Buscar

Guia_da_Disciplina_Et Cid _1 sem_21

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 3, do total de 54 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 6, do total de 54 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes
Você viu 9, do total de 54 páginas

Faça como milhares de estudantes: teste grátis o Passei Direto

Esse e outros conteúdos desbloqueados

16 milhões de materiais de várias disciplinas

Impressão de materiais

Agora você pode testar o

Passei Direto grátis

Você também pode ser Premium ajudando estudantes

Prévia do material em texto

ÉTICA E CIDADANIA 
Me. Clara Versiani dos Anjos 
GUIA DA 
DISCIPLINA 
 2021 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Objetivo: 
Promover o conhecimento, a reflexão e o debate sobre a ética e a cidadania; 
favorecer a formação de pensamento crítico por parte dos futuros profissionais acerca da 
realidade social e das organizações; enfatizar a ética como ciência que oferece 
parâmetros para avaliação das escolhas e ações; desenvolver o conhecimento da 
cidadania como conceito e prática da modernidade, resultado de um processo histórico, 
político e social. 
 
Introdução: 
A disciplina relaciona dois diferentes conceitos, Ética e Cidadania. Colocando-os 
lado a lado refletimos uma noção hoje em dia amplamente divulgada de que a Cidadania, 
para ser exercida de fato, não pode prescindir da Ética. 
 
No entanto, esta relação nem sempre existiu da maneira como a entendemos hoje, 
o que significa dizer que ela foi historicamente construída. Demonstrar como ela surgiu e 
suas implicações será um dos objetivos de nossas aulas. 
 
Ética é uma palavra de origem grega, derivada de ethos que significa “costumes”. 
Em latim corresponde à palavra moris que quer dizer “moral”. No entanto, ao longo do 
tempo, a Ética passou a significar “ciência da moral”. Mas este é um dos significados que 
podemos atribuir à palavra. Um outro sentido é o da “Ética como ciência”. 
 
A moralidade é algo presente em todas as ações humanas, entendidas aqui como 
ações concretas e resultantes de “escolhas conscientes”. A Ética enquanto ciência 
examina estas ações que podem ser, a partir deste exame, condenadas ou aprovadas 
dependendo dos parâmetros que utilizamos. Estes parâmetros variam ao longo do tempo, 
ou seja, uma ação que poderia ser considerada moral e ética numa determinada época, 
altamente recomendável, não necessariamente o é em outra. 
 
Por exemplo, no Brasil escravocrata era muito pouco recomendável que pessoas 
de um certo nível econômico e social se dedicassem a trabalhos braçais. Estes deveriam 
ser realizados apenas pelos escravos ou pelos brancos pobres. As senhoras das classes 
mais abastadas passavam a maior parte do seu tempo sentadas, rodeadas de mucamas 
que executavam todo o serviço. Quando se deslocavam para alguma aparição pública, 
faziam-no carregadas em liteiras pelos escravos. O sociólogo Gilberto Freyre relata em 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
sua obra “Casa Grande e Senzala” que não raro essas mulheres acabavam perdendo a 
mobilidade em razão do atrofiamento dos músculos. À época este comportamento era o 
esperado e por isto aprovado, muito diferente do que consideraríamos hoje. 
 
A Ética como “ciência da moral” surgiu na antiguidade grega. Os gregos foram os 
primeiros a buscar o entendimento e avaliação racionais das ações humanas. Isto não 
quer dizer que outras civilizações mais antigas não tivessem os seus próprios conceitos 
de certo/errado, moral/imoral, justo/injusto. Todas as sociedades humanas conheceram e 
conhecem tais sentidos embora os parâmetros possam variar de uma para outra. A 
diferença é que os gregos pretenderam criar uma “ciência” para compreensão de tais 
parâmetros, enquanto outras civilizações os estabeleceram a partir de um conjunto de 
crenças e práticas baseadas nas tradições e religiões sem nenhuma preocupação de 
produzir conhecimento racional. 
 
A Cidadania com o sentido que atribuímos a ela, um conjunto de direitos e deveres 
que diz respeito a todos os indivíduos, surgiu na modernidade como resultado das 
revoluções burguesas do ocidente nos séculos XVII e XVIII. A antiguidade grega e 
romana conheceu sua própria noção de “cidadão”, mas que é diferente da que temos hoje 
altamente influenciada pelos princípios liberais de igualdade e liberdade. 
 
Ao longo do nosso curso trabalharemos a construção e evolução dos dois 
conceitos, a relação entre eles e suas implicações para a nossa vida pessoal e 
profissional. 
 
Estendendo tais conceitos para o âmbito profissional, nas últimas décadas do 
século XX, tornou-se mais presente no contexto das organizações as práticas inicialmente 
chamadas de Responsabilidade Social Empresarial que, mais tarde, assumiram o nome 
de Responsabilidade Socioambiental nas Organizações. Tais práticas devem ser 
compreendidas como resultado do desenvolvimento da Ética Empresarial e também do 
conceito de Sustentabilidade. Em nossa disciplina também trataremos destes temas 
pretendo promover uma percepção mais profunda do ambiente organizacional. 
 
Este guia está organizado, portanto em torno de três grandes eixos, um sobre 
Ética, outro sobre Cidadania e o terceiro sobre Responsabilidade Socioambiental nas 
Organizações, desenvolvidos em nove aulas-texto, seis videoaulas e três webs aulas. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Além da bibliografia básica e complementar apresentadas para o curso, você encontrará 
ao final das aulas indicações de sites para estudo, vídeos e filmes referentes aos temas 
das aulas e de obras sobre o assunto que constam da Biblioteca Virtual da UNISANTA e 
outras indicações de leitura. 
 
Durante o nosso curso você contará com o apoio do seu (sua) professor (a) -tutor 
(a), que estará a postos para esclarecimento de qualquer dúvida ou orientação que você 
precise. 
 
Para o seu melhor aproveitamento, lembramos que a participação no ambiente 
virtual de aprendizagem, a realização das atividades, o estudo das aulas texto e das 
videoaulas são muito importantes. 
 
Dando-lhe as boas-vindas e desejando-lhe sucesso, damos início ao nosso curso. 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
1. ÉTICA: AUTONOMIA MORAL DOS SUJEITOS E “REVOLUÇÕES 
MORAIS” 
 
Como colocado a Ética é a ciência que examina a ação concreta e livre dos 
sujeitos. Isto quer dizer em primeiro lugar que a avaliação ética não incide sobre o 
pensamento ou sentimento caso este não se expresse concretamente. Diferente das 
religiões que estabelecem mandamentos aos quais os fiéis devem obedecer mesmo em 
pensamento, a Ética julga apenas o que existe ou se manifesta na realidade concreta das 
coisas. 
 
Em segundo lugar implica que a avaliação se dá para escolhas e ações que são 
tomadas “livremente”, ou seja, conscientemente. Isto não quer dizer que tudo o que é 
realizado pelos sujeitos após uma avaliação individual consciente seja lícito, moral ou 
justo. Ou seja, é falsa a ideia de que “cada um é cada um e porque fulano/fulana acha 
que é bom, certo e melhor para ele/ela” é necessariamente ético. 
 
A autonomia moral dos sujeitos significa ainda o reconhecimento de que todos 
somos racionais e livres para realizarmos nossas próprias escolhas, podendo aceitar 
cumprir ou não lei; definir o que achamos justo ou não. 
 
Esta liberdade implica em assumir as consequências de nossa escolha e também 
em perceber uma outra diferença importante, nem tudo que é ético é lei, nem tudo que é 
lei é ético. 
 
Por exemplo, durante a Segunda Grande Guerra, Anne Frank, adolescente de 
origem judia, autora do famoso “Diário”, junto com sua família viveu escondida durante 
dois anos na Amsterdam ocupada pelos nazistas. Antes de serem descobertos, a família 
viveu no esconderijo graças ao apoio de funcionários do escritório do pai de Anne que, 
conscientemente, desobedeceram a leis que consideravam injustas. A ocupação nazista 
implicava a obrigação de delação de “todos os inimigos do Reich” o que, como se sabe, 
dizia respeito aos judeus e outras minorias. 
 
Ao desobedecerem a leis que consideravam injustas e moralmente reprováveis, e 
agindo em torno de outros valores que julgavam mais importantes como a lealdade, a 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
solidariedade e a amizade,os funcionários do pai de Anne Frank desobedeceram a lei, 
mas agiram como sujeitos autônomos dentro dos padrões morais que levam em 
consideração o outro, a diversidade e a tolerância. 
 
Sujeito moral é aquele que age autonomamente, que não é só um súdito, alguém 
que só obedece sem refletir. É aquele que segue leis e normas caso as considere 
efetivamente justas. Isto significa dizer que todo aquele que age sem refletir é imoral 
ainda que o resultado de sua ação esteja de acordo com normas, lei e/ou princípios 
morais aceitos pelo conjunto da sociedade. 
 
O sujeito moral, submete cada escolha a uma avaliação. Como coloca Aristóteles, 
filósofo grego da antiguidade, “As questões relativas à conduta e às dúvidas sobre o que 
seja bom para nós não têm regras fixas, não mais que as questões de saúde (...) Os 
próprios agentes devem considerar a cada caso o que é apropriado na ocasião tal como 
acontece na prática da medicina ou na arte da navegação.” (ARISTOTELES apud 
SANDEL, 2012, p. 246.) 
 
Mas como julgar, quais critérios usar? Os critérios surgem com a nossa “prática” e 
o pertencimento a uma “opinião pública julgadora”. Implicam também em preparo, 
educação, que não é só a formal, e tolerância porque a modernidade possibilitou o 
surgimento de “várias formas de moralidade”. 
 
As mudanças nos comportamentos morais são, como ensina Appiah (2012), 
resultado das chamadas “Revoluções Morais”. Estas grandes transformações implicam 
uma redefinição de valores como, por exemplo, o movimento que fez com que a 
escravidão moderna, implantada pelos colonizadores europeus nas áreas dominadas nos 
séculos XVI e XVII, deixasse de ser considerada legítima. 
 
