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Andréia Reis Bacha Moriningo Práticas Psicopedagógicas aplicadas à Educação A n d ré ia R ei s B ac h a M o ri n in g o Ps ico pe da go gia P rá tic as P sic op ed ag óg ica s a pl ica da s à E du ca çã o FAMÍLIA E AS DIFICULDADES DE APRENDIZAGEM 05 N esta unidade, veremos que a família e a escola devem promover a descoberta da individua-lidade da criança. A alfabetização emocional deve-se iniciar na família, e posteriormente, ampliar-se para o âmbito escolar. Nisso reside a participação dos pais na vida es- colar do filho, oferecendo-lhe o suporte necessário ao seu desenvolvimento integral, garantindo dessa forma, que a aprendizagem ocorra. 129 escola e família 5.1 O propósito da família e da esco- la deve ser o de oferecer à criança um contexto que lhe permita sobreviver e desenvolver-se adequadamente. A família deve ocupar-se das necessida- des primordiais a seus membros, quais sejam: necessidades que se relacionam à sobrevivência (alimentação, higiene, saúde), ao desenvolvimento cognitivo e emocional, atra- vés da transmissão de um senso de valor (Macedo, 1994). Em relação a isso, a família e a escola são as res- ponsáveis pela construção no indivíduo da autoestima, confiança, emoções, sentimentos e atributos. Por isso, há a necessidade de ambas seguirem princípios e crité- rios semelhantes, assim como a direção em relação aos objetivos que desejam atingir. Isso reforça a ideia de que a escola e a família jamais poderão estar dissociadas uma da outra. Os processos de aprendizagem precisam da co- laboração de ambas as partes. Porém, sendo fruto de um modelo social, a fa- mília enfrenta nos dias atuais desafios que lhe perturbam a ordem e a assimilação de valor, que outrora eram bem diferentes. Cada família tem suas próprias regras, que se baseiam em crenças, valores adquiridos em grande parte na família de origem dos pais, e que permeiam as rela- ções cotidianas. Essas regras condicionam as expectati- vas entre os membros da família. Por isso, ser o sustentáculo necessário ao de- senvolvimento da vida afetivo-emocional da criança, oferecendo a ela um espaço para que o crescimento, o 130 equilíbrio, as oportunidades aconteçam de forma propí- cia, garante a unidade de seus membros, e a descoberta de suas individualidades. Aqui, entra, também, o papel dos professores, que são os que, em geral, organizam o meio social ao qual a criança adapta-se e a partir do qual aprende e desenvolve-se. Cabe, portanto, à família: selecionar a escola que pretende para seu filho, baseada em critérios que lhe ga- rantam a confiança da forma como o ensino procede; ficar a par do conteúdo que a criança está estudando nas disci- plinas; cumprir as regras estabelecidas pela escola; incenti- var o filho na resolução de problemas de relacionamento, que, eventualmente, podem ocorrer em sala de aula; man- ter contato com a escola, participando de reuniões, e com- parecendo sempre que solicitado. À escola cabe: cumprir a proposta pedagógica apresentada aos pais; oferecer ao aluno espaço para manifestar-se espontaneamente; dialo- gar com os pais, recebendo-os sempre que solicitado; ofe- recer aos professores cursos de formação continuada para mantê-los atualizados; disponibilizar recursos adequados para a realização do ensino, dentre outras coisas. É importante, registrar aqui que o equilíbrio emocional da criança é propiciado pelo ambiente fami- liar. No entanto, ao participar da vida em grupo (no am- biente escolar), a criança começa a lidar com as emoções: amor, desejo, incertezas, inseguranças, ansiedades e várias outras que precisarão ser lapidadas durante a formação de sua personalidade. Nesse aspecto, a escola cumpre o papel de resgatar junto ao aluno valores de sua formação, pois não há como dissociar a educação cognitiva da edu- cação emocional ou das experiências bem sucedidas ou 131 frustrantes que acompanham a criança. As marcas, que cada ambiente deixa na vida da criança, constituem-se determinantes do movimento que ela estabelece ao lidar com os outros e consigo própria. Por exemplo, crianças que vêm de lares desajustados (que presenciam, diariamente, brigas entre os pais, situação de alcoolismo, drogas etc.), normalmente chegam à escola apresentando alguns desequilíbrios emocionais que afe- tam no desempenho cognitivo. De acordo com Goleman (2001), os problemas de relacionamento nas crianças e jovens desencadeiam um comportamento depressivo: apresentam certa ins- tabilidade comportamental, são irritadiços ou abatidos, impacientes e sentem-se, na maioria das vezes, excluídos. Feitas essas observações, podemos perceber que à escola não cabe apenas o papel de transmissão teórica do currículo formal, muito menos ser um produto da de- manda de mercado, pois a escola, assim como a família, envolve a infância, a juventude e, em muitos casos, a fase adulta do indivíduo. Com efeito, o professor precisa saber lidar com as dificuldades de seus alunos, colaborando para que possam superá-las, pois todo trabalho com a criança visa, primordialmente, a sua autonomia e equilíbrio social. O psicopedagogo, nessas condições, deverá de- tectar quais problemas e dificuldades no aprender são geradas a partir da rede de relacionamentos da criança com os pais, irmãos e membros da escola (professores, colegas, principalmente). Macedo (1994) levanta algumas questões para nortear o psicopedagogo a orientar-se nas relações com as famílias: 132 • Quanto à hierarquia Como se dá a tomada de decisões na família? De quem é a última palavra? Se a relação é absolutamente piramidal, em geral, costuma ser do pai; se simétrica, há consultas entre os pais e as decisões são