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PSICODIAGNÓSTICO- CUNHA, Jurema Alcides. Psicodiagnóstico é uma avaliação psicológica feita com propósitos clínicos, visando identificar forças e fraquezas no funcionamento psicológico, com um foco na existência ou não de psicopatologia. O fim do século XIX e começo do séc. XX foi marcado pelos trabalhos de Galton, que introduziu o estudo das diferenças individuais, Cattell, a quem se devem as primeiras provas designadas como testes mentais, e Binet, que propôs a utilização do exame psicológico, por meio de medidas intelectuais, como coadjuvante da avaliação psicológicas. A esses três autores é atribuída a paternidade do psicodiagnóstico. Embora a psicometria (difundida pelas escalas de Binet) tenha sido fundamental para a garantia de cientificidade dos instrumentos do psicólogo, é importante estabelecer a diferença entre o psicometrista e o psicólogo clínico: o primeiro tende a valorizar os aspectos técnicos da testagem, visando obter dados, enquanto no psicodiagnóstico há a utilização de testes e outras estratégias, para avaliar o sujeito de forma sistemática e cientifica, visando a resolução de problemas. Kraepelin, no século XIX, se notabilizou por seu sistema de classificação dos transtornos mentais, especialmente seus estudos diferenciais entre esquizofrenia e psicose maníaco- depressiva. Assim também Freud, que contribuiu decisivamente para caracterizar a diferença entre estados neuróticos e psicóticos, dentre os transtornos classificados como funcionais (não-orgânicos). Logo em seguida, o teste de associação de palavras, de Jung, completou o lastro para o lançamento posterior das técnicas projetivas. O psicodiagnóstico surgiu, assim, como conseqüência do advento da psicanálise, que ofereceu novo enfoque para o entendimento e classificação dos transtornos mentais. Psicodiagnóstico é um processo científico, limitado no tempo, que utiliza técnicas e testes psicológicos, em nível individual ou não, seja para entender problemas à luz de pressupostos teóricos, identificar e avaliar aspectos específicos, seja para classificar o caso e prever seu curso possível. O plano de avaliação é estabelecido com base nas perguntas ou hipóteses iniciais, definindo-se não só os instrumentos necessários, mas como e quando utilizá-los. Selecionada e administrada uma bateria de testes, obtêm-se dados que devem ser interrelacionados com as informações da história clínica, pessoal e outras, a partir do elenco das hipóteses iniciais, para permitir uma seleção e uma integração, norteada pelos objetivos do psicodiagnóstico. a) Classificação simples – comparação entre sujeitos (ex. nível intelectual). b) Descrição – além da classificação, interpreta diferenças de escores, identificando forças e fraquezas e descrevendo o desempenho do sujeito. c) Classificação nosológica – há testagem das hipóteses iniciais, tomando-se como referência critérios diagnósticos (uso preferencial de um modelo categórico para análise psicopatológica). d) Diagnóstico diferencial – são investigadas irregularidades ou inconsistência do quadro sintomático, para diferenciar alternativas diagnósticas, níveis de funcionamento ou a natureza da patologia. e) Avaliação compreensiva – é determinado o nível de funcionamento da personalidade, funções do ego e de insight e sistema de defesas, para a indicação de recursos terapêuticos e possível resposta aos mesmos. f) Entendimento dinâmico – há uma integração dos dados anteriores com base teórica, permitindo a explicação de aspectos comportamentais nem sempre acessíveis na entrevista, assim como a antecipação de fontes de dificuldades na terapia e a definição de focos terapêuticos (entendimento da problemática do sujeito numa dimensão mais profunda, na perspectiva histórica do desenvolvimento). g) Prevenção – identifica problemas precocemente, avalia riscos, faz uma estimativa de forças e fraquezas do ego e sua capacidade para enfrentar situações difíceis. h) Prognóstico – determina o curso provável do caso. i) Perícia forense – fornece subsídios para questões relacionadas com “insanidade”, competência para o exercício das funções de cidadão, avaliação de incapacidades ou patologias que podem se associar com infrações da lei etc. Resumidamente, os passos do diagnóstico com base em um modelo psicológico de natureza clínica são: a) levantamento de perguntas relacionadas com os motivos da consulta e definição das hipóteses iniciais e dos objetivos do exame; b) planejamento, seleção e utilização de instrumentos de exame psicológico; c) levantamento quantitativo e qualitativo dos dados; d) integração de dados e informações e formulação de inferência pela integração dos dados, tendo como pontos de referência as hipóteses iniciais e os objetivos do exame; e) comunicação de resultados e orientação sobre o caso. O problema Um problema é identificado quando são reconhecidas alterações ou mudanças nos padrões de comportamento comum, que podem ser percebidas como sendo de natureza quantitativa ou qualitativa. Pode-se falar em alterações autolimitadas, verificadas pela presença de um exagero ou diminuição de um padrão de comportamento usual, observadas na atividade (motora, fala, pensamento), no humor (depressão, euforia), em outros afetos (embotamento, excitação) etc. Se a intensidade dos sintomas for desproporcional às causas e/ou persistir além da vigência normal dos efeitos das mesmas (no luto patológico, p. ex.), já há significação clínica. Quando as mudanças percebidas são de natureza qualitativa, chamam a atenção por seu cunho estranho, bizarro, idiossincrásico, inadequado ou esquisito e geralmente são associadas com dificuldades mais sérias. No entanto, um comportamento ou experiência subjetiva definidos como sintomáticos em um contexto podem ser aceitáveis em outro, devendo-se observar que um sintoma único não tem valor diagnóstico em si, sendo necessário que o paciente apresente um certo número de características sintomatológicas, durante um certo período de tempo, para se chegar a uma decisão diagnóstica. Na avaliação da existência de psicopatologia, têm sido destacado o uso de dois modelos: o modelo categórico, de enfoque qualitativo, exemplificado pelo julgamento clínico sobre a presença ou não de uma configuração de sintomas significativos (mais utilizado pelos psiquiatras); e o modelo dimensional, de enfoque quantitativo, exemplificado pela medida da intensidade sintomática (mais utilizado pelos psicólogos), embora na maioria das vezes esses enfoques sejam associados. Transtorno mental pode ser conceituado como uma síndrome ou padrão comportamental ou psicológico clinicamente importante, que ocorre no indivíduo, associado com sofrimento ou incapacitação. Na tarefa do psicodiagnóstico, o psicólogo sofre inúmeras pressões e pode ter dificuldades em reconhecer percepções e experienciar sentimentos de raiva e intolerância que, se não forem conscientizados, podem interferir e até invalidar o processo avaliativo. Shafer se refere a algumas necessidades inconsciente e permanentes (constantes) mobilizadas no psicólogo-pessoa durante a testagem: a) aspecto voyeurista – o psicólogo examina e perscruta o paciente, enquanto se mantém preservado pela neutralidade e curta duração do vínculo; b) aspecto autocrático – na medida em que diz ao paciente o que deve fazer, de que forma e quando; c) aspecto oracular – quando procede como se tudo soubesse, conhecesse e pudesse prever (dono da verdade); d) aspecto santificado – quando assume o papel de salvador do paciente; O autor aponta também algumas constantes do paciente na interação clínica: a) auto-exposição sem confiança/intimidade violada – o paciente se sente vulnerável, exposto ao psicólogo; b) perda de controle sobre a situação – por se sentir à mercê do psicólogo, o paciente passa a adotar uma postura defensiva; c) perigode autoconfrontação – ao mesmo tempo querendo ajuda e receando o confronto de aspectos rechaçados, a testagem implica ataque aos seus processos defensivos; d) tentação de reagir de forma regressiva – pela dificuldade de aceitação das próprias dificuldades; e)ambivalência diante da liberdade – pois tem que enfrentar o risco de se expor A entrevista clínica Em psicologia a entrevista clínica é um conjunto de técnicas de investigação, de tempo delimitado, dirigido por um entrevistador treinado, com o objetivo de descrever e avaliar aspectos pessoais, relacionais ou sistêmicos (indivíduo, casal, família, rede social), em um processo que visa fazer recomendações, encaminhamentos ou propor intervenção em benefício do entrevistado. A entrevista é a única técnica capaz de testar os limites de aparentes contradições e de tornar explícitas características indicadas pelos instrumentos padronizados, dando a eles validade clínica. O entrevistador deve estar atento aos processos no outro, e a sua intervenção deve orientar o sujeito a aprofundar o contato com sua própria experiência. Todos os tipos de entrevista têm alguma forma de estruturação, na medida em que a atividade do entrevistador direciona a entrevista no sentido de alcançar os seus objetivos, sendo dele a responsabilidade pela condução do processo. Os tipos de entrevista podem ser classificados (no geral) a partir de dois eixos: quanto a forma (estrutura) e segundo o objetivo. Quanto ao aspecto formal, as entrevistas podem ser divididas em estruturadas, semi-estruturadas e de livre estruturação. As primeiras privilegiam a objetividade e geralmente se destinam ao levantamento de informações específicas, definidas pelas necessidades de um projeto (ex. entrevista epidemiológica). A grande maioria das técnicas de entrevista divulgadas em psicologia clínica enquadram-se como de livre estruturação, no