A escravização de populações nativas da América e de negros africanos foi 
durante muito tempo legítima. No caso das populações nativas, sua escravização ocorreu 
no primeiro século de domínio europeu no continente. Condenada pela Igreja, foi 
legalmente proibida. Mas outras formas de trabalho compulsório e intenso foram impostas 
aos chamados índios. No caso da escravidão dos negros esta permaneceu aceitável, 
recomendável, esperada e praticada como atividade econômica altamente lucrativa para 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
os comerciantes e senhores de escravos até meados do século XVIII, quando então 
transformações sociais, políticas e ideológicas foram mudando as “mentalidades”. 
 
O comportamento moral como mostra Appiah, remete à relação entre honra e 
identidade. Esta última corresponde à nossa profunda necessidade de reconhecimento, 
ou seja, que os outros correspondam apropriadamente ao que somos e ao que fazemos 
(2012, p. 13.) 
 
Já a honra na mesma linha de argumentação corresponde ao conceito de 
Eudaimonia encontrado em Aristóteles e que pode ser entendido como “viver bem”. Honra 
envolve o respeito dos outros e o próprio. Para vivermos melhor precisamos então da 
honra e da identidade social para tratarmos os outros e sermos tratados como devemos. 
 
No entanto a honra não depende só da visão ou consideração dos outros, depende 
da maneira como nós mesmos nos vemos. A vergonha, que é o contrário da honra, por 
exemplo, é alguma coisa que podemos experimentar mesmo sozinhos. Ou seja, se 
fazemos alguma coisa que nos pareça de fato condenável como mentir para um amigo, 
para um familiar, podemos nos envergonhar desta ação mesmo que ninguém saiba que 
mentimos. 
 
Sendo assim quando efetivamente estamos preocupados com a nossa honra, a 
tendência é que ajamos de modo a corresponder àquilo que a sociedade como um todo 
considera “honrado”. Se, de modo geral, a sociedade considera como um valor o respeito 
ao patrimônio e bens públicos que envolvem recursos financeiros do Estado, tão mais 
honrado será alguém que se comporta de modo a preservá-los e desonrado quem se 
comporta de outro modo. 
 
Estes valores e expectativas da sociedade com relação ao comportamento 
daqueles que fazem parte dela são construídos historicamente. Voltando ao exemplo 
inicial deste tópico. Houve um tempo que a escravidão era considerada uma prática válida 
e possuir escravos angariava respeito dos demais. Não havia nenhuma desonra em ter 
propriedade sobre outros. No entanto, uma série de processos fez com que mudássemos 
a nossa visão sobre o que é a “vida boa” e sobre a honra, o que nos leva ao sentido de 
Ética como um modelo de felicidade ou como “estética da existência”. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
2. ÉTICA NA ANTIGUIDADE: ESTÉTICA DA EXISTÊNCIA E CAMINHO 
PARA A FELICIDADE 
 
Um outro significado para Ética é o de “estética da existência”, de um modelo para 
basearmos nossa vida no mundo, de um “caminho de aperfeiçoamento” pessoal ou 
político. Este é o significado que encontramos no filósofo francês Michel Foucault e 
referenciado pelo professor José Américo Peçanha em entrevista para a série “Ética”, 
produzida e exibida pela TV Cultura1. 
 
Para os gregos antigos a “estética da existência” ou “estilização da vida” implicaria 
na adoção de um modelo ordenado, equilibrado, belo, inspirado no equilíbrio, na harmonia 
e na beleza observada no cosmos. Um modelo para orientar nosso aperfeiçoamento, 
nossa busca pela excelência, pelo equilíbrio “, por um bem”. 
 
Mas o que seria “o bem”? Este também é um conceito que vai variar de um filósofo 
para outro, de uma época para outra e que remete à ideia de felicidade. A noção de 
“bem”, do que é belo, do que é justo, do que nos torna melhores do que nos torna felizes 
porque “nos realiza” pode ter um sentido estritamente pessoal ou estendido à vida 
pública, exclusivamente material e/ou espiritual. 
 
É considerando este significado da Ética como um modelo para alcançar a 
felicidade que poderemos compreender melhor as diferenças entre a Ética antiga, neste 
caso, da antiguidade grega, e a surgida na modernidade, ou seja, a partir do século XVIII. 
 
Os gregos, como já ressaltado, foram os primeiros preocupados com a construção 
de um conhecimento, ou melhor, de uma ciência da moral. A “motivação” grega para a 
construção de tal conhecimento pode ser encontrada no que eles consideravam como 
uma das nossas principais angústias, o fato de nós nos sabermos “mortais”. 
 
Os seres humanos são os únicos seres vivos que têm consciência de que não 
existirão para sempre. Esta seria a fonte de todos os nossos medos e aflições. Diminuir 
tal angústia, pelo menos em parte, implicaria em buscar formas de que fôssemos 
lembrados mesmo quando já não existíssemos. A felicidade para os gregos estaria nisso, 
 
1 D isponíve l em ht tps : / /www.youtube.com/watch?v=qTiqU580z1I . Acesso em: 06/ 10/19 
about:blank
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
no alcance dessa “imortalidade”. Portanto, tudo o que dissesse respeito a isto era 
considerado justo, belo, bom, moral, ético. 
 
Mas como a “felicidade” descrita nestes termos poderia ser usufruída por nós? 
Como poderíamos avaliar se estamos de fato nos “imortalizando” diminuindo nossa 
angústia essencial? Buscando na vida presente a “excelência”, o aprimoramento pessoal, 
orientando-nos pelo “soberano bem” compreendido como aquele que diz respeito ao que 
é “comum”. 
 
Temos então que a felicidade para os gregos antigos seria a busca consciente da 
felicidade na vida presente, dependendo de um esforço próprio de aprimoramento, o que 
implicaria em nos livrarmos do “fatalismo”, ou seja, de que estaríamos “destinados” a isto 
ou aquilo. O nosso único “destino” seria o da “vida boa e feliz”. Para tanto deveríamos 
viver de acordo com as virtudes. 
 
“Virtudes” muitas vezes são definidas como qualidades que alguém tem. Esta é 
uma definição limitada e que conduz a equívocos. Virtude não é alguma coisa com a qual 
se nasça, ou que alguém porte “naturalmente”. É bem verdade que numa visão 
aristocráticade mundo os “nobres” são aqueles que possuem “virtudes naturais”, ou seja, 
que surgem no mundo já “virtuosos”. No entanto, mesmo na antiguidade grega em que 
este sentido também existiu, foi deixado de lado e suplantado por uma outra noção, a de 
que virtudes são adquiridas e desenvolvidas através de um esforço próprio. De acordo 
com este raciocínio, todos nós teríamos a possibilidade de nos tornarmos virtuosos se 
assim de fato o quiséssemos. 
 
A busca individual pela excelência, este esforço dos sujeitos morais porque 
autônomos, remete a um outro princípio importante na compreensão do sentido da Ética 
na antiguidade grega e que ainda permanece em perspectivas mais contemporâneas, o 
de que todos nós trazemos, naturalmente, as condições para o desenvolvimento das 
virtudes, assim como do seu oposto, os vícios. 
 
Na visão grega antiga a natureza humana é essencialmente “titânica” o que remete 
ao mito dos “titãs”. Seres terríveis, filhos da união de Gaia, a terra, com Urano, o céu que, 
por ciúmes do “pai”, foram encerrados de volta no ventre da “mãe”. Esta representação 
tanto servia para explicação de desastres naturais como terremotos, por exemplo, que 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
seriam resultado da fúria de um dos titãs aprisionados, e também para explicar a 
“paixões” tais como a ira, a inveja, o ciúme, o medo, a ganância, os desejos intensos que 
carregamos dentro de nós. 
 
Mas se as paixões podem desencadear “vícios”, por outro lado elas também 
podem suportar “virtudes”. A nossa “inveja”, por exemplo, se controlada, pode nos levar a 
progredir. Da mesma forma o nosso amor intenso à uma causa pode fazer com que 
desenvolvamos a coragem. 
 
Deste modo, o homem virtuoso ou bom, dentro da concepção grega antiga de 
Felicidade e de Ética, seria aquele que num esforço pessoal se conduziria avaliando em 
todas as circunstâncias “o quanto de paixão seus atos comportam”. Esta avaliação, na 
perspectiva de um dos filósofos gregos, Aristóteles, corresponde à “Ética do Télos”, ou do 
propósito e da adequação. 
 
O autor Michael Sandel, referenciado ao final na Bibliografia usada para elaboração 
deste Guia, ensina que para compreensão da Ética e da Política em Aristóteles devemos 
raciocinar de forma “teleológica”. 
 
Tal raciocínio parte do télos, palavra grega para “propósito”. Raciocinar deste modo 
é então avaliar as concepções de justiça a partir do seu propósito. Em seu livro, “Justiça 
– o que é fazer a coisa certa”, Sandel cita um exemplo (2012, p. 237-238). Ao colocar a 
questão “quem tem o direito de ser admitido em uma universidade?”, que pode ser posta 
na avaliação das políticas de ação afirmativa ou de “cotas”. 
 
Ao fazermos esta pergunta, 
 
Perguntamo-nos (pelo menos implicitamente): Qual o propósito, ou o télos, de uma 
universidade? 
(...), o télos não é o óbvio, mas contestável. Alguns dizem que as universidades 
existem para promover a excelência acadêmica, e que a promessa acadêmica 
deveria ser o único critério de admissão. Outros dizem que elas também existem 
para atender a determinados propósitos cívicos e que a capacidade de ser um 
líder em uma sociedade diversificada, por exemplo, deveria fazer parte dos 
critérios de admissão. Definir o télos de uma universidade parece essencial para 
que se determinem os critérios de admissão adequados. (...). 
Intimamente relacionada à discussão sobre o propósito de uma universidade há 
uma questão de mérito moral: que virtudes ou excelências as universidades 
efetivamente valorizam e recompensam? Aqueles que acham que as 
universidades existem para celebrar e recompensar apenas a excelência 
acadêmica provavelmente rejeitarão a ação afirmativa; por outro lado, os que 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
acreditam que as universidades também existem para promover determinados 
ideais cívicos talvez abracem essa ideia. 
 
