 
- anão-exigibilidade (fatores exógenos): situações que tornam 
inexigível outro tipo de comportamento por parte doagente; 
- a graduação: o dolo (violação intencional da norma) 
e a negligência (o descuido, a violação do dever objetivo de 
cuidado). A culpa (o dolo) é excluída pela inimputabilidade e 
pelainexigibilidade.
A inimputabilidade pode verificar-se em razão da idade (art. 19º 
do CP): a idade inferior a 16 anosé um obstáculo à culpa, já que esta 
pressupõe a liberdade de decisão, existindo uma presunçãoabsoluta 
de inimputabilidade, através de um critério biológico, sem ter que 
se averiguar sequer oestado de desenvolvimento individual da 
criança ou do jovem e a sua capacidade intelectual evolitiva.
A inimputabilidade pode, ainda, verificar-se em razão 
de anomalia psíquica (art. 20º do CP): adeterminação da 
inimputabilidade referida no nº 1 do art. 20º está condicionada à 
existência deum pressuposto biológico (anomalia psíquica) e de 
um pressuposto psicológico ou normativo (aincapacidade para 
avaliar a ilicitude do fato ou se determinar de harmonia com essa 
avaliação).
O nº 2 do art. 20º prevê a possibilidade de declaração da 
imputabilidade diminuída. Se o tribunalentender que o efeito 
psicológico da inimputabilidade só parcialmente se verifica, mas 
encontraruma base biológica grave permanente, não dominando 
o agente os seus efeitos, pode declarar oagente como inimputável, 
tendo presente o indício previsto no nº 3 do mesmo artigo, ou seja, 
aincapacidade do agente para se deixar influenciar pelas penas.
A não exigibilidade de conduta diferente da realizada pelo 
agente de um fato criminalmentepunível está cristalizada em 
situações-tipo: 
- estado de necessidade desculpabilizante (art. 35º);
- excesso astênico de legítima defesa; 
- obediência devida desculpabilizante; 
- o erro sobre as circunstâncias do fato (art. 16º) ; e) o erro 
sobre a ilicitude (2ª parte do nº1 do art. 16º e a falta devaloração e 
interiorização do juízo de valor prevista no art. 17º).
A culpa é atenuada por: 
- erro censurável sobre a ilicitude; 
- excesso de legítima defesa;
- estado de necessidade desculpabilizante.
Sintetizando e articulando as diferentes noções e categorias 
referidas, podemos concluir que aculpa resulta do juízo segundo 
o qual o agente deveria agir de acordo com a norma porque podia 
atuar de acordo com ela, o que pressupõe a liberdade de decisão 
(pois só assim se poderáconsiderar responsável o agente por ter 
praticado o ato, em vez de dominar os impulsos criminais) e uma 
decisão correta (a liberdade de querer deve andar associada à 
capacidade paraajuizar os valores uma vez que sem ela as decisões 
humanas não poderão ser determinadas pornormas de dever). 
Com a liberdade de decisão prendem-se as questões relacionadas 
com a imputabilidade; com a correção da decisão prende-se a 
problemática do erro sobre as circunstâncias do fato e sobre a 
ilicitude.
A definição de trauma pode variar de acordo com a perspectiva 
teórica e prática em que oconceito assenta.Quando se fala em 
trauma pensamos, muitas vezes, em traumatismo físico, da mesma 
formaque quando se fala em dano corporal (conceito médico-legal) 
pensamos, geralmente, apenas nasua vertente orgânica. Trata-se de 
um hábito ancestral, que remonta a alguns milênios antes deCristo 
e para o qual ainda continua a remeter-nos o sistema de peritagem 
médico-tabelar.
Procura-se, desta forma, a organicidade do dano, que facilita 
o estabelecimento do seu nexo decausalidade com o traumatismo 
permitindo, assim,descrevê-Io de maneira objetiva e,supostamente, 
orientar concretamente o tratamento/reintegração da vítima e a 
atribuição de uma eventual indenização.
Didatismo e Conhecimento 6
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Mas os eventos traumáticos podem ser de múltiplas etiologias, 
não correspondendo,necessariamente, todos eles, a situações de 
violência e, muito menos de lesão orgânica. Poroutro lado, mesmo 
no caso de existirem lesões orgânicas, além das suas sequelasmais objetiváveis (no corpo, nas capacidades e nas situações de 
vida), poderão existir outras subjetivas, relacionadas não só com a 
vivência pessoal do trauma mas, também, com apercepção que a 
pessoa tem do seu dano corporal.
Dependendo da natureza da força que causa o trauma, 
podemos designá-lo por desastre (forçada natureza), ou atrocidade 
(força de outro ser humano).
Ainda que de forma muito incompleta, podem sistematizar-se 
da seguinte maneira algumasetiologias do trauma:
1. Desastre sofrido pelo próprio ou por terceiros:
a) de origem natural (ex.: terremoto);
b) de origem humana (ex.: acidente de viação);
2. Assalto pessoal violento ao próprio ou a terceiros:
a) Crime contra a integridade física;
b) Crime sexual;
c) Maus-tratos;
d) Tortura;
e) Rapto;
3. Guerra, ataque terrorista e atentado
4. Diagnóstico de doença ameaçadora da vida, no próprio ou 
em terceiros
5. Sequelas mais ou menos graves, de um traumatismo ou 
doença, sofridas pelo próprio oupor terceiros
6. Questão relacional:
a) Separação;
b) Divórcio;
c) Conflito grave (laboral ou familiar);
d) Injúrias graves ou falsas acusações;
7. Questão de sobrevivência:
a) Problema econômico grave;
b) Desemprego prolongado e inesperado;
c) Burla, fraude ou falsificação;
d) Roubo;
8. Perda de terceiros:
a) Morte por suicídio ou homicídio;
b) Morte súbita de causa acidental ou natural.
Assim, o conceito de trauma, de acordo com o ponto de vista 
de vários autores traduz um evento(choque), que ocorre súbita 
e inesperadamente, de forma irreversível, que não é familiar à 
vítimae está fora do seu controlo não lhe sendo por isso possível a 
tomada de ações corretivas diretas e que ameaça o seu bem-estar 
psicológico, direta ou indiretamente, constituindo umaexperiência 
muito estressante que requer uma adaptação psicológica, podendo 
originar sequelas,designadamente psicológicas.
A mudança imposta pelo trauma inclui a percepção de si 
próprio, a percepção dos outros e apercepção da vida circundante, 
na medida em que implica a vivência de emoções intensas e 
cognitiva da vulnerabilidade pessoal.
Todas estas formas de trauma têm consequências definitivas, 
mais ou menos graves, que se irãomarcar e ter repercussões na 
vida da pessoa que o viveu.