entanto as técnicas de entrevista vêm sendo gradativamente especificadas, de modo que sua estrutura pode ser mais claramente definidas. As entrevistas semi-estruturadas são assim denominadas porque o entrevistador tem clareza de seus objetivos, que tipo de informação é necessária para atingi-los, como essa informação deve ser obtida, em que seqüência e em que condições deve ser investigada e como deve ser considerada (critérios de avaliação). Além de estabelecer um procedimento que garante a obtenção da informação necessária de modo padronizado, ela aumenta a confiabilidade ou fidedignidade da informação obtida e permite a criação de um banco de dados úteis à pesquisa, ao estabelecimento da eficácia terapêutica e ao planejamento das ações de saúde. Quanto aos objetivos, deve-se considerar primeiramente que a finalidade maior de uma entrevista é sempre a de descrever e avaliar para oferecer alguma forma de retorno, requerendo sempre uma etapa de apresentação da demanda, de reconhecimento da natureza do problema e da formulação de alternativas de solução e encaminhamento. Além desses objetivos-fins, existem objetivos instrumentais, que são muitos e variados (p. ex., quando se pretende avaliar um quadro psicopatológico, é necessário um exame detalhado dos sintomas; na entrevista psicodinâmica, é importante a investigação do desenvolvimento psicossexual etc). Por isso, estratégias diferentes de avaliação podem ser utilizadas para atingir os objetivos de cada situação, ou combinadas, para atingir objetivos diversos, além de considerar as variações de abordagem, de problemas apresentados e da clientela atendida. Alguns tipos de entrevistas quanto à sua finalidade, no entanto, devem ser ressaltados: de triagem, de anamnese, diagnósticas (sindrômicas ou dinâmicas), sistêmicas e de devolução. a) entrevista de triagem – tem por objetivo avaliar a demanda do sujeito e fazer um encaminhamento, sendo geralmente utilizada em serviços de saúde pública ou clínicas sociais, onde é necessário avaliar a adequação da demanda em relação ao encaminhamento pretendido. A triagem também é fundamental para avaliar a gravidade da crise, identificando a necessidade de apoio medicamentoso. b) entrevista de anamnese - objetiva o levantamento detalhado da história de desenvolvimento da pessoa, principalmente na infância, podendo ser estruturada cronologicamente. Fazer uma anamnese irá facilitar ao clínico a apreciação de questões desenvolvimentais importantes na história do paciente. c) Entrevista diagnóstica – exame e análise cuidados de uma condição na tentativa de compreende-la, explica-la e possivelmente modifica-la. Pode priorizar aspectos sindrômicos (descrição de sinais, como baixa auto-estima e sentimentos de culpa, e de sintomas, como humor deprimido e ideação suicida) para a classificação de um quadro ou síndrome, ou aspectos psicodinâmicos (descrição e compreensão da experiência ou modo particular de funcionamento do sujeito, tendo em vista uma abordagem teórica). Essas duas perspectivas devem ser vistas como complementares. É comum a existência de sinais e sintomas isolados ou subclínicos, que não são suficientes para dar configuração a uma síndrome, mas são importantes por sugerir uma dinâmica e indicar um modo particular de adoecer. d) Entrevista sistêmica – focalizam a avaliação da estrutura ou da história relacional ou familiar e também aspectos importantes da rede social de pessoas e famílias. e) Entrevista de devolução – tem por finalidade comunicar ao sujeito o resultado da avaliação e também permitir ao sujeito expressar seus pensamentos e sentimentos em relação às conclusões e recomendações do avaliação e ainda a reação do sujeito a elas. Destaca-se a importância de ajudar o sujeito a compreender as conclusões e recomendações e a remover distorções ou fantasias contraproducentes em relação a suas necessidades. A entrevista tem o potencial de modificar a maneira como o paciente se percebe (auto- estima), percebe seu futuro pessoal (planos, desejos, esperanças) e suas relações significativas. Assuntos importantes, afetivamente carregados e associados a experiências dolorosas, muitas vezes aparecem nas entrevistas clínicas, devendo o entrevistador desenvolver a capacidade de tolerar a ansiedade e de falar abertamente sobre temas difíceis. Vale ressaltar que a observação do comportamento , da comunicação não-verbal e do material latente do paciente contribui de maneira especial para elucidações importantes sobre o entrevistados. Restringir o âmbito do interpretável somente ao conteúdo explícito da comunicação pode acarretar perda de informação clínica significativa. Ser capaz de compreender seus processos contratransferenciais é um dos recursos mais importantes do clínico. Reconhecer como os processos mentais e afetivos são mobilizados em si mesmo e ser capaz de relacionar esse processo ao que se passa na relação imediata com o sujeito fornece ao entrevistador uma via inigualável de compreensão da experiência do outro. História clínica Pretende caracterizar a emergência de sintomas ou de mudanças comportamentais, numa determinada época, e a sua evolução até o momento atual (ocasião em que o exame foi solicitado). As queixas, os motivos explícitos e até a não admissão de sintomas fornecem um ponto de partida, procurando-se localizar no tempo o aparecimento de mudanças sintomáticas, associa-los com as circunstâncias de vida no momento, analisando o seu impacto e repercussão em atividades e relações. História pessoal ou anamnese Pressupõe uma reconstituição global da vida do paciente, devendo ser enfocada conforme os objetivos do exame e dependendo do tipo e da idade do paciente. De acordo com a problemática e a estrutura de personalidade do paciente, certas áreas e conflitos deverão ser mais explorados do que outros, com atenção em certos pontos que possam indicar explicações para a emergência e o desenvolvimento do transtorno atual.Alguns tópicos podem servir de referência: contexto familiar, primeira infância (até 3 anos), infância intermediária (3 a 11 anos), pré-puberdade, puberdade e adolescência, idade adulta e fontes subsidiárias (familiar ou familiares, exames anteriores etc). Avaliação dinâmica Geralmente integrada com a história, busca-se relação entre os problemas específicos atuais e as experiências passadas da pessoa, colocando a problemática numa perspectiva histórica que permita compreender o transtorno dentro de um processo vital, em um contexto temporal, afetivo e social, com base num quadro referencial teórico. Partindo-se de queixas, são identificados conflitos e causas, interrelacionados conteúdos, reunidos e integrados informações que embasam o entendimento dinâmico no fluxo da história do paciente. Exame do estado mental do paciente No que diz respeito à ordenação metodológica do exame do estado mental, há um consenso de que as principais alterações envolvem sinais e/ou sintomas nas seguintes áreas da conduta humana: atenção, sensopercepção, memória, orientação, consciência, pensamento, linguagem, inteligência, afetividade e conduta. Atenção – é um processo psíquico que permite concentrar a atividade mental sobre um fato determinado, sendo importante considerar a capacidade de concentração; quanto tempo é mantida a atenção (persistência/fatigabilidade); em quantos objetos é capaz de estar focada simultaneamente (distribuição; quanto tempo demora para começar a efetiva atenção (excitabilidade). São considerados transtornos de atenção a aprosexia (ausência de atenção), hipoprosexia (atenção diminuída), hiperprosexia (atenção exagerada) e distraibilidade (atenção inconstante). A distração, entendida como a impossibilidade de manter constante atenção e também quando o indivíduo estão tão concentrado que não percebe o que se passa ao seu redor, é chamada de desatenção seletiva. Sensopercepção – é a capacidade de captar as sensações, através do receptores sensoriais, e transforma-las em imagens ou sensações no SNC. Os transtornos mais freqüentes são as ilusões (percepções deformadas de um objeto) e as alucinações (percepções sem objeto, podendo ser produzidas em relação a qualquer qualidade sensorial). As ilusões podem ser causadas por peculiaridades do sistema de refração; limitações naturais dos órgãos do sentido; alterações da consciência (turvação ou obnubilação da consciência, gerando as ilusões metamorfósicas – macroscopia, microscopia e porropsia1); falta de atenção; catatimias (influência exercida pela afetividade na percepção, na atenção, no julgamento e na memória, resultando em deformação da realidade em relação aos objetos que cercam); erros de julgamento (delírios); reconhecimento deficiente. As alucinações podem ser visuais, auditivas, gustativas, olfativas, táteis, térmicas, cenestésicas (sensibilidade dos órgãos viscerais) e cinestésicas ou motoras (falsa percepção de movimentos). Costuma-se falar também em alucinose, quando há todas as características da imagem alucinatória, menos a convicção da realidade ou participação da pessoa no processo (termo frequentemente empregado para designar delirium alucinatório por causa orgânica). Nas pseudoalucinações (alucinações psíquicas) falta também a convicção que caracteriza as alucinações, mas não há uma patologia orgânica comprovada (p. ex. visão do duplo). Memória – é a função que garante o elo temporal da vida psíquica. Costuma ser analisada em três dimensões: a fixação, a evocação e o reconhecimento.A fixação é a capacidade de gravar os dados; a evocação é a capacidade de atualizar os dados já fixados (esquecimento é 1 Sensação de distanciamento e diminuição dos objetos que se movem. È um dos fenômenos de alteração perceptiva observados na epilepsia, onde os objetos parecem retroceder