E em que medida isto se relaciona com a Ética? A “ideia de Justiça” tal como 
apresentada por Sandel pode ser também compreendida como aquilo que entendemos 
num sentido genérico como ético ou a “coisa certa”. Sendo assim, a avaliação aristotélica 
da justiça, ou moralidade das ações, o quanto estas seriam éticas ou não, depende de 
raciocínio teleológico. 
 
Falta esclarecer o termo Política e como ele se insere na compreensão da 
perspectiva da Ética aristotélica. Em primeiro lugar, Política no pensamento grego antigo 
e sobretudo em Aristóteles é definida como uma arte ou ciência. Política seria a “arte ou 
ciência da convivência na pólis”. 
 
Pólis é o termo grego para cidade. Vimos que uma das principais inquietações dos 
pensadores gregos era buscar e oferecer respostas que pudessem diminuir nossa 
angústia essencial, a percepção da mortalidade. 
 
A pólis é o espaço público, o lugar de realização das ações que expressam nossa 
excelência. Só assim, uma vez que tais ações sejam testemunhadas pelos demais, é que 
poderemos ser lembrados mesmo quando não existirmos mais. A pólis é, portanto, dentro 
desta perspectiva, o espaço para a nossa “plena realização”, o lugar para sermos felizes. 
 
Sandel chama a atenção para o fato de que, em Aristóteles, “o propósito da política 
não é criar uma estrutura de direitos neutra em relação às finalidades. É formar bons 
cidadãos e cultivar o bom caráter.” (2012, p. 240.) 
 
Citando Aristóteles diretamente, temos: 
 
Qualquer pólis que mereça ser assim chamada deve dedicar-se ao propósito de 
promover a bondade. Caso contrário, uma associação política reduzir-se-á a uma 
mera aliança (...) Caso contrário, também, a lei será transformada em um mero 
pacto (...) uma garantia dos direitos dos homens contra seus semelhantes” – em 
vez de ser, como deveria, uma regra da vida para tornar seus membros bons e 
justos. (ARISTOTELES apud SANDEL, 2012, p. 240.) 
 
Em Aristóteles e em outros autores da antiguidade, encontramos uma forte ênfase 
nas virtudes cívicas, ou seja, aquelas que desenvolvemos tendo em vista a “boa vida nas 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
cidades”. Este é um dos aspectos que podemos destacar das diferenças existentes entre 
a ideia de felicidade, de justiça, de ética e moralidade dos pensadores antigos e o que 
encontramos na modernidade., tema do nosso próximo tópico. 
 
 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
3. ÉTICA NA MODERNIDADE 
3.1. Princípios em Adam Smith 
Como colocado no início, chamamos aqui “modernidade” o período histórico que 
teve início no Ocidente a partir do século XVIII. No entanto, há alguns autores, fundadores 
do pensamento dito moderno, como Nicolau Maquiavel, pensador florentino, de um 
período anterior (séculos XV e XVI). 
 
Mais importante do que estabelecer tal recorte histórico é enfatizar a distinção entre 
antiguidade e modernidade. Uma das características que nos parece essencial do 
pensamento dos autores ditos modernos é que estes não alimentavam muitas ilusões 
sobre a natureza humana. Como bem sintetizou o economista e escritor Eduardo 
Giannetti da Fonseca em sua obra “Vícios privados, benefícios públicos?”, enquanto os 
antigos pensavam a realidade como “deveria ser”, os modernos buscaram refletir sobre o 
mundo tal como ele é. 
 
Uma outra diferença marca a modernidade, o individualismo. Enquanto na 
antiguidade grega, tal como vimos, a possibilidade da “vida feliz” estava na nossa 
experiência cívica, embora a modernidade não deixe de valorizar o espaço público, ela 
coloca, principalmente entre os autores do século XVIII em diante, a importância da 
realização individual para os sujeitos. A modernidade, em contraponto com o passado 
medieval e sociedades de ordens do Antigo Regime, pôs como causa o “direito de o 
indivíduo existir como tal”, o que significa o direito à nossa existência de acordo com asnossa caraterísticas, anseios e crenças. 
 
É possível então perceber que a ideia de Felicidade dos modernos é diferente da 
dos antigos. A Felicidade para os primeiros dependerá de a possibilidade do indivíduo 
garantir a sua existência de acordo com aquilo que deseja e anseia. A Felicidade passa a 
ser “medida” pela nossa eficiência em garantir esta realização. Um “indicador” de tal 
sucesso será a riqueza material, alcançada pela tenacidade, esforço, pela entrega a 
certas noções de dever e obediência a processos, normas, horários, regras que 
assegurem o melhor desempenho para a maior recompensa. Tanto mais “virtuoso” será o 
mais “eficiente”, ou seja, aquele que melhor obedece às orientações para o caminho do 
“sucesso” 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Tais normas e regras não necessariamente foram estabelecidas por nós, a 
natureza delas é “suprassensível”, ou seja, surgiram independente da nossa vontade ou 
opinião. No entanto, o princípio moderno de que todos os homens são livres e iguais 
determina a nossa “liberdade” em aceitar cumprir tais obrigações ou não. 
 
Por outro lado, ainda que para o conjunto dos pensadores modernos o indivíduo 
importe mais do que a comunidade, veremos que há diferenças entre eles no que tange à 
avaliação moral das escolhas e ações humanas. 
 
Adam Smith foi um filósofo da moral do século XVIII. Muito embora também seja 
referenciado como um “economista”, sendo uma das suas obras mais conhecidas, “A 
História da Riqueza das Nações”, clássico que traz princípios importantes para 
compreensão da economia capitalista, é em outra obra “Teoria dos Sentimentos Morais”, 
também essencial para compreensão do pensamento de Smith, que iremos encontrar 
elementos para uma melhor compreensão do que é Ética na modernidade. 
 
Em Smith o egoísmo surge como parte de nossa condição e essencial para a 
nossa sobrevivência. É porque naturalmente nós queremos mais a nós mesmos do que 
aos outros que conseguimos sobreviver. 
 
Para melhor compreender o que isto significa, tomemos um exemplo prático. Uma 
pessoa que tenha um familiar, alguém próximo muito doente sob seus cuidados. O que 
muitas vezes ocorre é que o cuidador tão envolvido que está com o outro esquece-se de 
si mesmo. Não raro o cuidador adoece, ou mesmo perece, e aquele ou aquela que 
recebeu os cuidados sobrevive. Isto mostra o quanto o “egoísmo” pode ser importante 
para nossa sobrevivência. 
 
Mas Smith enxergava ainda no nosso “egoísmo natural” uma fonte de virtudes. O 
fato de nos querermos mais que aos outros faz com que desejemos que os demais nos 
amem e/ou admirem na medida em que consideramos que devemos ser 
amados/admirados. Para tanto, é preciso mostrar aos outros que eles teriam razões de 
sobra para isso. De modo geral, portanto, nos esforçaríamos o tempo todo em mostrar as 
nossas melhores qualidades, evitando expor nossos defeitos e vícios, o que, ao final, 
possibilitaria mais harmonia e civilidade na vida em sociedade. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Outra resultante do nosso egoísmo e também da nossa vaidade é a ambição. A 
princípio poderíamos considerá-la como um vício ou defeito, no entanto, de acordo com a 
perspectiva de Smith e outros, é ela que nos move no sentido de alcançarmos mais 
fortuna, projeção, sucesso, impulsionando o progresso e a “riqueza das nações”. 
 
Voltando à maneira como gostamos de parecer aos olhos dos outros. O nosso 
esforço em mostrar o melhor de nós só ocorre à medida que tememos o juízo dos outros. 
Smith coloca a seguinte questão: “Quem continuaria agindo da maneira como age se 
tivesse certeza absoluta da impunidade, ou de que não seria julgado pelos outros?” 
 
Isto quer dizer que, se deixados à sua própria vontade, sem nenhum “juízo 
externo”, os homens agiriam no sentido de apenas e tão somente atender aos seus 
desejos, impossibilitando a vida em sociedade. Seria o cenário descrito por Thomas 
Hobbes, pensador inglês dos séculos XVI e XVII, da “guerra de todos contra todos”. 
 
Neste ponto Smith mostra a necessidade da existência de regras morais 
impessoais, formais e/ou informais para controle de nossa parcialidade. Por exemplo, não 
existe nenhuma lei que determine que devemos dar precedência na entrada de um 
elevador aos idosos, ou às mulheres, ou àqueles que estão com as mãos ocupadas. No 
entanto, há um código informal que considera adequado, moral, “ético”, que assim seja. 
De modo geral obedecemos a esta norma e aqueles de nós que não o fazem são taxados 
de “mal-educados”. Se não temêssemos este julgamento externo seria que ainda assim 
seguiríamos tal orientação? 
 
Mas Smith, dentro da tradição iluminista que toma o individualismo como causa, 
aponta para o fato de que tais regras, formais ou não, devem existir, mas não a ponto de 
tolher ou impedir o exercício da individualidade. Quer dizer, nenhuma regra deve 
impossibilitar o meu direito de existir com as minhas liberdades e direitos. Um exemplo, a 
minha liberdade de ir e vir deve ser preservada tanto quanto a liberdade do outro. Parar 
em fila dupla impedindo a passagem de outros carros é tomar dos demais, ainda que “por 
um minutinho”, um de seus direitos como indivíduos. 
 
Neste sentido, o grande desafio da moral e da ética na modernidade estaria neste 
equilíbrio entre a ética cívica, aquela que diz respeito ao espaço e vida em comum, e a 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
ética pessoal, o conjunto de normas que “eu” individualmente considero que devo seguir. 
Mais um exemplo para melhor esclarecer este desafio. 
 