consensuais. Se um dos pais é periférico (por questões de trabalho, de desinteresse, acomodação ou dificuldade) as decisões recaem no outro, que, em geral, reclama de sobrecarga, peso e super-responsabilidade. • Quanto aos limites e fronteiras A família é capaz de dizer não? Como são esses nãos? São fundamentados e podem ser coerentemente mantidos? Há acordo entre os pais com relação a esses limites? Há “jogo” entre pais e filhos na colocação de tais limites ou há capacidade de negociação entre eles. Que acontece quando tais limites não são respeitados? Que tipo de sanções existe? São proporcionais à idade da criança, ou são desproporcionais, fruto da impulsividade e não podem ser mantidas? • Quanto às expectativas As expectativas existentes na família são mais difíceis de detectar. Pela sua própria natureza, muitas ve- zes, não chegam a ser formuladas claramente, nem para os próprios pais. Daí, que as questões precisam ser mais indiretas, do tipo: o que deveria acontecer para que os senhores se sentissem realizados como pais? O que seria necessário que seu filho conseguisse ou fizesse, para que os senhores se sentissem recompensados pelos esforços que têm feito para criá-lo? • Quanto à comunicação Importante, considerar o nível do discurso: ob- 133 jetividade, mensagens indiretas, paradoxais, contradições, clareza. Pode-se perceber, pelo tipo de abordagem, se a família é de evitar confrontos, postergar soluções ou se é do tipo que quer esclarecer logo qualquer problema, com linguagem clara, direta, sem duplas mensagens. A coerência entre linguagem verbal e não-verbal é um sinal importante para uma compreensão mais rica. • Quanto aos padrões afetivos Como são as demonstrações de afeto no grupo familiar? Como as pessoas costumam expressar sua sa- tisfação, seu descontentamento, sua raiva, suas aflições, medo? Quem na família mostra mais o que está sentindo? Quem percebe, mais prontamente, quando alguém está triste ou chateado? A família é a primeira instituição educativa de seus filhos. A educação familiar é a base da conduta da criança, do seu processo de desenvolvimento, do concei- to que tem de si mesma e de sua afetividade. Quanto mais claras forem as regras da família, tanto maisfácil será a educação da criança. É nesse ins- tante que entram em cena as regras e os limites como es- truturantes da personalidade e do comportamento. Para haver respeito, compromisso, educação, em seu sentido prático, deverá existir primeiro o equilíbrio entre seus membros. Os pais devem ser o modelo para um aprender construtivo e em permanente equilíbrio. O desenvolvimento, visto como um processo complexo e global, manifesta em seu curso dificuldade relacionada tanto a características próprias da criança quanto a atitudes da família e da escola. É importante distinguir, no terreno das dificuldades de aprendizagem, 134 àquelas específicas à capacidade intelectual, linguagem, atividade motora, desenvolvimento neurológico e as refe- rentes a atitudes e comportamentos. Para sua elucidação, a produção infantil é fruto da inter-relação de toda a rede que constitui o contexto de sua vida. Por isso, qualquer diagnóstico infantil deverá ser cauteloso, tomando o cuidado de não criar estigmas, que possam comprometer o desenvolvimento sadio da criança, ou então criar barreiras, que a impeçam de su- perar as dificuldades. problemas e dificuldades de aprendizagem 5.2 5.2.1 considerações preliminares O distúrbio ou problema de aprendizagem vai além da simples dificuldade na aprendizagem escolar, uma vez que todas as modificações da conduta consti- tuem-se num processo de aprendizagem, o que explica que tais alunos encontrem também dificuldades fora da escola. Já, as dificuldades de aprendizagem podem ser classificadas como: problemas gerais de aprendizagem e transtorno específico de aprendizagem. Os problemas gerais de aprendizagem instalam- se no organismo do aluno quando existe um atraso geral 135 de toda aprendizagem, como por exemplo: lentidão para aprender, desinteresse geral, dificuldade na atenção e na concentração, afetando o rendimento global, atraso mental, dificuldade auditiva severa e alteração na psicomotricidade. Já, os transtornos específicos de aprendizagem manifestam-se em crianças com inteligência normal ou próxima do normal, que manifestam alterações sensomo- toras e emocionais severas. Embora convivendo em um ambiente sociocultural e educacional satisfatórios, não têm um rendimento escolar normal. Apresentam dificul- dades repetidas em certas áreas da aprendizagem, funcio- nando bem em algumas e saindo-se mal em outras. Estas dificuldades manifestam-se por alterações no desenvolvi- mento, no amadurecimento psíquico e neurológico. É importante ressaltar, também, que os pro- blemas de aprendizagem podem ser condicionados pela escola; pela situação familiar; por características da personalidade da criança, como ansiedade excessiva, temperamento difícil, desconfiança exacerbada, perfec- cionismo, sentimento de inadequação; por dificuldades de educação, caracterizadas pela falta de oportunidades pedagógicas eficientes, despreparo de professores para atender à demanda da população educacional, falta de compromisso docente com as etapas de desenvolvimen- to da criança e do adolescente; ou por deficiências orgâ- nicas, fisiológicas, provenientes de carga hereditária, as quais interferem na capacidade de aprender, lembrar e raciocinar. Além disso, podem ser desencadeados pelos seguintes fatores: • Orgânicos: saúde física deficiente, falta de integridade neuro- lógica (sistema nervoso doentio), alimentação inadequada etc. 136 • Psicológicos: inibição, fantasia, ansiedade, angústia, inade- quação