São os eventos traumáticos súbitos e inesperados, 
incontroláveis, fora do comum, crônicos ecom culpa de terceiros, 
que produzem mais dificuldades psicológicas para o indivíduo que 
osvive.
As alterações psicológicas e a capacidade para ultrapassar 
todas estas dificuldades econtrariedades, reencontrando o gosto 
anterior de viver, dependem:
- do tipo de trauma: severidade e duração;
- da disposição individual: estado de saúde prévio da pessoa, 
da sua experiênciaanterior, do nível da vida da vítima (um trauma 
na infância e na velhice temconsequências muito particulares; 
os idosos sofrem mais repercussões do stress queos jovens), das 
crenças e práticas culturais, de fatores demográficos;
- da percepção individual: percepção do trauma, expectativas 
e motivação relativamenteà reabilitação/reintegração, tipo 
de práticas usadas contra o stress (como o exercícioou uma 
alimentação adequada);
- do suporte de terceiros: características do seu meio e da sua 
situação social e cultural,da existência de suporte de amigos e da 
família.
Desta forma podemos compreender que nem todos os abusos 
são traumáticos, sendo para talimportante a percepção da pessoa 
relativamente ao evento. Se não houver violência, um abusosexual 
de um menor pode não ser percebido como tal e, por isso, não 
ser traumatizante (noimediato), uma vez que não percebe o evento 
como uma ameaça de séria lesão ou dano.
As situações traumáticas, pela sua natureza, confrontam as 
pessoas com os sentimentosmáximos de abandono, incapacidade 
e terror. Não sendo a severidade do trauma mensurável,pode, no 
entanto, caracterizar-se pelo seu poder em inspirar os sentimentos 
referidos.
Há três elementos que transformam um evento numa situação 
de verdadeiro trauma: aincapacidade da pessoa para o controlar 
e o resultado da falta desse controlo na segurançaindividual; a 
atribuição de uma elevada valência negativa ao evento; o fato da 
experiência serinesperada.
A capacidade para controlar um evento torna-o mais 
previsível e a capacidade para o prever tornao seu controlo mais 
fácil. No entanto, a previsibilidade não é, necessariamente, um 
elementoessencial para o processo de trauma. Mesmo que um 
evento seja previsível, poderá sertraumatizante se sentido como 
incontrolável e altamente negativo (ex: abuso sexual reiterado 
decriança; neste caso a previsibilidade pode até torná-lo mais 
traumático na sequência do stress etensão devido à espera do 
abuso incontrolável).
A valência negativa é devida à percepção ou à presença de 
lesão e(ou) sofrimento físico ouemocional. As características desta 
valência negativa dependem de fatores subjetivos quevariam de 
indivíduo para indivíduo. Por exemplo, testemunhar a tortura 
ou morte de uma pessoapode ser sentido como negativo em 
determinadas circunstâncias (quando se trate dum próximoou ente 
querido) ou positivo (quando por exemplo se tratar de um inimigo 
de guerra).
Didatismo e Conhecimento 7
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
O fato de ser inesperado constitui, também, um elemento 
chave do processo de trauma. Oseventos discretos que surgem de 
forma abrupta podem causar mais terror e ser mais traumáticosdo 
que aqueles que são vividos gradualmente, durante um longo 
período de tempo, uma vez queeste tempo permite uma adaptação 
cognitiva e emocional ao esquema individual e do mundo emredor.
Assim, respondendo à pergunta inicial, “O que pode 
vitimizar uma pessoa?”, diríamos quepodemos ser vitimizados 
por circunstâncias que nos são adversas e causam dano 
físico,psicológico e(ou) social, seja um crime ou outra situação 
de violência, mesmo que não criminosa,situações estas que, pelas 
suas características podem configurar um trauma, resultando daí 
orisco de maior dano bio-psico-social, temporário ou permanente, 
para a vítima.
Vítima e vitimação. Níveis e tipos de vitimaçãoA raiz do 
termo vítima está ligada aos verbos latinos vincire(ligar, atar) ou 
vincere(derrotar,desarmar).Este substantivo usa-se frequentemente 
em criminologia e na medicina legal mas raramente nodireito, que 
prefere os termos “ofendido”, “pessoa ofendida”, “parte lesada” 
ou, ainda, “sujeitopassivo do crime”, entendido como “o titular do 
bem jurídico tutelado da norma incriminatóriaviolada”.
Todos somos vítimas de próximos e de desconhecidos, da 
sociedade e das tecnologias, até denós próprios.... Ser considerada 
vítima faz pressupor que se sofreu qualquer tipo de “agressão” 
aque frequentemente se chama violência. Essa forma de violência, 
como se referiu, não tem de sersempre intencional. Há pessoas que 
têm tendência para sofrer acidentes repetidos, porapresentarem 
determinadas características pessoais ou do seu contexto que 
favorecem esseacontecimento. Serão vítimas de acidentes, 
acidentes que o podem ser, de fato, mas quetambém podem resultar 
de determinado tipo de culpa de terceiros (negligência).
Muitos, são vítimas não só destas ocorrências, como da forma 
como posteriormente são tratadospelas estruturas a que têm de 
recorrer (de saúde, de justiça, por exemplo) e pela comunidade 
emgeral. Outros são vítimas indiretas ou vicariantes.
De uma forma clássica a vítima pode ser considerada 
como a pessoa ferida ou lesada por outroou outros, que se sente 
prejudicada, que partilha essa experiência e procura assistência 
ereparação, e que é reconhecida como vítima e possivelmente 
assistida por organismoscomunitários públicos ou privados. 
Nesta definição a vítima é entendida como um indivíduo, masas 
instituições, corporações, estabelecimentos comerciais e grupos de 
pessoas podem, também,ser vitimizados e reclamar o seu estatuto 
de vítima. De fato podem ser vítimas pessoas físicas ouentes 
jurídicos (ex: o Estado) e também sujeitos passivos indeterminados 
(ou seja, nos casosemque o ofendido pertence genericamente a 
uma coletividade não delimitada mas concreta,ex:crimes contra 
a integridade e saúde da raça, contra a incolumidade pública, o 
sentimento religiosoe a piedade dos defuntos).
Têm-se afirmado que o crime pode não ter uma vítima mas tal 
é apenas devido à invisibilidade davítima; quanto mais não fosse, 
o Estado seria a vítima, como tutelar do interesse da resolução 
doconflito e da paz social.