Individualmente todos acreditamos que temos o direito de apreciarmos o estilo 
musical que quisermos. No entanto, ouvir música muito alto impede que os outros 
escutem a que gostariam, ou mesmo que deixem de usufruir o seu direito ao silêncio. 
Como se pode ver, boa parte dos conflitos nas grandes cidades se dá exatamente por 
este “desequilíbrio” que frequentemente ocorre entre estes sistemas morais, o individual e 
o comum. 
 
Tanto este conflito será maior quanto mais adverso for o ambiente externo. Num 
ambiente de escassez de recursos, numa epidemia de fome, por exemplo, ou em 
sociedades que sofrem com a guerra e a violência, o que se vê? Saques, assassinatos, 
famílias que se dividem, vizinhos que se atacam. A adversidade dá lugar ao caos, à já 
mencionada “guerra de todos contra todos”, em que cada um quer fazer valer a sua 
própria vontade. 
 
Mas mesmo em situações nem tão extremadas, em sociedades muito competitivas 
ou marcadas por um sentimento disseminado de “injustiça” e de desigualdade, ou de falta 
de oportunidades, podemos chegar a tal desequilíbrio. 
 
De novo entra em cena o “egoísmo” que pode nos impedir de chegar a extremos. 
O nosso “enorme e desmedido amor” por nós mesmos, de acordo com o Adam Smith, dá 
origem a uma nobre virtude, a solidariedade. Quando vemos alguém que consideramos 
semelhante a nós numa situação de sofrimento, o nosso “egoísmo” faz com que, nem que 
seja por alguns segundos, coloquemo-nos no lugar desse nosso semelhante. E ainda que 
por um breve momento, pensamos, “Se fosse eu estaria sofrendo muito agora, nem sei se 
suportaria”. Neste instante e por esta razão nos solidarizamos. 
 
No entanto, esta é uma empatia que estabelecemos com os que consideramos 
“semelhantes”. Com os que percebemos “diferentes” pela razão que for não conseguimos 
estabelecer tal laço. Por isso, radicalismos, situações que favoreçam a disseminação de 
preconceitos, a consideração dos outros como “dessemelhantes”, estranhos a nós, 
impedem a solidariedade e dão lugar ao desprezo e à insensibilidade com o sofrimento 
alheio. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Importante aqui ressaltar que os fatores que permitem o surgimentode tais 
situações, dessa cisão, separação entre “nós e eles”, podem ser não só sentimentos 
nacionalistas ou teorias de superioridade racial. Estes se alimentam de outros fatores 
como as desigualdades sociais, políticas e econômicas. Portanto, em sociedades 
rigidamente estratificadas, ou de forte desigualdade como a nossa, o “desprezo pelo 
outro” por considerá-lo diferente, ou “menos cidadão”, com menos direito de existir como 
indivíduo, pode florescer. 
 
Para concluir, a modernidade inaugurada no século XVIII coloca-nos então, a 
considerarmos a perspectiva de Smith, um enorme desafio, a busca do equilíbrio entre o 
que penso como “melhor, justo, certo para mim”, e o “melhor, justo, certo” para que todos 
possamos continuar buscando a felicidade. O “ético” em Smith será tudo o que colabora 
para a busca de tal equilíbrio, e condenável tudo o que o impede. 
 
3.2. O utilitarismo em Bentham e Stuart Mill. 
O utilitarismo, perspectiva ética e filosófica que tem Jeremy Bentham, filósofo 
inglês também do século XVIII, como um de seus fundadores, pode ser apresentado 
resumidamente como o modelo que remete à felicidade calculada em termos do maior 
benefício para o maior número. 
 
Esta simplificação muitas vezes leva à interpretação equivocada de que a 
perspectiva utilitária serviria exclusivamente ao interesse próprio o que retiraria dela a 
“moralidade”, ou seja, seria uma “perspectiva do vale-tudo” ou de que o “importante é tirar 
vantagem, sempre”. 
 
No entanto, é preciso detalhar melhor o que quer dizer esta avaliação calculada do 
“caminho para a felicidade”. Os pressupostos utilitaristas tal como extraídos de Sandel 
(2012) são: 
 
1- Moral consiste em pesar custos e benefícios e uma avaliação ampla das 
consequências; 
2- O mais elevado objetivo da moral é maximizar a felicidade (utilidade das coisas 
está em quanto de prazer e felicidade elas produzem); 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
3- Utilidade pensada em termos de benefícios para o maior número o que pode 
levar a conflitos com os direitos dos indivíduos. 
 
Para compreender melhor tais pressupostos e suas implicações, vejamos o que 
apresenta Sandel sobre o pensamento de Bentham: 
 
Todos gostamos do prazer e não gostamos da dor. A filosofia utilitarista reconhece 
esse fato e faz dele a base da vida moral e política. Maximizar a “utilidade” é um 
princípio não apenas para o cidadão comum, mas também para os legisladores. 
Ao determinar as leis ou diretrizes a serem seguidas, um governo deve fazer o 
possível para maximizar a felicidade da comunidade em geral. O que, afinal, é 
uma comunidade? Segundo Bentham, é um “corpo fictício”, formado pela soma 
dos indivíduos que abrange. Cidadãos e legisladores devem, assim, fazer a si 
mesmos a seguinte pergunta: Se somarmos todos os benefícios dessa diretriz e 
subtrairmos todos os custos, ela produzirá mais felicidade do que uma decisão 
alternativa? (SANDEL, 2012, p. 48.) 
 
Como se pode ver, não é uma “ética do vale-tudo”, muito embora, como outras 
perspectivas para avaliação moral das nossas escolhas e ações comporte algumas 
falhas. No caso do utilitarismo estas diriam respeito, principalmente, ao desrespeito aos 
“direitos individuais”. 
 
O princípio do “maior benefício para o maior número” acabaria, no limite, impondo 
uma “ditadura da maioria”. Para continuar com Sandel, “a lógica utilitarista, se aplicada de 
forma consistente, poderia sancionar a violação do que consideramos as normas 
fundamentais da decência e do respeito no trato humano.” (2012, p, 51.) 
 
Para ilustrar isso, examinemos o exemplo destacado pelo mencionado autor: 
 
(...). Consideremos uma situação na qual uma bomba-relógio está por explodir. 
Imagine-se no comando de um escritório local da CIA. Você prende um terrorista 
suspeito e acredita que ele tenha informações sobre o dispositivo preparado para 
explodir em Manhattan dentro de algumas horas. Na verdade, você tem razões 
para suspeitar que ele próprio tenha montado a bomba. O tempo vai passando e 
ele se recusa a informar onde a bomba foi colocada. Seria certo torturá-lo até que 
ele diga onde está a bomba e como fazer para desativá-la? 
O argumento a favor da tortura nesse caso começa com um cálculo utilitarista. A 
tortura inflige dor ao suspeito, reduzindo muito sua felicidade e utilidade. Mas 
milhares de inocentes morrerão se a bomba explodir. Assim, você pode 
argumentar, nos termos do utilitarismo, que é moralmente justificável infligir dor 
intensa a uma pessoa se isso evitar morte e sofrimento. (SANDEL, 2012, pp 52-
53.) 
 
Embora seja possível encontrar quem defenda a tortura, de modo geral, e como um 
princípio fundamental, a sociedade global a rejeita. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
 
A revisão crítica da perspectiva inaugurada por Bentham, no sentido de aproximá-
la de outros princípios que ganharam força ao longo do século XIX, mais inclusivos 
surgidos em razão das desigualdades extremas observadas no desenvolvimento da 
sociedade industrial e urbana na Europa, influenciou o pensamento do também utilitarista 
Stuart Mill. 
 
O pai de Stuart, James Mill, era amigo, colega e discípulo de Bentham. Stuart, 
educado na tradição utilitarista pelo próprio pai em casa, tornou-se um revisor crítico de 
parte dos pressupostos utilitaristas. 
 
Seu objetivo foi conciliar os princípios utilitaristas e os direitos e liberdades 
individuais. A preocupação com estes revela-se de forma sincera na obra de Stuart Mill. 
Foi um defensor de mais direitos para os trabalhadores, defendeu direitos e igualdade 
para as mulheres, foi um intransigente porta voz da liberdade de imprensa. 
 
Na sua revisão o princípio do cálculo de quanto de benefícios as escolhas e ações 
trazem permanece. Mas deve-se considerar que alguns prazeres são “mais elevados que 
outros” e isto deve ser levado em conta. Além disso, a utilidade deve ser pensada a longo 
prazo. 
 
A título de ilustração tomemos o seguinte exemplo, uma unidade fabril, se instalada 
numa determinada região, a curto prazo, trará empregos e gerará riqueza. Mas vamos 
supor que sua atividade a médio e longo prazos produza danos irreversíveis para o meio 
ambiente a ponto de ameaçar a vida das pessoas no entorno. Se fizermos este cálculo 
veremos então que o quanto de riqueza que a unidade gerar no curto prazo não 
compensará os efeitos negativos no longo prazo. Além disso, considerando que para as 
pessoas, de modo geral, a preservação da vida tem mais importância que a geração de 
riqueza, esta última seria um “prazer menor” comparado com o gerado pela primeira. 
Nesta perspectiva, a “utilidade” das escolhas e ações a longo prazo e o “maior benefício” 
que elas proporcionam é a instância final para considerá-las éticas. (SANDEL, 2012, p. 
64.) 
 
Neste ponto é importante ressaltar que para Mill a avaliação das consequências só 
pode ser feita por sujeitos livres de fato. Daí a insistência dele na defesa das liberdades, 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
incluindo a de pensamento e expressão. Ou seja, também para Mill só os sujeitos morais, 
aqueles que refletem sobre escolhas e ações, é que são capazes de avaliar as suas 
consequências. 
 