à realidade, sentimento generalizado de rejeição etc. • Ambientais: o tipo de educação familiar, o grau de esti- mulação que a criança recebeu desde os primeiros dias de vida, a influência dos meios de comunicação. • As crianças, com problemas de aprendizagem, apresen- tam distúrbios em um ou vários dos processos básicos envolvidos na compreensão ou no uso da linguagem fala- da ou escrita, podendo manifestar-se por dificuldades no pensar, falar, ler, escrever, calcular, incluindo condições referidas como incapacidades perceptivas, lesão cerebral, disfunção cerebral mínima, dislexia, dislalia; não incluin- do problemas de deficiências mentais ou sensoriais gra- ves, nem distúrbios psíquicos. Esses alunos, geralmen- te, apresentam hiperatividade, distúrbios perceptivos e motores, deficiência da coordenação geral, distúrbios de atenção, impulsividade, distúrbios de linguagem, de me- mória e de pensamento. 5.2.2 problemas de aprendizagem Para Alicia Fernández, apud Pena & Modesto (1996), os problemas de aprendizagem podem ser de or- dem sintomática ou reativa. Os de ordem sintomática são as inibições e, para entendê-las, é necessário descobrir a história familiar do sujeito; utilizar um tratamento psico- pedagógico clínico que liberte a inteligência e mobilize a circulação patológica do conhecimento em seu grupo familiar. Os problemas reativos afetam o sujeito sem afe- tar a inteligência - os bloqueios, que podem acontecer devido a um choque entre o aprendente e a sua insti- tuição educativa. Já, para Dunn (1993), um problema de 137 aprendizagem é um transtorno permanente, que afeta a maneira pela qual os indivíduos com inteligência normal ou acima da média selecionam, retêm e expressam infor- mações. As informações que entram e saem ficam desor- denadas, conforme viajam entre sentidos e cérebro. Segundo, Fonseca (1995), os problemas de aprendizagem podem ser divididos em três categorias: • Os problemas primários, considerados como os ver- dadeiros transtornos de aprendizagem. Não correspon- dem à comorbidade de nenhuma patologia, não havendo comprometimento da inteligência (endógena primária). A criança com transtorno de aprendizagem vê e ouve bem, comunica-se, normalmente, e não possui inferiori- dade mental global. É uma criança normal, que aprende de uma forma diferente, apresentando discrepância entre o potencial atual e o esperado. Pode acusar problemas de comportamento, na linguagem e na psicomotricidade, aprendendo a um ritmo mais lento. Possui sinais difusos de ordem neurológica, provocados por fatores obscuros, os quais podem incluir índices psicofisiológicos, irregula- ridades bioquímicas, que interferem no desenvolvimento e na maturação do Sistema Nervoso Central (SNC). A Neurologia da aprendizagem ou o processo sensório- neuropsicológico em que ela opera, provavelmente, foi afetado, resultando uma “disability”, e não uma incapa- cidade na aprendizagem. Inexistem perturbações globais de inteligência, da personalidade, motoras ou sensoriais; potencial de aprendizagem intacto; inexistem deficiências (dislexia, disgrafia, disortografia, discalculia). • Os secundários são chamados de dificuldades de aprendizagem, pois não têm causas em si mesmo, sen- do desenvolvidos enquanto uma comorbidade (endóge- 138 na secundária), podendo, neste caso, a inteligência estar comprometida. Os problemas secundários são aqueles consequentes a alterações biológicas, comportamentais e emocionais específicas e bem esclarecidas. Em relação às alterações biológicas (neurológicas), teríamos as lesões cerebrais, Paralisia Cerebral, Epilepsia e Deficiência Men- tal. Envolvem, também, os sistemas sensoriais, através da Deficiência Auditiva, hipoacusia, deficiência visual e ambliopia. E ainda, dentro das causas biológicas, as situ- ações de Desordem Auditiva (DA), consequentes de ou- tros problemas perceptivos, que afetam a discriminação, síntese, memória, relação espacial e visualização; todos associados à noção de incapacidade. Em relação aos pro- blemas de comportamento, um dos fatores mais marcan- tes para desenvolvimento de DA são os quadros classifi- cados como Comportamento Disruptivo e, dentro deles, o Transtorno de Déficit de Atenção e Hiperatividade e o Transtorno Desafiador e Opositivo. Ainda dentro da ca- tegoria dos problemas secundários, existem as chamadas dificuldades escolares ou de ensinagem, que são aquelas de origem exógena ao indivíduo, correspondendo a difi- culdades na aprendizagempor motivos metodológicos, didáticos, culturais e sociais em geral. Fonseca (1995) traz uma listagem dos principais fatores etiológico-sociais dos problemas de aprendizagem: • Carências afetivas; • Deficientes condições habitacionais, sanitárias, de higie- ne e de nutrição; • Pobreza da estimulação precoce; • Fraca interação sociolinguística; • Privações lúdicas, psicomotoras, simbólicas e culturais; • Ambientes repressivos; 139 • Nível elevado de ansiedade; • Relações interfamiliares; • Hospitalismo; • Métodos de ensino impróprios e inadequados. Os conflitos afetivos provocam, também, pro- blemas na aprendizagem dos alunos e acarretam difi- culdades de adaptação escolar, uma vez que a carga de hostilidade e agressividade reprimida dificulta o processo do relacionamento. Nesse caso, família e escola são res- ponsáveis tanto pelas alternativas aos obstáculos naturais, quanto pela aplicação dos recursos pedagógicos para as soluções. Todo o trabalho direcionado à criança visa, a priori, à sua autonomia e ao equilíbrio social. Na instituição, a psicopedagogia vem contribuir para a superação de tais dificuldades, ou amenizando-as, ou ajudando o aluno a conviver com suas limitações e a conhecer seu