Para dar resposta às perguntas: quem deve ser considerada 
vítima? quando deve uma pessoaser considerada vítima?, 
analisaremos os diversos níveis a considerar relativamente ao 
estatutode vítima. Assim, no processo de vitimação podemos 
distinguir quatro níveis, segundo Viano:
- 1º nível: O indivíduo experimenta um dano e sofrimento 
causado por outra pessoa ou instituição,sem o entender como uma 
forma de vitimação;
- 2º nível: Alguns desses indivíduos entendem esse dano como 
imerecido e injusto e sentem-sevítimas;
- 3º nível: Outros, ainda, sentindo-se lesados ou vitimizados, 
tentam encontrar alguém (familiar,amigo, profissional, autoridade) 
que reconheça essa vitimação e o dano sofrido;
- 4º nível: Destes, os que encontram reconhecimento para o 
seu estatuto de vítima tornam-se
“oficialmente” vítimas, podendo beneficiar de vários tipos de 
apoio.
Primeiro nível: O primeiro nível remete-nos para o dano 
e suas causas.De acordo com o ponto de vista tradicional, o 
elemento essencial do estatuto de vítima é apresença de dano, 
sofrimento e(ou) lesão, causado por um crime. No entanto, alguns 
consideramque não existe nenhuma razão que deva limitar a causa 
do dano a um ato criminoso cometidopor um indivíduo contra 
outro. A vitimação institucional, o abuso do poder, a vitimação 
coletiva e as ações governamentais ilegais ou ilegítimas também 
devem ser consideradas causas devitimação. Da mesma forma, 
devem ser considerados não só os atos de comissão mas tambémos 
de omissão. Em que medida é que as vítimas de desastres naturais, 
guerra, poluiçãoambiental, encerramento de fábricas, etc., devem 
ser aqui incluídas, é discutível. Algunsconsideram que o motivo 
e a forma do dano é irrelevante e o que conta é estar em crise, 
serlesado, ferido e necessitar de recuperação, de reparação e de 
adquirir, novamente, autonomia.
Assim, como atrás referido, a vítima pode ser considerada 
como alguém que sofre um dano, nasequência de um crime ou 
de um ato violento não criminoso, que em certas circunstância 
podeconfigurar um trauma.
No entanto, uma pessoa pode experimentar um dano sem 
se auto-considerar vítima (mesmo emcaso de dano e sofrimento 
causado por outro). A cultura, tradição e credos religiosos 
podempermitir uma racionalização que os leve a considerar 
eles próprios como responsáveis pelo danoque estão a sofrer e a 
culpar-se a eles mesmos e não ao perpetrador. As vítimas podem 
acreditarque são responsáveis pela sua vitimação, surgindo 
sintomas de stress, ansiedade e culpa,associados com a vitimação 
(perturbação de stress pós-traumático). A violência conjugal, 
oscrimes sexuais e o assédio sexual são exemplos clássicos que 
estão na origem deste tipo deracionalizações.
Os conceitos de susceptibilidade, vulnerabilidade e estilo de 
vida são instrumentos importantes naabordagem desta dimensão. 
Por essa razão, muitos autores consideram que a vitimologia 
nãodeveria incluir este nível, devendo antes partir do momento em 
que a pessoa compreende e sesente vitimizada ou, melhor ainda, 
do momento em que esta sente necessidade de revelar o fatoe o seu 
estatuto de vítima é publicamente reconhecido.
Outros discordam e consideram que as questões levantadas 
a partir deste primeiro nível e na suatransposição para o nível 
seguinte facultam uma importante e útil investigação. Por outro 
lado,este nível fornece-nos uma forte fundamentação para efetivos 
esforços de prevenção, uma vezque nos permite articular questões 
do tipo: como reduzir o grau de dano das pessoas quandoestas não 
se consideram vítimas? O que significa um aumento da taxa de 
vitimaçãopara umasociedade? Que reestruturação fundamental é 
necessária para interromper a vitimação?
Didatismo e Conhecimento 8
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Segundo nível: A transição entre o primeiro nível (sofrer 
um dano) e o segundo nível (sentir-se vítima) é crucial etem 
sido negligenciada, talvez devido à recente ênfase dada à macro-
pesquisa orientadasociologicamente (ex: sondagens nacionais de 
vitimação) versus as micro-abordagens orientadasdo ponto de 
vista psicológico.
Um dos maiores obstáculos ao reconhecimento da vitimação, 
mesmo por parte da vítima, éfrequentemente a sua tolerância 
pública silenciosa. Tal tolerância pode resultar de um sistema de 
valores, crenças e leis que ativamente sustentem, justifiquem e 
legitimem a vitimação.
O fato de altos cargos religiosos e alguns padres terem 
recentemente reconhecido de formaexplícita, a existência e as 
atividades do crime organizado, tem causado sensação, não tanto 
porrevelarem algo de novo mas porque desafiam o código do 
silêncio, tradicionalmente aceite, e apretensão de que nada estava 
errado.
A aceitação tácita da vitimação pode ser o resultado de uma 
ideologia “não consciente”, umsistema de crenças e atitudes, que 
são implicitamente aceites mas que não estãoconscencializadas, 
devido aos estereótipos que prevalecem. Pode ser, também, 
devida ao fatode algumas vezes não existirem alternativas 
disponíveis, possíveis ou imagináveis. Para evitar oaparecimento 
da dissonância cognitiva perturbadora, a consciência das injustiças 
e prevaricaçõesé apagada e a normalidade é restaurada através da 
legitimação e incorporação da vitimação nosvalores e formas de 
vida aceites numa dada sociedade.
É frequentemente preciso mudanças sociais drásticas como 
a industrialização, a urbanização, ocrescimento de oportunidades 
educacionais e de carreiras e a abertura de estilos de viaalternativos 
para abanar o status quo e levantar questões importantes. Isto por 
sua vez educa asvítimas acerca da sua vitimação, aumenta a sua 
consciência, encoraja a busca pela mudança e,acima de tudo, leva-
as a assumirem-se como vítimas de um sistema injusto. A percepção 
de que“isto não me deveria ter acontecido”, “eu não merecia 
isto”, ou “as coisas não têm de ser assim”,constitui a dinâmica 
psicológica chave neste complexo processo. A dificuldade de 
atingir esta meta resulta do fato de crenças, valores e sistemas 
bem enraizados terem de ser questionados ealterados e as figuras 
de liderança rejeitadas, sem garantia imediata de sucesso. Este 
riscoemparelha com a consciência de que a derrota agravaria mais 
ainda o processo de vitimação (ummal maior).
A principal razão porque as pessoas têm dificuldade em se 
assumirem como vítimas é a novelaameaçadora e abaladora 
da experiência de ser vitimizado. Geralmente uma atmosfera 
desegurança e harmonia social suporta as nossas actividades. Ser 
vitimizado não é uma realidadeque normalmente se nos depara. Se 
há algum pensamento de vitimação a tendência é pensar “seique 
acontece mas não me acontecerá a mim”. Antes da ocorrência 
a vitimação é no máximo umapossibilidade vazia, com a qual 
normalmente não nos preocupamos na nossa rotina diária.