Mas para que os sujeitos desenvolvam sua capacidade de julgar necessitam de um 
ambiente que favoreça a liberdade e estimule-os a pensar: 
 
As faculdades humanas de percepção, julgamento, sentimento, discriminativos, 
atividade mental e até mesmo a preferência moral só são exercitadas quando se 
faz uma escolha. Aquele que só faz alguma coisa porque é o costume não faz 
escolha alguma. Ele não é capaz de discernir nem de desejar o que é melhor. As 
capacidades mentais e morais, assim como as musculares, só se aperfeiçoam se 
forem estimuladas (...). Quem abdica de tomar as próprias decisões não necessita 
de outrafaculdade, apenas da capacidade de imitar, como os macacos. Aquele 
que decide por si emprega todas as suas faculdades. (MILL apud SANDEL, 2012, 
p. 66.) 
 
Além de Smith e dos utilitaristas há muitos outros pensadores modernos nos quais 
encontraremos reflexões sobre a Ética e moral. Mas não nos será possível tratar de todos 
eles, e também fugiria aos objetivos de nosso curso. No entanto, para encerrar esta 
introdução à questão da Ética na modernidade, trataremos no próximo tópico de mais 
uma perspectiva. 
 
3.3. “A coisa certa a fazer” em Kant 
Kant foi um filósofo do século XVIII, prussiano, da região que hoje integra a 
Alemanha. Para examinarmos e compreendermos a perspectiva ética neste pensador 
começaremos explicando, um a um, três de seus pressupostos: 
 
1- Somos seres racionais e, portanto, merecedores de dignidade e respeito 
O que se pode depreender deste primeiro é que todos nós, uma vez que somos 
racionais, merecemos respeito e devemos ser tratados com dignidade. Este pressuposto 
fundamenta o “imperativo categórico” da dignidade humana no qual se baseiam os 
direitos humanos universais. Se todos devemos ser tratados tal como determina o 
princípio elencado, tortura, maus tratos, desprezo, iniquidades não são admissíveis, em 
nenhuma situação e para ninguém. 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
2- A moralidade não pode se basear em interesses, vontades, desejos e 
preferências (agir com base em desejos é “obedecer” a eles, ser escravizado por 
eles). 
Se somos racionais, portanto capazes de pensar e avaliar, tanto mais moral será 
nossa ação quanto mais racional ela for porquê de acordo com a nossa verdadeira 
“natureza”. Agir de outra forma, seguindo um desejo, uma vontade, é contrariar este 
princípio. A minha escolha e a ação decorrente dela só serão morais se de acordo com a 
razão 
 
3- Moralidade é agir de acordo com a liberdade de se impor as suas próprias 
leis (agir com autonomia e não com heteronomia). 
Este pressuposto é uma consequência do segundo. Também para Kant o “sujeito 
moral” é o que age de acordo com sua livre e própria determinação, ou seja, o que age 
com “autonomia”. Quem age de outro modo, tendo em vista ordens ou vontades externas, 
ou mesmo para atender seus desejos de recompensa, vaidade, prazer, age com 
heteronomia ainda que faça a coisa certa. 
 
Vejamos o seguinte exemplo. Uma criança de cinco anos que ainda não conhece 
as operações matemáticas básicas vai à padaria com uma nota de R$20,00. Faz uma 
compra de R$6,00. Vamos supor que o (a) proprietário (a) do estabelecimento esteja no 
caixa. Ele (a) poderia dar o troco errado que a criança não notaria. No entanto não o faz 
porque teme que alguém veja, ou que os pais da criança percebam ameaçando sua 
reputação. O (a) proprietário (a) ao dar o troco certo faz o que deveria ser feito, mas pela 
motivação “errada”, ou seja, o resultado é certo, mas a ação, avaliada do ponto de vista 
da motivação, não é moral. 
 
Isto pode ser aplicado ainda a outras situações como a da Responsabilidade Social 
em empresas. Muitas vezes estas são questionadas, considera-se que as que agem de 
forma socialmente responsável só o fazem para proteger sua reputação. Se esta for de 
fato a motivação, também de acordo com a perspectiva de Kant, tais ações podem ser 
classificadas como boas, mas não como morais porque são “heterônomas”, não estão de 
acordo com a vontade “autônoma” dos indivíduos, no caso os dirigentes das 
organizações, mas porque servem ao seu desejo de preservar a imagem ou a marca. 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Na avaliação de nossas ações devemos, de acordo com Kant, orientar-nos pelo 
imperativo categórico. Em termos práticos isto significa o seguinte, devemos 
“universalizar” as nossas ações para ver quanto elas estão de acordo com os nossos 
desejos ou de acordo com os nossos princípios. 
 
Um exemplo, temos um compromisso previamente agendado. Mas 
conscientemente e por vontade própria escolhemos que vamos nos atrasar porque, 
naquele dia, não estamos muito dispostos. Para julgar se esta é uma “boa ação” no 
sentido kantiano devemos proceder à seguinte avaliação: ao me atrasar hoje, por um 
motivo fútil, apenas para atender a minha própria disposição, eu sinalizo para o mundo e 
para mim mesmo (a) que acho correto que as pessoas se atrasem para seus 
compromissos porque não estão muito dispostas. Se considerarmos que esta é uma 
razão justa, aplicável a todos e não só a nós, então a tomaremos como moral. Mas se 
entendermos que universalmente ela não seria aceitável, tampouco o será para nós. 
 
Para terminar de ilustrar que a moral em Kant é “fazer a coisa certa, porque é o 
certo a fazer”, tomemos um trecho do professor Renato Janine Ribeiro em palestra 
proferida no Congresso de Educação para a Cidadania, organizado pelo Serviço Social do 
Comércio de São Paulo. 
 
Kant tem uma idea mojito boa, (…), que é a sanguine: quando eu ajo, eu devo agir 
de modo tal, que a minha ação constitua uma máxima universal. Vamos tentar ver um 
pouco o que isto quer dizer. Isto quer dizer que se eu passo no sinal vermelho estou 
fazendo que essa minha ação constitua uma máxima universal, ou seja, eu estou 
declarando para toda Humanidade que é bom, que é correto e até recomendável passar no 
sinal vermelho. Se eu mato uma outra pessoa, eu estou proclamando que é recomendável 
matar outras pessoas, idem furtar, roubar, etc. Não há ação então que eu possa caracterizar 
como sendo apenas minha, como sendo meu privilégio. Toda ação que eu pratico, por ela 
eu autorizo outras pessoas a praticarem iguais, é óbvio que, dito os exemplos que eu 
elenquei, já decorre que é impossível convivência desse jeito. Se nós agirmos assim, então 
se eu passar no sinal vermelho, autorizando todos outros a passarem no sinal vermelho, 
vou acabar sendo batido. 
 
Encerramos aqui este pequeno panorama da Ética na modernidade. No próximo 
item trataremos de um outro aspecto da sua compreensão a partir da análise da relação 
com a Política. 
 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
4. ÉTICA E POLÍTICA 
 
Norberto Bobbio, pensador e teórico italiano, afirma em sua obra “Elogio à 
Serenidade”, que as teorias que se dedicaram ao estudo da relação entre Ética e Política 
podem ser divididas em dois grandes grupos: as teorias monísticas, que consideram que 
Ética e Política fazem parte de um mesmo sistema moral; e as dualísticas que as julgam 
como integrantes de sistemas morais distintos. 
 
Mas dentro destes dois grupos, nos quais encontramos teóricos diversos, há outras 
divisões. As teorias monísticas se dividem em monismo rígido e o flexível, as dualísticas 
em dualismo aparente e o real. 
 
Mas antes de proceder à explicação de tais teorias e relações, é preciso esclarecer 
o uso dos termos “Ética” e “Política” em Bobbio. Na obra mencionada, Ética surge 
algumas vezes significando “moral”, sendo que esta, ao longo do livro, pode ser a moral 
individual e a pública. Política aparece em alguns pontos como dizendo respeito à arte ou 
“ciência da convivência”, ou como o que tem lugar na vida pública. 
 
“Monismo rígido” corresponde ao que encontramos em certos autores como Kant e 
Hobbes. Para tais autores a Ética é uma só, a que rege a vida privada, rege também a 
vida pública. Isto quer dizer que aquilo que consideramos como certo, moral, lícito, justo, 
tanto vale para a vida cotidiana e para a pública, seja como cidadãos, ou no espaço da 
casa, ou como governantes. Este é o ponto em comum entre os dois autores citados, 
mas, por outro lado, “monistas rígidos” podem divergir sobre um aspecto fundamental. 
 
Para Kant, por exemplo, como vimos o princípio que orienta minha ação, qualquer 
que ela seja, é o mesmo que considero que deve orientar a de todos os outros. Então seconsidero que mentir é errado, assim considerarei para qualquer um e em qualquer 
situação. Por exemplo, vamos supor que você seja um (a) dirigente do Banco Central do 
Brasil. Você sabe que nos próximos dias deverá ser decretada intervenção na instituição 
financeira X. Numa coletiva de imprensa alguém lança a pergunta: “Senhor (a) dirigente, é 
verdade que o Banco Central intervirá na instituição X?” Se você se orientar pelo 
monismo rígido de Kant dirá a verdade ainda que isto implique em consequências 
terríveis como por uma corrida dos correntistas daquela instituição para sacar o dinheiro, 
gerando inúmeros problemas. Este é um exemplo que implica consequências terríveis. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Mas podemos citar um outro com consequências mais positivas. Se eu considero 
que matar é errado, orientando-me pela perspectiva de Kant, considerarei que assim o é 
tanto na vida pessoal, quanto na vida e espaço públicos. Desta forma, supondo que eu 
seja um governante e me oriente deste modo, não determinarei nem autorizarei a morte 
de ninguém, o que costuma ser considerado como bastante positivo. 
 