potencial de superação e conquista. O clima institucional deverá afetar a disponibilidade dos alunos para aprendizagem, sua participação e comprometimento nos processos de descoberta, de abertura e de estrutura- ção cognitiva, chegando-se à conclusão de que o aluno consegue aprender alguma coisa “apesar de”, e não devi- do às “situações de ensino”, na maioria das vezes, pouco estimuladoras, não facilitadoras e nem, adequadamente, planejadas. É preciso que a escola favoreça um clima fa- cilitador dos processos de aprendizagem e de adaptação dos seus membros. A presença das dificuldades acontece em diferentes momentos de aprendizagem: assimilação, retenção e criati- 5.2.3 dificuldades de aprendizagem 140 vidade em relação à sua idade mental, sem ausência de alte- rações sensoriais graves. Aprendem em quantidade e quali- dade inferior ao esperado em relação à sua capacidade. Este desnível, entre o potencial e a capacidade de aprendizagem, acontece devido a alterações psiconeurológicas. Como intervir, então, nas dificuldades de aprendizagem? De um modo geral, os pais devem observar, du- rante os 4 e 5 primeiros anos de vida, dificuldades no de- senvolvimento de seus filhos. É importante levar à profes- sora da pré-escola suas observações e as possíveis dúvidas que tiver. Se necessário solicitar uma avaliação psicopeda- gógica, a qual permitirá um diagnóstico para esclarecer às dúvidas e orientar o processo escolar desde o início, ade- quando a criança num ambiente que responda às suas ne- cessidades. De acordo com os resultados da avaliação, em alguns casos é possível indicar o tratamento psicopedagó- gico, e em outros, encaminhar o aluno a outras instituições educativas próprias para atendê-lo em sua dificuldade. Quando as dificuldades são observadas no início do período escolar da criança, a intervenção psicopeda- gógica seria orientada no sentido de estimular funções e habilidades no processo da leitura e escrita, nos primeiros anos, cálculo e estratégias de pensamentos. As crianças com dificuldades de aprendizagem requerem ações ativas e eficientes, por parte de todos os que, direta ou indireta- mente, intervêm em suas vidas. Sugestão para complementação de estudos 1. Artigo “Um olhar sobre a Etiologia das dificuldades de aprendizagem” A Psicopedagogia considera que toda a educa- ção é especial no sentido de que todos têm direito a uma 141 Educação de qualidade. Para que isso ocorra, o psicope- dagogo junta-se a todos os que lutam por uma Educa- ção que transforma condutas, e que leva à sociedade as mudanças significativas para o crescimento e bem-estar integral de cada ser humano. A Psicopedagogia não procura responsáveis ou culpados pelo fracasso em aprender, tão constante em nos- sos jovens estudantes. Ela propõe-se a orientar, oferecer subsídios, mecanismos e técnicas, que devolvam ao sujeito aprendente o desejo e as possibilidades para aprender. O entendimento dos fatores etiológicos das di- ficuldades, da significação emocional do problema, além de outros fatores, possibilita ao psicopedagogo compre- ender o que se passa com o sujeito, ajudando-o, no seu processo individual de construção do conhecimento. A compreensão do fenômeno de aprendizagem implica co- nhecer os diferentes estágios do desenvolvimento emo- cional do ser humano, relacionando-os com fases impor- tantes da aprendizagem. Optamos por apresentar, aqui, o estudo feito por Erik H. Erikson do desenvolvimento psicossexual de Freud, mostrando etapas da aprendizagem relacionadas a cada nível do conhecimento. Fase Oral – Confiança versus desconfiança Na fase oral, deve ocorrer o estabelecimento da confiança básica. A primeira tarefa do ego, neste momento, é a solução do conflito entre a confiança básica e a descon- fiança. A criança adquire esta confiança, se suas necessida- des básicas de alimentação, sono, proteção, calor humano etc., forem satisfeitas. A falta desses cuidados básicos leva a criança a sentir-se insegura, com medo e carente. A curio- 142 sidade e a capacidade de exploração não se instalam; terá dificuldades de memória e planejamento de ação. Fase Anal – Autonomia versus vergonha e dúvida Aqui, a ênfase é dada à aquisição do controle motor de modo geral. O controle das funções fisiológi- cas deve ser conduzido de forma a não expor a criança ao ridículo. Nesta fase, a criança tem consciência do seu próprio “eu”, sente-se independente. Dificuldades, nes- te momento, podem gerar um senso geral de vergonha e dúvida e um rebaixamento da autoestima, obstáculos severos para a fluidez da aprendizagem. A dificuldade na organização do trabalho escolar pode ter origem nesta fase, e as noções fundamentais de espaço podem ficar prejudicadas (análise e síntese, integração perceptiva, orientação espacial). Fase Genital – Iniciativa versus culpa A crescente elaboração da fase edípica leva a um aumento da consciência e a identificação com papéis. O conflito que se instala, nesta fase, está entre a necessidade de livre iniciativa e a de se submeter às regras sociais e ser aceito. A criança mostra-se ávida, como nunca, para aprender e por compartilhar obrigações com os adultos. É importante a oportunidade de sucessos em suas ini- ciativas ao lado de limites firmes e decididos. Condições desfavoráveis podem levar a criança a supercontrolar-se, e sentir-se indesejada. O sentimento de culpa bloqueia a percepção apurada da realidade, leva à diminuição de iniciativa, da criação e do raciocínio. Período de Latência – Senso de realização versus senso de inferioridade A criança quer demonstrar habilidades, criar, 143 aprender, quer ser valorizada em seu meio; prepara-se para a produtividade. Quando seus esforços não são valoriza- dos, passa a evitar competições, a fazer seus trabalhos pela metade, ou recusa-se a produzir inteiramente. Instala-se, aí, um sentimento de inferioridade e impotência. De modo geral, a criança com problemas emo- cionais apresenta os seguintes sintomas: • Irriquietude, excitação e desatenção; • Bloqueios e má estruturação da memória; • Incapacidade de planejamento de trabalho; • Dificuldade para organizar-se frente às tarefas escolares e terminá-las; • Dificuldade para associar conhecimentos (letras, pala- vras, conteúdos etc.) Terezinha Nunes Gomes Garcia Psicopedagoga 2. Livro: “A criança, sua “doença” e os outros” MANNONI, M. Rio de Janeiro: Zahar, 1983. 