Ser vitimizado é a alvorada de uma nova configuração do 
significado e ocorre naexperiência real através de um processo 
desenvolvimental. No início deste processo apresenta-secomo 
estranha, desenquadrada, não familiar, talvez problemática e 
confusa. Mesmo quando avitimação se torna uma realidade viva, 
a descrença expressa nos relatos das vítimas indica queela ainda 
é um tipo relativamente vazio de quase realidade. Ela ainda 
não foi completamentearticulada, apercebida e compreendida. 
Isto acontece porque o mundo de significado prévio dapessoa 
era baseado na segurança e harmonia social. Quando que estas 
estruturas são abaladas,a vítima é entregue a uma nova realidade 
estranha, não familiar, chocante e dificilmente credível,fora das 
normas usuais e das normaisexperiências de vida.
A vitimização (ou pelo menos uma sua primeira fase) é 
originalmente surpreendente, alígena eimprevisível, já que 
despedaça o mundo da pessoa. Assim, mesmo quando se torna 
claro para apessoa que a sua situação preferida está a ser destruída 
por outra pessoa, o que resulta é umaespécie de vazio que só 
gradualmente começa a ser entendido. A vítima foi arrancada da 
sua vidae lançada noutra que é contrária à primeira, esvaziando 
assim o seu mundo do seu significadousual.
Há três componentes principais da vitimação que a tornam 
particularmente ameaçadora e difícilde assumir:
- a capacidade da vítima para controlar as perdas, ficando 
indefesa, vulnerável e isolada;
- a dificuldade de aceder aos sistemas de apoio social e 
cooperativo;
- o fato de alguém ter invadido a sua vida e destruído, a vários 
níveis, o seu bem-estar.
Ver-se como vítima e aceitar a sua vitimação é importante por 
outra razão crucial: pode ser oinício do processo de recuperação. 
Compreender, permite ultrapassar o choque e a confusão eabre o 
caminho para encetar a luta.
Este segundo nível alerta-nos para a importância da educação 
pública e do despertar dasconsciências, para que as pessoas possam 
transcender explicações particulares e justificaçõesda vitimação e 
agarrem a natureza sistêmica e alargada do dano que as afeta. Isto 
deveráconduzi-las ao desenvolvimento do sentimento de raiva 
e da decisão de que algo tem de ser feitopara mudar a situação, 
não só num caso particular mas em toda uma classe de vítimas 
oupotenciais vítimas, o que atacaria assim o problema nas suas 
raízes, resolvendo-o na sua formadefinitiva.
Alguns peritos acreditam que as pessoas que foram vítimas 
de um dano deveriam ser capazes dese considerarem elas próprias 
vítimas antes ainda da vitimologia as considerar vitimizadas. 
Outrosdefendem que nenhuma fase isolada constitui o ponto 
fulcral da vitimologia e que, em vez disso, avitimologia deve 
concentrar-se em todo o processo de vitimação.
Terceiro nível: O terceira nível corresponde à assunção 
do estatuto e papel de vítima, pela própria.Após um indivíduo 
reconhecer uma experiência de vitimação ele deve decidir o que 
fazer acercadisso. Várias possibilidades, formais e informais 
se abrem à vítima. Há provas de que as vítimasvalidam a sua 
experiência e as suas conclusões com uma pessoa de confiança, 
maisfrequentemente do que se pensa. Tal validação influencia 
fortemente o fato de eles participaremoficialmente (polícia, 
agências de proteção) ou não. Muitas variáveis afetam a decisão 
da vítimarelativamente à participação pública da vitimação: a 
opinião sobre a probabilidade da políciaencontrar o culpado; 
a quantidade do dano e sofrimento devidos à revelação; a 
relação com ovitimizador; o impacto social da participação; 
os obstáculos, despesas e tempo envolvido naparticipação; a 
percepção da complexidade do complexo burocrático; o medo 
de ser ridicularizadoou de sofrer retaliação e vingança; a falta de 
privacidade nos níveis iniciais da participação; o localde residência 
(os habitantes rurais participam mais dificilmente).
Didatismo e Conhecimento 9
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Assim, fatores sociais, culturais e psicológicos podem impedir 
a vítima de reclamar publicamenteesse estatuto. Tal pode levar, por 
vezes, à perpetuação da vitimação com o vitimizador a tirar partido 
da falta de ação por parte da vítima.
Um fator decisivo para dar algum espaço de manobra à vítima 
é a importância colocada no fatode ganhar ou de ser bem sucedida 
na sociedade. Aos olhos de muitos, a vítima é um perdedor,mesmo 
que inocente; como resultado, a vítima pode ter um preço alto a 
pagar quando reconhecea vitimação. É por isso que é mais difícil 
ao sexo masculino admitir, participar a sua vitimação eprocurar 
ajuda apropriada.
Nas sociedades em que estabelecer os limites da atividade 
sexual é estritamente daresponsabilidade das mulheres, a violação 
é um crime sério.
Percebe-se, assim, a relutância da vítima para participar um 
acontecimento vitimizante. Participá-lopoderá ser o equivalente a 
passar uma sentença de morte a si próprio ou, pelo menos, pôr 
emsério risco o seu estatuto social, a respeitabilidade e aceitação 
na comunidade, bem como oestatuto social da sua família. Enfim, 
pode significar a estigmatização ou até a exclusão social.Por outras 
palavras, onde a culpabilização da vítima é prevalecente, e pior 
que isso, interiorizadapela própria vítima, o preço psicológico e 
social a pagar pela revelação pode ser muito alto.
Da mesma forma a percepção da vítima de que poderá não ser 
acreditada, pode, efetivamente,fechar todas as vias para revelar e 
procurar a reparação por um período indeterminado de tempo,e 
pode conduzir a uma vitimação prolongada. Para além disso, a 
desvalorização social doconsentimento para revelar, pode fazer 
da vítima um alvo fácil para assédio e revitimização, nasmãos do 
vitimizador ou de outros. Exemplos destas vitimizações incluem 
o incesto, assédiosexual, violência doméstica e abuso dos idosos.
A relutância em reclamar o estatuto ou papel de vítima não se 
confina às vítimas. Corporações,empresas e mesmo os governos, 
podem não participar serem vítimas de vitimação, paramanterem 
uma certa imagem, por razões de ordem prática (ex: empresa pode 
não participar umainvasão de vírus ou perda de segurança nos 
seus computadores, preferindo arcar com as perdaspara evitar má 
publicidade que poderia abalar a confiança dos clientes e afetar a 
sua capacidadede funcionamento).