no espaço, sem modificar aparentemente o seu tamanho. a impossibilidade de evocar); e reconhecimento é a capacidade de recordar uma imagem (engrama). As alterações da memória quanto à fixação são a amnésia (abolição da memória); hipomnésia (enfraquecimento da memória); hipermnésia (exagero patológico da evocação); dismnésia (designação geral das perturbações da fixação e/ou evocação). É freqüente o uso de expressões hipmnésia anterógrada, retrógrada e retroanterógrada, correspondentes ao déficit de memória para os fatos ocorridos antes, depois ou antes e após o fator desencadeante do quadro. Há também ocorrência de amnésia lacunar nos estados crepusculares epilépticos (anterógrada) e amnésia lacunar histérica (retrógrada, explicada pela repressão). As disfunções do reconhecimento mais habituais são as agnosias (transtorno do reconhecimento da imagem, quando o objeto é familiar ao paciente); paramnésias (alucinações da memória: trata-se de imagens criadas pela fantasia e tidas como recordações de acontecimentos reais – fenômenos do déjà vu e jamais vu). Orientação – é uma das expressões da lucidez psíquica pela qual se identifica a capacidade de consciência temporo-espacial. Examina-se a orientação autopsíquica, relativa à identidade pessoal e as relações com o grupo social, e a orientação alopsíquica, referente à consciência do lugar, do tempo e da situação. As desorientações são classificas em seis tipos: apática (falta de interesse); amnésica (alterações da memória); confucional (turvação da consciência); delirante (ajuizamento patológico da realidade); histriônica (desorientação temporo-espacial limitada) e oligofrênica (dificuldade de aprender ou entender). Consciência – capacidade de o indivíduo dar conta do que ocorre dentro e ao seu redor. O estado de consciência é suscetível de alterar-se quanto à sua continuidade, amplitude e claridade, nos estados de obnubilação (ou turvação); estados de coma; estados de estreitamento da consciência (epilépticos) e estados de dissociação da consciência (casos de histeria). Pensamento – traduz a aptidão do indivíduo para elaborar conceitos (aptidão de relacionar a palavra com seu significado e relacionar os significados entre si), articular esses conceitos em juízos (capacidade de relacionar conceitos entre si) e, com base nisso, construir raciocínios (capacidade de concluir por indução, do particular para o geral, por dedução, do geral para o particular, e por analogia, do conhecimento particular para o particular). As manifestações qualitativas do pensamento incluem os conceitos, juízos e raciocínios, cabendo analisar as operações racionais: análise e síntese; generalização e sistematização; abstração e concreção e comparação. Nas manifestações quantitativas avalia-se a velocidade de associação das idéias ou o fluxo das idéias. De modo geral, a análise clínica do pensamento é baseada nos distúrbios de produção, curso e conteúdo do pensamento. Quanto à produção, costuma-se distinguir o pensamento mágico (predominância de idéias primitivas, selvagens ou infantis) e o pensamento lógico. No curso do pensamento observa-se as seguintes alterações: fuga de idéias (aceleração do pensamento, com exuberância e incontinência verbal); inibição do pensamento (oposto do anterior, podendo chegar ao mutismo); perseveração / verbigeração (persistência obstinada em determinados temas; pronúncia de frases ou palavras inúmeras vezes, sem relação identificável com a realidade); desagregação (perda da capacidade de estabelecer relações conceituais), bloqueio/interceptação ou detenção (bloqueio abrupto do curso do pensamento). No exame do conteúdo do pensamento encontram-se os delírios, as idéias supervalorizadas e o delirium. Os delírios podem ser classificados conforme a sua temática (de desconfiança, de perseguição, de influência, de prejuízo, de referência, de autopreferência, de ciúme, de grandeza, de descendência, de invenção, detransformação, de prestígio, de missão divina, de reforma social, de possessão diabólica ou divina, de culpa etc; quanto ao grau de elaboração (sistematizados e não-sistematizados) e conforme o curso evolutivo (agudos e crônicos). As idéias supervalorizadas são causadas por perturbação da capacidade de ajuizar e constituem uma tendência determinada mais por valores afetivos, passando a determinar a conduta do indivíduo. Quando tais manifestações se tornam irredutíveis e o indivíduo perde a capacidade de estabelecer o confronto entre o objetivo e o subjetivo, já se fala em juízos delirantes. Emprega-se o termo delirium para caracterizar uma alteração da consciência-vigilância de natureza orgânica, com a presença de delírios (ex. delirium tremens, delirium febril). Linguagem – os principais quadro patológicos da linguagem falada de causa orgânica são: a) disartria - dificuldade de articular palavras; em grau extremo é anartria). b) disfasia - dificuldade ou perda da capacidade de compreender o significado das palavras e/ou incapacidade de se utilizar dos símbolos verbais; em grau extremo é afasia. Existem três tipos básicos de afasia: 1) afasia de Werbucke (afasia nominal), essencialmente de compreensão, resultante da incapacidade de entender os símbolos verbais, falados ou escritos, resultando em fala incompreensível; 2) afasia de Broca (afasia mista), quando todas as modalidades de linguagem estão afetadas; e 3) afasia motora pura, em que o paciente pode entender o que lhe é dito, pode ler e escrever, só não pode falar. c) disfonia – defeito da fala que resulta em alteração da sonoridade das palavras, de causa periférica (traquéia, aparelho respiratório). d) dislalia – quando a linguagem resulta defeituosa, sem que haja lesão central. Os principais quadros patológicos da linguagem falada de causa predominantemente psíquica são: a) mutismo; b) logorréia – fluxo incessante, com comprometimento da coesão lógica (o estado mais grave é a fuga de idéias, quando a velocidade do fluxo do pensamento ultrapassa as possibilidades de expressão); c) jargonofasia – as palavras são pronunciadas corretamente, mas não combinam de forma lógica (salada de palavras); d) parafrasia – quando são inseridas numa frase correta uma ou mais palavras sem correspondência com as demais. e) neologismo – palavra nova utilizada em lugar de outra, cujo significado somente o paciente sabe qual é. f) coprolalia – uso incontrolável de linguagem obscena fora de contexto adequado. g) Verbigeração ou estereotipia verbal – repetição de sílabas, palavras ou frases de forma incontrolável e monótona. h) Pararrespostas – respostas não correspondentes à pergunta feita. Inteligência – diz-se que um indivíduo será tanto mais inteligente: 1) quanto melhor, mais rápido e mais facilmente compreenda: 2) quanto maior, mais extenso e variado for o número de enlaces e associações que estabeleça entre os dados da compreensão; 3) quanto mais pronta e espontaneamente elabore novas e originais idéias; 4) quanto melhor saiba ajuizar com segurança e raciocinar com lógica; 5) quanto melhor se adapte às exigências das situações vitais. As patologias mais freqüentes são os estados deficitários, congênitos ou adquiridos da atividade intelectual e os métodos utilizados para aferição são feitos por testes específicos. Afetividade – revela a sensibilidade interna da pessoa frente à satisfação ou à frustração de suas necessidades (tendências que impulsionam o indivíduo a praticar um ato ou a buscar uma categoria determinada de objetos). Os fenômenos afetivos mais elementares são as emoções (respostas afetivas resultantes da satisfação ou frustração das necessidades primárias, ou seja, biológicas ou orgânicas) e os sentimentos (vivências relacionadas com a satisfação ou frustração das necessidades superiores (de natureza estética, ética e moral). Fala-se em afeto para tipificar uma explosão incontida de emoções ou sentimentos, como medo, ira, alegria, angústia, paixão, desde que a lucidez de consciência seja mantida. As alterações patológicas mais freqüentes do humor são: 1. distimia – alteração tanto no sentido de exaltação quanto inibição. Os graus mais comuns são a distimia depressiva (hipotímica ou melancólica) e a distima hipertímica (expansiva ou eufórica); 2. disforia – tonalidade do mau humor (irritabilidade, desgosto e agressividade); 3. hipotimia/hipertimia – tristeza e/ou alegria patológica (imotivada ou inadequada). As alterações mais freqüentes das emoções e dos sentimentos são: a) ansiedade – é a tensão expectante, que varia da apreensão à aflição. Há uma vivência de perigo iminente, de origem indeterminada, e um sentimento de impotência e insegurança diante do perigo, podendo chegar ao pânico; b) angústia – ocorre quando a ansiedade é acompanhada de sintomas físicos (sudorese, taquicardia, variação da pressão etc.); c) apatia – indiferença afetiva; d) fobia – medo patológico de um objeto específico, com reações inadequadas ao objeto amedrontador; e) ambivalência afetiva – sentimentos opostos em relação ao mesmo objeto; f) labilidade afetiva – mudança rápida e imotivadas das emoções e sentimentos. Conduta – refere-se a um padrão habitual de comportamento num determinado contexto. Os transtornos de conduta são classificados por alguns autores em: a) Alterações patológicas das pulsões (tendências) instintivas, divididas em: 1) perturbações da tendência natural de conservação: condutas suicidas, automutilações, auto-agressões. 2) perturbações da tendência natural do sono: insônia, hipersonia, cataplexia2. 3) perturbações da tendência de alimentação: anorexia, bulimia, polidipsia3, dipsomania4, mericismo5, pica6. 