3. Livro: “Teoria do vínculo” PICHÓN-RIVIÈRE, E. São Paulo: Martins Fontes, 1982. 4. Livro: “A função da ignorância” PAÍN, S. Porto Alegre: Artes Médicas, 1987. 5. Livro: “Problemas de Aprendizagem” JOSÉ, Elisabete da Assunção José & COELHO, Maria Teresa. 12ª edição, São Paulo: Ática. 6. Filme: “Uma mente brilhante” AMatemática e a Esquizofrenia 144 Entrar no mundo de uma pessoa que sofre qual- quer tipo de desordem mental constitui um desafio inimagi- nável para todas as pessoas. Não conseguimos ter a mínima noção de como uma patologia do tipo de uma esquizofrenia pode afetar suas vidas no cotidiano. São verdadeiros heróis anônimos, os parentes e amigos que se dedicam a dar-lhes toda a atenção que merecem, todo o carinho, de que preci- sam, todos os cuidados, de que necessitam. O filme “Uma Mente Brilhante” apresenta-nos a história de uma pessoa que, apesar de toda a sua inte- ligência, sofre as agruras de quem padece de um desses males. Seu caso, verídico, ganhou ainda maior notorieda- de pelo fato de o personagem central ser um dos grandes matemáticos do século XX. Professor de tradicional uni- versidade norte-americana (Princeton), tendo participado de programas governamentais durante a época da Guerra Fria e, já com idade bastante avançada, tendo-se tornado vencedor da maior das honrarias concedidas a pesquisa- dores de várias áreas, o prêmio Nobel. John Nash (em atuação brilhante do ator Russell Crowe, indicado ao Oscar), revela-se um grande mate- mático desde a sua chegada à universidade. Talento reco- nhecido pela instituição, pelos professores e, até mesmo, pelos seus colegas (apesar da competição e da inveja que reina entre alguns deles). Brilha com grande intensidade pela genialidade nos cálculos, tanto quanto pelo estranho comportamento social. Mostra-se um verdadeiro desastre com as garotas e, um tanto quanto arrogante perante os colegas. Demora a decidir-se quanto a que tese defender, a fim de valorizar-se nacionalmente. Desdenha dos traba- lhos de seus colegas por achar que não incorporavam no- 145 vidades ao estudo da matemática, sendo apenas ensaios acerca de pontos já defendidos em obras anteriores. Não quer ser igual a eles, pretende atingir o ápice, criar algo original, próprio, que carregue sua assinatura pessoal. 146 Com base nas leituras feitas, e a partir das biblio- grafias sugeridas, responda às questões abaixo: 1. Será o problema da não-aprendizagem ape- nas do aluno? 2. Não estará o professor estagnado em rela- ção à busca de novos conhecimentos? 3. Não estará a escola sendo, apenas, repetitiva, impondo diariamente uma dose de “conheci- mentos prontos”, que são “engolidos” pelo aluno e não “digeridos”? 4. A atualização da escola apenas em metodo- logia de ensino não poderia estar deixando de lado as questões de aprendizagem? 5. A maioria do aparecimento do fracasso es- colar está ligada a questões culturais, sociais e políticas, que regem a instituição escolar e seus diferentes grupos de pertença? 6. Como a família deve lidar com os conflitos de aprendizagem existentes em seu meio? 7. Quais as atitudes mais comuns dos pais frente às dificuldades escolares de seus filhos? Como acolhem o não-aprender em seu pro- cesso normal de desenvolvimento? atividades a DISTÚRBIOS QUE INTERFEREM NO APRENDER 06 N esta unidade, faremos um breve estudo dos principais distúrbios que interferem no desen-volvimento da aprendizagem da criança. Re- comenda-se que, a fim de prevenir problemas maiores, desencadeados por desajustes cognitivos instalados no sujeito, esses distúrbios sejam tratados. E nesse instante, deve-se contar com apoio da família, da escola e de todos que, direta ou indiretamente, mantém relação com a criança portadora de tais problemas. 149 alunos de apren- dizagem lenta 6.1 É importante tratarmos desse assunto, pois muitos educadores e pais associam determinados comportamentos na aprendizagem da criança ao sintoma de lentidão. Isso pode representar um perigo à própria aprendizagem, alvo das injustas avaliações dos adultos. Cada criança tem um ritmo para aprender. De acordo, com Bravo (1994), os alunos com aprendizagem lenta apresentam os seguintes pontos em comum: • Manifestam lentidão para processar as infor- mações escolares, assim como para acompanhar o ensino em relação a seus colegas; • Manifestam diferença entre o nível de desenvol- vimento de suas estruturas cognitivas e o grau de complexidade dos conteúdos escolares; • Possuem baixa motivação para aprender, acompanhada de baixa autoestima e inadequação entre suas habilidades psicolinguísticas e a lingua- gem utilizada pelo professor; • Apresentam falta de autonomia necessária para estabelecer suas próprias estratégias para estudar e memorizar. São crianças que apresentam, desde o âmbito escolar, dificuldade na realização autônoma de tarefas. Esse problema requer a flexibilidade e adaptabilidade do sistema escolar e especificamente: • Adequação às exigências programáticas, a capacidades e 150 interesses e ao número de alunos por