A aquisciência de pequenos e mesmo grandes negócios às 
exigências do extorcionista do crimeorganizado ou de um corrupto 
judiciário, também refletem muitas destas dinâmicas que afetama 
vontade individual das vítimas para reconhecer e reclamar o seu 
papel de vítima e procurarem areparação.
Quarto nível: O quarto e último nível é o do reconhecimento 
público da vitimização e do apoio da sociedade.Ultrapassar a 
vitimação é o exato reverso do seu significado e não deve ser 
descurada. Se omundo social que causa e apoia a vitimação não 
muda ou continua a ser conivente, se a vítimanada faz acerca 
da sua má sorte ou se os outros permanecem indiferentes ou 
indisponíveis, avitimação é aprofundada. A sociedade e os outros 
desempenham um papel fundamental noprocesso que permite à 
vítima ultrapassar a sua vitimação e construir um novo mundo. 
A ajuda ativa dos outros restaura o sentimento de confiança e 
harmonia na sociabilidade destruída davítima e ajuda-a a fazer a 
transição para o novo mundo “após” a vitimação.
É vital para o bem-estar da vítima, como indivíduo e como 
membro da sociedade que o danoprovocado pela vitimação seja 
ultrapassado e que a crise por ele gerada se resolva com sucesso.
A tarefa e necessidade de todas as vítimas é restabelecer 
o mundo como o prefere e conhece.Isto envolve sair da 
imobilidade e aproveitar a iniciativa, pondo fim ao isolamento e 
estabelecendocontactos e redes, escapando ao perigo e entrando 
num porto seguro.
Este processo requer três elementos interrelacionados: um 
esforço ativo, a garantia por parte domundo de uma segurança 
previsível, e a ajuda ativa dos outros. É através deste processo 
que avitimação aparecerá como evitável, prevenível e possível 
de ultrapassar. O reconhecimento ecompreensão da sociedade é 
crucial para a efetivação deste processo de recuperação.
Uma quantidade substancial da pesquisa vitimológica tem-
se desenvolvido à volta dos fatores que afetam a transição do 
terceiro para o quarto nível (ex: os fatores que determinam se 
areclamação do estatuto de vítima é reconhecida e leva os agentes 
da sociedade a agir) e das ações dos agentes que oferecem ajuda, 
retribuição, restituição e compensação. Pesquisas eartigos sobre 
a vítima e o sistema criminal de justiça, programas de proteção à 
vítimatestemunha, compensação e restituição, tratamento à vítima, 
reforma do sistema criminal dejustiça, etc, dominam esta área.
A reação e envolvimento da sociedade são muito afetadospelo terceiro nível. O númerocrescente de vítimas que ultrapassam 
a questão reforça e intensifica a consciência pública acercada 
vitimação e contribui para estabelecê-la na constelação de 
assuntos que não podem serignorados e acerca dos quais é preciso 
fazer algo. Também fornece informação em primeira mãosobre 
as vítimas, números, dinâmicas de vitimação, necessidades das 
vítimas e como chegar atéelas.
Assim que as vítimas se revelam e o interesse público e 
profissional é acentuado, o passoseguinte será formular uma política 
pública apropriada e fornecer serviços relacionados. Talplanificação 
é requerida para assegurar que a sociedade terá capacidade para 
responderadequada e prontamente quando as vítimas reconhecem 
e reclamam o seu estatuto e procuramreconhecimento e apoio na 
comunidade.
No contexto criminal, para se ser considerada vítima, devem 
verificar-se certas condições: osseus direitos legais ou interesses 
devem ter sido afetados ou, pelo menos, postos em risco, por um 
ato punível pela lei penal; o dano sofrido deve ter sido causado 
pela ofensa criminal.
Esta conceptualização permite não só o reconhecimento do 
dano direto à pessoa como vítimamas, também, dos seus próximos 
ou ainda daqueles que dependem diretamente da vítima. Adistinção 
deve ser feita entre as vítimas individuais ou integradas num corpo 
coletivo. A vitimação coletiva envolve grupos de indivíduos 
ligados por fatos especiais ou circunstâncias que os tornaalvo de 
ofensa criminal.
O assunto sobre quando uma pessoa deve ser considerada 
vítima na perspectiva médico-legal é polêmico. Há três diferentes 
pontos de vista sobre esta questão:
- A pessoa deve ser considerada vítima nos procedimentos 
criminais, a partir domomento que denunciar o crime às autoridades 
judiciárias;
- Deve ser considerado vítima apenas no momento em que 
assume a posição formal e oseu papel no sistema de justiça 
criminal;
- Só deve ser reconhecido como vítima depois do tribunal ter 
estabelecido a culpa doacusado.
Didatismo e Conhecimento 10
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
Nesta última perspectiva, a pessoa que sofreu o dano por 
uma ofensa mantém o estatuto dealegada vítima durante todo 
o processo criminal até ao veredicto final. Esta opinião vai na 
mesmaordem de razão da presunção de se considerar o agressor 
inocente até o tribunal decisor que éculpado (fundamental para 
proteger os direitos e interesses do acusado e para lhe permitir 
oexercício do seu direito de defesa). No entanto, relativamente 
à vítima, se esta presunção fortambém usada, não lhe avança os 
seus interesses, pelo contrário, limitando-a no efetivoexercício 
dos seus direitos, além de ter um claro efeito prejudicial na sua 
posição durante oprocesso judicial. Assim, a analogia referida 
não deve ser seguida, no respeito pela vítima decrime. A pessoa 
que apresenta uma denúncia às autoridades e reclama o seu papel 
de vítimadeve ser presumida como tal até prova em contrário, de 
forma a salvaguardar os seus direitoslegais.
A segunda perspectiva é frequentemente encontrada. Nesta 
conceptualização os direitos davítima podem apenas ser exercidos 
se esta formalmente reconhecer o seu papel, particularmentea 
demanda civil. Esta conceptualização da vítima previne, por 
exemplo, a provisão de informaçãopela polícia no momento 
em que a vítima denuncia o crime. Mais ainda, se a vítima 
não estáinformada pela autoridade sobre os seus direitos e 
oportunidades no processo criminal, o riscodesta não ser capaz de 
assumir o papel formal necessário não é imaginável.
A primeira opinião é aquela que oferece melhor proteção 
aos direitos e interesses da vítima. Oreconhecimento da pessoa 
como vítima desde o momento da denúncia às autoridades não só 
lhedá a melhor possibilidade de ser informada dos seus direitos 
e oportunidades, como apossibilidade de ser notificada dos 
desenvolvimentos relevantes, além da melhor oportunidade de 
efetivamente exercer o seu direito de perseguir os seus interesses 
no processo criminal.
Excluindo esta perspectiva puramente técnico-jurídica, impõe-
se outra perspectiva menos rígida, mais articulada e capaz de se 
adaptar às inúmeras situações de vitimação, sem perder de vista a 
visão unitária do fenômeno do crime ou das situações traumáticas.