Já o monismo rígido em Hobbes e outros pode ser bem diferente. Neste caso o que 
vale é o que determina o Estado. Então se a lei ou aquele que representa o Estado 
considera que é lícito matar pessoas que atentem contra a propriedade privada, também 
na dimensão individual e cotidiana assim será. No entanto, se o Estado considerar que 
pessoas que atentam contra a propriedade privada devem ser condenadas à morte, mas 
que a execução da pena cabe exclusivamente aos agentes do Estado, então na dimensão 
pessoal consideraremos que a pena de morte deve ser aplicada nestes casos, mas que 
nós, cidadãos comuns, não podemos de forma alguma executá-la. De acordo com esta 
perspectiva, o cidadão só tem autonomia para fazer suas próprias escolhas de acordo 
com os seus próprios princípios sobre aquilo que o Estado cala. 
 
O monismo flexível também implica o princípio de que há um único sistema moral e 
ele será o mesmo para a vida comum e para a pública. Mas, em algumas situações muito 
especiais podemos “flexibilizar” os princípios. Por exemplo, neste sistema podemos ter o 
princípio de que “matar é errado” em qualquer situação. No entanto, o monismo flexível 
considera que, em algumas situações, como a de uma ameaça externa contra o Estado, é 
possível flexibilizar neste princípio. 
 
Uma outra situação para ilustrar melhor a questão. A tortura é nos dias de hoje, de 
modo geral, uma atitude condenável tanto aos olhos dos indivíduos quanto também dos 
sistemas que regem os Estados. Mas, de acordo com o monismo flexível, em certas 
situações e em nome de um “bem maior”, como por exemplo proteger as pessoas de uma 
ameaça terrorista, considera-se que por uma “razão de Estado”, a tortura para extrair 
informações com vistas a proteger os cidadãos possa ser praticada. Uma “lei especial” 
derroga uma “lei mais geral”. 
 
De acordo com Bobbio, esta “derrogação” é a base para as Éticas profissionais. 
Tais códigos ou sistemas de normas por vezes dispõem condutas mais rigorosas ou mais 
flexíveis, especiais para os que exercem uma determinada atividade. Um exemplo é a 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
“mentira caridosa do médico”. Os códigos profissionais determinam que os sujeitos 
sempre exerçam sua prática de acordo com os mais altos princípios de honestidade. No 
entanto, vamos supor que um médico tenha um paciente em estado terminal. O 
profissional sabe que o doente vai morrer, que não há chance alguma. Sofrendo, 
agonizando, o paciente pergunta: “Doutor, eu vou morrer?” O médico sempre poderá dizer 
honestamente que sim. Mas se ele optar por responder de modo a oferecer alguma 
esperança ou alívio para o paciente, dizendo algo como: “Enquanto a vida há esperança.” 
Tal atitude não será condenável, posto que agiu com o intuito de minimizar o sofrimento 
do seu paciente o que é mais importante e nobre do que dizer a absoluta verdade neste 
caso. 
 
Vejamos agora as implicações do “dualismo aparente”. Nesta linha estão os 
autores e pensadores que consideram que há dois sistemas morais, um que diz respeito à 
ética pública, e outro que se refere à vida privada. No entanto, como o próprio nome desta 
vertente indica, estes sistemas são aparentemente “independentes”. Entre eles haveria 
uma ordem hierárquica. Isto significa dizer que, para alguns dos autores que defendem tal 
teoria, o “moral” no sentido do que se refere à vida comum seria superior ao “político”, ou 
seja, ao sistema que governa a vida pública. Mas há também aqueles autores que 
consideram o contrário, ou seja, o “político” seria superior ao “moral”. 
 
Observemos um exemplo de como isto se processa na prática de acordo com 
Hegel, filosofo alemão dos séculos XVIII – XIX. Para esse pensador o sistema político 
seria superior ao moral. Isto é, os valores que governam a vida cotidiana seriam 
“inferiores” aos da vida pública. A nossa vivência comum, privada nos educa de alguma 
forma, mas a educação verdadeira, o sentido superior de moral e o desenvolvimento 
pleno do nosso “espírito” só se dá a parir da vivência como cidadãos que compartilham os 
valores mais amplos. Deste modo, considerando que a moral privada julga errado matar 
alguém, se, num determinado momento, nós, quando chamados a pegar em armas pelo 
poder que nos governa contra um inimigo comum, aquela interdição, “não matar”, cede 
para atender a “missão histórica que o Estado exige”. 
 
Neste ponto você deve estar se perguntando em que isto seria diferente do 
“monismo flexível”. A diferença está em que o dualismo aparente considera que existem 
dois sistemas, embora um seja mais importante que o outro. O monismo flexível não 
reconhece duas éticas, só uma. Mas leva em conta o fato de que no exercício de 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
determinadas funções, exigências maiores, ou de outro lado, normas mais flexíveis 
podem ter lugar. Mas só naquele momento, para aquela situação muito específica. 
 
Por fim vejamos o dualismo real que, na perspectiva de Norberto Bobbio parece ser 
o que melhor descreve a natureza da relação entre Ética e Política. 
 
O dualismo real, ou seja, a teoria que considera que há dois sistemas distintos, um 
que diz respeito à vida cotidiana e privada dos homens, ou dos cidadãos comuns, e outro 
que orienta os que governam, tem suas origens no pensamento de Nicolau Maquiavel. 
 
Este pensador, como já mencionado, florentino dos séculos XV e XVI, viveu numa 
das “cidades-república” da região que hoje compõe a Itália, é considerado um dos 
fundadores do pensamento político moderno. 
 
Maquiavel parte de uma constatação, os homens são egoístas, maus e toda 
sociedade caminha para a desordem. A história, principalmente a vivida por Maquiavel na 
sua Florença natal, mostra que há um ciclo permanente de ordem e caos. Portanto, a 
grande inquietação de Maquiavel e de outros pensadores um pouco antes dele, já que o 
florentino filia-se à tradição do pensamento humanista italiano anterior, era exatamente 
como romper tal ciclo. 
 
Maquiavel sofreu na própria pele as agruras da instabilidade política. Diplomata, 
quando de uma das mudanças drásticas no comando da cidade, perdeu seu posto, 
posses e honras. Foi preso, torturado e exilado. No ostracismo pretendeu se aproximar 
dos novos governantes, mais especificamente de Lorenzo de Médici a quem dedicou sua 
obra mais conhecida, “O Príncipe”. A despeito de seus esforços terminou a vida no 
ostracismo, muito embora tenha escrito obras consideradas fundamentais para o 
entendimento do pensamento moderno. 
 
Alguns dos principais aspectos do pensamento de Maquiavel a respeito da relação 
Ética e Política são os seguintes: 
 
a) A natureza davida privada é uma, a da vida política é outra. Enquanto cada um de 
nós está preocupado com a própria segurança e dos que nos são mais caros, o 
governante deve ocupar-se da “cidade”. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
b) Considerando-se o objetivo final da vida política, a garantia da ordem para todos, 
as ações políticas terão uma natureza diferente das ações comuns e privadas. 
Portanto o conjunto de virtudes que orientam tais ações também será diferente do 
que pensamos como sendo “virtuoso” na vida cotidiana. 
 
Alguns exemplos práticos. Cabe ao governante a defesa da cidade. Se ela for 
atacada ele deverá rechaçar o ataque e revidá-lo. Isto implica em organizar forças, liderar 
exércitos, dar ordens para matar. Algumas destas ações seria recomendável na nossa 
vida privada ou para o homem comum? Ainda que pensemos que “temos o direito de 
defender nossa família e a nós mesmos”, devemos organizar forças, liderar grupos e sair 
por aí caçando e matando quem julgamos que ameaça a nossa segurança em particular? 
 
Uma outra situação. É consenso que mentir é errado e que devemos falar sempre 
a verdade. Voltemos a um exemplo já dado, o que se refere à posição de um (a) dirigente 
do Banco Central quando inquirido (a) sobre a possibilidade de intervenção numa 
instituição financeira que ele (a) sabe que ocorrerá. Se falar a verdade certamente 
provocará uma corrida aos bancos, não só ao que sofrerá a intervenção, pois a 
desconfiança pode comprometer a sensação de segurança que os investidores todos 
precisam. Portanto, a “virtude” da franqueza, da honestidade, de nunca faltar com a 
verdade que é adequada e aprovada para o homem comum, não o seria para aqueles 
que ocupam uma posição no comando de uma instituição que é parte da “ordem”. 
 
Um outro pensador que se soma a Maquiavel na defesa da perspectiva de que 
existem “duas Éticas” é Weber. Para este autor, no entanto, embora considere a 
existência de dois sistemas, ele não aponta a exclusividade de um deles de servir à 
política ou à vida privada. 
 
Max Weber, pensador alemão dos séculos XIX e XX, identificou no agir humano 
quatro tipos de ação: 
 
1- A ação racional com relação a um valor (princípio); 
2- A ação racional com relação a um fim (objetivo); 
3- A ação orientada pelos afetos (instintos); 
4- A ação orientada pela tradição. 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Note que as duas últimas não são consideradas racionais. Se considerarmos que 
as ações éticas são próprias dos “sujeitos morais” que agem com autonomia e, portanto, 
de acordo com a razão, veremos que só poderão ser consideradas “éticas” de acordo 
com Weber as duas primeiras. 
 
À orientação por princípios ou valores, dá-se o nome de Ética da Convicção e seria 
considerada por muitos como mais própria do cidadão comum. Os sujeitos quando agem 
deste modo, independente das consequências de suas ações, não abrem mão de seus 
princípios. Se eu tenho por princípio, estabelecido por mim racionalmente, ou seja, de 
acordo com a minha própria reflexão, não mentir em nenhuma situação, e ajo sempre 
orientado (a) deste modo, isto significa que mesmo em situações nas quais as 
consequências de falar a verdade podem ser complicadas, independente delas agirei 
conforme este valor estabelecido. 
 
Vamos supor que um amigo tenha se envolvido num acidente que testemunhei e a 
responsabilidade seja de fato dele. Este amigo pede que eu minta em juízo em seu favor 
porque pode ser punido. Se eu tenho por princípio não mentir, orientado por esta minha 
convicção, independente das consequências que isto possa ter para ele, direi a verdade. 
 