turma; • Respeito ao ritmo próprio de aprendizagem de cada um; • Consideração da capacidade da maioria desses alunos de alcançar um nível de aprendizagem adequada, se re- ceber uma orientação gradual, a partir do nível de de- senvolvimento cognitivo, no qual se encontra. Da mesma forma, se receber uma ajuda oportuna, através do desen- volvimento de estratégias cognitivas, tempo necessário para a aprendizagem. transtornos de déficit de atenção e hiperatividade - tdah 6.2 Os transtornos de Déficit de Atenção/Hiperativi- dade caracterizam-se por um problema de saúde mental, cujos sintomas são: desatenção, agitação (hiperatividade) e a impulsivi- dade, podendo provocar na vida da criança ou do ado- lescente, dificuldades emocionais, de relacionamento fa- miliar, social e baixo desempenho escolar. O TDAH pode apresentar-se de três maneiras: • TDAH com predomínio de sintomas de desatenção; • TDAH com predomínio de sintomas de hiperatividade; • TDAH combinado. A sintomatologia tem início antes dos 7 anos de idade. Em crianças pré-escolares (de 4 a 6 anos), os sin- tomas mais evidentes são os de marcada hiperatividade associada a dificuldades em tolerar limites e frustrações. Na idade escolar, há uma combinação variável dos sinto- mas na área da desatenção, da hiperatividade e da impul- sividade. Na adolescência, os sintomas mais evidentes passam a ser a desatenção e a impulsividade. 151 A etiologia não é específica. Incluem-se causas pré-natais (decorrentes do álcool na gestação, prematu- ridade), perinatais (anoxia ou hemorragia intracraniana) e pós-natais (sequelas de doenças no início da infância, como encefalites, meningites, traumatismo crânio-ence- fálico etc.) e os fatores ambientais decorrentes de baixo nível socioeconômico. De acordo, com Rodhe e Benczik (1999), os sin- tomas abaixo fazem parte do grupo de desatenção: • Não prestar atenção a detalhes ou cometer erros por descuido; • Dificuldade de concentração em tarefas e/ou jogos; • Desatenção quando alguém lhe diz algo; • Dificuldade em seguir regras e instruções e/ou de fina- lizar o que inicia; • Desorganização com as tarefas escolares e materiais; • Evitar atividades que exijam um esforço mental continuado; • Perder coisas importantes; • Distrair-se, facilmente, com coisas que não têm nada a ver com o que está fazendo; • Esquecer compromissos e tarefas. Sintomas que fazem parte do grupo de hiperati- vidade/impulsividade: • Dificuldade em parar sentado por muito tempo, ou ficar mexendo pés e mãos; • Pular, correr excessivamente em situações inadequa- das, inquietude; • Fazer muito barulho para jogar ou divertir-se; • Apresentar muita agitação; • Falar demais; • Responder às perguntas antes de terem sido terminadas; • Ter dificuldade de esperar a vez; • Intrometer-se em conversas ou jogos dos outros. 152 O diagnóstico de TDAH é fundamentalmente clínico, devendo ser realizado por neurologista, psicólogo e psicopedagogo, concomitantemente, quando necessá- rio. Na clínica psicopedagógica aplica-se como procedi- mento avaliativo, além da observação, do momento lúdi- co, a escala de Conners. A intervenção psicopedagógica caminha no sentido de auxiliar o aprendente a reconstruiras habilidades e conteúdos. Em conjunto a esse atendi- mento, às vezes, é necessário um acompanhamento pe- dagógico feito pelo professor. 6.2.1 orientação aos pais O relacionamento dos pais com os filhos portado- res de hiperatividade, na maioria das vezes associada à desa- tenção, é por vezes desgastante e tensa. Os pais sentem-se de mãos atadas, sem rumo certo para lidar com esse distúr- bio. Muitos chegam a desenvolver, como fuga da realidade, comportamentos autoprotetores para com seus filhos. Bem, sabemos que esse não é o caminho para uma boa educação dos hiperativos, mesmo porque não existem receitas prontas de manejo. O que podemos su- gerir são dicas gerais e estratégias cognitivo-comporta- mentais que, aliadas à boa vontade dos pais para educar seus filhos, servem como meios e não fins em si mesmos. De antemão, o sujeito portador desse transtorno sofre também por não conseguir dar conta de autocontrolar-se ou de focalizar a atenção em situações diversas. São pes- soas que precisam da ajuda da família e da escola, contan- do sempre com a intervenção terapêutica (psicológica ou fonoaudiológica ou, quando o sintoma dá-se via aprendi- zagem, psicopedagógica). Rohde e Benczik (op.cit., p. 74 a 80) apresentam dicas gerais, que contribuem para o tratamento dos sujeitos 153 portadores de hiperatividade, transcritas a seguir: 1. Estabelecer prioridades: verificar quais dificul- dades exigem prioridades. Estabelecer uma estra- tégia de manejo para a dificuldade maior e assim, sucessivamente, em ordem de prioridade. O im- portante é que se resolva um problema por vez. 2. Pensar antes de agir: frente à dificuldade da criança, pensar na melhor alternativa de mane- jo: Bater na criança? Ameaçar com castigo? Xin- gar? Pedir para ficar quieta? Retirar as garrafas e os talheres desnecessários de perto da criança? Propor uma recompensa se conseguir terminar de comer sentada?Pensar bastante para que o bom senso prevaleça nas horas de intervir para ajudar a melhorar o comportamento da criança. 3. Usar o reforço positivo antes da punição: as crianças e adolescentes com TDAH precisam de constante reforço positivo, pois elas respondem melhor a esses do que às estratégias punitivas, para que comportamentos esperados predominem. Usar como estratégia o reforço positivo, na verdade, re- flete um princípio básico da relação interpessoal, ou seja, o da obtenção de direitos na medida em que os deveres são cumpridos. Procurar reforçar o que há de melhor na criança. 