Conceito Formal de Crime
Afirma Damásio de Jesus que este conceito deriva da análise 
do crime sobre o “aspecto da técnica jurídica, do ponto de vista da 
lei”. Neste sentido, abundam definições: “Crime é o fato humano 
contrário à lei” (Carmignani). “Crime é qualquer ação legalmente 
punível” (Maggiore). “Crime é toda ação ou omissão proibida pela 
lei sob ameaça da pena” (Fragoso). “Crime é uma conduta (ação 
ou omissão contrária ao Direito, a que a lei atribui uma pena” (Pi-
mentel). “Todo ato ou fato que a lei proíbe sob ameaça de uma 
pena” (Bruno). “o fato ao qual a ordem jurídica associa a pena 
como legítima consequência” (Liszt). “ação punível: conjunto dos 
pressupostos da pena” (Mezger). “l´azionevietatadaldirittoconlam
inaciadella pena” (Petrocelli).
Como se percebe, estes significados conceituam o crime atra-
vés da descrição obtida através de um imperativo legal vigente. 
Segundo L.A. Machado, esta formulação é “claramente tautoló-
gica, a nada conduz. Pode ser, sem ofensa à verdade, reduzida a 
uma igualdade matemática: o crime é o crime.” De fato, sobre 
o prisma da modernidade, o conceito formal de crime não só é 
insuficiente e vazio, como claramente dogmático. No entanto, não 
basta criticá-lo, é necessário demonstrar a sua importância, visto 
que, em termos, o conceito analítico vem a resgatar um pouco des-
ta dogmática.
A conceituação formal como uma definição autossuficiente 
poderia ser fundamentada através do pensamento normativista, 
principalmente através de Kelsen e o seu pretenso purismo meto-
dológico. A tentativa normativista de unificar o direito em um blo-
co monolítico foi um sucesso, no entanto, o mesmo não pode ser 
dito sobre o esforço de firmar o direito como uma ciência absoluta-
mente autônoma, em atitude típica do modernismo, cujas reflexões 
tanto ciências quanto nas artes procuravam objetos puros auto re-
feridos, visto que a existência da insuperável interdisciplinaridade.
Muito embora a função de garantia dos direitos do cidadão 
(segurança jurídica) já estivesse a muito sedimentada através do 
princípio da legalidade, e, aliás, com uma doutrina que remonta a 
vários séculos atrás, foi o normativismo que contribuiu com o seu 
radicalismo para expurgar da aplicação do direito os valores que 
externos a este, apesar da segurança jurídica poder ser abalroada 
de outras maneiras, como leis retroativas, cuja teoria pura do Di-
reito não refuta, mas até explica.
A aparente suficiência de conceitos formais era proveniente 
da necessidade de certeza, assim como a eliminação da insegu-
rança que atingia os juristas, por isto, nada mais certo e ausente 
de dúvidas interpretativas que afirmar “crime é crime”. Todavia, 
está clara a tautologia, assim como a impossibilidade de se utilizar 
deste conceito para desenhar os critérios de orientação da materia-
lidade legislativa.
Conceito Puramente Material do Crime
Como afirma o L.A. Machado, “o conceito material busca a 
essência … do delito, a fixação de limites legislativos à incrimina-
ção de condutas”. Desta forma, o crime é um “desvalor da vida so-
cial”, e, segundo Garofalo, “a violação dos sentimentos altruísticos 
fundamentais de piedade e probidade, na medida média em que se 
encontram na humanidade civilizada, por meio de ações nocivas à 
coletividade”.
A raiz da valorização destes tipos de conceitos puramente ma-
teriais do direito pode ser encontrada através do desenvolvimento 
de correntes que negavam o direito como uma expressão autôno-
ma, ora o caracterizando como apenas um fato social (sociologis-
mo jurídico), ora como expressão de relações puramente econô-
micas de repressão (materialismo jurídico), o que castravam do 
mundo jurídico a sua capacidade de auto-alimentação científica.Na corrente materialista econômica mais radical (marxismo 
vulgar), para compreender o fenômeno jurídico, se utiliza uma 
compreensão sociológica baseada em fatos economicamente va-
lorados, na qual as condições materiais de produção e existência 
econômica (a infra-estrutura) exerceriam um determinismo sobre a 
superestrutura, isto é, sobre o plano cultural e psicológico, na qual 
se insere o estado, o direito, a política, a consciência individual 
e coletiva, etc. Esta corrente era tão exacerbada que não admitia 
que a superestrutura influenciasse a infra-estrutura, e, desta forma, 
o direito adquiria a forma de um “instrumento de dominação do 
homem pelo homem”, refletindo condições concretas de existência 
puramente econômica.
Evidentemente, esta teoria não era capaz de formular um im-
portante conceito suficiente de crime, já que, se o direito era um 
instrumento de dominação, não explicava como o crime poderia 
ser um mal social que poderia afetar toda a sociedade, e não apenas 
a sua classe dominante. Outro erro era o fato de asseverar que as 
correntes sociais se constituíam principalmente por interesses eco-
Didatismo e Conhecimento 11
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
nômicos. A expressão mais correta é que as realizações subjetivas 
podem ser traduzidas e expressas através dos seus equivalentes 
econômicos, muitas vezes de forma árdua e imprecisa, no entan-
to, apenas para aferição das consequências derivadas de interesses 
socialmente difundidos e transplantá-los para o da economia desta 
sociedade, sem resumir ou menosprezar as análises sociais que vi-
sualizam as relações sociais sobre outras perspectivas.
Outro problema do materialismo radical é que não explica 
porque a culpabilidade (juízo de reprovação social) não é menor 
em casos de crimes contra vida que naqueles furtos e roubos que 
envolvem valores monetários de enorme valia, que, na teoria, afe-
tam as classes dominantes no seu instrumento básico de poder. No 
entanto, serve de explicação para o fato do latrocínio possuir uma 
pena maior que o homicídio e o estupro seguido de morte.
Existem mais coisas entre o céu e a terra do que sonha o nosso 
vão materialismo radical, e é nesse sentido que o sociologismo ju-
rídico é capaz de superá-lo, quando atribuiu maior relevância a ca-
racterização material do crime fundada em elementos sociais mais 
complexos. Em contraposição, a sua maior desvantagem é atribuir 
a sociologia o papel de ciência enciclopédica do ramo cultural, tor-
nando a sociologia como a única ciência social (cultural/humana).