Já à orientação por objetivo ou fim dá-se o nome de “Ética da Responsabilidade”. 
Nesse caso o sujeito age racionalmente tendo em vista o objetivo final de suas ações e 
avaliando as consequências de seus atos, quanto eles poderiam colaborar ou 
comprometer o alcance do resultado. Esta avaliação pode implicar a “flexibilização” de 
um princípio. Agir deste modo está associado ao espaço público, ou seja, seria uma 
“ética mais própria dos governantes”. Por exemplo, voltemos ao valor de sempre falar a 
verdade que parece de modo geral um bom princípio. Na situação hipotética já dada do 
(a) dirigente do Banco Central, o sujeito pode considerar que, naquele caso, o melhor 
será orientar-se por um “fim”, qual seja, o de preservação da confiança de investidores e 
correntistas já que falar a verdade, naquela situação, colocará toda a ordem financeira e 
social em risco. Mas isto se aplicaria também ao exemplo do amigo que pode ser 
condenado pelo meu testemunho? Ou seja, seria ético neste caso mentir? Se mentir em 
favor do amigo significa, no limite, como consequência final, colaborar para a impunidade 
geral, o que você faria? 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Weber conclui a respeito das “duas Éticas” que o homem verdadeiramente sábio 
e/ou grande político não age de acordo só com uma ou só com a outra. Segundo ele, 
como parte da conclusão de sua obra “Ética e Política, duas vocações”, os que se 
orientam exclusivamente pelas convicções são os “fanáticos”, e os orientados 
exclusivamente pelos fins são os cínicos”. 
 
Mas se assim for, como saber qual a melhor forma de agir? Caberá a cada um 
avaliar o quanto a flexibilização de um princípio pode afastá-lo ou não de sua identidade, 
ou de uma causa à qual esteja ligado. Da mesma forma julgar se o fim que pretendemos 
é legítimo e quanto nossas ações de fato colaboram para que ele seja alcançado ou se 
elas o colocam em risco. Para concluirmos este tópico, imaginemos o seguinte: Quando 
alguém adultera o balanço da empresa para evitar que ela perca mercado, poderíamos 
considerar que o fim último, assegurar o valor da empresa é um objetivo legítimo. No 
entanto, mentir sobre sua situação financeira, maquiá-la, pode, se a operação for 
descoberta, comprometer para sempre sua imagem, portanto, uma ação que, no limite, 
ameaça o fim. 
 
Analisando a mesma situação de acordo com a orientação da ética da convicção. A 
preservação da situação momentânea da empresa justifica que eu me afaste de modo 
irreparável de um princípio fundamental do exercício da atividade, qual seja, a 
honestidade? 
 
Para concluirmos com Norberto Bobbio, a Ética política 
 
É a ética de quem exerce a atividade política, mas a atividade política na 
concepção de quem argumenta partindo da consideração da ética profissional não 
é o poder em si, mas o poder como condição para o alcance de um fim que é o 
bem comum, ou o interesse coletivo ou geral. (…) bom governo é aquele de quem 
persegue o bem comum, mau governo é o de quem persegue o próprio bem. 
(2002, p. 80.) 
 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
5. ÉTICA EMPRESARIAL 
 
Já há algum tempo, não pouco, constituiu-se consenso em torno da necessidade 
de as empresas serem “éticas”. Como visto anteriormente isto requer que elas sejam mais 
do que “obedientes à lei”, porque atuar de acordo com a legislação nem sempre garante 
moralidade e ética a uma ação. 
 
Para retomarmos esta noção, lembremos que “nem tudo que é ético é lei, nem tudo 
que é lei é ético.” A Ética corresponde a normas formais ou informais e que dizem 
respeito aos valores, princípios, a uma certa ideia de felicidade, de justiça aderidos e 
compartilhados por indivíduos e sociedades. 
 
As leis muitas vezes remetem a tais princípios e ideias, mas não necessariamente. 
Há leis que podem determinar direitos que reproduzam ou levem a injustiças. Por 
exemplo, uma legislação que seja tolerante ou flexível quanto ao uso da mão de obra 
infantil ou no que se refere ao estabelecimento dos limites para as jornadas de trabalho, 
pode levar a situações de exploração do trabalho de crianças, ouà submissão de 
trabalhadores à intensa exploração. 
 
Existem ainda outras razões que fizeram com que, nos últimos anos, aumentasse a 
cobrança a respeito da Ética nas organizações e muitas delas empenharam esforço e 
tempo afim de corresponder a tais expectativas. Não que esta nunca tenha sido uma 
preocupação na maioria das organizações. Afina, l a preocupação com o “agir ético” como 
vimos até aqui é uma constante nas sociedades. O que muda é o que ele significa. 
 
Sob este aspecto, algumas coisas mudaram no âmbito das organizações nas 
últimas décadas do século XX e na primeira deste. Com uma atuação mais global, num 
mundo em que as informações são cada vez mais compartilhadas em tempo real, a 
ocorrência de um escândalo numa empresa, ou o seu envolvimento em algum episódio 
que provoque desgaste à imagem tem sempre uma rápida e grande repercussão, 
produzindo abalos não só na confiança ou percepção que consumidores têm de suas 
marcas, mas, principalmente, abalando a confiança de mercados e investidores. 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
E por que a reputação de uma empresa é tão importante para investidores e 
mercados? Porque escândalos, muitas vezes, implicam em punições que podem produzir 
multas e prejuízos. E isto, sem dúvida, interfere diretamente na confiança de investidores. 
 
No entanto, a despeito de grandes e em alguns casos, terríveis consequências, os 
escândalos nas empresas persistem. Por que isto ocorre? 
 
Temos algumas respostas colhidas em diferentes autores. Para uma determinada 
linha a persistência dos escândalos diz respeito ao fato de que as empresas enxergam e 
praticam a ética empresarial como um instrumento para garantir a confiança de mercados 
e investidores, além de satisfazer governos. Portanto não a enxergam como um objetivo 
final. Isto é, a Ética seria no âmbito das organizações um instrumento para garantir mais 
lucro ou evitar prejuízos, mas não por ser a “coisa certa a fazer”, ou para gerar o “maior 
benefício para o maior número”. 
 
Alguns autores, como Meira no artigo “A ética empresarial em movimento: as (de) 
limitações de campo. “, disponível na web2, chamam a atenção para o fato de que esta 
visão que predomina no ambiente empresarial se deve à crença na “perfectibilidade do 
sistema”, ou seja, de que o Mercado funciona perfeitamente, e de que sobre seus agentes 
e práticas não caberia um julgamento moral. Isto significa dizer que entre a maioria dos 
responsáveis pelas organizações e agentes econômicos, existe um consenso em torno da 
objetividade prevalecente nas suas ações. Todas seriam determinadas pela razão fria e 
objetiva e, por isto, não sujeita a avaliações morais. 
 
Mas nem todos compartilham de tal consenso. Autores como Solomon, Giannetti, 
Sen e outros, entendem que não nos movemos exclusivamente por critérios objetivos e 
que, ainda que consideremos o auto-interesse como principal motivação, este não o é 
sempre e todo o tempo o único. Um exemplo, destacado na obra “Vícios privados, 
benefícios públicos?” De Eduardo Giannetti, está no depoimento de Akio Morita ex-
presidente da Sony. 
 
 
2Disponíve l em: 
h t tp : / /u f rgs .academia.edu/Fab ioMei ra /Papers /565116 /A_et ica_empresar i a l_em_mov imento_as_de_l im i taco
es_do_campo. Acesso em: 06 /10/19. 
about:blank
about:blank
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Não existe um ingrediente secreto ou fórmula oculta responsável pelo sucesso das 
melhores empresas japonesas. Nenhuma teoria ou plano ou política de governo 
fará de um negócio um sucesso. Isso só pode ser feito pelas pessoas. A mais 
importante missão para um administrador japonês é criar um relacionamento 
saudável com seus funcionários, um sentimento de família dentro da corporação, 
um sentimento de que funcionários e administradores compartilham do mesmo 
destino. […]. Se você deseja uma eficiência e produtividade elevadas, uma relação 
próxima e cordial com seus funcionários […] é necessária. Algumas vezes é mais 
importante gerar um senso de afinidade do que qualquer outra coisa, e algumas 
vezes você precisa tomar decisões que são tecnicamente irracionais. Você pode 
ser totalmente racional com uma máquina. Mas, se você trabalha com gente, 
algumas vezes a lógica tem que dar lugar à compreensão. […] Na Sony nós 
aprendemos que o problema com um funcionário que está acostumado a trabalhar 
só pelo dinheiro é que ele com frequência se esquece de que se espera que ele 
trabalhe para o grupo; essa atitude auto-centrada de trabalhar só para si próprio e 
sua família, excluindo seus co-trabalhadores e a empresa, não é saudável. 
(MORITA apud GIANNETTI, 1993, p. 162-163.) 
 
A este depoimento devemos acrescentar um outro relato, este de Vabo Jr, sobre a 
empresa Amazon em artigo para o site Endeavor: 
 
A cultura organizacional da Amazon é a chave quando se pretende comparar o 
sucesso dela com outras empresas. Desde o processo de contratação, procura-se 
deixar muito claro que as pessoas e a cultura são prioridade, quais são as regras 
do jogo e como as coisas são feitas. 
Mesmo que a pessoa seja muito talentosa, não fica se não for “culture fit”. Fica 
clara a diferença entre os missionários e os mercenários. Os missionários são 
aqueles que entendem o propósito da companhia, acreditam no projeto e se 
comprometem. Já os mercenários são aqueles apenas interessados no objetivo 
financeiro de curto prazo. 
Na Amazon, paixão continua sendo a força-motriz. Uma prática que possuem é 
frequentemente oferecer dinheiro a funcionários para deixarem a companhia. 
Desta forma, ficam apenas os “believers”.3 
 
O que os trechos destacados demonstram é que a subjetividade importa. No 
entanto, em muitas organizações tem prevalecido uma visão assentada em princípios 
neoliberais, como os que se pode extrair da citação de Milton Friedman, economista 
norte-americano, ganhador do prêmio Nobel em Ciências Econômicas: 
 
Poucas tendências poderiam minar de forma tão completa as próprias fundações 
de nossa sociedade livre do que a aceitação, por parte dos executivos, de uma 
outra responsabilidade social que não seja a de ganhar o máximo possível de 
dinheiro para seus acionistas. (FRIEDMAN apud NASH, 2003, p. 54.) 
 