4. Manter constância de estratégia: significa não abandonar, rapidamente,a estratégia proposta. Mantê-la constante, independentemente do am- biente. Certificar-se de que ambos os pais estão executando-a de forma similar. Proporcionar um ambiente com rotina diária (hora fixa para fazer o dever de casa, para o almoço e jantar e para outras tarefas). 154 5. Antecipar os problemas: os pais deverão an- tecipar os problemas e dificuldades que irão en- frentar, para que orientem seus filhos nos mo- mentos que exigem concentração. Formar com o filho regras e perguntas que o ajudarão a superar suas dificuldades de atenção e impulsividade com maior exatidão. 6. Estabelecer uma comunicação clara e eficiente: tornar as regras claras e, se possível, dispostas às vistas da criança, contendo as instruções diárias. 7. Proporcionar uma atividade física regular para o seu filho. 8. Escolher, cuidadosamente, a escola: procurar es- colas que valorizam o desenvolvimento global da criança e que adotam uma avaliação progressiva do desempenho. Muito cuidado com as escolas vol- tadas para o resultado das avaliações, sobretudo, em termos de conteúdos. As crianças com TDAH, nesse tipo de instituição, estão fadadas à reprova- ção e à desvalorização do potencial que carregam. desordem do processamento auditivo central 6.3 A Disfunção Auditiva Cen- tral ou Desordem do Pro- cessamento Auditivo Central (DPAC) caracteriza-se por um distúrbio da audição, em que há um impedimento da habilidade de analisar e/ou in- terpretar padrões sonoros. Os indivíduos que apresentam esse problema podem apresentar uma ou mais das seguintes manifesta- ções comportamentais: 155 1. Quanto à comunicação oral: • Problemas de produção de fala envolvendo os sons /r/ e /l/, principalmente. • Problemas de linguagem expressiva envolvendo regras da língua (estrutura gramatical). • Dificuldade de compreender em ambiente ruidoso. • Dificuldade de compreender palavras com duplo sen- tido (piada). 2. Quanto à comunicação escrita: • Problema de escrita quanto às inversões de letras, orien- tação direita/esquerda. • Disgrafias. • Dificuldade de compreender o que lê. 3. Quanto ao comportamento social: • Distraídos. • Agitados, hiperativos ou muito quietos. • Desajustados (ou brincam com crianças mais novas ou adultos mais tolerantes). • Tendência ao isolamento (sentem-se frustrados ao no- tarem suas falhas na escola ou no lar). 4. Quanto ao desempenho escolar: • Inferior em leitura, gramática, ortografia, matemática. • O desempenho escolar pode ser melhorado ou agrava- do dependendo de fatores tais como: posição do aluno na sala de aula, tamanho da classe, nível de ruído am- biental, fala do professor quanto ao nível de intensidade e clareza de voz. Crianças com suspeitas da DPAC devem ser en- caminhadas ao fonoaudiólogo para avaliação. 156 distúrbios psicomotores 6.4 Os distúrbios psicomotores e os distúrbios afetivos estão estreitamente ligados; influen- ciam-se e reforçam-se, mutua- mente. Ou seja, as dificuldades afetivas traduzem-se no comportamento. Por isso, a psicomotricidade deve sem- pre considerar o indivíduo como um todo, pesquisando se o problema está no corpo, na área da inteligência ou na afetividade. É muito comum na instituição escolar encon- trarmos alunos com distúrbios psicomotores. Embora, aparentemente normais, apresentam muita dificuldade na aprendizagem da leitura e da escrita, além de uma série de outros problemas, que interferem no processo escolar. O distúrbio de psicomotricidade pode origina- ser de uma Disfunção Cerebral Mínima (DCM), de um problema físico ou de um problema emocional. Além dos problemas motores, há a coexistência de transtornos relacionados ao ritmo, à atenção, ao comportamento, ao esquema corporal, à orientação espacial e temporal, à la- teralidade e maturação. De acordo, com Grünspun (1966, p. 211-217), os distúrbios psicomotores são classificados em: • Instabilidade psicomotora • Debilidade psicomotora • Inibição psicomotora • Lateralidade cruzada • Imperícia 157 A princípio, uma educação psicomotora deve ensinar a criança a ficar sentada, adquirir boa postura, aprender a ouvir. Depois de atingir esse objetivo é que ela será capaz de receber ordens, concentrar-se, usar a memória, executar tarefas do começo ao fim. A criança pode progredir lentamente, porém é primordial o apoio do adulto no sentido de ajudá-la nesse processo, pois uma estimulação mal orientada pode con- fundir, ainda mais, a criança. A educação psicomotora na idade escolar deve ser antes de tudo uma experiência ativa com o meio. distúrbios de leitura 6.5 Podem estar associados a: • Memória: quando a criança apresenta dificuldade auditiva e visual de reter in- formações. Nesse caso, pode encontrar dificuldades para recordar sons de letras, juntar os sons para formar pala- vras ou memorizar a sequência das palavras. • Orientação espaço-temporal: a criança tem dificuldade de identificar direita e esquerda. • Esquema corporal: geralmente, a criança com distúr- bios de leitura tem um conhecimento deficiente de seu esquema corporal. • Motricidade: os distúrbios de coordenação motora am- pla e fina atrapalham a criança em seu equilíbrio e em sua destreza manual. • Distúrbio topográfico: caracteriza-se pela incapacidade de compreender legendas de mapas, gráficos, globos e maquetes. • Soletração: consiste na incapacidade que as crianças 158 têm de revisualizar e reorganizar auditivamenteas letras. • Dificuldades de discriminação visual: podendo estar as- sociada a um defeito de visão (corrigível com o uso de lentes apropriadas) ou uma incapacidade para diferenciar, interpretar ou recordar palavras, devido a uma disfunção do sistema nervoso