4) perturbações da tendência de expansão motora (impulso natural de poder, impulso agressivo), caracterizadas pelo exagero do impulso agressivo: crueldade (infligir ou mostrar- se indiferente ao sofrimento alheio); agressividade auto ou heterodirigida (geralmente sob a forma de sintomas psicossomáticos). Formas particulares de agressividade são o furor epiléptico, o furor catatônico e o furor maníaco. Esses estados são frequentemente 2 Rigidez provocada por espanto; paralisia causada por espanto. Em sentido amplo, desmaio passageiro provocado por vivência emocional. 3 Ressecamento incômodo da boca; sede compulsiva, frequentemente de origem psicológica. 4 Abuso periódico do álcool (bebedeira trimestral). 5 Consiste em regurgitar repetidamente o alimento ingerido, voltando a mastigar para voltar a engolir. 6 Gosto perverso. Prazer de comer coisas esquisitas e estranhas (ex. giz). associados a episódios de agitação psicomotora em pacientes oligofrênicos7, portadores de quadros demenciais e portadores de afecções do lobo frontal e temporal. 5) perturbações da tendência sexual: impotência, frigidez, ejaculção precoce, sadomasoquismo, promiscuidade. 6) perturbações da higiene corporal: incontinência fecal e/ou urinária; gatismo8. b) Alterações patológicas das necessidades ditas superiores (não-primárias): avareza, prodigalidade, cleptomania, hedonismo9, colecionismo patológico, imediatismo sociopático, egoísmo, narcisismo. A ENTREVISTA CLÍNICA ESTRUTURADA PARA O DMS-IV – SCID – é hoje o mais atual e abrangente para o diagnósticos dos transtornos mentais. Todas as versões da SCID são compostas por uma série de módulos, cada um destino à avaliação de conjuntos de categorias diagnósticas agrupadas nos mesmos padrões do DSM-IV. Os módulos estão organizados hierarquicamente, segundo uma ordem ou seqüência lógica (denominada algoritmo), que representa o raciocínio clínico completo, considerando as alternativas que possam (ou devam) ser antecipadas. Os algoritmos diagnósticos são integrados à estrutura da entrevista, de modo que as várias hipóteses diagnósticassão sucessivamente testadas. As questões que investigam cada quadro patológico estão organizadas em hierarquias, assim, a maioria das perguntas só é formuladas se o contexto é adequado. O primeiro módulo da SCID é a avaliação preliminar, destinada a obter informações gerais e facilitar o rapport. Um dos diagnósticos diferenciais mais difíceis de se estabelecer é o da depressão dupla, que ocorre quando há sobreposição de um Transtorno Depressivo Maior (TDM) à Distimia. Neste caso, é essencial para o diagnóstico final não só a gravidade dos sintomas, mas também o seu padrão temporal. Ou seja, o reconhecimento das variações dos quadros psicopatológicoas, levando em consideração outras informações relevantes, irá ajudar a desenvolver uma compreensão e uma terapêutica mais adequadas a cada situação. ENTREVISTA MOTIVACIONAL – EM (ou INTERAÇÃO MOTIVACIONAL) – tem como objetivo auxiliar nos processos de mudanças comportamentais, trabalhando a resolução da ambivalência, tendo sido delineada para ajudar na decisão de mudança nos comportamentos considerados aditivos, como transtornos alimentares, tabagismo, abuso de álcool e drogas, jogo patológico e outros comportamentos compulsivos. Inspira-se em várias 7 Oligofrenia – deficiência congênita ou precoce de qualquer origem. Idiotia. Debilidade mental. 8 9 O prazer como causa e fim último. abordagens, como a terapia cognitivo-comportamental, terapia sistêmica, terapia centrada na pessoa, combinando elementos diretivos e não-diretivos. De acordo com Heather (1992) os transtornos aditivos são essencialmente problemas motivacionais, sendo a motivação para a mudança a chave do problema comportamental. O conflito motivacional (por que mudar?), presente no problema, instala a ambivalência. Assim, trabalhar a ambivalência nos comportamentos aditivos é trabalhar a essência do problema, pois nas concepções das terapias pós-comportamentais, a ambivalência não é considerada um traço de personalidade, mas uma interação dinâmica entre o paciente e uma situação aguda, imediata e com dimensões interpessoais e intrapessoais. Na EM os clientes são estimulados a articular para si mesmos suas razões para mudar, por meio de técnicas de aconselhamento, de feedback adequado e de análise de custo-benefício, entre outros. A balança decisional é uma estratégia fundamental, utilizada para mostrar os dois lados do conflito. Outro princípio norteador da EM é o modelo transteórico, composto por vários conceitos teóricos destinados a descrever os processos demudança do comportamento humano, baseado na premissa de que a mudança comportamental é um processo e que as pessoas têm diversos níveis de motivação, de prontidão para mudar. Este modelo está atualmente sendo empregado nos comportamentos sadios, na área de educação e da promoção da saúde. ENTREVISTA LÚDICA Freud foi o primeiro estudioso que refletiu sobre a função e o mecanismo psicológico da atividade lúdica infantil. É na situação do brinquedo que a criança procura se relacionar com o real, experimentando-o a seu modo, procurando construir e recriar sua realidade. Graças ao processo de projeção dos perigos internos sobre o mundo externo, ela domina a realidade e realiza seus desejos. O brinquedo é, então, um meio de comunicação; é a ponto que permite ligar o mundo externo e o interno, a realidade objetiva e a fantasia. Assim, Freud estabeleceu os marcos referenciais da técnica do jogo, demonstrando que brincar não é só um passatempo prazeroso, mas também uma maneira de elaborar circunstâncias traumáticas. Para Melanie Klein, o brincar é a linguagem típica da criança, equiparada à associação livre e aos sonhos dos adultos, portanto a neurose de transferência desenvolve-se da mesma maneira. Anna Freud, ao contrário, afirmava que a criança não possui consciência de sua doença, pelo que não pode estabelecer uma neurose de transferência com o terapeuta. Embora divergentes, o trabalho de ambas muito contribuiu para o desenvolvimento da psicoterapia infantil. Arminda Aberastury, por sua vez, afirma que a criança não estabelece uma transferência positiva com o psicoterapeuta, como também é capaz de estruturar, através dos brinquedos, a representação de seus conflitos básicos, suas principais defesas e fantasias de doença e cura. Evidenciou, assim, o valor diagnóstico da entrevista lúdica, considerando que qualquer tipo de brinquedo oferece possibilidades projetivas. A hora do jogo diagnóstica, fundamentada num referencial teórico psicodinâmico, é um recurso técnico que o psicólogo utiliza dentro do processo psicodiagnóstico, que tem começo, desenvolvimento e fim em si mesmo, operando com unidade para o conhecimento inicial da criança, devendo interpreta-la como tal, e cujos dados serão ou não confirmados com a testagem. A primeira hora do jogo terapêutico é apenas um elo dentro de um contexto maior, onde irão surgir novos aspectos e modificações estruturais em função da intervenção ativa do terapeuta. Uma entrevista lúdica consiste em oferecer à criança oportunidade para brincar, como deseje, com todo o material lúdico disponível na sala, esclarecendo sobre o espaço onde poderá brincar, o tempo disponível, os papéis dela e do psicólogo, bem como sobre os objetivos dessa atividade, que possibilitará conhecê-la mais para posteriormente ajudá-la. A entrevista lúdica refletirá o estabelecimento de um vínculo transferencial breve. Nos brinquedos oferecidos pelo psicólogo, a criança deposita parte dos sentimentos, representante de distintos vínculos com objetos de seu mundo internos. Assim, muitos fenômenos que não seriam obtidos pela palavra poderão ser observados através do brincar. Uma análise detalhada da hora do jogo permite: a) conceitualização do conflito atual do paciente; b) evidenciar seus principais mecanismos de defesa e ansiedades; c) avaliar o tipo de rapport que pode estabelecer a criança com o terapeuta e o tipo de ansiedade que contratransferencialmente pode despertar nele; d) manifestar a fantasia de doença e cura. Não existe um roteiro padronizado para analisar a entrevista lúcida, mas são proposto oito indicadores para orientar a análise com fins prognósticos e diagnósticos, especialmente para o nível de funcionamento da personalidade: 1. escolha de brinquedos e jogos; 2. modalidade do brinquedo; 3. motricidade; 4. personificação; 5. criatividade; 6. capacidade simbólica; 7. tolerância à frustração e 8. adequação à realidade. 1. escolha de brinquedos e jogos – relaciona-se com o momento evolutivo emocional e intelectual em que a criança se encontra. 2. modalidade de brinquedo – baseia-se nas formas de manifestação simbólica de seu ego e de seus traços de funcionamento psíquico. Entre as principais modalidades estão a plasticidade (fantasia expressa através de brincadeiras organizadas, com seqüência lógica, utilizando brinquedos que podem modificar a sua função de acordocom a sua necessidade de expressão), a rigidez (fixação de certos comportamentos ou ações lúdicas para expressar uma mesma fantasia; dificuldades para aproveitar ou modificar os atributos dos brinquedos), a estereotipia (falta de resposta afetiva e presença de maneirismos e movimentos estereotipados, assim como ações auto-agressivas, evidenciando desconexão com o mundo externo) e a perseveração (idem). 3. motricidade – manejo adequado das possibilidades motoras, referente à integração do esquema corporal, organização da lateralidade e estruturação espaço-temporal, possibilitando à criança o domínio do mundo externo e satisfação de suas necessidades com autonomia. 4. personificação – capacidade da criança para assumir e desempenhar papéis no brinquedo, mostrando o equilíbrio – ou não – entre o superego, o id e a realidade, e também a capacidade de fantasia nadefinição de determinados papéis. 