Friedman e outros representam o grupo que coloca a questão do lucro como sendo 
a única responsabilidade das organizações. Deste modo, elas não estariam erradas em 
considerar a Ética como um instrumento e não como um fim. 
 
3 6 l i ções que aprend i na sede g loba l da Amazon. Endeavor , 19 /11/14 . D isponíve l em: 
h t tps : / /exame.ab r i l . com.b r / pme/6 - l i coes -que-ap rend i -na-sede -g loba l -da -amazon / . Acesso em: 06/10/19 
about:blank
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
No entanto, a medida em que cresce o consenso da sociedade global em torno da 
sustentabilidade, desenvolvimento sustentável, todas as medidas que precisam ser 
tomadas para que sejam alcançados como a preservação ambiental, redução da pobreza, 
transparência das informações fornecidas pelas organizações para garantir a confiança 
de mercados e consumidores, mais intolerantes pessoas e governos têm se mostrado 
com práticas empresariais antiéticas. 
 
Para ilustrar como isto tem se dado, em 21 de setembro de 2015 as ações da 
empresa Volkswagen despencaram 20% no que foi considerada a “sua maior queda 
diária”, em razão da empresa ter sido acusada nos EUA de usar um software nos carros a 
diesel e nos modelos Audi que produzia dados falsos sobre a emissão de poluentes, 
burlando, deste modo, a fiscalização, tendo que arcar com multas bilionárias.4 
 
Acrescentamos a este exemplo o da Petrobras que, em abril de 2015, calculou em 
R$ 6,194 bilhões as perdas por corrupção e reduziu o valor de seus ativos em R$ 44,3 bilhões. 
Esta situação, somada à queda internacional dos preçosdo petróleo, fez com que a empresa 
nos nove primeiros meses do ano de 2015, tivesse uma queda no lucro líquido de 58% em 
relação a 2014. 
 
Para terminar este tópico, citemos um outro prêmio Nobel de economia, o indiano 
Amartya Sen, sobre o quanto as liberdades que interessam ao desenvolvimento não são só as 
de mercado, enfatizando deste modo que as reflexões morais devem incidir também sobre as 
questões econômicas afim de promover não só o lucro dos acionistas, mas a prosperidade de 
todos. 
 
As liberdades não são apenas os fins primordiais do desenvolvimento, mas 
também os meios principais. Além de reconhecer, fundamentalmente, a 
importância avaliatória da liberdade, precisamos reconhecer a notável relação 
empírica que vincula, umas às outras, liberdades diferentes. Liberdades políticas 
(na forma de liberdade de expressão e eleições livres) ajudam a promover a 
segurança econômica. Oportunidades sociais (na forma de serviços de educação 
e saúde) facilitam a participação econômica. Facilidades econômicas (na forma de 
oportunidades de participação no comércio e na produção) podem ajudar a gerar a 
abundância individual, além de recursos públicos para os serviços sociais. 
Liberdades de diferentes tipos podem fortalecer umas às outras. (SEN, 2010, pp-
25-26) 
 
 
4 A es te respe i t o e sobre prá t icas ant i é t i cas d e out ras empres as e i nves t ido res há uma sé r ie , 
“D i r t y Money” , de 2017, d i sponíve l para os ass inantes de um serv iço de s t reaming. 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
Encerramos este tópico concluindo que a Ética tem hoje nas organizações 
empresariais, seja pela razão que for, uma centralidade muito maior do que há décadas 
atrás. Por isso, torna-se muito importante refletir sobre ela no contexto das empresas e 
das ações dos profissionais que nelas atuam. 
 
Além disso, aproveitando a citação de Sen, também as liberdades colaboram para 
o desenvolvimento de sociedades, mercados e organizações. Tais liberdades estão na 
essência da Cidadania, nosso próximo assunto. 
 
 
 
 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
6. CIDADANIA 
 
A noção de cidadania existiu mesmo em civilizações muito anteriores, como é o 
caso das civilizações ditas clássicas, a grega e a romana. No entanto, do ponto de vista 
dos nossos estudos, o que nos interessa é a noção moderna de cidadania, ou seja, a que 
vem se desenvolvendo desde o século XVIII. 
 
Tal noção remete, portanto, à modernidade ocidental da qual já tratamos em 
tópicos anteriores. No entanto, é importante aqui relembrar e acrescentar alguns pontos: 
 
1- A modernidade corresponde ao processo de ruptura com a antiga sociedade de 
ordens que teve lugar no Ocidente, representada não só pela sociedade feudal, 
como também pela rígida estratificação, manutenção de privilégios e forte 
limitação das liberdades características do absolutismo. 
2- A ruptura foi sendo construída a partir de importantes movimentos como o 
Iluminismo, movimento intelectual do século XVIII de caráter humanista, 
racional e progressista. Este movimento deu origem a novas ideologias que 
reproduziram suas características essenciais. 
3- Dentre os princípios do Iluminismo, enfatizados por ideologias como o 
Liberalismo, está a valorização do indivíduo entendido como portador de 
direitos e liberdades fundamentais. 
4- A modernidade rompe então com a ideia de “súdito” e a substitui pelo 
“cidadão”. Diferentemente do primeiro, o segundo é livre e, ainda que 
submetido a um Estado e governo, sua obediência se fundamenta no 
consentimento e não na obrigação. 
5- O consentimento se expressa na obediência e respeito à autoridade em troca 
da proteção e segurança que o Estado e os governos que se revezam na sua 
gestão devem aos indivíduos. 
6- Estabelecem-se, portanto, compromissos mútuos. Ao Estado cabe garantir e 
proteger os direitos e liberdades individuais, os cidadãos em troca obedecem. 
O não compromisso de um dos lados pode implicar na “quebra do contrato” e 
aí então estariam ambos sujeitos às consequências de tal ruptura. 
 
Mas quais seriam exatamente os direitos e liberdades que o cidadão tem? A noção 
moderna de Cidadania envolve direitos de três diferentes grupos, os civis ou individuais, 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
os políticos e os sociais. Tais direitos não surgiram todos de uma vez. Como ensina 
Norberto Bobbio em sua obra “A Era dos Direitos”, eles surgiram determinados por 
condições e circunstâncias históricas ao longo do tempo. 
 
O primeiro grupo de direitos que corresponde às liberdades fundamentais como a 
de expressão, pensamento, religião, propriedade, vida, segurança, de ir e vir, surgiram no 
processo de afirmação do indivíduo diante do Estado. Como vimos em tópicos anteriores, 
esse é um princípio próprio da modernidade, ou seja, de que o indivíduo tem o direito de 
existir de acordo com suas próprias vontades e características. 
 
Portanto, os direitos civis ou individuais correspondem ao que garante a afirmação 
e preservação do sujeito, de sua liberdade, de sua privacidade, diante deste poder, que 
costuma ser muito maior que o de cada um de nós, o do Estado. 
 
Numa argumentação típica dos filósofos modernos da tradição iluminista, embora 
todos saibamos da necessidade da existência do Estado e da nossa submissão a ele para 
que a vida em sociedade seja possível, isto não pode significar a perda da 
individualidade, ou seja, o direito de existir e viver de acordo com os próprios valores e 
vontades. 
 
O segundo grupo, o dos direitos políticos, historicamente surgiu junto com os 
individuais. Mas eles mantêm uma outra relação com os fundamentos deste processo de 
construção da cidadania. Os direitos como votar, ser votado, participar da vida cívica, 
garantem o nosso controle sobre o Estado e suas ações. Eles também ajudam a garantir 
a nossa autonomia à medida que, para usar uma expressão conhecida, nos 
“empoderam”. 
 
Os direitos sociais correspondem a uma outra geração. Eles surgiram como 
consequência do exercício de direitos individuais e políticos permitindo que grupos 
inicialmente destituídos de força e representatividade, as minorias, fossem pouco a pouco 
buscando sua afirmação e exigindo mais atenção para o tratamento das desigualdades 
aprofundadas durante o desenvolvimento das sociedades industriais. 
 
No entanto, como mostra Bobbio, se os direitos individuais garantem a nossa 
liberdade, os direitos sociais as limitam já que reforçam o poder do Estado e a 
 
 
53 Ética e Cidadania 
Universidade Santa Cecília - Educação a Distância 
possibilidade de sua intervenção na sociedade. Por exemplo, a educação é um direito 
social que por isso deve ser garantido pelo Estado. Para tanto, o Estado deve não só 
garantir escola para todos, mas exigir que toda a sociedade, o que inclui cada um em 
particular, fiscalize, exija o seu cumprimento e obedeça à obrigação de que todos em 
idade escolar frequentem instituições de ensino. Vamos supor que alguém em razão dos 
seus próprios princípios e valores não queira que seus filhos frequentem a escola? Neste 
caso o indivíduo pode ser processado e até mesmo perder a guarda dos filhos por impedi-
los de exercerem o direito de frequentar a escola. 
 
É importante ainda ressaltar o seguinte, se os direitos que compõem a cidadania 
surgiram ao longo do tempo como resultado de processos históricos, isto significa dizer 
que novos direitos ainda podem surgir à medida que a história da humanidade continua. 
Por exemplo, ressaltada por Dallari (2009, p. 203), há uma terceira geração de direitos 
que ele situa a partir da década de 70 do século XX como o que corresponde ao direito a 
um meio ambiente limpo e saudável. Este direito como outros, o do consumidor, o direito 
ao desenvolvimento,

Continue navegando