Os juristas que aderiram a esta corrente, para poderem afir-
mar que o direito constituía ciência, deveriam fazê-lo como uma 
subdivisão da sociologia. Desta forma, nada mais correto que 
caracterizar o direito como um fato social, como outro qualquer, 
cuja análise também deveria ser sociológica. Daí o surgimento do 
conceito puramente material do crime como algo autossuficiente, 
o que precedeu os dogmáticos normativistas neste tipo de orgulho 
insensato.
É desta doutrina que se origina a afirmativa que o direito é 
um mero reflexo da sociedade, criado pela simples observação 
dos fatos sociais e suas relações, negando qualquer abstração 
independente orientada exclusivamente no plano teórico, já que 
todas as iniciativas criativas do direito deveriam surgir de outros 
fatos sociais. Destarte, o crime seria uma ofensa ao corpo social, 
uma atitude patológica, que abalava a harmonia e a saúde deste or-
ganismo, tornando necessária o tratamento (eliminação) da doen-
ça.
Seus defeitos são definidos por Machado: “É evidente que, 
pela sua amplitude conceitual, a definição material de crime tem 
sabor pré-legislativo, de orientação e parâmetro à liberdade legis-
lativa de criação de delitos... Não presta à formulação dogmáti-
ca pela sua volatilidade e insegurança conceituais”. No entanto, 
mesmo como definidor pré-legislativo, o conceito material puro é 
incompetente, pois resume os crimes aos de dano, perigo e dano 
presumido (sem comprovação prática), quando, como em caso de 
alguns crimes de mera desobediência, o sistema penal pode clas-
sificar algo como crime apenas por causa da mobilização social 
que se comove a favor de tal medida, sem que este represente um 
problema efetivo.
Várias condutas são assim proibidas não porque representam 
ou podem potencialmente representar algum dano, mas por razões 
de vontade, pura e simples. Na sociedade atual, o surgimento des-
tes crimes ocorre pela proliferação de toda sorte de fobias, terrores, 
horrores e medos, são gerados pelo constante fluxo de informações 
realizadas por veículos de informação, cujo interesse primário é de 
atrair o público com notícias chocantes.
Não obstante, quase todos os autores conceituados, ao defi-
nirem o conceito material de crime, sempre trazem ao bojo uma 
análise material através dos olhos da modernidade, não tratando do 
conceito material puro justamente por causa da sua instabilidade, 
instabilidade esta que surge do fato que alguns fatos só são dano-
sos se situados em uma determinada conjuntura, e estas conjuntu-
ras modificam rapidamente, assim como o dano potencial destas 
condutas, que pode mesmo não mais existir; enquanto, por outro 
lado, o direito penal é dogmático, e a descriminalização de uma 
conduta não depende de uma modificação social, pura e simples, 
mas um esforço despendido através do processo legislativo.
Então, atualmente, o conceito de crime não pode ser 
desvinculado da legislação penal, e uma análise científica da 
lei deve ser necessariamente destacada como independente do 
corpo social que lhe deu razão, mesmo que apenas a título de 
interpretação.
Conceito Moderno Material de Crime
Este conceito que foi inaugurado por Rudolf VonIhering, e 
baseado neste, autores defendem que crime seria “o ato que ofen-
de ou ameaça um bem jurídico tutelado pela lei penal”, o que, ao 
contrário do conceito anterior, vincula a avaliação do que seja so-
cialmente valioso a noção de bem jurídico (valor juridicamente 
protegido).
Portanto, “crime é, assim, numa definição material, a ação ou 
omissão que, a juízo do legislador, contrasta violentamente com 
valores ou interesses do corpo social, de modo a exigir seja proi-
bida sob ameaça de pena”, seria a “infração da lei do Estado, pro-
mulgada para proteger a segurança dos cidadãos, resultante de um 
ato externo do homem, positivo ou negativo, moralmente imputá-
vel e politicamente danoso”.
Podemos destacar deste discurso dois elementos, a lei penal 
e o “bem jurídico material” que visa proteger, sabendo que bem 
jurídico material não só engloba objetos materiais, como abstratos, 
como os religiosos, morais e psicológicos. Destarte, o problema 
do conceito material puro é solucionado, no entanto, apesar de re-
presentar um avanço em relação ao parâmetro anterior, é apenas 
com o conceito analítico que podemos extrair de forma mais exata 
e melhor o conceito de crime. Mesmo assim, é de grande valia o 
presente conceito para a definição de critérios para incriminação 
de condutas.
Conceito Analítico de Crime
A classificação analítica tem várias vantagens, como demons-
tra a analogia de Machado: “Ainda que, formalmente, a água seja 
água e, materialmente, seja um líquido insípido, inodoro e incolor 
que serve para, entre outras coisas, saciar a sede, analiticamente a 
sua composição é H2O”.
Preliminarmente, disciplina Fragoso que a expressão “ele-
mento” é inadequada, pois dá a ideia de partes simples de um 
composto. Seria mais adequado falar em “características” ou em 
“requisitos”, embora este mesmo autor admita que esta questão 
não afete a “essência das coisas”.
Existem duas formas de classificação analítica do crime. Em-
bora a primeira classificação (bipartida) não seja mais aceita pela 
doutrina, reservaremos a esta algum espaço, assim como para a 
corrente dominante, que é a conceituação tripartida.
Didatismo e Conhecimento 12
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
A concepção bipartida define o crime através de doiscritérios: 
o subjetivo e o objetivo, quer dizer a força moral e a força física, 
“na força moral teríamos a culpabilidade (vontade inteligente) e o 
dano moral do delito, constituído pela intimidação (dano imediato) 
e pelo mau exemplo que o delito apresenta; na força física tería-
mos a ação com que o agente executa o desígnio malvado e o dano 
material do delito”.
Porém, é pacífica a caracterização analítica do crime da forma 
tripartida, como uma ação ou omissão típica, antijurídica e culpá-
vel. No entanto, disciplina Magalhães Noronha que, “com segu-
rança escreve Hungria que um fato pode ser típico, antijurídico, 
culpado e ameaçado com pena (“inthesi”), isto é, criminoso, e, no 
entanto, anormalmente deixar de acarretar a efetiva imposição de 
pena, como nas causas pessoais de exclusão da pena (eximentes, 
escusas absolutórias), tal qual se dá no furto familiar (art. 181, 
I e II) e no favorecimento pessoal (art. 348, §2º), nas causas de 
extinção da punibilidade nas extintivas condicionais (livramento 
condicional e “sursis”), em que não há aplicação de pena, mas o 
crime permanece”.
Enquanto a ação é atividade, a omissão seria a falta de ação, 
falta que é uma transgressão a uma expectativa jurídica sobre um 
ato considerado imperativo e necessário. A conduta típica seria a 
correspondência entre o fato concreto e o modelo abstrato (pre-
visão legislativa), a ilicitude (antijuridicidade) é a característica 
deste ato, que é juridicamente proibida, (sempre que a conduta é 
típica e não estão presentes os excludentes de ilicitude, quer dizer, 
a legítima defesa, o estado de necessidade e o estrito cumprimento 
de dever legal e o exercício regular de direito, conforme art. 19 do 
Código Penal).