5. criatividade – processo mental de manipulação do ambiente do qual resultam novas idéias, formas e relações. 6. capacidade simbólica – expressa pela habilidade no uso de uma variedade de elementos para se expressar no brinquedo; o simbolismo habilita a criança a transferir interesses, fantasias e ansiedades para outros objetos. 7. tolerância à frustração e (8) adequação à realidade são indicadores que têm relação com a aceitação ou não de limites, do próprio papel e do papel do outro, assim como das possibilidades egóicas e do princípio de prazer e realidade. PASSOS DO PROCESSO PSICODIAGNÓSTICO 1) ‘Formulação das perguntas básicas 2) Contrato de trabalho 3) Estabelecimento de um plano de avaliação (bateria de testes padronizadas e/ou não- padronizadas) 4) Administração de testes e técnicas: particularidades da situação da interação com e examinando e do manejo clínico. 5) Levantamento, análise, interpretação e integração dos dados. 6) Diagnóstico e prognóstico (classificação diagnóstica cf. CID 10 e DSM-IV). 7) Comunicação dos resultados. Roteiro: - Motivos de encaminhamento - Descrição - Plano de avaliação - Observação - História clínica - Integração e seleção dos dados - Entendimento dinâmico - Discussão sobre os achados nas técnicas e testes, em função das hipóteses e perguntas iniciais - Fundamentação das hipóteses diagnósticas - Laudo psicológico AVALIAÇÃO INTER E TRANSGERACIONAL DA FAMÍLIA Todo psicólogo solicitado a intervir num dado problema, deverá, em primeiro lugar, situar o ponto do ciclo vital em que o solicitante se encontra. Esse ciclo é constituídos pelos momentos mais significativos da vida pessoal/familiar, onde existem zonas de estabilidade e/ou inestabilidade, correspondentes a mudanças na organização pessoal/familiar, geradoras tanto de equilíbrio como de desequilíbrios. A organização da família está formada por uma rede de relações que é preexistente ao sujeito. O ser humano mantém vinculação com seus semelhantes, para uma adequada satisfação de suas necessidades múltiplas e diferenciadas e cada família desenvolve uma estrutura característica, um padrão de regras e papéis, dentro dos quais seus membros funcionam. São as regras ou normas estabelecidas pela família que nortearão a conduta de seus membros. Os ritos são moldados pelas regras estabelecidas pela família, cujos hábitos são exteriorizados através de ritos e ancorados nas regras por ela definidas. Os ritos são produtos da tradição, transmitidos culturalmente e sancionados pelo consenso grupal, e exigem, como condição básica, a crença em sua eficácia e a repetição constante. Tanto os mitos quanto os ritos são a expressão do aparelho psíquico da família e expressam sua dinâmica, sendo que eles podem ser tanto altamente criadores quanto destruidores, caso se tornem rígidos. (Bucher, 1985) Cf. Vilhena (1988), a família não é apenas entidade grupal ou social mas também uma entidade psíquica, onde os mecanismos de projeção são constantes e maciços, sendo as projeções múltiplas próprias do sistema, do grupo familiar. A família elabora uma imagem interiorizada, comum ao grupo, unindo seus membros em um projeto comum. Assim sendo, a perspectiva intergeracional considera os problemas individuais como familiares – com sua raiz em fatos passados, constituindo a história natural da família – transmitidos de geração em geração, por meio de condutas repetitivas. A abordagem intergeracional, desta forma, procede a uma análise da transmissão dessa cultura familiar, de uma geração para outra e entre os membros da mesma geração, identificando padrões, costumes, segredos, mitos e problemas que determinam o funcionamento pessoal/familiar. Assim, o psicólogo trabalha em dois eixos, o vertical, ou transgeracional, onde são identificados papéis e funções característicos da família, bem como o nível de autonomia e diferenciação de cada elementos face à sua família de origem; e o eixo horizontal, que inclui o estudo dos padrões da interação pessoal e familiar, bem como o modo como o indivíduo e/ou grupo familiar lida com as dificuldades da vida. O genetograma é um instrumento clínico de investigação inter e transgeracional, baseado na teoria sistêmica familiar de Murray Bowen, cujo formato padronizado registra informações a respeito dos membros da família e de seu relacionamento ao longo de três gerações, tendo como pilar de sustentação o retrato gráfico de como os diferentes membros de uma família estão biologicamente e legalmente relacionados uns com os outros, de uma geração para a outra. A identificação dos diferentes padrões de interação entre os membros da família, assim como os papéis de cada um deles e o traçado das mudanças que ocorreram ao redor dos diversos eventos e transições proporcionam indícios para a formulação de hipóteses a respeito do estilo adaptativo ou não da família. As avaliações dos padrões de funcionamento e relacionamentos, principalmente após determinados eventos e/ou transições, fornecem pistas sobre regras familiares, padrões de organização e fontes de recursos ou de resistência da família. Os princípios interpretativos do genetograma têm como base a teoria geral dos sistema e, nessa, a perspectiva que considera as relações familiares como determinantes da saúde emocional de seus membros. AVALIAÇÃO PROSPECTIVA: O EXAME PRECOCE DA CRIANÇA O modelo baseia-se em uma perspectiva de articulação cruzada dos procedimentos de avaliação com os de intervenção. À medida que é possível constatar os resultados da avaliação, vão sendo formuladas e aplicadas as estratégias de intervenção decorrentes, e seus resultados, por sua vez, consequentemente avaliados, configurando-se fases (avaliação/intervenção) até a conclusão do estudo. Entende-se por avaliação a compreensão do momento evolutivo da criança nas suas diferentes áreas do seu desenvolvimento, especificando aspectos significativos e suas interrelações com o ambiente sócio-familiar em que ela vive. Compreende as ações de compilar, analisar, interpretar e integrar dados que possam conduzir ao efetivo conhecimento das condições em que se apresenta o desenvolvimento da criança, inclusive seu progresso e limitações. Nessa atividade elaboram hipóteses que serão aceitas ou rejeitadas, identificam fatores de risco e proteção, manifestações de resiliência e indicadores da probabilidade prospectiva (sinais de alerta). O processo de intervenção tem por finalidade proporcionar à criança condições apropriadas ao seu desenvolvimento, incluindo desde pequenas mudanças no ambiente até a implementação de programas completos. AVALIAÇÃO PSICOMÉTRICA Em psicologia é usual a construção de escalas para medir variáveis, conceitos ou constructos teóricos não diretamente observáveis, como inteligência, depressão, traços de personalidade etc. O objetivo é que essas medidas sejam o mais precisas possível (fidedignidade e validade). A maioria das escala de medidas em ciências do comportamento são escalas aditivas, obtidas a partir da soma de vários itens selecionados. A construção de escalas aditivas é normalmente feita a partir de marcos teóricos estabelecidos e de resultados empíricos de pesquisas já realizados ou adaptadas de outros países para o contexto local. O processo de verificação da fidedignidade e de validação das escalas de medida segue alguns critérios. Os conceitos principais de fidedignidade de um teste dizem respeito ao problema de estabilidade no tempo e ao problema de consistência interna da escala. Diversos métodos para obter a fidedignidade são sugeridos, como: a) Método do teste-reteste – baseia-se na repetição de mensurações em condições constantes, i.é, pode-se estimar fidedignidade repetindo a aplicação da escala ou teste sobre a mesma pessoa usando os mesmosmétodos. b) Método das formas paralelas – versões supostamente equivalentes da escala são dadas aos mesmos indivíduos e os resultados correlacionados. c) Método das metades – é utilizado quando uma única forma do teste ou escala foi aplicada numa única sessão. O conjunto de itens do teste é dividido em duas metades e os escores para as duas metades são correlacionados. d) Coeficientes de consistência interna – a consistência interna do instrumento será maior quanto maior for a homogeneidade do conteúdo expresso através dos itens. PERÍCIA PSICOLÓGICA NA ÁREA FORENSE Sempre que questões de decisão judicial são colocadas, elas se referem a capacidades individuais físicas, mentais e/ou sociais, relacionada à vida passada, corrente ou futura do sujeito. As decisões na área criminal ou cível relacionam-se com a avaliação de competências legais. O objetivo é atribuir ou não ao sujeito um status de debilidade ou insuficência, que é percebido como comprometedor do bem-estar do indivíduo ou da sociedade. A construção dos limites da competência está ligada aos valores da sociedade e serve para reforçar ou restringir os direitos das pessoas para determinados propósitos. O papel do psicólogo junto ao pedido de uma avaliação forense pode se dar: a) como perito oficial, quando designado pelo juiz no decorrer do processo; b) em função de seu desempenho profissional, em uma instituição pública; c) a pedido de uma das partes litigantes, quando é conhecido como perito assistente. A legitimação do papel do psicólogo como perito se encontra no Decreto-lei 53.664, de 21 de janeiro de 1964. O cliente do psicólogo poderá ser tanto o sujeito (periciado) como o sistema mais amplo (sociedade). Na área penal o trabalho do psicólogo pode dar-se em dois momentos do andamento processual: primeiro, num período anterior à definição da sentença, quando se verificará a responsabilidade penal (imputabilidade) do acusado, ou durante a fase de execução da pena, através do exame criminológico. O exame para