central. • Dificuldades de discriminação auditiva: envolvem pro- blemas auditivos relacionados com as dificuldades em dis- criminar os sons. Pode ser manifestada pela troca de con- soantes surdas por sonoras; troca de vogal oral por nasal; pontuação ausente ou inadequada; elocução hesitante ou inexpressiva; incapacidade para ouvir sons iniciais ou finais das palavras; análise e síntese auditiva deficientes. • Dislexia: a criança disléxica demonstra muitas dificulda- des para identificar símbolos gráficos no início da alfabe- tização, o que acarreta transtornos na leitura e na escrita. distúrbios de escrita 6.6 São basicamente três tipos de distúrbios na escrita: • Disgrafia: Caracteriza-se pela dificul- dade em passar para a escrita o estímulo visual da palavra impressa. O traçado das letras, geralmente, são lentos e ilegíveis. É importante saber que a criança disgráfica não é portadora de defeito visual nem motor, e tampouco de qualquer comprometimento intelectual ou neurológico. • Disortografia: Caracteriza-se pelas trocas ortográficas e confusão de letras. Essa dificuldade não implica a dimi- nuição da qualidade do traçado das letras. A memória da criança que apresenta esse distúrbio deve ser estimulada constantemente. 159 • Erros de formulação e sintaxe: Caracteriza-se pela difi- culdade em transmitir para a escrita conhecimentos ad- quiridos. A criança não consegue expressar-se por cartas, histórias, não consegue resolver questões de prova, que exigem a escrita como respostas, embora apresentem uma leitura fluente e uma linguagem oral perfeita. discalculia 6.7 Caracteriza-se pela impossibilidade de compreender e processar os símbolos aritméticos, de fazer cálculos ou de ler e escrever núme- ros. Em muitos casos, existe falta de reconhecimento vi- sual dos números ou confusão entre eles; dissociando-se a quantidade representada do numeral que lhe corresponde. A discalculia associa-se à dislexia, pois em ambos os casos trata-se de uma dificuldade na leitura e escrita de símbolos gráficos. Entretanto, isso não implica que todas as crian- ças disléxicas apresentam discalculia e vice-versa. Sugestão para complementação de estudos 1. Sugestões para ajudar a criança disléxica Entre as sugestões apresentadas pela Associação Brasi- leira de Dislexia (ABD), destacamos: • Estabelecer horários para refeições, sono, deveres de casa e recreações. • As roupas do disléxico devem ser arrumadas na se- quência que ele vai vestir para evitar confusões e preo- cupações à criança (simplificar usando zíper em vez de botões, sapatos e tênis sem cordão e camisetas). • Quando for ensinar a amarrar os sapatos, não fique 160 de frente para a criança; coloque-se a seu lado, com os braços sobre os ombros dela. • Como a criança disléxica tem muita dificuldade para sa- ber as horas, marque no relógio, com palavras, as horas das obrigações. Isso evita a preocupação da criança. • Para as que têm dificuldade com direita e esquerda, uma mar- ca é necessária. Isso pode ser feito com um relógio de pulso, um bracelete ou um botão pregado no bolso do lado favorecido. • Reforçar a ordem das letras do alfabeto, cantando e dividindo-as em pequenos grupos. • Ensinar a criança a “sentir” as letras através de diferentes texturas de matérias, com areia, papel, veludo, sabão etc. • Ler histórias que se encontrem no nível de entendimen- to da criança. • Instruir as crianças canhotas precocemente, para evitar que assumam posturas pouco confortáveis e mesmo pre- judiciais, como encobrir o papel com a mão ao escrever. • Providenciar para que a criança use lápis ou caneta grossos, com película de borracha ao redor e que sejam de forma triangular. • A criança disléxica confunde-se com o volume de pa- lavras e números com que tem de defronta-se. Para evi- tar isso, arranjar um cartão de aproximadamente 8 cm de comprimento por 2 cm de largura, com uma janela no meio, da largura de uma linha escrita e comprimento de 4 cm. Deslizando o cartão na folha à medida que a criança lê, bloqueia o acesso visual para as linhas de baixo e de cima e dirige a atenção da criança da esquerda para a direita. 2. Livro: “Distúrbios de Aprendizagem, Princípios e Li- nhas Práticas.” JOHNSON, D. J. e MYKLEBUST, H. R. São Paulo, Edusp, 1983. 161 atividades a 1. Faça uma pesquisa sobre as principais ca- racterísticas dos distúrbios de aprendizagem citados: instabilidade psicomotora, debilidade psicomotora, inibição psicomotora, lateralida- de cruzada e imperícia. 2. Pesquise sobre atividades práticas que visam à estimulação psicomotora que poderão ser aplicadas em sala de aula. a. esquema corporal; b. lateralidade; c. ritmo; d. coordenação geral e orientação espaço-temporal; e. coordenação visomotora. 3. Procure elaborar um programa ou plano para ser desenvolvido com crianças da pré- escola, que abranja todos os aspectos de uma educação psicomotora. 4. Que atividades poderão ser planejadas pelo professor para trabalhar os distúrbios de leitu- ra, de escrita e de cálculo nos alunos portado- res desses problemas? 5. Em relação aos alunos com TDAH, pesqui- se sobre práticas de intervenção psicopedagó- gica para atender a tais necessidades. 162 163 bibliografia AJURIAGUERRA, J. de et alii. “A Dislexia em Questão”. Porto Alegre, Artes Médicas, 1990. BEAUCLAIR, João. “Para entender psicopedagogias: perspectivas atuais, desafios futuros.” Rio de Janeiro: Wak Editora, 2007. BORGES, Aglael Luz. “O Ato de Aprender: Algumas Contribuições da Psicanálise Freudiana”, in SCOZ et alii, Psicopedagogia – Contextualização, Formação e Atuação Profissional, Porto Alegre, Artes Médicas: 1992. BOSSA, N. A. e MONTTI, C. 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