Já a culpabilidade seria o juízo de reprovação social sobre a 
ação ou omissão, pois, quando era esperado que o sujeito tomas-
se uma determinada atitude, toma outra proibida em seu lugar. 
Todavia, a conduta, apesar de ser vedada pelo ordenamento, não 
é reprovável quando o sujeito não é imputável, quando não tem 
potencial consciência da ilicitude ou quando dele não se poderia 
exigir do indivíduo conduta diversa.
Parte bastante recessiva da doutrina diverge do aqui estabele-
cido, fixando que o conceito de crime é constituído apenas de uma 
conduta ilegal e culpável, já que a conduta ilegal é necessariamen-
te típica. Outros acreditam que a culpabilidade é pressuposto da 
pena, e não do crime. Como podemos perceber, nos baseamos na 
doutrina dominante para trabalhar esta parte. Baseada nesta carac-
terização analítica, afirma Fragoso que “é feliz a expressão que al-
guns autores empregam, segundo a qual, se concebe o crime como 
um prisma, seus componentes devem ser representados por suas 
faces e não como suas partes”.
A conceituação do crime foi delongada porque esta definição 
é a mais importante do Direito Penal. É o conceito chave deste 
ramo do direito, que, segundo alguns autores, deveria ser chamado 
de “Direito Criminal”, e não “Penal”.
Embora se tenha valorado cada uma destas definições como 
completas ou incompletas, todas são importantes. Apesar disto, 
alguns autores se esforçaram para concretizar uma conceituação 
mais definitiva do crime, algo que o jurista Damásio parece ter 
tentado ao desenvolver o critério “formal, material e sintomático 
do crime”, que “visa o aspecto formal e material do delito, incluin-
do na conceituação a personalidade do agente. Ranieri, sob esse 
aspecto, define o delito como “fato humano tipicamente previsto 
por norma jurídica sancionada mediante pena em sentido estrito 
(pena criminal), lesivo ou perigoso para bens ou interesses consi-
derados merecedores da mais enérgica tutela, constituindo expres-
são reprovável da personalidade do agente, tal como se revela no 
momento de sua realização”.
Alguns acentuam que o crime não é o fato em si, como postula 
Machado, já que o fato é a consequência do ato/omissão criminosa, 
sendo que esta consequência não é sempre necessária para a 
caracterização da atitude criminosa. No entanto, segundo doutrina 
dominante, esta separação de fato e ato não é procedente, pelo 
menos não da forma como foi realizada. Melhor caracterização 
nos traz Heleno Fragoso: “O crime é, sem dúvida, fato jurídico. 
Fato jurídico é designação genérica de todo acontecimento rele-
vante para o direito, provocando o nascimento, a modificação ou 
extinção de uma relação jurídica. Fatos jurídicos dividem-se em 
fatos naturais (ou fatos jurídicos em sentido estrito) e fatos vo-
luntários (ou atos jurídicos). Aqueles são fatos da natureza, como 
o nascimento ou a morte. Estes são condutas voluntárias, que in-
fluem sobre relações jurídicas. Os fatos voluntários (ou atos jurídi-
cos) subdividem-se em duas grandes categorias, a dos atos lícitos 
e a dos atos ilícitos. Os atos lícitos são atos praticados de acordo 
com o direito e podem ser declarações de vontade dirigidas a pro-
duzir efeitos jurídicos (negócios jurídicos) ou ações, positivas ou 
negativas, que produzem efeitos jurídicos, sem serem dirigidas a 
produzi-los”.
Assim, a Ciência Penal se torna principalmente o estudo jurí-
dico dos atos ilícitos, que são fatos em sentido amplo. A definição 
do crime é tão importante que tem serventia para o desenvolvi-
mento de inúmeros outros conceitos, como por exemplo, a deter-
minação do objeto do crime (jurídico formal, jurídico substancial e 
material), a diferença entre os ilícitos civis e os ilícitos penais e etc.
Observação:Quando se aborda o fenômeno crime, uma das 
questões mais frequentemente colocadas é a das suas razões ou 
causas, sendo comum ouvir como resposta que é porque os sujei-
tos são fracos, são maus ou são anormais. No entanto a resposta 
parece ter de ser bem mais complexa, implicando estudar o sujeito 
criminoso, de modo a dar conta de todos os fatores que influen-
ciam o seu comportamento. Tenta-se seguidamente demonstrar 
a necessidade de incluir as abordagens biológicas no estudo do 
crime. 
A utilização do atual paradigma científico, o paradigma sis-
têmico comunicacional informacional, permite ter uma visão 
complexa do ser humano, pois ao considerá-lo como um sistema 
biopsicossocial, realça não só a existência dos níveis biológico, 
psicológico e social, separadamente, mas também a articulação e 
comunicação entre eles. Num comportamento complexo e proble-
mático como é o crime, a complexidade do sistema biopsicossocial 
torna-se particularmente importante, pois para intervir é necessá-
rio conhecer os diferentes níveis do sistema humano e a importân-
cia de cada um deles no comportamento do sujeito. 
Um dos níveis mais criticado e desvalorizado é o nível bioló-
gico. Defender a existência e a importância das abordagens bioló-
gicas no estudo do crime implica entrar num tema polêmico, fre-
quentemente utilizado pelos meios de comunicação social como 
explicação securizante de casos pontuais. No entanto, convém 
não esquecer que esta utilização da biologia como justificação do 
comportamento não é recente, pois há bem menos de um século 
quer a biologia, quer o darwinismo social serviram de base para 
Didatismo e Conhecimento 13
PROGRAMA DE NOÇÕES DE CRIMINALÍSTICA
o colonialismo, o racismo e a procura da raça pura. Contudo, não 
considerar este nível, elimina à partida um dos elementos do triplo 
sistema, o sistema biopsicossocial.
O crime, definido como um “ato que ofende certos sentimen-
tos coletivos”, apesar da sua natureza aparentemente patológica, 
não deixa de ser considerado como um fenômeno normal, no en-
tanto, com algumas precauções. O que é normal é que “exista uma 
criminalidade, contanto que atinja e não ultrapasse, para cada 
tipo social, um certo nível”. 
A sociedade constrói-se, na verdade, em torno de sentimen-
tos mais ou menos fortes, sentimentos cuja dignidade parece tanto 
mais inquestionável quanto mais forem respeitados. No entanto 
isso não quer dizer que todos os membros da coletividade parti-
lhem dos mesmos sentimentos com a mesma intensidade. De fato, 
alguns indivíduos

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