verificação de responsabilidade penal é realizado por peritos médicos (psiquiatras), estando o psicólogo em posição auxiliar (testagens). Esse exame tem por objetivo verificar se o culpado de um delito o cometeu em estado mental idôneo (capacidade para discernir sobre o seu ato). O exame criminológico visa a investigação da dinâmica do ato criminoso, de suas causas e dos fatores a ele associados, com o objetivo de determinar uma maior ou menor probabilidade de reincidência. (no Brasil este tem se restringido à concessão de benefícios, como o livramento condicional). Na área do direito de família, o trabalho do psicólogo envolve as questões familiares de maus-tratos, guarda de filhos, destituição do pátrio poder e interdições. O psicólogo atua também na avaliação de danos psíquicos para ressarcimento (dano moral ou psicológico). AVALIAÇÃO RETROSPECTIVA: AUTÓPSIA PSICOLÓGICA PARA CASOS DE SUICÍDIO Objetiva identificar comunicações prévias da intenção de se matar de um indivíduo, possibilitando observar pistas diretas ou indiretas relacionadas àquele comportamento letal que estava por vir. A autópsia psicológica busca compreender os aspectos psicológicos de uma morte específica, esclarecendo o modo da morte e a intenção letal ou não do morto, identificando motivação, intencionalidade, letalidade e precipitadores e/ou estressores. TÉCNICAS DE AVALIAÇÃO PSICOLÓGICA Bender (B-G) – Teste Gestáltico Visomotor – possibilita tanto uma exploração nomotética como idiográfica do indivíduo. Possibilita 1) medida de inteligência de crianças de 4 a 12 anos ou de adolescentes e adultos, com idade mental correspondente; 2) medida de maturação visomotora ou perceptual, investigação de alterações do desenvolvimento neurológico e problemas de ajustamento; 3) triagem de disfunção cerebral e alguns tipos de lesão cerebral; 4) avaliação de déficits cognitivos etc. Binet – escala Binet-IV – Medida da capacidade intelectual global. CAT (Children Apperception Test) – Indicação do estádio de desenvolvimento infantil; indicação de necessidade de intervenção terapêutica e acompanhamento da evolução do processo terapêutico. Columbia (Escala de Maturidade Mental) – avaliação da capacidade de raciocínio geral em crianças normais ou com problemas de ordem motora; teste de triagem intelectual. Desenho da figura humana (Goodenough)– medida de desenvolvimento cognitivo. Desenho da figura humana (Machouver) – Avaliação da personalidade; identificação de indicadores emocionais e psicopatológicos. EFE – Entrevista Familiar Estruturada – avaliação das relações familiares facilitadoras ou não de saúde emocional. Escala de Desesperança de Beck (BHS) – avaliação do pessimismo ou expectativas negativas frente ao futuro em pacientes psiquiátricos; triagem de atitudes pessimistas em adolescentes e adultos normais. Escala de Ideação Suicida de Beck (BSI) – identificação da presença ou não de ideação suicida ou intensidade (gravidade) da ideação. ESCALAS WECHSLER – avaliação do QI. Figuras complexas de Rey – avaliação neuropsicológica de funções de percepção e memória. HTP – avaliação da personalidade e de suas interações com o ambiente. IDATE – avaliação da ansiedade, como estado e como traço. INV – Teste de Inteligência Não-Verbal – medida de inteligência geral; avaliação do nível intelectual em analfabetos, sujeitos de língua estrangeira, surdos e sujeitos com problemas de linguagem; investigação de déficits neuropsicológicos. IFP – Inventário Fatorial de Personalidade – medida de variáveis da personalidade normal MMPI – Inventário Multifásico Minnesota de Personalidade – criada para uso em grupos para identificar sintomas, comportamentos e características da personalidade PMK – Teste Psicodiagnóstivo Miocinético – avaliação clínica da personalidade, especialmente quanto à agressividade, emocionalidade, tônus psicomotor e aspectos psicopatológicos: avaliação de condições para orientação e seleção profissional. PROCEDIMENTO DE DESENHOS-ESTÓRIAS (D-E) – investigação da dinâmica inconsciente da personalidade RAVEN – Teste de Matrizes Progressivas – medida de inteligência; avaliação da capacidade de exatidão e clareza de raciocínio lógico com poder de discriminação nos níveis mais altos de inteligência. RORSCHACH – Diagnóstico de personalidade, em clínica, planejamento terapêutico, seleção profissional e na área forense. Detecção da dinâmica interpessoal e planejamento da terapia familiar na forma consensual. Prognóstico. TAT – Thematic Aperception Test (Teste de Apercepção Temática) – avaliação da personalidade, principalmente a natureza dos vínculos afetivos, identificação de conflitos e mecanismos de defesa. Subsídios sobre a função cognitiva de planejamento e capacidade de organização e manutenção de idéias. TESTE DAS FÁBULAS – método projetivo para investigação de conflitos inconscientes WARTEGG – avaliação da personalidade, em clínica, na área escolar e organizacional. DESIDERATIVO – avaliação dinâmica (hierarquia de desejos, condições de integridade do ego diante da morte etc.). WAIS – medida de inteligência geral, de indícios psicopatológicos e avaliação neuropsicológica. WAIS III – medida de inteligência geral; identificação de forças e fraquezas no funcionamento cognitivo; avaliação do impacto de problemas psicopatológicos sobre o funcionamento cognitivo. WAIS-R NI – avaliação neuropsicológica; triagem para avaliação mais completa. WISCONSIN – medida do pensamento abstrato; flexibilidade na resolução de problemas; déficits neuropsicológicos. ZULLIGER (Z-Teste) – técnica projetiva de avaliação da personalidade, recomendada para fins de seleção ou classificação de pessoal e de pesquisa.HISTÓRIA DO PSICODIAGNÓSTICO 1 – Introdução: A palavra diagnóstico origina-se do grego diagõstikós e significa discernimento, faculdade de conhecer, de ver através de. Este seria o sentido mais amplo, e desta forma o diagnóstico é inevitável. Em sentido mais restrito, utiliza-se o termo diagnóstico para referir-se à possibilidade de conhecimento que vai além daquela que o senso comum pode dar, ou seja, a possibilidade de significar a realidade fazendo uso de conceitos, noções e teorias científicas. O diagnóstico psicológico busca uma forma de compreensão situada no âmbito da Psicologia. Em nosso país, é uma das funções exclusivas do psicólogo garantidas pela Lei nº 4119 de 27/08/62, que dispõe sobre a formação em Psicologia e regulamenta a profissão de psicólogo. Quando nos dispomos a realizar um psicodiagnóstico, presumimos possuir conhecimentos teóricos, dominar procedimentos e técnicas psicológicas. Devemos nos lembrar que devido ao grande número de teorias existentes, a atuação do psicólogo varia consideravelmente. Com isso o próprio uso do termo varia e muitas vezes, ao invés de “diagnóstico psicológico” encontra-se “psicodiagnóstico”, “diagnóstico da personalidade”, “estudo de caso” ou “avaliação psicológica”. Segundo Trinca (1984) na avaliação psicológica houve uma procura de integração das diversas abordagens e quando olhamos concretamente para a Psicologia Clínica, verificamos grandes variações de conhecimentos e atuações, e, portanto, na prática do psicodiagnóstico, temos também várias formas de atuação, muitas das quais não podem ser consideradas decorrentes de exclusivamente uma ou outra abordagem. Atualmente, todas as correntes em Psicologia concordam, embora partindo de pressupostos e métodos diferentes, que, para se compreender o homem é necessário organizar conhecimentos que digam respeito à sua vida biológica, intrapsíquica e social não sendo possível excluir nenhum desses horizontes. Segundo Ocampo (1981) o processo Psicodiagnóstico era considerado, anteriormente, como uma situação em que o psicólogo aplicava um teste em alguém. Ele então cumpria uma solicitação seguindo os passos e utilizando os instrumentos indicados por outros profissionais, quase sempre da área médica (psiquiatra, pediatra, neurologista). Assim o psicólogo atuava como alguém que aprendeu a aplicar testes e esperava que o paciente colaborasse docilmente. O psicólogo trabalhou durante muito tempo com um modelo similar ao do médico clínico que, para proceder com eficiência e objetividade, toma a maior distância possível em relação a seu paciente a fim de estabelecer um vínculo afetivo que não lhe impeça de trabalhar com a tranqüilidade e objetividade necessárias. Ocampo (1981) atribui este fato à falta de uma identidade sólida por parte do psicólogo, que lhe permitisse saber quem era e qual era seu verdadeiro trabalho dentro das ocupações ligadas à saúde mental. Neste momento os testes eram utilizados no psicodiagnóstico como se eles constituíssem em si mesmos o objetivo do psicodiagnóstico e como escudo entre o profissional e o paciente, para evitar pensamentos e sentimentos que mobilizassem afetos. Observamos aqueles profissionais que buscaram uma aproximação autêntica com o paciente, mas para isso tiveram que abandonar o modelo médico sem estarem preparados para isso. Com a difusão da Psicanálise os psicólogos optaram por aceitá-la como modelo de trabalho, o que trouxe progressos e ao mesmo tempo uma nova crise de identidade no psicólogo, uma vez que este se esqueceu que a dinâmica do processo psicanalítico era muito diferente da dinâmica do processo psicodiagnóstico. Assim podemos perceber, como nos mostra Ocampo (1981), que o psicólogo teve que percorrer as mesmas etapas que um indivíduo percorre em seu crescimento. Buscou figuras boas para se identificar, aderiu ingênua e dogmaticamente a certa ideologia e identificou-se com outros profissionais, até que pôde questionar-se sobre a possibilidade de não ser como eles. Por fim entrou em um período de maturidade ao perceber que utilizava uma “pseudo” - identidade que distorcia sua identidade real, conseguindo assim uma maior autonomia de pensamento e prática. A palavra diagnóstico origina-se do grego diagõstikós e significa discernimento, faculdade de conhecer, de ver através de O diagnóstico psicológico busca uma forma de compreensão situada no âmbito da Psicologia. Em nosso país, é uma das funções exclusivas do psicólogo garantidas pela Lei nº 4119 de 27/08/62, que dispõe sobre a formação em Psicologia e regulamenta a profissão de psicólogo 2 - FUNDAMENTOS DO PSICODIAGNÓSTICO E SEU HISTÓRICO “Os psicólogos, hoje em dia, não apenas administram testes; eles realizam avaliações”. Segundo Jurema Cunha e colaboradores “os psicólogos realizam avaliações; psicólogos clínicos, entre outras tarefas, realizam psicodiagnósticos”. A avaliação psicológica é um conceito muito amplo. O psicodiagnóstico é um capítulo dentro da avaliação psicológica, realizado com propósitos clínicos e, portanto não abrange todos os modelos de avaliação psicológica das diferenças individuais. Testagem é um método de avaliação psicológica. Psicodiagnóstico pressupõe a utilização de outros instrumentos, além dos testes, para abordar os dados psicológicos de forma sistemática, científica, orientada para a resolução de problemas. O psicodiagnóstico nasceu (derivou) da Psicologia Clínica que foi criada sob a tradição da psicologia acadêmica e da tradição médica e é um ramo da Psicologia que tem por finalidade básica o desenvolvimento e a aplicação das técnicas de diagnóstico e psicoterapêuticas para a identificação e tratamento de distúrbios do comportamento. Entre essas técnicas ¾ usualmente designadas pelo nome de método clínico ¾ salientam-se as entrevistas, os testes, as técnicas projetivas e a observação diagnóstica. Pode-se dizer que as primeiras sementes do psicodiagnóstico foram lançadas no final do século XIX e no início do século XX, através dos trabalhos de Galton que introduziu o estudo das diferenças individuais, de Cattell, a quem se devem as primeiras provas, designadas como testes mentais, e de Binet, que propôs a utilização do exame psicológico (através da mensuração intelectual) como coadjuvante da avaliação pedagógica. Por tais razões, foi atribuída a paternidade do psicodiagnóstico a esses três autores: Galton, Cattell e Binet. A tradição psicométrica (medida quantitativa dos fenômenos psíquicos) foi desta maneira fundada e ficou sedimentada pela difusão das escalas de Binet que em 1905 apresenta um teste de inteligência para separar crianças com retardo mental, seguidas pela criação dos testes do exército americano em 1906 que foi o primeiros teste coletivos para selecionar recrutas. Por outro lado, na medicina, após a reabilitação moral dos casos psiquiátricos (abolição dos métodos terapêuticos brutais ¾ eletrochoque), iniciada por Philippe Pinel, a necessidade de compreender o doente mental, obrigou o meio médico a estudar a doença mental. Como seria de esperar, as causas da doença mental foram buscadas no organismo e, em especial, no sistema nervoso, e, como decorrência disso, “os pacientes psiquiátricos, não mais considerados lunáticos, se tornaram ” nervosos “ou” neuróticos “. Desta época, data a divisão dicotômica dos transtornos psiquiátricos em “orgânicos” e “funcionais”. Foi nessa escala pré-dinâmica da psiquiatria que surgiu Emil Krapelin, que se notabilizou por seu sistema de classificação dos transtornos mentais e, especialmente, por seus estudos diferenciais entre esquizofrenia e psicose maníaco-depressiva. Em conseqüência, as classificações nosológicas e o diagnóstico diferencial ganharam ênfase. É importante lembrar que ao mesmo tempo Freud publica “A interpretação dos sonhos”, que provinha da melhor tradição neurofisiológica, mas querepresentou o primeiro elo de uma corrente de conteúdo dinâmico, logo em seguida com o aparecimento do teste de associação de palavras, de Jung, fornecendo a base para o lançamento, mais tarde, das técnicas projetivas. A expressão psicodiagnóstico é utilizada pela primeira vez por Hermann Rorschach quando publica em 1921 seu teste de manchas de tinta. O teste passou a ser utilizado como um passo essencial (e, às vezes, único) do processo psicodiagnóstico. A grande popularidade alcançada nas décadas de quarenta e cinqüenta é atribuída ao fato de que os dados gerados pelo método eram compatíveis com os princípios básicos da teoria psicanalítica. Esse foi o tempo áureo das técnicas de personalidade. Embora o teste de Rorschach e o Teste de Apercepção Temática (Apercepção ¾ a partir da apresentação de um estímulo em forma de tema por exemplo, leva o sujeito a aperceber nele necessidades e motivos que existiam no seu inconsciente e que projeta no tema, assim facilitando o diagnóstico de seus ajustamentos e desajustamentos) fossem os instrumentos mais conhecidos, começaram a se multiplicar rapidamente as técnicas projetivas, como o teste da figura humana, o Szondi (protótipo do BBT: teste de fotos de profissões) e tantos outros. Entretanto, a partir de então, as técnicas projetivas começaram a apresentar certo declínio em seu uso, por problemas metodológicos, pelo incremento de pesquisas com instrumentos alternativos, como o MMPI e outros inventários de personalidade, por sua associação com alguma perspectiva teórica, novamente a psicanalítica e pela ênfase na interpretação intuitiva apesar de esforços para o desenvolvimento de sistemas de escores. Apesar disso, essas técnicas ainda são bastante utilizadas, embora com objeções por parte dos psicólogos que lutam por avaliações de orientação condutista (behaviorista) e biológica. Atualmente, há indiscutível ênfase no uso de instrumentos mais objetivos e entrevistas diagnósticas mais estruturadas, notadamente com o incremento no desenvolvimento de avaliações computadorizadas de personalidade que vêm oferecendo novas estratégias neste campo. Também, as necessidades de manter um embasamento científico para o psicodiagnóstico, compatível com os progressos em outros ramos da ciência, têm levado ao desenvolvimento de novos instrumentos mais precisos, especialmente após o advento do DSM-IV e de baterias padronizadas, que permitem nova abordagem na área diagnóstica da neuropsicologia, constituída pela confluência da psicologia clínica e da neurologia comportamental Por outro lado, pode-se afirmar, que “o campo da avaliação psicológica da personalidade tem feito contribuições vitais para a teoria, prática e pesquisa clínica”. Mas alguns autores propõem uma questão: terá o psicodiagnóstico o impacto que merece? Neste sentido, algumas pesquisas foram desenvolvidas, uma delas com 70 pacientes, encontrando concordância entre as recomendações diagnósticas do psicólogo e do psiquiatra, em 94% dos casos, mesmo quando havia ocorrido uma discordância inicial. Considera que o reconhecimento da qualidade do psicodiagnóstico tem que ver, em primeiro lugar, com um refinamento dos instrumentos e, em segundo lugar, com estratégias de marketing de que o psicólogo deve lançar mão para aumentar a utilização dos serviços de avaliação pelos receptores de laudos. Também se levantou outra questão: observando que muitas vezes psicólogos competentes acabam por “fornecer uma grande quantidade de informações inúteis para as fontes de encaminhamento”, por falta de uma compreensão adequada das verdadeiras razões que motivaram o encaminhamento ou, em outras palavras, por desconhecimento das decisões que devem ser tomadas com base nos resultados do psicodiagnóstico. As sugestões apontadas, de conhecer as necessidades do mercado e de desenvolver estratégias de conquistas desse mercado, parecem se fundamentar na pressuposição de que o psicólogo, sobrecarregado com suas tarefas, não está avaliando a adequabilidade de seus dados ao público consumidor. Mas que público é este? Que profissionais ou serviços podem ter necessidade de solicitar psicodiagnósticos? Primeiramente, vejamos onde costuma trabalhar um psicólogo que lida com psicodiagnósticos. Mais comumente exerce suas funções numa instituição que presta serviços psiquiátricos ou de medicina geral, num contexto educacional ou legal ou numa clínica ou consultório psicológico, em que o psicólogo recebe encaminhamento principalmente de psiquiatras, de outros médicos (pediatras, neurologistas, etc.), da comunidade escolar (de orientadores, professores, etc.), de juízes ou de advogados, ou atende casos que procuram espontaneamente um exame, ou são recomendados por algum familiar ou amigo. A questão básica com que se defronta o psicólogo é que, embora um encaminhamento seja feito, porque a pessoa necessita de subsídios para basear uma decisão para resolver um problema, muitas vezes ela não sabe claramente que perguntas levantar ou, por razões de sigilo profissional, faz um encaminhamento vago para uma “avaliação psicológica”. Em conseqüência, uma das falhas comuns do psicólogo é a aceitação silenciosa de tal encaminhamento, com a realização de um psicodiagnóstico, cujos resultados não são pertinentes às necessidades da fonte de solicitação. É, pois, responsabilidade do clínico manter canais de comunicação com os diferentes tipos de contextos profissionais para os quais trabalha, familiarizando-se com a variabilidade de problemas com que se defrontam e conhecendo as diversas decisões que os mesmos pressupõem. Mais do que isto: deve determinar e esclarecer o que dele se espera, no caso individual. Esta é uma estratégia de aproximação, que lhe permitirá adequar seus dados às necessidades das fontes de encaminhamento, de forma que seus resultados tenham o impacto que merecem e o psicodiagnóstico receba o crédito a que faz jus. “Os psicólogos, hoje em dia, não apenas administram testes; eles realizam avaliações”. O psicodiagnóstico é um capítulo dentro da avaliação psicológica, realizado com propósitos clínicos e, portanto não abrange todos os modelos de avaliação psicológica das diferenças individuais. Testagem é um método de avaliação psicológica. Psicodiagnóstico pressupõe a utilização de outros instrumentos, além dos testes, para abordar os dados psicológicos de forma sistemática, científica, orientada para a resolução de problemas. 3 - O PSICODIAGNÓSTICO CLÍNICO NA ATUALIDADE Segundo Arzeno (1995), o psicodiagnóstico está recuperando-se de uma época durante a qual poderíamos dizer que havia caído no descrédito da maioria dos profissionais da saúde mental. É imprescindível revalorizar a etapa diagnóstica no trabalho clínico, e um bom diagnóstico clínico está na base da orientação vocacional e profissional, do trabalho com peritos forenses ou trabalhistas, etc. Se o psicólogo é consultado é porque existe um problema, alguém sofre ou está incomodado e deve indagar a verdadeira causa disso. Fazer um diagnóstico psicológico não significa necessariamente o mesmo que fazer um psicodiagnóstico. Este termo implica automaticamente a administração de testes e estes nem sempre são necessários ou convenientes. Um diagnóstico psicológico tão preciso quanto possível é imprescindível por diversas razões: • Para saber o que ocorre e suas causas, de forma a responder ao pedido com o qual foi iniciada a consulta. • Porque iniciar um tratamento sem o questionamento prévio do que realmente ocorre representa um risco muito alto. Significa, para o paciente, a certeza de que se pode “curá-lo” (usando termos clássicos). E o que ocorre se logo aparecem patologias ou situações complicadas com as quais o psicólogo não sabemos lidar, que vão além daquilo que podemos absorver, através de supervisões e análises? Buscaremos a forma de interromper (conscienteou inconscientemente) o tratamento com a conseguinte hostilidade ou decepção do paciente, o qual terá muitas duvidas antes de tornar a solicitar ajuda. • Para proteger o psicólogo, que ao iniciar o tratamento contrai automaticamente um compromisso em dois sentidos: clínico e ético. Do ponto de vista clínico, deve estar certo de poder ser idôneo perante o caso sem cair em posturas ingênuas nem onipotentes. Do ponto de vista ético, deve proteger-se de situações nas quais está implicitamente comprometendo-se a fazer algo que não sabe exatamente o que é. No entanto, a conseqüência do não cumprimento de um contrato terapêutico é, em alguns países, a cassação da carteira profissional. Por estas razões explica-se a importância da etapa diagnóstica, sejam quais forem os instrumentos científicos utilizados na mesma. Freud já falava da importância desta etapa, à qual ele dedicava os primeiros meses do tratamento. Coloca que ela é vantajosa tanto para o paciente quanto para o profissional, que avalia assim se poderá ou não chegar a uma conclusão positiva. Quando se dedica muito tempo ao diagnóstico acaba-se estabelecendo uma relação transferencial muito difícil de dissolver caso a decisão de interromper o processo for tomada. Além do mais, dispomos na atualidade de muitos recursos que permitem solucionar as dúvidas em um tempo menor. Vejamos agora, segundo Arzeno (1995) com quais finalidades pode ser utilizado o psicodiagnóstico. 1) Diagnóstico. Conforme o exposto acima é óbvio que a principal finalidade de um estudo psicodiagnóstico é a de estabelecer um diagnóstico. E cabe esclarecer que isto não equivale a “colocar um rótulo”, mas a explicar o que ocorre além do que o paciente pode descrever conscientemente. Durante a primeira entrevista elaboramos certas hipóteses presuntivas. Mas a entrevista projetiva, mesmo sendo imprescindível, não é suficiente para um diagnóstico cientificamente fundamentado. Lembremos o que diz Karl Meninger, no prefácio do livro de David Rapaport: Durante séculos o diagnóstico psiquiátrico dependeu fundamentalmente da observação clínica. Todas as grandes obras mestras da nosologia psiquiátrica foram realizadas sem a ajuda das técnicas de laboratório e de nenhum dos instrumentos de precisão que atualmente relacionamos com o desenvolvimento da ciência moderna. Tanto a psiquiatria do século XIX como a da primeira parte do século XX, era uma psiquiatria de impressões clínicas, de impressões colhidas graças a uma situação privilegiada: a do médico capacitado para submeter o paciente a exame. Mas esse exame à sua disposição não era de modo algum uniforme ou estável; e tampouco poderia ter sido padronizado de forma que fosse possível comparar os diferentes dados obtidos. Com o advento dos modernos métodos de exame psicológico através de testes, a psiquiatria atingiu a idade adulta dentro do mundo científico. Sem medo de exagerar pode-se afirmar que é o campo da ciência mental que tem tido o maior progresso relativo nos últimos anos. Meninger foi durante muitos anos chefe da clínica que leva seu nome. Ele apoiou e animou a criação e o desenvolvimento dos testes tanto projetivos como objetivos. Cada paciente que ingressava na clínica era submetido a uma bateria completa de testes. Ainda hoje esse modelo de trabalho é eficiente, porque a entrevista clínica não é uma ferramenta infalível, a não ser quando em mãos de grandes mestres, e às vezes, nem mesmo nesses casos. Os testes tão pouco o são. Mas se utilizarmos ambos os instrumentos de forma complementar há uma margem de segurança maior para chegar a um diagnóstico correto, especialmente se incluirmos testes padronizados. Além do mais, a utilização de diferentes instrumentos diagnósticos permite estudar o paciente através de todas as vias de comunicação: pode falar livremente, dizer o que vê em uma lâmina, desenhar, imaginar o que gostaria de ser, montar quebra cabeças, copiar algo, etc. Se por algum motivo o domínio da linguagem verbal não foi alcançado (idade, doença, casos de surdos-mudos, etc.) os testes gráficos e lúdicos facilitam a comunicação. A bateria de testes utilizada deve incluir instrumentos que permitam obter ao máximo a projeção de si mesmo. Por isso, se pedirmos ao paciente que desenhe uma figura humana, sabemos que haverá uma projeção, mas muito mais se lhe pedirmos que desenhe uma casa ou uma árvore, já que ele não pode controlar totalmente o que projeta. Como dito antes, é importante incluir testes padronizados porque nos dão uma margem de segurança diagnóstica maior. Outro elemento importante que nos é dado pelo psicodiagnóstico refere-se à relação de transferência-contratransferência. Ao longo de um processo que se estende entre três e cinco entrevistas, aproximadamente, e observando como o paciente se relaciona diante de cada proposta e o que nós sentimos em cada momento, podemos extrair conclusões de grande utilidade para prever como será o vínculo terapêutico (se houver terapia futura), quais serão os momentos mais difíceis do tratamento, os riscos de deserção, etc. Porém, nem todos os psicólogos, psicanalistas e psicólogos clínicos concordam com esse ponto de vista. Alguns reservam a utilização do psicodiagnóstico para casos nos quais surgem dúvidas diagnósticas ou quando querem obter uma informação mais precisa, diante, por exemplo, de uma suspeita de risco de suicídio, dependência de drogas, desestruturação psicótica, etc. Em outras ocasiões o solicitam porque têm dúvidas sobre o tratamento mais aconselhável, se a psicanálise ou uma terapia individual ou vincular. Finalmente, existe outro grupo de profissionais que não concordam em absoluto com este ponto de vista e prescindem totalmente do psicodiagnóstico. Ainda mais, não concedem valor científico algum aos testes projetivos. Alguns vão mais longe, dizendo que de forma alguma é importante fazer um diagnóstico inicial, que isso chega com o tempo, ao longo do tratamento. Todas as posições são respeitáveis, porém devem ser fundamentadas cientificamente e, até o momento, não foram encontradas demonstrações, baseadas na teoria da projeção e da psicologia da personalidade, que os testes projetivos carecem de validade. 2) Avaliação do tratamento. Outra forma de utilizar o psicodiagnóstico é como meio para avaliar o andamento do tratamento. É o que se denomina “re-testes” e consiste em aplicar novamente a mesma bateria de testes aplicados na primeira ocasião. Havendo suspeita de que o paciente lembre perfeitamente o que fez na primeira vez e se deseje variar, pode-se criar uma bateria paralela selecionando testes equivalentes. Algumas vezes isto é feito para apreciar os avanços terapêuticos de forma mais objetiva e também para planejar uma alta. Em outras palavras é para descobrir o motivo de um “impasse” no tratamento e para que, tanto o paciente como o terapeuta possa falar sobre isso, estabelecendo, talvez, um novo contrato sobre bases atualizadas. Em outros casos ainda, é porque existe disparidade de opiniões entre eles. Um deles acredita que pode dar fim ao tratamento, enquanto que o outro se opõe. Estes casos representam um trabalho difícil para o psicólogo, pois passa a ocupar o papel de um árbitro que dará a razão a um dos dois. É então conveniente esclarecer ao paciente que o psicodiagnóstico não será realizado para demonstrar-lhe que estava enganado, mas, como um fotógrafo, ele registrará as situações para depois comentá-las. O mesmo esclarecimento deve ser dado ao terapeuta. Obviamente, é conveniente que a entrevista de devolução seja feita por aquele que realizou o estudo, tendo um cuidado muito especial em mostrar uma atitude imparcial e fundamentando as afirmações no material dado pelo paciente. Nos tratamentos particulares, o terapeuta é que decide o momento adequado para um novo psicodiagnóstico (ou, talvez, para o primeiro). No entanto, nos tratamentos
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